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Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas


«Lei n.º 8/2018

de 2 de março

Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (Altera o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas e o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado)

A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.º da Constituição, o seguinte:

CAPÍTULO I

Disposições gerais

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei:

a) Cria o Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (RERE);

b) Altera o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (Código do IRC) e o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (Código do IVA);

c) Define a responsabilidade por dívidas tributárias dos administradores judiciais e titulares de órgãos de administração de uma pessoa coletiva ou ente fiscalmente equiparado, que sejam investidos nessas funções na sequência de acordo celebrado nos termos do RERE, da aprovação de plano de revitalização homologado no âmbito de Processo Especial de Revitalização (PER) ou de plano de recuperação aprovado no âmbito de processo de insolvência.

Artigo 2.º

Âmbito objetivo de aplicação do Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas

1 – O RERE regula os termos e os efeitos das negociações e do acordo de reestruturação que seja alcançado entre um devedor e um ou mais dos seus credores, na medida em que os participantes manifestem, expressa e unanimemente, a vontade de submeter as negociações ou o acordo de reestruturação ao regime previsto na presente lei.

2 – Entende-se por acordo de reestruturação, para os efeitos do número anterior, o acordo com vista à alteração da composição, das condições ou da estrutura do ativo ou do passivo de um devedor, ou de qualquer outra parte da estrutura de capital do devedor, incluindo o capital social, ou uma combinação destes elementos, incluindo a venda de ativos ou de partes de atividade, com o objetivo de permitir que a empresa sobreviva na totalidade ou em parte.

Artigo 3.º

Âmbito subjetivo de aplicação do Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas

1 – O RERE aplica-se às negociações e aos acordos de reestruturação que envolvam entidades devedoras que, cumulativamente:

a) Estejam referidas nas alíneas a) a h) do n.º 1 do artigo 2.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março, com exceção das pessoas singulares que não sejam titulares de empresa, na aceção do artigo 5.º do mesmo diploma;

b) Estejam em situação económica difícil ou em situação de insolvência iminente.

2 – Não podem submeter-se ao RERE as negociações nem os acordos de reestruturação quando o devedor seja uma das entidades referidas no n.º 2 do artigo 2.º do CIRE.

3 – Para efeitos do disposto na alínea b) do n.º 1, a situação do devedor é aferida de acordo com o estabelecido no artigo 3.º e no artigo 17.º-B do CIRE.

4 – Para efeitos da presente lei, são credores do devedor os titulares de créditos de natureza patrimonial sobre este, vencidos, vincendos e sob condição, tal como definidos no n.º 1 do artigo 50.º do CIRE, qualquer que seja a sua nacionalidade ou domicílio.

5 – Na medida do que seja necessário à prestação de consentimento relativo a alteração dos termos e condições da garantia, podem intervir nas negociações e no acordo de reestruturação os titulares de garantias sobre bens do devedor, mesmo não sendo credores do devedor.

6 – Podem ser admitidos a intervir nas negociações e no acordo de reestruturação os sócios do devedor, na medida em que, em virtude da lei ou dos estatutos do devedor, seja necessária a sua intervenção ou consentimento.

7 – Para efeitos do acordo de reestruturação, admite-se que grupos de credores sejam representados coletivamente por entidade que esteja mandatada por estes, no caso dos trabalhadores, as organizações representativas dos trabalhadores, para atuar como agente de financiamento e que grupos de beneficiários de garantias sobre bens do devedor sejam representados coletivamente por entidade que esteja mandatada por estes para atuar como agente de garantias.

Artigo 4.º

Natureza voluntária do Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas

1 – As partes são livres de sujeitar ao RERE os efeitos do acordo de reestruturação que alcancem, bem como os efeitos decorrentes das negociações.

2 – A participação nas negociações e no acordo de reestruturação é livre, podendo o devedor para o efeito convocar todos ou apenas alguns dos seus credores, segundo o que considerar mais apropriado a alcançar o acordo de reestruturação, sem prejuízo do disposto nos n.os 5 e 6 do artigo 7.º

Artigo 5.º

Princípios orientadores

1 – O acordo de reestruturação e as respetivas negociações devem pautar-se pelo princípio da boa-fé e pelos Princípios Orientadores da Recuperação Extrajudicial de Devedores aprovados pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 43/2011, de 25 de outubro, sem prejuízo de as partes envolvidas nas negociações poderem, a todo o tempo, adotar um código de conduta.

