- Parecer n.º 5/2018 – Diário da República n.º 37/2018, Série II de 2018-02-21
Educação – Conselho Nacional de Educação
Parecer sobre o projeto de lei de alteração ao Estatuto da Carreira Docente Universitária
«Parecer n.º 5/2018
Parecer sobre o projeto de lei de alteração ao Estatuto da Carreira Docente Universitária
Preâmbulo
No uso das competências que por lei lhe são conferidas e nos termos regimentais, após apreciação do projeto de Parecer elaborado pelos relatores Inês Duarte, Sebastião Feyo de Azevedo e Joaquim Mourato, o Conselho Nacional de Educação, em reunião plenária de 12 de dezembro de 2017, deliberou aprovar o referido projeto, emitindo assim o seu quinto Parecer do ano de 2017.
A Comissão de Educação e Ciência da Assembleia da República solicitou ao Conselho Nacional de Educação parecer sobre o projeto de lei n.º 620/XIII/3.ª, que propõe uma “alteração cirúrgica, mas significativa” ao Estatuto da Carreira Docente Universitária.
A iniciativa legislativa encontra a sua motivação no que os proponentes consideram uma dificuldade: “a vivência do pessoal académico sem o conhecimento e a experiência do ambiente empresarial com o seu ritmo próprio e o foco na criação de valor económico.” O projeto de lei visa, portanto, “introduzir instrumentos que facilitem a mobilidade entre a academia e as empresas (…)”.
Embora nada no articulado do ECDU seja um obstáculo à participação dos professores universitários em projetos realizados em contexto empresarial, desde que os mesmos sejam considerados relevantes pela instituição universitária em que os professores envolvidos desenvolvem a sua atividade, entendemos que a nova redação proposta para o n.º 1 do artigo 77.º põe em destaque um dos objetivos/desafios do Compromisso com o Conhecimento e a Ciência referido no discurso de abertura do “Ciência 2016” proferido pelo Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Nessa intervenção, referia-se esse membro do governo ao desafio que constitui para as instituições científicas e académicas assegurar
“[a] ligação externa efetiva à sociedade e à economia, designadamente às empresas, ao sistema hospitalar e de saúde, às instituições de cultura e às organizações sociais. Refiro-me à capacidade única que as comunidades científicas e académicas apresentam para fazer face à oportunidade, também ela única, de relacionar o conhecimento com o bem-estar e o nosso desenvolvimento social e económico.”
(www.ciencia2016.pt/programa/discursoaberturamctes.pdf – acedido em 20/11/2017).
Quanto à introdução de um n.º 6 no mesmo artigo, somos de parecer que ela não se justifica, repetindo escusadamente parte do articulado do n.º 5.
A considerar-se necessário clarificar que neste artigo se enquadram “projetos inovadores de reconhecido interesse científico e tecnológico em contexto empresarial”, sugerimos uma redação alternativa do n.º 5, como a seguinte (a redação nova está destacada entre aspas)
5 – Independentemente do disposto nos números anteriores, os professores em regime de dedicação exclusiva ou de tempo integral podem ser dispensados do serviço docente, mediante decisão do órgão máximo da instituição de ensino superior, sob proposta do conselho científico, por períodos determinados, “para a realização de projetos inovadores de reconhecido interesse científico, social e tecnológico, inclusivamente, em contexto empresarial.”
Relativamente à introdução de um n.º 7 no mesmo artigo, que exige a elaboração de um relatório por entidade externa competente, somos de parecer que ela nem é suficientemente concreta nem se justifica. Na realidade, o professor é dispensado do serviço docente se o órgão competente da instituição universitária considerar relevante o projeto em causa e, como acontece com qualquer licença sabática, findo o período de duração da dispensa, presta contas perante o mesmo órgão das atividades que se comprometeu a desenvolver durante esse período.
Finalmente, o artigo 4.º do ECDU tem como objeto as “funções dos docentes universitários”. Ora o conteúdo da alínea f) que o projeto de lei propõe seja introduzida neste artigo não configura funções que possam ser cometidas especificamente pelas universidades aos seus professores.
O projeto de lei propõe que seja introduzida uma alínea f) com a seguinte formulação: “Contribuir para a inovação e o desenvolvimento social, cultural, artístico e económico do país”. O CNE concorda que este objetivo faz parte integrante da missão da universidade e dos seus docentes. Ora esta missão, cumprem-na os professores universitários através das funções específicas de docência, de investigação e de extensão que exercem e de que prestam contas. Com efeito, qualquer professor universitário, no âmbito das funções que exerce, aspira a ser um ator na inovação, na produção de conhecimento e na formação das gerações mais jovens, contribuindo deste modo para “o desenvolvimento social, cultural, artístico e económico do país”.
É, portanto, nosso entendimento que esta proposta de alteração não deve ser acolhida.
Finalmente, o CNE reconhece que o ECDU se revela desajustado e pouco claro em vários aspetos, como é o caso do conceito de licença sabática, que necessita de clarificação quanto às condições da sua concessão e às obrigações dela decorrentes.
Assim, o CNE recomenda que a Assembleia da República proceda a uma profunda reflexão sobre o ECDU conducente a uma proposta normativa coerente, articulada e que tenha em consideração os desafios e as mudanças das instituições universitárias num mundo globalizado.
12 de dezembro de 2017. – A Presidente, Maria Emília Brederode Santos.
Declaração de Voto
Votei favoravelmente os pareceres (desfavoráveis) sobre o Projeto de lei de alteração ao Estatuto da Carreira Docente Universitária e o Projeto de lei de alteração ao Estatuto da Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico essencialmente por três ordens de razões: i) não me parece ser claro o fundamento desta “alteração cirúrgica, mas significativa”, como referido por uma das propostas de alteração (N.º 620/XIII/3.ª), parecendo antes que se trata de atender uma questão excessivamente “particular”, que pode criar mais problemas do que aqueles que supostamente resolve; (ii) o quadro atual de licenças sabáticas não impede o desenvolvimento de projetos aplicados em fora das instituições de ensino superior, com a vantagem de um enquadramento legal estabilizado e claro; (iii) embora invocando “a inovação e o desenvolvimento social, cultural, artístico e económico do país” estas propostas parecem focar-se numa visão estreita desse desenvolvimento, localizado apenas nos contextos empresariais. Isabel Menezes»