- Parecer n.º 13/2018 – Diário da República n.º 103/2018, Série II de 2018-05-29
Educação – Conselho Nacional de Educação
Parecer sobre Regime jurídico dos centros académicos clínicos
«Parecer n.º 13/2018
Parecer Sobre Regime jurídico dos centros académicos clínicos
Preâmbulo
No uso das competências que por lei lhe são conferidas e nos termos regimentais, após apreciação do projeto de Parecer elaborado pelo relator António Fidalgo o Conselho Nacional de Educação, em reunião plenária de 4 de abril de 2018, deliberou aprovar o referido projeto, emitindo assim o seu segundo Parecer do ano de 2018.
Sua Excelência o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior solicitou parecer ao Conselho Nacional de Educação sobre a Proposta de decreto-lei que estabelece o regime jurídico aplicável aos Centros Académicos Clínicos (CAC), aprofundando uma forma de cooperação interinstitucional que promova e garanta a concretização progressiva do desenvolvimento, de forma integrada, das atividades assistencial, de ensino e de investigação clínica e de translação, aplicáveis a todos os centros académicos clínicos e estabelecendo o regime dos projetos-piloto de hospitais universitários.
A. Aspetos gerais
Globalmente, é um documento extremamente importante pois estabelece o quadro de funcionamento, bem como o de avaliação dos CAC, e apresenta vários aspetos positivos. No entanto, são de realçar alguns pontos que deverão ser clarificados e, eventualmente, modificados, de forma a criar um quadro contextual que permita uma implementação e desenvolvimento adequados dos CAC. De facto, há diversos princípios que são enunciados, como, por exemplo, a valorização para concursos, que a não serem introduzidos nas legislações específicas correm o risco de não serem eficazes.
No que diz respeito ao processo de articulação entre as instituições de ensino e as de saúde, para além da criação deste novo nível, a proposta de decreto-lei pouco aporta quanto à resolução dos problemas constatados nesse âmbito. De facto, não inclui sequer regras quanto à seleção de profissionais nem quanto à autonomia de gestão das unidades envolvidas.
Também é de realçar que o preâmbulo faz referência a “hospitais universitários” e a “hospitais com ensino universitário”, não sendo claro se são designações para a mesma tipologia de hospitais, ou se haverá coexistência de duas tipologias diferentes e, neste último caso, o que distingue o perfil de cada uma.
Finalmente, é necessário explicitar de forma mais clara como será o financiamento-base dos CAC, bem como dos “hospitais universitários” como projeto-piloto, uma vez que a articulação entre instituições, no âmbito de um CAC, é exigente e implica um esforço financeiro e de recursos humanos por parte das mesmas, devendo ser mais detalhadas as mais-valias para as instituições, de todos este processo de constituição e desenvolvimento do CAC.
B. Aspetos específicos
I. Natureza e organização dos CAC
O artigo 1.º sobre o objeto do diploma deveria ser mais amplo, nomeadamente contemplando também estruturas já existentes de investigação clínica básica e de desenvolvimento de tecnologias na área da saúde, fomentando a complementaridade e a sinergia com os CAC.
O artigo 5.º refere que os CAC podem assumir a forma de consórcio ou de associação e adotar um modelo de gestão apropriado ao seu objeto. Este aspeto é positivo e fundamental pois permite que cada CAC procure, dentro das restrições inerentes aos consórcios e às associações, um de dois formatos de gestão e funcionamento de CAC que seja o mais adequado às suas características específicas: modelo de cooperação (p.e. França), ou modelo de cogovernação (p.e. Alemanha). Contudo, fica arredado deste processo a natureza e forma do modelo integrado de gestão única, que tão bons resultados tem demonstrado em países como a Holanda, o Reino Unido e países da Escandinávia. Seria desejável que este artigo 5.º pudesse também prever a possibilidade do modelo integrado.
O artigo 8.º refere a autonomia dos membros que integram os CAC mas não esclarece como se deverá processar o alinhamento entre o plano de atividade do CAC e os planos de atividade dos seus membros. Este aspeto é fundamental pois apesar da existência de um plano de atividades, bem como de um plano estratégico, aprovado pelo Conselho Diretivo dos CAC, não está claro que implique, nesta proposta de decreto-lei, que essas atividades deverão também constar dos planos de atividades de cada membro dos CAC, o que poderá conduzir a situações de dificuldade de operacionalização de planos.