2 – No decurso das negociações, o devedor deve fornecer às demais partes envolvidas informação atual, verdadeira e completa, que permita aferir com rigor a sua situação económico-financeira e os credores devem partilhar entre si, de forma transparente, a informação que possuam sobre o devedor, sem prejuízo das limitações legais decorrentes de deveres de sigilo a que estejam vinculados.

CAPÍTULO II

Negociação do acordo de reestruturação

SECÇÃO I

Sujeição das negociações ao Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas

Artigo 6.º

Opção pela sujeição das negociações ao Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas e depósito

1 – Caso as partes pretendam que as negociações destinadas a alcançar um acordo de reestruturação produzam os efeitos previstos na secção seguinte, podem sujeitá-las ao RERE, devendo o devedor e credores que representem pelo menos 15 % do passivo daquele que, de acordo com o CIRE, seja considerado não subordinado, para o efeito, assinar um protocolo de negociação e promover o seu depósito na Conservatória do Registo Comercial.

2 – O depósito do protocolo de negociação, do protocolo de alteração e das declarações de adesão podem ser feitos a todo o tempo, por qualquer interessado, segundo o Processo Especial de Depósito do RERE.

3 – As declarações de adesão constantes dos n.os 5 e 6 do artigo 7.º podem ser feitas durante o período em que decorrerem as negociações, por qualquer interessado.

4 – Para verificação do requisito previsto no n.º 1, deve o devedor anexar ao protocolo de negociação uma declaração de um contabilista certificado ou revisor oficial de contas emitida há 30 dias ou menos.

5 – O prazo das negociações resultante do protocolo de negociação, incluindo a prorrogação em que as partes acordem, não pode exceder três meses contados desde a data em que for requerido o respetivo depósito na Conservatória do Registo Comercial.

Artigo 7.º

Protocolo de negociação

1 – O conteúdo do protocolo de negociação é estabelecido livremente entre as partes e contém, pelo menos, os seguintes elementos:

a) Identificação completa do devedor, dos credores participantes, dos representantes do devedor e dos representantes dos credores para efeitos do RERE;

b) Prazo máximo acordado para as negociações, com o limite previsto no n.º 5 do artigo anterior;

c) Passivo total do devedor, apurado de acordo com o disposto no n.º 4 do artigo 3.º;

d) Responsabilidade pelos custos inerentes ao processo negocial, incluindo o custo com a assessoria técnica, financeira e legal, e modo de repartição dos mesmos;

e) Acordo relativo à não instauração pelas partes, contra o devedor no decurso do prazo acordado para as negociações, de processos judiciais de natureza executiva, de processos judiciais que visem privar o devedor da livre disposição dos seus bens ou direitos, bem como de processo relativo à declaração da insolvência do devedor;

f) Data e assinaturas reconhecidas.

2 – O protocolo de negociação pode, adicionalmente, incluir os seguintes elementos:

a) Lista dos fornecedores dos serviços essenciais referidos no artigo 12.º e identificação completa dos respetivos contratos de prestação de serviços;

b) Autorização dos credores participantes para que o devedor divulgue a existência e conteúdo do protocolo de negociação junto dos seus credores, na medida do que o devedor considere necessário à participação de outros credores no processo de negociação ou no acordo em negociação.

3 – O protocolo de negociação é acompanhado, pelo menos, dos seguintes documentos:

a) Certidão do registo comercial do devedor ou código de acesso à respetiva certidão eletrónica e estatutos, se aplicável;

b) Documentos de prestação de contas do devedor relativos aos três últimos exercícios;

c) Declaração do devedor a indicar o detalhe do seu passivo, apurado de acordo com o disposto no n.º 4 do artigo 3.º, designadamente, nome de todos os credores, proveniência, montante e natureza dos créditos, e garantias associadas;

d) Lista de todos os processos judiciais e arbitrais nos quais o devedor seja parte;

e) Justificação para a não apresentação de algum destes documentos, se não forem apresentados com o protocolo de negociação.

4 – O protocolo de negociação e qualquer documento que o altere podem conter os seguintes elementos:

a) Manifestação da opção pela publicidade da existência de negociações nos termos do n.º 1 do artigo 8.º;

b) Identificação do credor líder e do mediador de recuperação de empresas que possa ter sido nomeado;

c) Identificação dos credores que integram o comité de credores e das competências que lhe são atribuídas;

d) Identificação do assessor jurídico e/ou do assessor financeiro nomeado para assistir as partes subscritoras do protocolo de negociação e respetivos termos e condições;

e) Termos e condições aplicáveis ao novo financiamento a conceder no decurso das negociações e respetivas garantias.

