Parecer do Ministério Público sobre a legalidade das regularizações dos valores faturados à ADSE


«Parecer n.º 31/2018

ADSE – Hospitais Privados – Contrato Administrativo Regulamento Administrativo

1.ª O acesso dos beneficiários aos cuidados de saúde e demais prestações sociais disponibilizados pelo Instituto de Proteção e Assistência na Doença IP (ADSE) pode ser feito mediante o reembolso das despesas ao beneficiário (previamente suportadas por este) ou, então, mediante o pagamento direto à entidade prestadora de serviços, em conformidade com as tabelas e regras de pagamento em vigor (artigo 19.º n.º 3, do Decreto-Lei n.º 118/83, de 25 de fevereiro)

2.ª Para este efeito, «o diretor-geral da ADSE pode celebrar acordos com instituições hospitalares do setor público, privado ou cooperativo, bem como com quaisquer outras entidades singulares ou coletivas, em ordem a obter e a oferecer, com a necessária prontidão e continuidade, as prestações que interessam ao prosseguimento dos seus fins» (artigo 37.º do Decreto-Lei n.º 118/83, de 25 de fevereiro).

3.ª A celebração destes acordos obedece a uma minuta tipo (que pode ser consultada no sítio online da ADSE) da qual constam as condições em que esta celebra com o interessado a convenção destinada a regular a prestação de serviços de saúde aos seus beneficiários.

4.ª Entre essas condições, consta a possibilidade de atualização automática das tabelas e das regras em vigor, mediante mera notificação ao segundo outorgante (cláusula 5.º, n.º 2, da Convenção tipo).

5.ª Em 2009, atendendo às revindicações de alguns dos convencionados, a ADSE celebrou com os prestadores de serviços atas adicionais às convenções anteriormente outorgadas, criando dois códigos globais, sem preços fixos, que permitem a faturação global de todos os consumos utilizados.

6.ª Neste último caso, contudo, nos termos das referidas atas adicionais, a ADSE «reserva-se o direito de corrigir os valores faturados através dos códigos 6032 e 6074 sempre que excederem em 10 % os valores médios praticados pelos prestadores congéneres e depois de ponderadas as justificações do prestador».

7.ª Por despacho do Diretor Geral, de 29 de agosto de 2014, a ADSE agregou num mesmo documento todas as tabelas de preços em vigor, bem como as regras gerais específicas aplicáveis a cada um dos cuidados de saúde/códigos referenciados, que anteriormente estavam dispersos por vários documentos autónomos.

8.ª Para além disso, alterou, igualmente, alguns códigos que anteriormente tinham um valor fixo, passando o prestador a poder proceder à faturação global destes consumos e a ADSE a poder regularizar os valores apurados, caso sejam superiores às médias acrescidas de 10 %, ou, em algumas situações, com base no menor valor praticado pelos prestadores envolvidos.

9.ª Essas alterações foram devidamente comunicadas às entidades prestadoras convencionadas em finais de agosto de 2014, sendo aplicáveis aos serviços de saúde prestados a partir de 1 de outubro de 2014, tendo as entidades convencionadas mantido a faturação nos códigos sujeitos a regularizações já existentes e passado a utilizar os novos códigos regularizáveis então criados.

10.ª As convenções devidamente celebradas entre a ADSE e os prestadores de serviços são contratos administrativos atípicos.

11.ª Mesmo assim, estas convenções, apesar de serem contratos administrativos, contêm cláusulas regulamentares que são fonte de direitos e deveres para terceiros, que não participaram na sua celebração.

12.ª Os efeitos regulamentares desencadeados com a celebração do negócio jurídico, não modificam, contudo, a natureza contratual do ato jurídico em causa (contrato), não pressupondo, pois, o regime juridicamente previsto para a formação e para a impugnação dos regulamentos.

13.ª O poder de atualização unilateral das tabelas de preços e das regras de faturação decorre do próprio contrato (cláusula 5.ª, n.º 2), sendo uma manifestação paradigmática e legítima da vontade inicial das partes.

14.ª O procedimento de regularização relativo aos anos de 2015 e 2016 é legal, não podendo ser afastado por eventuais vícios na elaboração, formação e celebração da convenção e na atualização automática das tabelas de preços e regras em vigor.

Senhora Ministra da Saúde,

Excelência:

I

Submeteu Sua Excelência o, então, Ministro da Saúde, nos termos da alínea a), do artigo 37.º, do Estatuto do Ministério Público, a emissão de parecer urgente a este Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República (1) invocando o seguinte:

«Considerando o diferendo surgido entre a ADSE, IP. e a Associação Portuguesa de Hospitalização Privada no que respeita às regularizações dos valores faturados relativos aos anos de 2015 e 2016, previstas nas “regras, procedimentos e tabelas da rede ADSE” (doravante designadas por “Tabelas”) adotadas em 2009 e 2014 foi solicitado parecer à Senhora Auditora Jurídica, junto deste Ministério, relativamente à legalidade de tal procedimento objeto de controvérsia.

Subsequentemente, foi elaborado o competente parecer, anexo ao presente ofício, o qual conclui que:

A prestação de cuidados de saúde em regime convencionado assenta em acordos/convenções celebradas pela ADSE, IP, com entidades prestadoras privadas, que estabelecem os cuidados de saúde objeto dos mesmos e a tramitação da entrega da faturação, integrando as regas e tabelas de preços correspondentes.

As entidades prestadoras conhecem e aderiram aos termos da convenção que preveem regularização, ou seja, aceitaram que os valores faturados sejam suscetíveis de ser corrigidos de acordo com as regas fixadas.

