- Regulamento n.º 515/2018 – Diário da República n.º 151/2018, Série II de 2018-08-07
Ordem dos Enfermeiros
Regulamento de Competências Específicas do Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica
«Regulamento n.º 515/2018
Regulamento de Competências Específicas do Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica
Preâmbulo
Com a entrada em vigor das alterações ao Estatuto da Ordem dos Enfermeiros (EOE) introduzidas pela Lei n.º 156/2015, de 16 de setembro, e ao contrário do que se verificava até esta alteração, o Estatuto da Ordem dos Enfermeiros passou a identificar os Títulos de Enfermeiro Especialista passíveis de serem atribuídos, conforme se encontra estabelecido no seu artigo 40.º, os quais correspondem aos seguintes: (i) enfermeiro especialista em enfermagem de saúde materna e obstétrica; (ii) enfermeiro especialista em enfermagem de saúde infantil e pediátrica; (iii) enfermeiro especialista em enfermagem de saúde mental e psiquiátrica; (iv) enfermeiro especialista em enfermagem de reabilitação; (v) enfermeiro especialista em enfermagem médico-cirúrgica; (vi) enfermeiro especialista em enfermagem comunitária.
Assim e no que tange aos cuidados de enfermagem, estes têm como finalidade ajudar o ser humano a manter, melhorar e recuperar a saúde, ajudando-o a atingir a sua máxima capacidade funcional tão rapidamente quanto possível. As pessoas que se encontram a viver processos de sofrimento, alteração ou perturbação mental têm ganhos em saúde quando cuidados por enfermeiros especialistas em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica (EESMP), diminuindo significativamente o grau de incapacidade que estas perturbações originam. O EESMP compreende os processos de sofrimento, alteração e perturbação mental do cliente assim como as implicações para o seu projeto de vida, o potencial de recuperação e a forma como a saúde mental é afetada pelos fatores contextuais.
Assim, a enfermagem de saúde mental e psiquiátrica foca-se na promoção da saúde mental, na prevenção, no diagnóstico e na intervenção perante respostas humanas desajustadas ou desadaptadas aos processos de transição, geradores de sofrimento, alteração ou doença mental.
Na especificidade da prática clínica em enfermagem de saúde mental e psiquiátrica, são as competências de âmbito psicoterapêutico, que permitem ao enfermeiro EESMP desenvolver um juízo clínico singular, logo uma prática clínica em enfermagem distinta das outras áreas de especialidade.
Durante o processo de cuidar da pessoa, da família, do grupo e da comunidade, ao longo do ciclo vital, essa especificidade permite desenvolver uma compreensão e intervenção terapêutica eficaz na promoção e proteção da saúde mental, na prevenção da doença mental, no tratamento e na reabilitação psicossocial.
O EESMP, para além da mobilização de si mesmo como instrumento terapêutico, desenvolve vivências, conhecimentos e capacidades de âmbito terapêutico que lhe permitem durante a prática profissional mobilizar competências psicoterapêuticas, sócio terapêuticas, psicossociais e psicoeducacionais. Esta prática clínica permite estabelecer relações de confiança e parceria com o cliente, assim como aumentar o insight sobre os problemas e a capacidade de encontrar novas vias de resolução.
No que respeita à sua participação no tratamento das pessoas com doença mental, as intervenções do EESMP visam contribuir para a adequação das respostas da pessoa doente e família face aos problemas específicos relacionados com a doença mental (adesão à terapêutica, auto cuidado, ocupação útil, stress do prestador de cuidados, etc.), tendo como objetivo evitar o agravamento da situação e a desinserção social da pessoa doente, e promover a recuperação e qualidade de vida de toda a família.
Ao mobilizar na prática clínica um conjunto de saberes e conhecimentos científicos, técnicos e humanos e ao demonstrar níveis elevados de julgamento clínico e tomada de decisão, traduzidos num conjunto de competências clínicas especializadas, o EESMP possibilita também que a pessoa, durante o processo terapêutico, viva experiências gratificantes quer na relação intrapessoal quer nas relações interpessoais.