5 – Enquanto decorrerem as negociações, qualquer credor do devedor pode, a todo o tempo, aderir ao protocolo de negociação, através de uma declaração de adesão.

6 – Apenas se admitem adesões integrais ao protocolo de negociação, considerando-se não escritas as adesões parciais ou sujeitas a condição, bem como as adesões que incidam apenas sobre parte dos créditos que o credor detém sobre o devedor.

7 – O protocolo de negociação apenas pode ser alterado através de protocolo de alteração e requer o consentimento expresso de todas as partes que o subscreveram inicialmente e das que ulteriormente a ele tenham aderido.

Artigo 8.º

Confidencialidade das negociações e do protocolo de negociação

1 – Sem prejuízo do disposto no número seguinte, as negociações e o conteúdo do protocolo de negociação são confidenciais, exceto se as partes acordarem por unanimidade em dar-lhes publicidade, no todo ou em parte.

2 – Cessa a confidencialidade relativa à existência e ao conteúdo do protocolo de negociação na medida necessária à suspensão dos processos judiciais e à execução judicial da obrigação, previstos respetivamente no artigo 11.º e no n.º 4 do artigo 30.º

3 – O depósito do protocolo de negociação não prejudica a confidencialidade do seu conteúdo.

4 – Caso o protocolo de negociação o autorize expressamente, a Conservatória do Registo Comercial publica anúncio relativo ao início das negociações, identificando o devedor e as partes envolvidas na negociação.

5 – A confidencialidade não prejudica o direito de qualquer entidade que seja parte no acordo de reestruturação a obter cópia dos documentos arquivados na Conservatória do Registo Comercial, nem o direito da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) de aceder aos mesmos, para efeitos de verificação dos pressupostos necessários à produção dos efeitos previstos no artigo 27.º

6 – Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, a segurança social, a AT e os trabalhadores são, obrigatoriamente, informados do depósito do protocolo de negociação e do seu conteúdo, sempre que sejam titulares de créditos sobre o devedor.

7 – O incumprimento do disposto no número anterior, importa a nulidade do protocolo de negociação, bem como de todos os atos a ele inerentes.

SECÇÃO II

Efeitos do depósito do protocolo de negociação

Artigo 9.º

Obrigações do devedor

1 – Após o depósito do protocolo de negociação, o devedor fica obrigado a manter o curso normal do seu negócio e a não praticar atos de especial relevo, tal como definidos nos n.os 2 e 3 do artigo 161.º do CIRE, exceto se previstos no referido protocolo ou se previamente autorizados por todos os credores, diretamente ou através do comité de credores.

2 – Caso o devedor considere não existirem condições para prosseguir com as negociações e decida fazer cessar as mesmas, está obrigado a comunicar essa sua decisão a todos os credores que subscreveram o protocolo de negociação e aos que a ele aderiram ulteriormente, bem como a requerer o depósito de tal comunicação na Conservatória do Registo Comercial.

3 – O cumprimento do disposto no n.º 6 do artigo anterior é da responsabilidade do devedor.

Artigo 10.º

Obrigações dos credores

1 – Sem prejuízo do direito à resolução do protocolo de negociação motivado por violação grosseira pelo devedor das obrigações dele decorrentes, após o depósito daquele, os credores não podem desvincular-se dos compromissos aí assumidos antes de decorrido o prazo máximo previsto para as negociações, embora possam cessar a participação ativa nas mesmas.

2 – A obrigação prevista no número anterior vincula o adquirente do crédito, caso o crédito seja cedido ou por qualquer forma transmitido no decurso do prazo estabelecido no protocolo de negociação ou em documento que o altere, estando o credor cedente obrigado a informar o cessionário da existência e conteúdo do protocolo de negociação.

3 – A obrigação prevista no n.º 1 cessa com a comunicação do devedor prevista no n.º 2 do artigo anterior.

4 – Excetua-se da aplicação dos números anteriores o acordo previsto na alínea e) do n.º 1 do artigo 7.º

Artigo 11.º

Suspensão de processos judiciais

1 – Sem prejuízo de as partes poderem acordar sobre outros efeitos processuais do protocolo de negociação, a participação no protocolo de negociação ou a adesão a este por credor que tenha requerido a insolvência do devedor determina a imediata suspensão do processo de insolvência, caso esta não tenha ainda sido declarada.