Os métodos de regularização dos pagamentos efetuados relativamente a cuidados de saúde prestados em códigos abertos, são não só legais, como exigíveis em obediência aos princípios que regem a atuação da ADSE, IP., nomeadamente os princípios de garantia de eficiência económica na gestão, da transparência e da sustentabilidade, previstos no art. 6.º do Decreto-Lei n.º 7/2017, de 9 de janeiro.

Tendo em conta eventuais medidas de limitação de acesso dos beneficiários da ADSE à rede de convencionados que a APHP possa levar a cabo, o elevado número de beneficiários afetados e as consequências que tais medidas poderiam acarretar para o aumento da procura no Serviço Nacional de Saúde (SNS), serve a presente para, neste contexto, ao abrigo do disposto no artigo 37.º, al.ª a), do Estatuto do Ministério Público, solicitar parecer do Conselho Consultivo, quanto ao tema da legalidade das pretendidas regularizações».

Importa, pois, emitir parecer relativo à legalidade das regularizações dos valores faturados, relativos aos anos de 2015 e 2016, de acordo com as regras, procedimentos e tabelas da rede ADSE, adotadas em 2009 e 2014.

II

Origem e natureza da ADSE

A ADSE (Assistência na Doença aos Servidores Civis do Estado) foi criada em 1963, pelo Decreto-Lei n.º 45002, de 27 de abril. Embora já existissem algumas normas especiais, válidas para alguns serviços autónomos, só nessa altura foi criado um regime geral, aplicável a todos os funcionários civis do Estado. Como, então, se referia no preâmbulo do referido diploma: «pelo presente decreto-lei estabelece-se uma proteção na doença, segundo esquema capaz de abranger, com a maior latitude, as modalidades de assistência médica e cirúrgica, materno-infantil, de enfermagem e medicamentosa, em realização gradual por todo o País, a fim de abranger a totalidade dos servidores. Além disso, prevê-se que tais benefícios possam vir a estender-se aos agregados familiares, e que se institua ainda uma ação social em ordem a completar o esquema agora introduzido, no que se refere à correção dos problemas surgidos ou interferidos pela doença».

Desta forma pioneira, ainda antes da criação do Serviço Nacional de Saúde, o legislador nacional procurava equiparar os servidores do Estado aos trabalhadores das empresas privadas, que, através dos mecanismos consagrados no Estatuto do Trabalho Individual usufruíam (como à data se dizia) de «um esquema de benefícios muito mais amplo do que o concedido àqueles que constituem o vasto número dos servidores do Estado» (2). Logo no ano seguinte, prosseguindo naquele louvável desiderato inicial, o Decreto n.º 45688, de 27 de abril de 1964, regulamentou o referido regime legal, criando efetivas condições para a sua concretização e implementação prática.

Apesar da Constituição da República Portuguesa prever a criação do Serviço Nacional de Saúde (3) (depois instituído pela Lei n.º 56/79, de 15 de setembro), a ADSE não foi extinta com a revolução de 25 de abril de 1974 (e a nova mundividência dai resultante), mantendo-se, enquanto sistema autónomo, continuando os funcionários públicos a beneficiar dos seus serviços diferenciados e a contribuir, obrigatoriamente, para o seu financiamento.

Com efeito, pouco tempo depois da criação do SNS, procurando reorganizar e redimensionar os serviços da ADSE «em ordem a dotá-los dos meios materiais e humanos necessários e suficientes à prossecução de modo adequado, dos seus objetivos», o Decreto-Lei n.º 476/80, de 15 de outubro, embora mantendo a sigla inicial, transformou a Assistência na Doença aos Servidores Civis do Estado em Direção-Geral de Proteção Social aos Funcionários e Agentes da Administração Pública, enquanto serviço específico dotado de autonomia administrativa, na direta dependência do Ministério das Finanças e do Plano. Desta forma, foi criado – como logo se alertou no preâmbulo do diploma – um organismo central de proteção social na administração pública, dotado da estrutura adequada à coordenação de todos os benefícios ao tempo oferecidos pelo sistema. Em vez de optar pela inclusão dos beneficiários da ADSE no SNS, o legislador post revolucionário manteve a autonomia do sistema supletivo que lhes é aplicável.

Em 1983, procurando regulamentar este novo regime legal, reunir uma série de legislação avulsa, mas também introduzir algumas inovações, o Decreto-Lei n.º 118/83, de 25 de fevereiro, estabeleceu o funcionamento e o esquema de benefícios da Direção-Geral de Proteção Social aos Funcionários e Agentes da Administração Pública (ADSE), «no sentido de facultar aos seus funcionários uma melhor segurança social, buscando a unidade do sistema no setor indispensável para uma distribuição equitativa dos benefícios por todos os funcionários públicos» (4). Aquele regime orgânico e institucional foi, mais uma vez completado, pelas normas necessárias à sua boa implementação prática, que, como iremos ver, apesar dos aperfeiçoamentos institucionais que a ADSE veio sofrendo ao longo dos anos, no essencial, ainda se mantém inalterado.

No final do milénio, considerando o universo dos beneficiários (que, então, rondavam o milhão e meio) e a diversidade sempre crescente de apoios concedidos e respetivos encargos, o legislador entendeu que era «imperioso proceder ao ajustamento, redimensionamento e racionalização da estrutura orgânica, quadro de pessoal e modelo de funcionamento da Direção-Geral de Proteção Social aos Funcionários e Agentes da Administração Pública (ADSE), dotando-a dos recursos e dos instrumentos de gestão necessários à sua transformação num organismo moderno e apto a responder com eficiência e qualidade às realidades do presente e aos desafios do futuro». Para o efeito, através do Decreto-Lei n.º 279/99, de 26 de julho, aprovou a nova «Orgânica da Direção-Geral de Proteção Social aos Funcionários e Agentes da Administração Pública (ADSE)». As normas de funcionamento, criadas pelo Decreto-Lei n.º 118/83, de 25 de fevereiro, apesar de alguns retoques operativos, mantiveram, todavia, a sua plena autonomia e valia, assim demonstrando a bondade prática e dogmática das soluções nelas ab initio consagradas.