O artigo 10.º identifica os órgãos de gestão dos CAC e prevê a Direção e o Conselho Científico e Estratégico. Considerando as diversas tipologias dos CAC em Portugal, talvez fosse indicado que os CAC pudessem optar por ter também um Comité Executivo, nomeado pela Direção, e que permitisse agilizar o funcionamento operacional dos CAC com um número mais alargado de membros.
O artigo 13.º enumera as competências da direção dos CAC. No seu n.º 2 identifica as competências ligadas à atividade do CAC e, na alínea b), refere que deverão “Desenvolver a formação pré-graduada…”. Contudo, claramente não compete aos CAC desenvolver esse tipo de formação mas sim estimulá-la e promovê-la. Essa função mais direta compete às instituições com ensino universitário e politécnico, incluídas nos CAC, com o apoio das unidades de saúde e centros de investigação que colaborem com as instituições de ensino.
O artigo 16.º refere que os membros dos CAC afetam à concretização dos objetivos dos centros os seus recursos humanos, financeiros e materiais que se revelem necessários à execução dos planos de atividades aprovados, nos termos da legislação em vigor, atendendo à sua natureza e modelo de gestão. Este aspeto é importante pois salienta que tem de haver uma participação e contribuição efetiva dos membros dos CAC na dinâmica dos mesmos. Contudo, será desejável que esta proposta de decreto-lei defina mais claramente alguns aspetos ligados à mobilidade de recursos humanos das instituições-membro dos CAC e ao CAC propriamente dito. De facto, a carência de recursos humanos poderá dificultar essa mobilidade. Em ligação com este ponto, situa-se um outro que diz respeito à eventual transferência de hierarquia de comando para o CAC, em relação ao pessoal mobilizado. Este ponto deverá ser clarificado, sendo desejável evitar que pessoal que foi cedido por alguma das instituições ao CAC possa ser retirado ou impedido de cumprir funções prementes no Centro, pelo facto de ter de cumprir funções que se sobrepõem, ligadas à instituição que o cedeu.
O artigo 18.º menciona as competências a exercer por decisão conjunta dos responsáveis máximos dos membros de um CAC. Uma vez que nem sempre poderão ser os responsáveis máximos de cada instituição a figurar na Direção, conforme consta das Portarias de criação de cada CAC, é necessário clarificar melhor o exercício desta “decisão conjunta”, nomeadamente se poderá ser exercida pelo representante designado por cada instituição membro para a Direção. Para além deste ponto, também será muito importante a inclusão de um número adicional neste artigo que indique e clarifique a forma de o plano do CAC ficar refletido nos planos das entidades que integram o centro.
II. Financiamento dos CAC
1) O financiamento dos CAC é um dos pontos mais importantes do enquadramento legal. De facto, tem de ser clarificado como é que vai ocorrer o financiamento deste tipo de associação ou consórcio interinstitucional pois a constituição dos CAC que cumpram realmente os objetivos e as funções designadas pela legislação tem encargos financeiros adicionais claros.
2) Em segundo lugar, o artigo 17.º indica que parte do financiamento dos CAC vem de atividades dos Centros, pois claramente assume que as receitas dos membros do CAC, resultantes da atividade dos centros, são afetas prioritariamente ao desenvolvimento da atividade destes, respeitando os planos de atividades previamente aprovados. Contudo, é preciso considerar que os CAC, independentemente do valor institucional individual de cada membro constituinte, estão, na maior parte dos casos, ainda em fase de consolidação das suas articulações interinstitucionais, à luz das ações integradas entre membros, para a investigação, o ensino e a prestação de cuidados de saúde, conforme indicado nesta proposta de decreto-lei e nas Portarias de criação de cada CAC. Assim, será fundamental apoiar esse desenvolvimento inicial através do financiamento de um período de instalação dos CAC, que poderá ser de um ou dois anos, e que permita desenvolver as atividades iniciais que poderão, posteriormente, criar um financiamento mais autónomo para cada CAC, como resultado de ações e iniciativas estratégicas.