2 – Celebrado acordo nos termos da presente lei, e salvo quando o mesmo preveja a manutenção da respetiva suspensão, extinguem-se automaticamente as ações executivas para pagamento de quantia certa instauradas contra a empresa e ou os seus respetivos garantes relativamente às operações garantidas, e, salvo transação, mantêm-se suspensas, por prejudicialidade, as ações destinadas a exigir o cumprimento de ações pecuniárias instauradas contra a empresa e ou os seus respetivos garantes relativamente às operações garantidas.

3 – O disposto no número anterior não se aplica às ações executivas para pagamento de quantia certa ou quaisquer outras ações destinadas a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias, instauradas por credores que não tenham subscrito o acordo.

4 – Cabe ao conservador do registo comercial informar do respetivo depósito os tribunais onde se encontrem pendentes os processos judiciais identificados no protocolo de negociação, por meios eletrónicos, para os efeitos previstos no presente artigo.

Artigo 12.º

Prestação de serviços essenciais

1 – Com o depósito do protocolo de negociação previsto no artigo 6.º, os prestadores dos seguintes serviços essenciais ficam impedidos de interromper o fornecimento dos mesmos por dívidas relativas a serviços prestados em momento anterior ao depósito:

a) Serviço de fornecimento de água;

b) Serviço de fornecimento de energia elétrica;

c) Serviço de fornecimento de gás natural e gases de petróleo liquefeitos canalizados;

d) Serviço de comunicações eletrónicas;

e) Serviços postais;

f) Serviço de recolha e tratamento de águas residuais;

g) Serviços de gestão de resíduos sólidos urbanos.

2 – O disposto no número anterior não afeta os créditos dos fornecedores dos serviços aí indicados que sejam anteriores ao depósito do protocolo de negociação.

3 – A proibição prevista no n.º 1 dura pelo prazo máximo de três meses, exceto se os prestadores aí referidos forem parte do protocolo de negociação e acordarem prazo mais longo.

4 – A proibição prevista no n.º 1 cessa se o devedor não efetuar o pagamento pontual do custo dos serviços que sejam prestados após o depósito do protocolo de negociação.

5 – O custo decorrente do fornecimento de serviços essenciais a prestar ao abrigo do n.º 1 que não seja pago pelo devedor constitui dívida da massa insolvente caso o devedor seja declarado insolvente no prazo de dois anos após o depósito do protocolo de negociação e, nos demais casos, beneficia de privilégio creditório mobiliário geral, graduado antes do privilégio creditório mobiliário geral concedido aos trabalhadores.

6 – Cabe ao devedor comunicar aos prestadores referidos no n.º 1 o depósito do protocolo de negociação.

Artigo 13.º

Situação de insolvência superveniente

Se, após o depósito do protocolo de negociação, o devedor ficar em situação de insolvência, aferida nos termos dos n.os 1 a 3 do artigo 3.º do CIRE, a contagem do prazo de apresentação do devedor à insolvência apenas se inicia após o encerramento das negociações, não sendo nesse caso admissível prorrogação do prazo das negociações ao abrigo da presente lei.

SECÇÃO III

Negociação do acordo de reestruturação

Artigo 14.º

Negociações

1 – Caso não haja sido nomeado previamente, o devedor pode solicitar, no decurso das negociações, a nomeação de um mediador de recuperação de empresas, nos termos do respetivo regime jurídico.

2 – Caso não hajam sido designados previamente, os credores, no decurso das negociações, podem:

a) Designar um credor líder, que será o interlocutor preferencial dos credores no contacto com o devedor, ou mais do que um credor líder, na medida em que os credores considerem que a tutela dos seus interesses justifica essa pluralidade; e

b) Acordar na nomeação de um comité de credores, para acompanhar a atividade do devedor no decurso das negociações e assessorar o credor líder na interligação com o devedor, devendo as funções específicas deste comité de credores ser acordado entre as partes.

3 – Sempre que forem credoras do devedor ou que com este mantenham acordo prestacional, a segurança social e a AT, os trabalhadores e as organizações representativas dos trabalhadores, participam obrigatoriamente nas negociações a realizar ao abrigo do RERE, mesmo que não subscrevam o protocolo de negociação, sem prejuízo do estipulado no artigo 30.º da Lei Geral Tributária, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de dezembro.