O Decreto Regulamentar n.º 23/2007, de 29 de março, no intuito de «proceder à reestruturação da ADSE, por forma a corresponder à responsabilidade acrescida que lhe é atribuída na gestão dos benefícios e da rede de prestadores, na sequência da conformação dos subsistemas e na administração das receitas decorrentes dos descontos obrigatórios […] e, bem assim, para dar satisfação às orientações veiculadas por aquela resolução» (5) criou uma nova orgânica da Direção-Geral de Proteção Social aos Funcionários e Agentes da Administração Pública (ADSE), mas manteve integralmente o seu antigo modus de funcionamento (Decreto-Lei n.º 118/83).

Em 2012, em plena intervenção da troika, procurando tornar a Administração Pública mais eficiente e racional na utilização dos, cada vez mais, escassos recursos públicos e reduzir a despesa pública, o Decreto Regulamentar n.º 44/2012, de 20 de junho de 2012, voltou a reorganizar a estrutura orgânica da ADSE, em consonância com o disposto na orgânica do Ministério das Finanças (6). Mais uma vez, porém, racionalizou-se a estrutura orgânica, mas manteve-se o seu modo de funcionamento.

Finalmente, através do Decreto-Lei n.º 7/2017, de 9 de janeiro (7), «tendo em vista a respetiva sustentabilidade, a estabilidade do seu modelo de governação, a representatividade dos seus associados e a autonomia para assegurar uma gestão técnica profissional e eficiente, atendendo ao número de titulares e beneficiários da ADSE, à utilidade pública que é reconhecida à ADSE pelos serviços que presta no âmbito da proteção social dos trabalhadores das administrações públicas, a necessidade de promover a confiança dos associados bem como de assegurar a continuidade das suas atividades», o legislador alterou outra vez a natureza jurídica da ADSE, atribuindo-lhe a natureza de instituto público de regime especial. Tal alteração organizacional, foi «também, ao encontro das recomendações do Tribunal de Contas, tendo em conta que a missão e os objetivos da ADSE não se confundem com o exercício de funções que competem ao Estado, considerando necessária a alteração do regime jurídico que regula o esquema de benefícios da ADSE e a responsabilidade financeira da mesma por cuidados prestados aos seus quotizados, atribuindo-lhe um regime jurídico de autonomia administrativa e financeira, e de participação dos quotizados na sua governação, ao nível das decisões estratégicas e de controlo financeiro» (8).

1.1 – Toda esta evolução foi conduzida no sentido da gestão eficiente dos recursos disponíveis (artigo 6.º, n.º 1, alª b), do Decreto-Lei n.º 7/2017 (9)), da transparência (artigo 6.º, n.º 1, alª d), da sustentabilidade (artigo 6.º, n.º 1, alª e), mas também do exercício da atividade de acordo com elevados padrões de qualidade (artigo 6.º, n.º 1, alª a).

1.2 – Apesar desta grande instabilidade legal, de que apenas referimos os pontos mais importantes, a ADSE manteve sempre, desde que foi criada em 1963, uma natureza eminentemente pública: primeiro, enquanto serviço central da administração direta do Estado, dotado de autonomia administrativa (10); depois, enquanto instituto público, de regime especial e de gestão participada, integrado na administração indireta do Estado, dotado de autonomia administrativa e financeira e de património próprio (11).

Para além disso, não obstante a revolução de 25 de abril de 1974 e a subsequente criação do SNS, a ADSE manteve também a sua autonomia enquanto serviço nacional supletivo aplicável aos servidores do Estado.

III

O modus operandi da ADSE

Igualmente, apesar desta grande instabilidade legal, a organização, o funcionamento e o esquema de benefício da ADSE mantiveram-se (com meras alterações de pormenor) no Decreto-Lei n.º 118/83, de 25 de fevereiro (12), que define a natureza, âmbito e fins (capítulo I); os beneficiários (capítulo II); as eventualidades e benefícios (capítulo III); os direitos, os deveres e a responsabilidade disciplinar dos beneficiários (capítulo IV); o financiamento e a responsabilidade pelo pagamento (capítulo V); a gestão financeira (capítulo VI); e contempla, ainda, diversas disposições finais e transitórias (capítulo VII); desta forma, regulando o efetivo funcionamento prático e o esquema de benefícios dos utentes da ADSE.

Nos termos deste regime (consolidado, não obstante aquelas alterações, ao longo de 35 anos de vigência), o acesso dos beneficiários aos cuidados de saúde e demais prestações sociais (13) pode ser feito mediante o reembolso das despesas ao beneficiário (previamente suportadas por este) ou, então, mediante o pagamento direto à entidade prestadora de serviços, em conformidade com o legalmente estabelecido (art. 19. n.º 3 (14)).