O cliente é um ser único e, como tal, com vulnerabilidades próprias que nesta área dos cuidados de enfermagem, podem determinar, em situação limite, ser envolvidos nos cuidados involuntariamente, pela aplicação do enquadramento legal específico. No mesmo sentido e dele decorrente, podem receber cuidados, que no momento vão contra o seu desejo. Estas particularidades afetam a natureza da relação enfermeiro-cliente e podem colocar dilemas éticos complexos, que necessitam ser sistematicamente objeto de reflexão.
O avanço no conhecimento requer que o EESMP incorpore continuamente as novas descobertas da investigação na sua prática, desenvolvendo uma prática baseada na evidência, orientada para os resultados sensíveis aos cuidados de enfermagem, participando também em projetos de investigação que visem aumentar o conhecimento e desenvolvimento de competências dentro da sua especialização.
Nesta conformidade, nos termos conjugados das alíneas c) d) e f) do n.º 1 artigo 42.º do Estatuto da Ordem dos Enfermeiros, após aprovação em Assembleia de Colégio, a Mesa do Colégio de Especialidade de Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica apresentou ao Conselho Diretivo, a sua proposta de Regulamento, tendo o mesmo sido aprovado na reunião de 22 de dezembro de 2017, em Conselho Diretivo.
Foi ouvido o Conselho de Enfermagem, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do artigo 37.º, emitido Parecer pelo Conselho Jurisdicional, em observância dos termos conjugados da alínea h), do n.º 1 do artigo 27 e da alínea h), do n.º 1 do artigo 32, todos do Estatuto da Ordem dos Enfermeiros, tendo a proposta de Regulamento sido submetida a consulta pública dos membros do respetivo Colégio da Especialidade, nos termos do disposto no artigo 101.º do Código de Procedimento Administrativo.
Assim,
A Assembleia Geral da Ordem dos Enfermeiros, reunida em sessão extraordinária no dia 3 de janeiro de 2018, ao abrigo do disposto nas alíneas i) e o) do artigo 19.º do Estatuto da Ordem dos Enfermeiros, aprovou o seguinte Regulamento de Competências Específicas do Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica, tendo sido homologado por despacho de 08 de maio de 2018 de Sua Excelência o Senhor Secretário de Estado Adjunto e da Saúde, Dr. Fernando Araújo:
Artigo 1.º
Objeto
O presente regulamento define o perfil das competências específicas do enfermeiro especialista em enfermagem de saúde mental e psiquiátrica.
Artigo 2.º
Âmbito e Finalidade
O perfil de competências específicas do enfermeiro especialista em enfermagem de saúde mental e psiquiátrica integra, junto com o perfil das competências comuns, o conjunto de competências clínicas especializadas que visa prover um enquadramento regulador para a certificação das competências e comunicar aos cidadãos o que podem esperar.
Artigo 3.º
Conceitos
Os termos utilizados no presente Regulamento regem-se pelas definições previstas no artigo 3.º do Regulamento que estabelece as competências comuns dos enfermeiros especialistas.
Artigo 4.º
Competências específicas do enfermeiro especialista em enfermagem de saúde mental e psiquiátrica
1 – As competências específicas do enfermeiro especialista em enfermagem de saúde mental e psiquiátrica são as seguintes:
a) Detém um elevado conhecimento e consciência de si enquanto pessoa e enfermeiro, mercê de vivências e processos de autoconhecimento, desenvolvimento pessoal e profissional;
b) Assiste a pessoa ao longo do ciclo de vida, família, grupos e comunidade na otimização da saúde mental;
c) Ajuda a pessoa ao longo do ciclo de vida, integrada na família, grupos e comunidade a recuperar a saúde mental, mobilizando as dinâmicas próprias de cada contexto;
d) Presta cuidados psicoterapêuticos, sócio terapêuticos, psicossociais e psicoeducacionais, à pessoa ao longo do ciclo de vida, mobilizando o contexto e dinâmica individual, familiar de grupo ou comunitário, de forma a manter, melhorar e recuperar a saúde.
2 – Cada competência prevista no número anterior é apresentada com descritivo, unidades de competência e critérios de avaliação (Anexo I).