Artigo 15.º

Diagnóstico económico-financeiro

1 – No decurso das negociações, o devedor, em articulação com o credor líder, os assessores financeiros e legais, se existirem, e o mediador de recuperação de empresas, se houver sido nomeado, devem elaborar e apresentar de forma transparente aos credores participantes nas negociações o diagnóstico económico-financeiro do devedor que lhes permita conhecer os pressupostos nos quais pode basear-se o acordo de reestruturação.

2 – Para efeitos do diagnóstico económico-financeiro referido no número anterior, pode o devedor recorrer à ferramenta de autodiagnóstico financeiro disponibilizada no sítio na Internet do IAPMEI – Agência para a Competitividade e Inovação, I. P.

SECÇÃO IV

Encerramento

Artigo 16.º

Encerramento das negociações

1 – As negociações encerram-se:

a) Com o depósito do acordo de reestruturação, nos termos previstos no artigo 22.º;

b) Com o depósito da declaração a que alude o n.º 2 do artigo 9.º;

c) Não tendo havido depósito do acordo de reestruturação, decorrido que seja o prazo previsto no protocolo de negociação, sem que haja acordo quanto à extensão do mesmo, ou o prazo máximo previsto no n.º 5 do artigo 6.º;

d) Nos casos previstos no n.º 5.

2 – Com o encerramento das negociações cessam os efeitos previstos na secção II do capítulo II.

3 – O prazo das negociações pode ser prorrogado, por acordo entre o devedor e todos ou alguns dos credores anteriormente envolvidos nas negociações, desde que continue a verificar-se um dos pressupostos previstos na alínea b) do n.º 1 do artigo 3.º

4 – Se, no decurso das negociações, o devedor ficar em situação de insolvência, aferida nos termos dos n.os 1 a 3 do artigo 3.º do CIRE, o prazo das negociações não é suscetível de prorrogação.

5 – Se, no decurso do prazo das negociações, o devedor se apresentar à insolvência ou for declarado insolvente em processo de insolvência requerido por um credor, estas encerram-se automática e imediatamente.

Artigo 17.º

Registo e publicidade do encerramento

1 – Está sujeito a registo pela Conservatória do Registo Comercial, nos termos do Processo Especial de Registo do RERE, o encerramento das negociações com a menção da respetiva causa.

2 – Caso as partes tenham atribuído caráter público às negociações, a Conservatória do Registo Comercial publica anúncio relativo ao termo das negociações e respetiva causa, com indicação sobre se foi ou não alcançado acordo de reestruturação entre as partes.

3 – Para efeitos do disposto no n.º 2 do artigo anterior, é comunicado o encerramento das negociações aos processos judiciais referidos no n.º 4 do artigo 11.º, por via eletrónica, e aos fornecedores de serviços essenciais previstos no artigo 12.º

Artigo 18.º

Novas negociações

1 – O devedor não pode sujeitar ao RERE mais do que um processo de negociação em simultâneo.

2 – Após a conclusão das negociações, tenha ou não sido alcançado acordo de reestruturação, o devedor é livre de sujeitar novas negociações, iniciadas com os mesmos ou com diferentes credores, ao RERE, desde que não viole os termos específicos de acordo anteriormente alcançado ao abrigo deste mesmo regime.

CAPÍTULO III

Acordo de reestruturação

SECÇÃO I

Conteúdo, forma e depósito

Artigo 19.º

Conteúdo do acordo de reestruturação

1 – Sem prejuízo das normas legais que devam ser cumpridas para efeitos do disposto no artigo 29.º, o conteúdo do acordo de reestruturação é fixado livremente pelas partes, podendo compreender, designadamente, os termos da reestruturação da atividade económica do devedor, do seu passivo, da sua estrutura legal, dos novos financiamentos a conceder ao devedor e das novas garantias a prestar por este.

2 – O acordo de reestruturação é acompanhado de:

a) Declaração, redigida em língua portuguesa, emitida por um revisor oficial de contas a atestar que, na data da celebração do acordo, a sociedade não se encontra em situação de insolvência, tendo em conta o disposto nos n.os 1 a 3 do artigo 3.º do CIRE, e a certificar o passivo total do devedor, apurado de acordo com o disposto no n.º 4 do artigo 3.º da presente lei;

b) Lista de todas as ações judiciais em curso contra o devedor movidas por entidades que sejam parte no mesmo, na medida do necessário à produção dos efeitos previstos no artigo 25.º

3 – O acordo de reestruturação pode incidir sobre a totalidade ou sobre parte dos créditos que sejam detidos pelos credores nele participantes.