No primeiro caso, o beneficiário escolhe no mercado o prestador do serviço, segundo as suas conveniências pessoais, aufere do mesmo e paga-lhe, sendo, depois, reembolsado de acordo com os montantes previamente fixados (15); no segundo caso (aquele que ora nos interessa), o beneficiário escolhe um prestador de serviço com convenção com a ADSE, usufrui do mesmo serviço, que depois é, diretamente, pago pela ADSE, em conformidade com o legalmente estabelecido, devendo o prestador (se for o caso disso) apenas cobrar a eventual comparticipação do utente no ato médico, concretamente, praticado. Para este efeito, nos termos do 37.º do referido decreto-lei, «o diretor-geral da ADSE pode celebrar acordos com instituições hospitalares do setor público, privado ou cooperativo, bem como com quaisquer outras entidades singulares ou coletivas, em ordem a obter e a oferecer, com a necessária prontidão e continuidade, as prestações que interessam ao prosseguimento dos seus fins» (16). Poder/dever de «celebrar os acordos, convenções, contratos e protocolos que interessem ao desempenho da sua missão e acompanhar o cumprimento dos mesmos» depois, igualmente, referido no artigo 3.º, alª b), do Decreto-Lei n.º 7/2017, de 9 de janeiro (17).

O êxito desta segunda modalidade depende, pois, da criação de uma rede alargada de pessoas (singulares ou coletivas) com convenção com a ADSE, que se dispõe a prestar o serviço, nos termos materiais e organizacionais por ela determinados e mediante o pagamento por ela depois, igualmente, efetuado. Ao contrário daquela primeira modalidade, o beneficiário não tem aqui que adiantar o pagamento.

1 – A celebração dos referidos acordos obedece a uma minuta tipo (que pode ser consultada no sitio online da ADSE (18)) da qual constam as condições em que o Instituto de Proteção e Assistência na Doença IP celebra com o interessado (hospital, clínica, médico) convenção destinada a regular a prestação de serviços de saúde aos beneficiários da ADSE.

Assim, aderindo (na integra ou em parte) às referidas cláusulas contratuais homogéneas, estipuladas unilateralmente pela ADSE, os interessados podem passar a fazer parte da rede de prestadores de serviços com convenção com a ADSE (19) e usufruir da procura do elevado número de beneficiários que ela abrange. Não está, pois, ao alcance de nenhum deles negociar condições específicas, porventura económica ou organizacionalmente mais favoráveis. Apenas podem aderir in totum ou in partem ao clausulado, previamente, fixado e – insistimos – válido para todos os convencionados.

2 – No que concerne ao pagamento dos serviços de saúde prestados aos beneficiários que optem por esta segunda modalidade, a convenção de prestação de cuidados de saúde celebrada entre a ADSE e os vários prestadores de serviços remete para as tabelas de preços e regras em vigor publicitadas no portal da ADSE (cláusulas 1.ª, n.os 1 e 5, 4.ª, n.º 1, alª c), 5.ª n.os 1, 2 e 4 e 8.ª n.º 1). Em vez de regular integralmente os montantes a pagar e o modo do seu facturamento (individual ou global), a convenção remete essas matérias para as tabelas e as regras unilateralmente fixadas e publicitadas pela ADSE.

Com efeito, estas tabelas descrevem o serviço médico praticado, o respetivo código e os encargos suportados pela ADSE e, se for o caso, pelo beneficiário, respetivamente, indicando, assim, o montante concreto que cada um deve suportar. O eventual montante suportado pelo beneficiário é cobrado, de imediato, no momento da realização do próprio ato, sendo o montante suportado pela ADSE pago posteriormente, nos termos previstos na convenção subscrita.

Os preços constantes destas tabelas são, normalmente, fixos, não podendo ser alterados nem pelo prestador do serviço, nem, tão pouco, pela ADSE, que, todavia, conserva o poder de proceder à sua atualização (cláusula 5.ª, n.º 2, da convenção). O prestador dos serviços sabe, previamente, quanto vai receber pela sua prestação técnica e sabe, igualmente, que a ADSE pode, a todo o tempo, alterar esses mesmos montantes fixos.

Porém, em 2009, atendendo às revindicações de alguns dos convencionados, a ADSE celebrou com os prestadores de serviços atas adicionais às convenções anteriormente outorgadas, criando dois códigos globais (6074 para cirurgias em ambulatório e 6032 para cirurgias com internamento) sem preços fixos (20). Estes códigos permitem a faturação global de todos os consumos utilizados na sala cirúrgica e não têm qualquer valor máximo, podendo o prestador debitar qualquer importância. Deste modo, passou a haver códigos com preço fixo (em que a um determinado ato corresponde sempre um determinado montante) e códigos com preço aberto (em que a um determinado ato não corresponde sempre um determinando montante).

Neste último caso, contudo, nos termos das referidas atas adicionais, a ADSE «reserva-se o direito de corrigir os valores faturados através dos códigos 6032 e 6074 sempre que excederem em 10 % os valores médios praticados pelos prestadores congéneres e depois de ponderadas as justificações do prestador» (cf. n.º 1, alª d), da referida ata adicional). Deste modo, uma vez que o valor global não pode (salvo a bondade da justificação prestada) exceder em 10 % o valor médio praticado pelos prestadores congéneres, também os montantes, assim, faturados acabam por ser, de certa forma, limitados. Em princípio, não podem ultrapassar 10 % daquele valor médio.

Por despacho do Diretor Geral, de 29 de agosto de 2014 (num esforço de racionalização e de uniformização), a ADSE agregou num mesmo documento todas as tabelas de preços em vigor, bem como as regras gerais e específicas aplicáveis a cada um dos cuidados de saúde/códigos referenciados, que anteriormente estavam dispersas por vários documentos autónomos.