3) Por outro lado, o n.º 4, do artigo 22.º, refere que a avaliação externa positiva dos CAC determina a possibilidade de atribuição de um financiamento programático plurianual pela FCT, ou por agência a indicar pela FCT, numa percentagem a propor pelo painel de avaliação do financiamento total obtido por todas as unidades de investigação científica e de desenvolvimento tecnológico que incluem o CAC. Este ponto implica que os CAC poderão ter acesso a financiamento de base, o que é positivo, mas que fica bastante limitado pela indexação ao montante total obtido pela(s) unidade(s) de investigação dos CAC. Estes aspetos têm de ser mais clarificados, pois suscitam várias questões: Como vai ocorrer o financiamento-base dos CAC? Está sempre garantido, desde que cumpridos os pressupostos acima referidos? O financiamento dos CAC surge apenas em função da investigação, devido à indexação? Se se pretende desenvolver a investigação clínica porque razão é que o financiamento é indexado ao das unidades de investigação que, na maior parte dos casos, são de interesse e foco não clínico?
4) Ainda no que respeita ao financiamento-base dos CAC, não deveria ser a nova agência clínica AICIB – Agência de Investigação Clínica e Inovação Biomédica, que inclui na sua direção a FCT, entre outras instituições, a financiar os CAC, na sua componente de investigação clínica, com um financiamento-base adequado? Ou a “agência a indicar pela FCT”, mencionada em diversos pontos da proposta de DL, é a AICIB? Este ponto deverá ser clarificado, uma vez que a criação da AICIB já foi aprovada em Conselho de Ministros, e tem um foco prioritariamente de promoção da investigação clínica, que é um dos principais objetivos da investigação a desenvolver nos CAC, permitindo assim aproximar a investigação clínica do patamar de excelência já atingido pela investigação mais fundamental em Portugal.
III. Aspetos de recursos humanos: recrutamento e progresso na carreira
1) O artigo 20.º foca o desenvolvimento da atividade de investigação, de ensino e assistencial pelos profissionais de saúde e refere, no seu n.º 1, que os profissionais de saúde das unidades prestadoras de cuidados de saúde integradas em CAC podem, nos termos e condições definidas em contrato-programa a celebrar entre o Estado e as entidades que integram os CAC, sujeito a autorização dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da saúde, dedicar até 30 % do período normal de trabalho semanal:
a) A atividades de investigação clínica e de translação desenvolvidas no CAC;
b) Ao ensino nas instituições de ensino superior que integrem o CAC, até ao limite de quatro horas semanais.
Mais ainda, o n.º 2 do artigo 20.º refere que o disposto nos números anteriores não pode conduzir ao aumento de encargos com novos recrutamentos, salvo se compensado com o acréscimo de receita proveniente da atividade desenvolvida.
Estes aspetos são cruciais, mas necessitam de esclarecimentos complementares uma vez que 30 % do tempo de cada clínico que possa estar envolvido vai ter impacto em termos de redução de atividade assistencial das unidades de saúde dos CAC. Isso significa que a produtividade (atos e serviços efetivamente prestados) destas unidades poderá baixar, uma vez que é retirado algum tempo assistencial, que é transferido para atividades de ensino e de investigação. Em particular, os hospitais que estejam constituídos como Centros Hospitalares e que são financiados por atividade desenvolvida (atos e serviços efetivamente prestados: Decreto-Lei n.º 18/2017, de 10 de fevereiro; Lei de Bases da Saúde, aprovada pela Lei n.º 48/90, de 24 de agosto, alterada pela Lei n.º 27/2002, de 8 de novembro) poderão ver o seu financiamento reduzido pela tutela por causa da diminuição da sua produtividade. É importante que esta questão fique esclarecida indicando, nomeadamente se haverá lugar a financiamento adicional, por parte da tutela, ou se o regime de financiamento dos Centros Hospitalares integrados em CAC será semelhante ao das Unidades Locais de Saúde (que são financiadas per capita, isto é, com base na população abrangida, com alguns ajustes), para que as instituições de saúde se sintam motivadas a avançar para este tipo de modelo de atividades.