4 – São nulos os negócios jurídicos celebrados após o início das negociações e na pendência da execução do acordo de reestruturação entre o devedor e qualquer credor participante neste, que tenha como objeto responsabilidades, garantias ou direitos, que tenham sido incluídos no acordo de reestruturação e que disponha em termos diversos do que aí ficou estabelecido.

5 – Os direitos de crédito sobre o devedor e as garantias sobre os seus bens apenas são afetados nos termos especificamente previstos no acordo de reestruturação, desde que os respetivos titulares sejam parte do mesmo.

6 – O acordo de reestruturação deve indicar claramente as alterações dele decorrentes para as posições jurídicas dos credores.

7 – Salvo se o acordo de reestruturação dispuser diversamente, a redução da obrigação do devedor determina a redução da obrigação dos condevedores ou dos terceiros garantes em termos equivalentes aos que resultem para o devedor do acordo de reestruturação.

8 – Os termos do acordo de reestruturação não podem prejudicar o cumprimento das obrigações do devedor enquanto empregador perante os trabalhadores.

Artigo 20.º

Forma do acordo de reestruturação

1 – O acordo de reestruturação é celebrado por escrito e o respetivo conteúdo consta de um único documento, a ser integralmente aceite, ainda que através de termo de adesão, por todos os credores que nele decidam participar.

2 – O acordo de reestruturação e o termo de adesão devem conter o reconhecimento da assinatura dos subscritores.

Artigo 21.º

Confidencialidade do acordo de reestruturação

1 – Sem prejuízo do disposto no número seguinte e dos direitos legais dos sócios à informação, a existência e conteúdo do acordo de reestruturação é confidencial, salvo se as partes acordarem expressamente no mesmo em conferir-lhe publicidade, no todo ou em parte.

2 – A confidencialidade do acordo de reestruturação cessa nos termos previstos na presente lei, designadamente para efeito de extinção dos processos judiciais de acordo com o artigo 25.º e de comunicação à AT de acordo com o artigo 27.º

Artigo 22.º

Depósito do acordo de reestruturação

1 – O acordo de reestruturação, assinado por todas as partes nele intervenientes, fica sujeito a depósito eletrónico na Conservatória do Registo Comercial, a requerimento do devedor ou de qualquer credor, segundo processo especial de depósito do RERE.

2 – Os efeitos previstos nos artigos 27.º e 28.º ficam dependentes do depósito referido no número anterior.

3 – O acordo de reestruturação depositado nos termos do n.º 1 é automaticamente comunicado à AT, por via eletrónica, nos termos do processo especial de registo do RERE.

4 – O depósito do acordo de reestruturação não prejudica a confidencialidade do mesmo.

SECÇÃO II

Efeitos do acordo de reestruturação

Artigo 23.º

Regra geral

1 – O acordo de reestruturação produz efeitos entre o devedor e cada um dos credores após o depósito previsto no artigo anterior, salvo disposição em contrário do próprio acordo, salvaguardando-se, em qualquer caso, o disposto no número seguinte.

2 – O acordo de reestruturação apenas produz efeitos para o futuro.

Artigo 24.º

Efeitos sobre as garantias

1 – Na medida em que o acordo de reestruturação afete garantias preexistentes, o consentimento dos respetivos beneficiários consta como anexo ao próprio acordo.

2 – A constituição de novas garantias e as modificações às garantias prestadas pelo devedor, pessoalmente ou através de bens de sua propriedade, ocorrem com a respetiva formalização segundo as regras que lhe sejam especificamente aplicáveis, podendo os documentos comprovativos ser anexados ao acordo de reestruturação aquando do seu depósito.

Artigo 25.º

Efeitos processuais

1 – Sem prejuízo de o acordo de reestruturação poder dispor diversamente, o seu depósito determina a imediata extinção dos processos judiciais declarativos, executivos ou de natureza cautelar, que respeitem a créditos incluídos no acordo de reestruturação e dos processos de insolvência, desde que a mesma não tenha ainda sido declarada, que hajam sido instaurados contra o devedor por entidade que seja parte no acordo de reestruturação, independentemente de o crédito que funda o pedido ter sido incluído ou não no acordo de reestruturação.

2 – Nos casos em que os processos referidos no número anterior hajam sido instaurados por mais do que uma entidade, os efeitos processuais previstos no presente artigo verificam-se apenas relativamente às entidades que sejam parte no acordo de reestruturação.