Para além disso, alterou, igualmente, o código 6640 (denominado «materiais de penso, antisséticos e outros consumos» (21)), que anteriormente tinha um valor fixo de (euro) 29,93 por cada dia de internamento com cirurgia, passando (à semelhança dos códigos 6032 e 6074) o prestador a poder proceder à faturação global destes consumos e a ADSE a poder regularizar os valores apurados, caso sejam superiores às médias acrescidas de 10 % (22).

Também os medicamentos antineoplásicos e imunomodulares (código 6636 (23)) e próteses intraoperatórias (código 7501) foram sujeitos à mesma regra das regularizações; neste último caso, com base no menor valor praticado pelos prestadores envolvidos (24).

Essas alterações foram, devidamente, comunicadas às entidades prestadoras convencionadas em finais de agosto de 2014, sendo aplicáveis aos serviços de saúde prestados a partir de 1 de outubro de 2014, tendo as entidades convencionadas mantido a faturação nos códigos sujeitos a regularizações já existentes (6032 e 6074) e passado a utilizar os novos códigos regularizáveis então criados (6636, 6640 e 7501).

O processo de regularizações referente à faturação emitida entre 2011 e 2014 decorreu normalmente, tendo as entidades convencionadas (67 entidades) pago as regularizações devidas nos montantes exigidos pela ADSE, num valor que totalizou 4,9 milhões de euros.

Os cálculos relativos às regularizações relativas aos anos de 2015 e 2016 foram concluídos em 2017, atingindo, segundo a ADSE, um montante de cerca de 35 milhões de euros. Neste momento, existe um diferendo sobre os mesmos entre a ADSE e a Associação Portuguesa de Hospitalização Privada.

IV

A natureza da relação estabelecida entre a ADSE e os prestadores de cuidados de saúde

O desempenho das funções da ADSE desencadeia uma relação jurídica triangular: ADSE/prestadores dos Serviços/beneficiários. Todos eles acabam por estar, inelutavelmente, envolvidos. A ADSE organiza o sistema e assume, total ou parcialmente, os custos; o prestador dos serviços disponibiliza (neste caso, sem prévio pagamento) os cuidados de saúde em causa; o beneficiário usufrui dos mesmos (pagando apenas, se for o caso, uma pequena contrapartida), assim se gerando, conforme a situação concreta, diversos direitos e obrigações, cuja natureza importa, naquilo que ora nos interessa, esclarecer.

1 – Ao longo dos tempos, devido à crescente utilização pela administração de instrumentos típicos do direito privado (25), a doutrina propôs vários critérios para distinguir a natureza administrativa ou privada dos contratos praticados pela administração. A mera paternidade dos mesmos já não é suficiente para a sua caracterização: muitos contratos, apesar de celebrados pela administração pública, seguem as regras do direito privado, sendo, por isso, necessário (tirando, como é óbvio, os contratos ope legis administrativos) determinar qual a sua verdadeira natureza jurídica.

Um dos critérios utilizados para o efeito é o critério da sujeição ou subordinação, segundo o qual, sempre que a administração estiver numa posição de superioridade em relação ao privado, o contrato será administrativo. Na velha fórmula de Marcelo Caetano nos contratos administrativos «o acordo tem como efeito principal (senão exclusivo) submeter o particular à vontade do Estado numa relação de subordinação especial: o particular obriga-se a cooperar com o Estado em tudo quanto seja necessário para a realização de certo interesse público, sujeitando-se às ordens que para esse efeito receba e o Estado em troca promete-lhe apoio, proteção jurídica e, normalmente, remuneração» (26).

Outro critério, agora retirado do direito comparado, é o critério do objeto do contrato, nos termos do qual o contrato será administrativo sempre que constitua, modifique ou extinga uma relação jurídica de direito administrativo. A natureza do contrato deveria ser definida «em função da índole da relação jurídica por ele constituída, modificada ou extinta», determinada, «por seu turno, pela natureza dos efeitos de direito (Wirkungen ou Rechtsfolgen) que a integram ou/e da situação de facto (Sachverhalten) a que respeita» (27).

O terceiro critério, não muito diferente do anterior, reputa o contrato administrativo, quando ele prossegue fins de imediata utilidade pública. «É a salvaguarda dos fins de interesse público que justifica as prerrogativas reconhecidas à Administração contratante e que explica que o contencioso de tais relações contratuais seja confiado aos tribunais administrativos» (28).

Segundo outro critério, serão atos administrativos todos os contratos que constituam «um processo próprio do agir da Administração pública e que cria, modifica ou extingue relações jurídicas, disciplinadoras em termos específicos do sujeito administrativo, entre pessoas coletivas da Administração ou entre a Administração e os particulares» (29).

O Código de Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442/91, de 15 de novembro (em vigor à data da consolidação do modus operandi da ADSE), reconhecendo a valia destes elementos distintivos, optou pelo critério do objeto, definindo o contrato Administrativo como «o acordo de vontades pelo qual é constituída, modificada ou extinta uma relação jurídica administrativa» (30). Necessário seria, depois, definir apenas o conceito de relação jurídica administrativa.

O Código dos Contratos Públicos (31), na sua versão original, consagrou no artigo 1.º, n.º 6, sem prejuízo do disposto em lei especial, categorias identificadoras do caráter administrativo do contrato:

a) Contratos que, por força da lei ou da vontade das partes, sejam qualificados como contratos administrativos ou submetidos a um regime substantivo de direito público;

b) Contratos com objeto passível de ato administrativo e demais contratos sobre o exercício de poderes públicos;

c) Contratos que confiram ao cocontratante direitos especiais sobre coisas públicas ou o exercício de funções dos órgãos do contraente público;

d) Contratos que a lei submeta, ou que admita que sejam submetidos, a um procedimento de formação regulado por normas de direito público e em que a prestação do cocontratante possa condicionar ou substituir, de forma relevante, a realização das atribuições do contraente público (32).