2) No preâmbulo e no ponto 3, do artigo 20.º, preconiza-se a valorização das atividades de ensino e investigação desenvolvida pelos profissionais de saúde, nas instituições de ensino superior e nas unidades de saúde, para efeitos de recrutamento. Este aspeto parece adequado, de forma a que se consiga consolidar cada vez mais os recursos humanos dos CAC. Contudo, é fundamental que a valorização destas atividades também seja necessária para progressão na carreira nos CAC, para que não haja estagnação dos recursos humanos, em termos de produtividade.
3) Por outro lado, também no preâmbulo e no ponto 4, do artigo 20.º, é referido que a atividade assistencial desenvolvida pelos profissionais de saúde é valorizada para efeitos de progressão na carreira e categoria respetiva, no contexto académico e das unidades de investigação integradas em CAC. Este aspeto é adequado, mas também deverá haver reciprocidade no caso de clínicos que tenham atividades essencialmente na carreira académica, para que estas também sejam valorizadas na carreira clínica. Só assim haverá complementaridade.
IV. Avaliação dos CAC
1) No n.º 1, do artigo 22.º, refere-se que atividade dos CAC é objeto de avaliação externa sujeita aos princípios da qualidade, imparcialidade, transparência e independência. Este ponto é muito importante e deve ser analisado em conjunto com a Resolução do Conselho de Ministros n.º 22/2016, de 11 de abril, que cria o Conselho Nacional de Centros Académicos Clínicos (CNCAC). A referida Resolução especifica que este Conselho tem como função, entre outras, “c) A definição de termos de referência para o estabelecimento de rotinas de acompanhamento e avaliação externa independente dos Centros Académicos Clínicos, incluindo a introdução de formas inovadoras de avaliação e de acompanhamento externo”. Deverá haver uma clarificação que relacione a atual proposta de decreto-lei e a Resolução do Conselho de Ministros, embora se possa inferir esta relação no n.º 4, do artigo 22.º que refere que a FCT, ou agência a indicar pela FCT, ouvidos a A3ES, a ACSS, a DGS e o CNCAC, designa um painel de avaliadores independentes para proceder à avaliação externa.
2) Por outro lado, o n.º 4, do artigo 22.º, refere que a avaliação externa dos CAC é coordenada pela FCT ou por agência indicada pela FCT, o que poderá determinar a possibilidade de atribuição de um financiamento programático plurianual pela FCT, ou agência a indicar pela FCT. Uma vez mais, e considerando a natureza da investigação que se quer desenvolver nos CAC, não deveria ser a nova agência clínica AICIB, a avaliar os CAC? Ou a “agência a indicar pela FCT”, mencionada em diversos pontos da proposta decreto-lei, é a AICIB? Mais ainda, esta avaliação externa, da primeira vez que for efetuada, ainda não terá atribuído nenhum financiamento programático plurianual. Assim sendo, quem financia a instalação e desenvolvimento dos CAC até essa primeira avaliação? E há lugar a avaliação nos casos em que não há financiamento-base atribuído? O que têm os CAC a ganhar, nesse sentido?
E o Ministério da Saúde não financia a componente de otimização de cuidados de saúde centrados no doente? Estes pontos deverão ser considerados e clarificados na atual proposta de decreto-lei.
3) Ainda no n.º 1, do artigo 22.º, os critérios de avaliação procuram monitorizar atividades de integração e de colaboração, avaliando o mérito, a criação de valor pela articulação e o desenvolvimento de uma organização colaborativa, o que parece ser extremamente importante pois só assim fará sentido a atuação de um CAC.
4) No ponto 2, do artigo 22.º, refere-se que a avaliação externa mencionada no número anterior tem em consideração os resultados da avaliação ou acreditação de cada um dos membros do centro académico clínico nas áreas de investigação, assistência médica e ensino, efetuadas, respetivamente pela FCT, ou agência a indicar pela FCT (será a AICIB?), pela ACSS, pela A3ES ou pela DGS, sendo coordenada pela FCT, ou por agência a indicar pela FCT, conjuntamente com a ACSS, em estreita articulação com a A3ES e a DGS, ouvido o CNCAC. Esta proposta de decreto-lei deverá ser mais explícita no que se refere a esta avaliação externa pois corre-se o risco de constituir uma avaliação separada por várias agências, quando o que se pretende é avaliar, acima de tudo, as ações de colaboração conjuntas, integradas, e os seus benefícios. Assim, esta proposta de decreto-lei deverá clarificar se haverá uma avaliação única integrada, na qual participem as agências acima referidas, sob coordenação, que seria a situação desejável.