3 – Excluem-se do n.º 1 os processos judiciais de natureza laboral, declarativos, executivos ou cautelares.

4 – No prazo de três dias úteis após o depósito do acordo de reestruturação, o conservador do registo comercial comunica, por meios eletrónicos, aos processos judiciais identificados na lista anexa ao acordo de reestruturação prevista na alínea b) do n.º 2 do artigo 19.º, informando-os do respetivo depósito, nos termos e para os efeitos previstos no presente artigo.

Artigo 26.º

Reestruturação societária

As modificações societárias previstas no acordo de reestruturação ocorrem com a respetiva formalização, nos termos das regras legais e estatutárias que lhes sejam aplicáveis.

Artigo 27.º

Efeitos fiscais

1 – O acordo de reestruturação confere às partes os benefícios previstos nos artigos 268.º a 270.º do CIRE, desde que compreenda a reestruturação de créditos correspondentes a, pelo menos, 30 % do total do passivo não subordinado do devedor.

2 – A AT pode, por requerimento fundamentado apresentado por alguma das partes subscritoras do acordo de reestruturação, aceitar que o mesmo produza os efeitos previstos no número anterior, ainda que este não abranja a percentagem do passivo aí referido.

3 – Para os efeitos previstos no n.º 1, o acordo de reestruturação é acompanhado de declaração, redigida em língua portuguesa, emitida por revisor oficial de contas a certificar que o acordo de reestruturação compreende a reestruturação de créditos correspondentes a, pelo menos, 30 % do total do passivo não subordinado do devedor e que, em virtude do acordo de reestruturação, a situação financeira da empresa fica mais equilibrada, por aumento da proporção do ativo sobre o passivo, e os capitais próprios do devedor são superiores ao capital social.

4 – Os titulares de créditos sobre o devedor que, de acordo com o CIRE, sejam considerados créditos subordinados, e o devedor, em relação a tais créditos, apenas podem beneficiar dos efeitos previstos no n.º 1 após autorização específica da AT, a pedido do credor ou do devedor.

5 – Para efeitos do disposto no n.º 12 do artigo 52.º do Código do IRC, presume-se que os acordos de reestruturação que as partes decidam submeter ao RERE e que cumpram o disposto nos n.os 1 a 3, revestem reconhecido interesse económico.

Artigo 28.º

Resolução de negócios em benefício da massa insolvente

1 – Caso o devedor venha a ser ulteriormente declarado insolvente, são insuscetíveis de resolução em benefício da massa insolvente os negócios jurídicos que hajam compreendido a efetiva disponibilização ao devedor de novos créditos pecuniários, incluindo sob a forma de deferimento de pagamento, e a constituição, por este, de garantias respeitantes a tais créditos pecuniários, desde que os negócios jurídicos hajam sido expressamente previstos no acordo de reestruturação, ou no protocolo de negociação que o preceder, e que o acordo de reestruturação contenha a declaração prevista no n.º 3 do artigo anterior.

2 – Cessa a insuscetibilidade de resolução em benefício da massa insolvente prevista no número anterior, se o novo financiamento tiver sido utilizado pelo devedor em benefício da respetiva entidade financiadora ou de entidade que com esta esteja especialmente relacionada, nos termos referidos no artigo 49.º do CIRE.

Artigo 29.º

Articulação com o Processo Especial de Revitalização

Se o acordo de reestruturação for subscrito por credores que representem as maiorias previstas no n.º 1 do artigo 17.º-I do CIRE, ou a ele vierem posteriormente a aderir os credores suficientes para perfazer aquela maioria, pode o devedor iniciar um PER com vista à homologação judicial do acordo de reestruturação, devendo nesse caso acautelar que este cumpre o previsto no n.º 4 do artigo 17.º-I do CIRE.

SECÇÃO III

Incumprimento do acordo de reestruturação

Artigo 30.º

Incumprimento

1 – O incumprimento de alguma das obrigações previstas no acordo de reestruturação não determina a invalidade das demais obrigações dele decorrentes perante o mesmo ou outros credores, nem afeta a validade dos atos que hajam sido praticados em sua execução, designadamente os atos societários.

2 – Na ausência de disposição expressa do acordo de reestruturação:

a) O seu incumprimento por uma das partes legitima a parte afetada pelo mesmo a resolver o acordo de reestruturação;

b) O incumprimento de uma prestação legitima o credor da mesma a declarar imediatamente vencidas todas as demais prestações de que seja credor constantes do acordo de reestruturação;

c) O incumprimento perante um credor não determina o automático incumprimento das demais obrigações constantes do acordo de reestruturação.