Com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31 de agosto, esta norma passou para o artigo 280.º, mantendo, porém, o seu conteúdo definitório inalterado.

2 – Neste contexto dogmático e legal, as convenções devidamente celebradas pela ADSE para a prestação efetiva dos serviços que constituem o seu múnus são (como iremos desenvolver melhor infra (33)) verdadeiros contratos administrativos atípicos.

Desde logo, porque estas convenções têm, pelo menos, como parte a ADSE, enquanto instituto público integrado na Administração Indireta do Estado (34). Um dos sujeitos que as celebra tem (como já veremos melhor) uma posição de superioridade em relação aos contraentes privados, visível na faculdade de impor cláusulas contratuais inegociáveis, justificáveis, apenas, por exclusivas razões de prossecução do interesse público.

Depois, porque estas convenções são a forma legal encontrada para o desenvolvimento e a concretização efetiva dos fins públicos, politicamente atribuídos à ADSE. É através destes acordos, convenções, contratos ou protocolos que ela dispensa os cuidados de saúde que constituem a sua finalidade pública última (art. 1.º e 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 7/2017). O recurso ao mesmo tipo de solução contratual (convenção) está, aliás, igualmente previsto (apesar de algumas diferenças) no Decreto-Lei n.º 139/2013, de 9 de outubro, que aprovou o regime jurídico das convenções para prestação de cuidados de saúde aos utentes do SNS. Também aí se consagrou uma figura que se aproxima dos contratos de adesão: «uma vez que a contratação dos cuidados de saúde em regime de convenção inicia-se com a adesão do interessado aos requisitos constantes do clausulado tipo de cada convenção (n.º 1, do art. 4.º)» (35). Como reconhece o próprio preâmbulo do diploma, por essa via «estabeleceu-se um modelo especial de contratação pelo Estado com os operadores privados para a prestação de cuidados de saúde, assente na figura do contrato de adesão, ao qual as pessoas singulares ou coletivas privadas, apenas têm de aderir e preencher os requisitos constantes no clausulado tipo, aprovado por Despacho do Ministro da Saúde» (36).

Em terceiro lugar, porque estes contratos têm subjacentes normas de direito público, que conferem à ADSE prerrogativas de direito público na sua execução, nomeadamente a atualização automática dos preços e das regras de faturação (cláusula 5.º, n.º 2); a publicitação das tabelas em vigor no Portal da ADSE (cláusula 1.ª, n.º 5); a imposição de procedimentos, maxime no que respeita à prescrição de medicamentos [cláusula 4.ª, n.º 1, alª e)]; a possibilidade de acesso aos locais de prestação de serviços para efeitos de verificação do cumprimento das obrigações contratuais [cláusula 4.ª, n.º 2, alª d)]; a verificação da qualidade de beneficiário da ADSE mediante a exibição do respetivo cartão (cláusula 3.ª, n.º 1) ou, mesmo, o poder de denúncia unilateral do contrato (cláusula 11.ª, n.º 3) (37). As prerrogativas da administração pública são bem visíveis ao longo de todo o contrato.

Trata-se, pois, de um contrato administrativo atípico, uma vez que, embora as convenções não estejam expressamente reguladas como tal contêm determinados elementos característicos do contrato administrativo, nos termos do artigo 280.º do Código dos Contratos Públicos: A lei, apesar de prever a sua celebração, não define, nem carateriza, ainda que de forma minimalista, o seu regime (38).

2.1 – A classificação destas convenções como contrato administrativo não implica, necessariamente, a sua imediata sujeição a todas as regras do Código dos Contratos Públicos. Com efeito, o regime aí previsto comporta exceções, não sendo a parte II aplicável à formação dos contratos públicos que tenham por objeto a aquisição de serviços sociais e de outros serviços específicos referidos no seu anexo IX, salvo quando o valor de cada contrato for igual ou superior ao limiar previsto na alínea d), do n.º 3, do artigo 474.º, caso em que se aplica o disposto nos artigos 250.º-A a 250.º-C (39).

Em todo o caso, mesmo nestas situações excluídas (40), são aplicáveis, com as devidas adaptações, os princípios gerais da atividade administrativa e os princípios gerais da contratação pública previstos no artigo 1.º-A (art. 6.º-A/2 do CCP). Malgrado aquela exclusão, é-lhes, assim, aplicável o disposto na parte III, do Código dos Contratos Públicos (41), nomeadamente as regras relativas à reposição do equilíbrio financeiro do contrato (artigo 282.º) ou as regras relativas à modificação objetiva do mesmo (artigo 311.º).

3 – Embora esteja em causa um contrato administrativo, cujo conteúdo essencial é inegociável, os contraentes privados conservam (como é óbvio) intacta a sua autonomia individual, podendo livremente aceitar ou não aquelas cláusulas heteronomamente concebidas e fixadas (artigo 405.º, n.º 1 do Código Civil (42)). Eles conservam o poder de contratar ou de não contratar (43). Só se vincula quem quer. O contrato administrativo só existe por ter sido aceite, em todo o seu conteúdo, por ambas as partes.

Para além disso eles conservam, também intacto, o poder de denunciar, a todo o tempo a convenção de prestação de cuidados de saúde, desde que haja comunicação escrita dessa sua intenção, com a antecedência mínima de 30 dias (cláusula 11.ª, n.º 3). Não ficam, inelutavelmente, amarrados às cláusulas que, de forma livre e esclarecida, subscreveram, podendo libertar-se delas quando entenderem fazê-lo. Se, por exemplo, entenderem que devido à atualização dos preços constantes das tabelas e/ou das respetivas regras de faturação a convenção deixa de ser, economicamente, compensadora podem, de imediato, denunciá-la, assim se desvinculando do, inicialmente, acordado.