5) Uma nota para o facto de que, ao longo da proposta de decreto-lei há vários pontos em que está previsto ouvir o CNCAC, o que pode ser discutível. Se, por um lado, o Conselho é constituído pelas escolas e hospitais que constituem os CAC e possa não fazer sentido que tenha de se pronunciar sobre si próprio e sobre as suas atividades, os pontos em que tal é mencionado não levantam problemas significativos e, na realidade, não está em causa julgar as suas próprias atividades. De facto, o CNCAC é ouvido, em conjunto com agências como a A3ES, a ACSS, e a DGS, e não de forma isolada. Para além disso, não efetua a avaliação propriamente dita (o que seria um contrassenso) mas, ao ser ouvido, pode dar a sua opinião em termos da avaliação externa e dos avaliadores, evitando situações que possam ser injustas. Deve, uma vez mais, ser levada em conta a indicação da Resolução do Conselho de Ministros n.º 22/2016, de 11 de abril, mencionada na alínea 1 deste ponto IV.
O CNCAC apenas tem um papel de liderança na monitorização dos projetos-piloto dos hospitais universitários, o que poderá fazer sentido, à semelhança do que se passa com uma associação que procura garantir que os seus associados cumprem as regras definidas e está de acordo com a Resolução do Conselho de Ministros anteriormente referida.
V. Projetos-piloto de hospitais universitários
A proposta de decreto-lei propõe repensar a forma de atuação dos hospitais universitários e dos hospitais com ensino universitário em Portugal, através da implementação de projetos-piloto de referência internacional que garantam formas integradas e inovadoras das atividades assistencial, de ensino e de investigação clínica e de translação. Isto é importante porque a tentativa anterior (DL n.º 206/2004, de 19 de agosto) foi de aplicação difícil ou inexistente. Contudo, há alguns pontos que deverão ser clarificados:
1) No n.º 1, do artigo 28.º, refere-se que as unidades de saúde dos CAC com certificação de acreditação da qualidade e segurança da prestação de cuidados podem, ouvido o CNCAC, desenvolver projetos-piloto de hospitais universitários, para prosseguir os objetivos do artigo 4.º Contudo, não está definido quem aprova o desenvolvimento desses projetos-piloto e quais os critérios para essa aprovação.
2) No n.º 2, do artigo 28.º, são descritos os requisitos que os hospitais universitários devem cumprir, e que parecem adequados. Contudo, não é claro o que são “hospitais com ensino universitário”, mencionados no Preâmbulo, e se estes representam uma outra categoria distinta de hospitais universitários. Se for este o caso, deverão igualmente ser descritos os requisitos a cumprir.
3) No n.º 2, do artigo 29.º, é referido que os projetos-piloto vigoram pelo prazo de três anos, com possibilidade de prorrogação por período igual e sucessivo, mediante proposta do CNCAC, ouvida a FCT, ou agência a indicar pela FCT, e a ACSS. Este período parece ser adequado, mas apenas se for considerado o tempo de prorrogação do prazo para seis anos, para a qualificação de um hospital como hospital universitário, tendo em conta as consideráveis alterações de paradigma de funcionamento e as consequentes implicações no financiamento-base a atribuir pela tutela e no financiamento a captar pelos CAC, para estes projetos-piloto. De facto, é preciso tempo para desenvolver e consolidar este tipo de projetos, se realmente se quer atingir dinâmicas com benchmarking internacional.
4) No n.º 1, do artigo 30.º, é definida a forma de monitorização dos projetos-piloto, que cabe ao CNCAC, com o apoio da FCT ou de agência a indicar pela FCT, bem como da ACSS. O que parece correto, como já referido anteriormente.
5) No n.º 2, do artigo 30.º, são definidos os indicadores de monitorização dos hospitais universitários, e que incluem aspetos ligados a: a) serviços clínicos; b) ensino e formação e c) investigação clínica.