Artigo 5.º
Norma revogatória
Com a publicação deste documento é revogado o Regulamento n.º 129/2011, aprovado pela Assembleia Geral da Ordem dos Enfermeiros e publicado na 2.ª série do Diário da República, n.º 35, de 18 de fevereiro.
Artigo 6.º
Entrada em vigor
O presente Regulamento entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação no Diário da República.
9 de maio de 2018. – A Bastonária da Ordem dos Enfermeiros, Ana Rita Pedroso Cavaco.
ANEXO I
1 – Detém um elevado conhecimento e consciência de si enquanto pessoa e enfermeiro, mercê de vivências e processos de autoconhecimento, desenvolvimento pessoal e profissional.
Descritivo:
A capacidade de autoconhecimento e desenvolvimento pessoal, mediante a vivência de técnicas psicoterapêuticas e sócio terapêuticas, é central para a prática de enfermagem de saúde mental, visto que, ao interferir na capacidade para estabelecer uma relação terapêutica e desenvolver intervenções psicoterapêuticas, sócio terapêuticas, psicossociais e psicoeducativas condiciona os resultados esperados.
2 – Assiste a pessoa ao longo do ciclo de vida, família, grupos e comunidade na otimização da saúde mental.
Descritivo:
Recolha de informação necessária e pertinente à compreensão do estado de saúde mental dos clientes, incluindo a promoção da saúde, proteção da saúde e a prevenção da perturbação mental. O processo de avaliação exige a mobilização de aptidões de comunicação, sensibilidade cultural e linguística, técnica de entrevista, de observação do comportamento, de revisão dos registos, avaliação abrangente do cliente e dos sistemas relevantes.
3 – Ajuda a pessoa ao longo do ciclo de vida, integrada na família, grupos e comunidade a recuperar a saúde mental, mobilizando as dinâmicas próprias de cada contexto.
Descritivo:
Sistematização, análise dos dados, determinação do diagnóstico de saúde mental, identificação dos resultados esperados, planeamento, desenvolvimento e negociação do plano de cuidados com o cliente e a equipa de saúde. Prescrição dos cuidados a prestar baseadas na evidência, de forma a promover e proteger a saúde mental, prevenir a perturbação mental, minimizar o desenvolvimento de complicações, promover a funcionalidade e a qualidade de vida do indivíduo, tomando em consideração o ciclo vital e centrando a atenção nas respostas do cliente a problemas de saúde, reais ou potenciais. O processo de diagnóstico exige integração e interpretação dos diversos dados, diagnóstico diferencial, bem como pensamento crítico. Utilização da gestão de caso para coordenar cuidados de saúde e para assegurar a continuidade de cuidados, integrando as necessidades dos clientes e equipas, otimizando os resultados existentes. O método de gestão de caso inclui atividades como: organização, avaliação, negociação, coordenação e integração de serviços e benefícios para o cliente.
4 – Presta cuidados psicoterapêuticos, sócio terapêuticos, psicossociais, e psicoeducacionais, à pessoa ao longo do ciclo de vida, mobilizando o contexto e dinâmica individual, familiar de grupo ou comunitário, de forma a manter, melhorar e recuperar a saúde.
Descritivo:
A implementação das intervenções identificadas no plano de cuidados de modo a ajudar o cliente a alcançar um estado de saúde mental próximo do que deseja e/ ou a adaptar e a integrar em si mesmo a situação de saúde/doença vivida, mobiliza cuidados psicoterapêuticos, sócio terapêuticos, psicossociais e psicoeducacionais. O tratamento para recuperar a saúde mental, a reabilitação psicossocial, a educação e o treino em saúde mental tem como finalidade ajudar a pessoa a realizar as suas capacidades, atingir um padrão de funcionamento saudável e satisfatório e contribuir para a sociedade em que se insere. Envolve as capacidades do enfermeiro para interpretar e individualizar estratégias através de atividades tais como ensinar, orientar, descrever, instruir, treinar, assistir, apoiar, advogar, modelar, capacitar, supervisar.