V

A natureza regulamentar ou contratual das cláusulas inseridas na convenção

A natureza contratual das convenções celebradas entre a ADSE e os prestadores de serviços não impede que se questione a eventual natureza regulamentar de algumas das suas cláusulas, maxime quando remetem para as tabelas e regras da ADSE [cláusulas 4.ª, n.º 1, alª c) e 5.ª, n.º 1]. Tanto mais que a parte final do próprio preâmbulo do contrato refere expressis verbis que ele «visa regulamentar a prestação de serviços de saúde aos beneficiários da ADSE».

1 – A doutrina costuma assinalar diversas características aos regulamentos, definindo-os como atos normativos emitidos por entidades administrativas, no exercício das suas funções administrativas (44).

Os regulamentos administrativos são, pois, normas jurídicas gerais e abstratas, suscetíveis de serem elevadas à categoria de critério de decisão e padrão de comportamento. Desta forma, por abrangerem um número indeterminado e indeterminável de situações, distinguem-se dos atos administrativos, normalmente dirigidos para uma determinada situação concreta.

Assim, tratando-se de normas jurídicas, poderíamos concluir que os regulamentos são inconfundíveis com outras formas de atuação da administração, nomeadamente (como é o nosso caso) com os contratos administrativos. No entanto, a verdade é que «sucede frequentemente no contexto de contratos de concessão de serviço público incorporarem-se neles cláusulas relativas à organização, gestão e funcionamento do serviço. A este tipo de cláusulas não pode ser assacada uma eficácia meramente contratual (inter partes), uma vez que as mesmas se compreendem e apenas se justificam enquanto supõem a existência dos utentes do serviço público. Por outro lado, incluem-se neste tipo de contratos cláusulas através das quais o concessionário assume perante a entidade pública contratante obrigações relativamente a terceiros (todos os utentes do serviço público) e, nesta medida, possuem uma eficácia normativa externa; efetivamente dessas cláusulas (com efeito regulamentar) decorre para os terceiros (destinatários ou beneficiários) um direito subjetivo, correspondente ao lado ativo da relação jurídica complexa emergente do contrato (administração-concessionário-utente)» (45). Nestes casos, onde (como veremos infra) também se incluem as convenções celebradas pela ADSE e os prestadores do serviço, torna-se, assim, difícil dizer se estamos perante autênticos negócios jurídicos ou antes verdadeiros regulamentos, dissimulados sobre uma forma contratual externa.

Com efeito, a atividade contratual da administração ainda está subordinada à prossecução do interesse público (46), de tal forma que contratar pode ser administrar. Será, na síntese de Pedro Miguel Matias Pereira, «governement by contract» (47). Cada vez mais, assistimos, aliás, à «fuga para o direito privado» e à utilização de mecanismos jurídicos que são próprios deste ramo do direito (48), gerando-se uma extensa zona cinzenta, propícia à sobreposição e à confusão conceitual.

Os contratos administrativos, nomeadamente os que concedem ou convencionam um determinado serviço público, podem produzir claros efeitos externos. «O contrato contém cláusulas que, entre as partes – ad intra – são cláusulas contratuais (fixam direitos e obrigações reciprocas) e que, ao mesmo tempo, fixam deveres de uma das partes em relação a terceiros, pessoas que não participaram no negócio mas que, no fim de contas são os destinatários ou beneficiários da atuação do contratante» (49). Assim, «através da criação de obrigações e de direitos ao cocontratante nas suas relações diretas com os administrados, tais cláusulas passam a gozar de uma eficácia “praeter contratualem” e, nessa medida, o “contrato assume uma eficácia geral ou regulamentar” (50).

A natureza jurídica (regulamentar, contratual, mista) destas cláusulas contratuais é, por isso, muito complexa. Na verdade, embora formalmente não constituam um verdadeiro regulamento administrativo, poderá dizer-se que – enquanto fonte de direitos e de obrigações extensíveis a terceiros – o são materialmente. Apesar de se apresentarem como contratos, seriam, de iure, um verdadeiro regulamento administrativo.

Esta tese esqueceria, todavia, que as referidas cláusulas com eficácia externa (nelas se incluindo as tabelas de preços e as respetivas regras de faturação fixadas pela ADSE) só ganham existência jurídica com a celebração ou inclusão na convenção: sem ela, elas não existem. A fixação e publicitação dos preços e das regras pela ADSE será irrelevante, enquanto não for celebrada a convenção. Nem a ADSE pode exigir o seu cumprimento junto de eventuais prestadores de serviços, nem estes podem reclamar os montantes ou cobrar aos beneficiários a eventual comparticipação aí prevista; nem, tão-pouco, os utentes podem exigir o serviço ou eximir-se ao normal pagamento do serviço que lhes tenha sido prestado, invocando que depois a ADSE o pagará, nos termos legalmente convencionados. Em suma, sem convenção aquelas tabelas não servem para nada, não tendo qualquer eficácia jurídica. Elas só ganham relevância com o posterior acordo de vontades entre a administração e o particular. É o contrato que lhes dá vida. Por isso mesmo, também os seus efeitos externos decorrem, apenas, do contrato celebrado e não de um qualquer outro ato unilateral e soberano da administração (51). Sem o contrato, são juridicamente irrelevantes.