A subalínea i), da alínea a) serviços clínicos, estabelece um novo referencial de cuidados de saúde, “cuidados centrados no doente…” que é fundamental caso este seja um objetivo real e concreto. Segundo os cuidados internacionais, conforme previsto por iniciativas como o ICHOM (International Consortium for Health Outcomes Measurement), isto envolve uma mudança de paradigma e vai implicar que haja forte articulação entre os diversos níveis de cuidados de saúde (aspetos organizacionais), bem como aspetos de financiamento (vai implicar um referencial de pagamento que não pode ser por atos e serviços prestados, mas que terá de ser por resultados obtidos). Este aspeto não está adequadamente salvaguardado nas alíneas que dizem respeito ao financiamento dos hospitais universitários.
Por outro lado, a subalínea ii) da alínea a) refere “Prestação de serviços diferenciados, nomeadamente no âmbito de centros de referência…”. Este ponto é fundamental e parece muito importante a inclusão da palavra “nomeadamente”, para não limitar as características de qualidade apenas nos “Centros de Referência” cuja atribuição a Serviços Clínicos tem demonstrado algum desequilíbrio, em termos nacionais.
A subalínea iv) da mesma alínea a) é igualmente importante, ao clarificar que é necessário haver “Demonstração de estruturas de apoio à interligação das áreas de prestação de cuidados de saúde, de formação e de investigação.” De facto, este aspeto é fundamental enquanto objetivo dos CAC, que irão desenvolver “Hospitais Universitários” como projetos-piloto e que deverão ser avaliados precisamente por essas estruturas e ações de apoio à interligação entre áreas.
Finalmente, este mesmo aspeto de interligação é salientado pela subalínea vi) que refere a “Promoção da integração de cuidados de saúde e garantia de articulação da prestação desses cuidados com os cuidados de saúde primários, continuados e paliativos e das redes de referenciação hospitalares do sistema de saúde.”
As subalíneas da alínea b), que dizem respeito ao Ensino e Formação, parecem adequadas pois salientam a necessidade dos profissionais de saúde, e também dos serviços e unidades, estarem envolvidos em ensino pré e pós-graduado.
As subalíneas da alínea c), que dizem respeito à Investigação Clínica, parecem adequadas, estando focadas claramente no compromisso de envolvimento em investigação clínica, de translação e em estudos observacionais com “elevada” produção científica, mas indexada ao número de profissionais do estabelecimento, o que é fundamental. Compromete também o hospital na diferenciação dos profissionais de investigação em saúde, bem como na consagração de tempo no horário para esse fim. Finalmente, cada hospital terá de demonstrar contribuição efetiva para a captação de recursos financeiros para atividades de I&D, o que é fundamental, e justifica que este tipo de capacitação pode surgir mais facilmente em hospitais integrados em CAC.
6) Uma vez mais, é de realçar que esta proposta de decreto-lei pouco clarifica em termos do financiamento dos projetos-piloto (Hospitais Universitários). Este é um ponto absolutamente crucial pois implica alterações significativas nas instituições, com esforço em termos de recursos humanos e de orçamento. Assim, deverá ser clarificada a forma de financiamento específico dos hospitais universitários, para que fiquem claros os benefícios dos mesmos.
VI. Avaliação dos projetos-piloto de hospitais universitários
O artigo 31.º refere que o regime previsto no respetivo capítulo (projetos-piloto de hospitais universitários) é avaliado no prazo de dois anos a contar da entrada em vigor do decreto-lei, devendo o CNCAC elaborar e apresentar um relatório aos membros do Governo responsáveis pelas áreas da ciência, tecnologia e do ensino superior e da saúde, com vista à redefinição do conceito e do estatuto dos hospitais universitários, dos hospitais com ensino universitário e dos serviços com ensino universitário, tal como definidos pelo Decreto-Lei n.º 206/2004, de 19 de agosto.
Este texto é pouco claro em relação ao regime e momento de avaliação dos projetos em si mesmos, bem como quem efetuará essa avaliação.
VII. Disposições finais
O n.º 2, do artigo 32.º, clarifica um aspeto importante ao indicar que os CAC poderão solicitar alterações às portarias da sua criação. Isto é relevante pois a dinâmica de um CAC pode implicar a necessidade de inclusão de membros adicionais, que possam contribuir adequadamente para a missão dos mesmos e, acima de tudo, para a qualificação e sua consolidação, num referencial de excelência, em termos de ensino, investigação e prestação de cuidados de saúde à população.
4 de abril de 2018. – A Presidente, Maria Emília Brederode Santos.»