3 – Em caso algum a resolução tem efeitos retroativos ou importa a repristinação dos termos originais da obrigação alterada no acordo de reestruturação.

4 – O acordo de reestruturação constitui título executivo relativamente às obrigações pecuniárias nele assumidas pelo devedor.

CAPÍTULO IV

Alteração aos Códigos do IRC e do IVA

Artigo 31.º

Alteração ao Código do IRC

O artigo 41.º do Código do IRC, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de novembro, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 41.º

[…]

1 – …

a) …

b) …

c) …

d) (Revogada.)

e) …

f) …

g) Quando for celebrado e depositado na Conservatória do Registo Comercial acordo sujeito ao Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (RERE) que cumpra com o disposto no n.º 3 do artigo 27.º do RERE e do qual resulte o não pagamento definitivo do crédito.

2 – …»

Artigo 32.º

Alteração ao Código do IVA

O artigo 78.º-A do Código do IVA, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de dezembro, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 78.º-A

[…]

1 – …

2 – …

3 – …

4 – …

a) …

b) …

c) …

d) (Revogada.)

e) Quando for celebrado e depositado na Conservatória do Registo Comercial acordo sujeito ao Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (RERE) que cumpra com o disposto no n.º 3 do artigo 27.º do RERE e do qual resulte o não pagamento definitivo do crédito.

5 – …

6 – …

7 – …

8 – …»

CAPÍTULO V

Responsabilidade dos administradores judiciais

Artigo 33.º

Responsabilidade dos administradores judiciais

Os administradores judiciais ou titulares de órgãos de administração de uma pessoa coletiva ou ente fiscalmente equiparado, que sejam investidos nessas funções na sequência de acordo celebrado nos termos do RERE, da aprovação de plano de revitalização homologado no âmbito de PER ou de plano de recuperação aprovado no âmbito de processo de insolvência, são subsidiariamente responsáveis em relação àquelas e solidariamente entre si, pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo ou depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa coletiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação.

CAPÍTULO VI

Disposições finais e transitórias

Artigo 34.º

Benefícios emolumentares

Os atos de registo que sejam praticados junto da Conservatória do Registo Comercial ao abrigo da presente lei e os atos de registo relativos à execução dos atos previstos no acordo de reestruturação que seja depositado gozam do benefício previsto no n.º 18 do artigo 28.º do Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de dezembro.

Artigo 35.º

Disposições transitórias

1 – Pelo prazo de 18 meses a contar da entrada em vigor da presente lei, podem recorrer ao RERE devedores que estejam em situação de insolvência, aferida nos termos do n.º 3 do artigo 3.º, dispensando-se nesse caso a apresentação da declaração prevista na alínea a) do n.º 2 do artigo 19.º

2 – No período previsto no número anterior e na medida em que o acordo de reestruturação preveja a necessidade de o devedor proceder à reavaliação dos seus ativos ao valor de mercado, as perdas resultantes da reavaliação são admitidas como custo fiscal do respetivo exercício, para efeitos do disposto no artigo 31.º-B do Código do IRC.

3 – Os procedimentos de Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (SIREVE), regulados pelo Decreto-Lei n.º 178/2012, de 3 de agosto, alterado pelo Decreto-Lei n.º 26/2015, de 6 de fevereiro, que estejam em curso sem que tenha sido celebrado acordo, podem ser concluídos ao abrigo do regime em que foram desencadeados, nos termos e prazos estipulados no referido diploma.

4 – Sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 36.º, aos acordos celebrados ao abrigo do número anterior é aplicável a alínea d) do n.º 1 do artigo 41.º do Código do IRC e a alínea d) do n.º 4 do artigo 78.º-A do Código do IVA.

Artigo 36.º

Norma revogatória

1 – Sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo anterior é revogado o Decreto-Lei n.º 178/2012, de 3 de agosto.

2 – São ainda revogados:

a) O n.º 2 do artigo 16.º do CIRE;

b) A alínea d) do n.º 1 do artigo 41.º do Código do IRC;

c) A alínea d) do n.º 4 do artigo 78.º-A do Código do IVA.

Artigo 37.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Aprovada em 15 de dezembro de 2017.

O Presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues.

Promulgada em 12 de fevereiro de 2018.

Publique-se.

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

Referendada em 22 de fevereiro de 2018.

O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa.»

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