Tais contratos não são, pois, atos normativos (disfarçados), emitidos por entidades administrativas, no exercício das suas funções administrativas, mas verdadeiros negócios jurídicos bilaterais, resultantes do encontro entre a vontade da administração e a vontade soberana de um privado (ou outro ente da administração), colocados numa posição de igualdade, no momento de decidir ou não contratar.

2 – Não sendo um verdadeiro regulamento administrativo (ainda que disfarçado de simples contrato), importa, agora, voltar a discutir qual é afinal, efetivamente, a natureza jurídica da convenção (maxime das tabelas e regras de faturação nelas incluídas) celebrada entre a ADSE e os particulares prestadores do serviço. Concluir, de forma quase apriorista, que é um mero contrato administrativo não é suficiente.

Segundo uma tese antiga, não estando as relações entre a Administração e os privados reguladas, a convenção seria um contrato bilateral, exclusivamente regulado pelo direito privado, resultante do mero encontro entre a vontade das partes, em igualdade de circunstâncias, entre a administração e o privado (52). Do mesmo modo, atenta a natureza sinalagmática dos contratos, não poderiam, portanto, resultar quaisquer efeitos regulamentares ou, sequer, extensíveis a terceiros alheios àquele.

A generalidade da doutrina posterior tenderá, porém, a refutar esta tese inicial, integrando a convenção de prestação de cuidados de saúde no direito público, enquanto modus operandi privilegiado da administração, baseado no seu ius imperium.

Prosseguindo essa asserção, a convenção poderá (ao invés) ser configurada como um autêntico ato administrativo. Ela será um ato unilateral da administração, baseado na supremacia do interesse público. Nesta perspetiva, a ADSE limitar-se-á a transferir para os privados as funções públicas que lhe estão legalmente confiadas (art. 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 7/2017, de 9 de janeiro), sendo a natureza pública do ato imposta pelo objeto prosseguido com as convenções. «Uma relação administrativa só pode ser constituída por um ato da autoridade, não podendo a vontade dos privados concorrer, em posição equivalente à da autoridade, para a formação dos respetivos atos constitutivos; quando há alguma intervenção sua, o privado não concorre como igual, mas com súbdito; ele pode aceitar ou não o ato unilateral que lhe é dirigido, mas sem que a sua vontade concorra para a formação desse ato» (53). O ato de adesão voluntária seria, portanto, irrelevante.

Esta tese esquece, todavia, a vontade do particular, que aceita ou não as condições fixadas na convenção, subordinando-se aos deveres e obrigações que ela implica, tornando assim possível a produção de efeitos internos e externos daquela decisão administrativa, maxime os constantes das tabelas e respetivas regras de faturação. A convenção e os efeitos que dela decorrem não resultam da mera vontade soberana da administração, pressupondo também uma manifestação de vontade individual. Desta forma, por mais poder que tenha, a exteriorização da mera voluntas da administração, sem o acordo imprescindível de mais ninguém, é irrelevante.

Por isso mesmo, prosseguindo na tentativa de integrar a convenção no direito público, poder-se-ia dizer que se estará perante um ato complexo, composto por um ato administrativo e por um contrato posterior, formado pela concorrência da vontade de ambos os contratantes envolvidos (54). A convenção teria lugar através de um ato unilateral da administração (de fixação geral e abstrata das condições e de legitimação do próprio procedimento subsequente) e de um contrato posterior, necessário para concretizar o exercício efetivo da atividade convencionada. Sem aquele ato inicial, de fixação do interesse público e de abertura da possibilidade de celebração da convenção aos interessados na prestação do serviço, o contrato posterior não poderia sequer ser celebrado.

Posição que, todavia, esquece que as condições gerais de funcionamento da convenção e a própria possibilidade da sua celebração decorrem da própria lei (v.g. Decreto-Lei n.º 118/83), sendo a invocação de um ato administrativo prévio uma simples forma de voltar a atribuir relevo à mera vontade unilateral da administração, característica de uma administração autoritária, hoje há muito ultrapassada.

Finalmente, prosseguindo ainda o mesmo objetivo de integração da convenção no direito público, a convenção poderá ser considerada (como, aliás, já concluímos anteriormente) como um contrato de direito público, cujas cláusulas podem produzir determinados efeitos jurídicos junto de terceiros. A convenção não será um mero contrato privado, exclusivamente regulado pela lei civil, sendo antes um ato jurídico de direito público, de natureza contratual (não é unilateralmente determinado pela administração no uso do seu ius imperium), não ficando, por isso, subordinado à totalidade dos princípios contratuais.

2.1 – A relação jurídica entre a ADSE e os sujeitos passivos da convenção é, com efeito, uma relação de direito público, assente na superioridade daquela e tem como objeto a prossecução de inquestionáveis fins de utilidade pública (objetivo de proteção social, nos termos do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 118/83 e do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 7/2017). Nem os contratantes estão numa posição de igualdade, nem o objeto prosseguido tem relevo mera ou exclusivamente privado. As marcas de administratividade subjacentes ao negócio são, como já vimos supra, evidentes (55).

2.2 – Mesmo assim, trata-se, sem dúvida, de um ato negocial, mediante o qual o privado adere ao contrato unilateralmente predefinido pela Administração. Na sua base está, pois, um acordo final de vontades, sem o qual a convenção não existe. O momento constitutivo do contrato é consensualizado pelas partes e não unilateralmente imposto pela Administração (56). É certo que o privado não tem possibilidade de discutir o teor das cláusulas contratuais propostas pela Administração (v.g. a ADSE), limitando-se a aderir ou não à convenção. Contudo, «a qualificação do instrumento regulador de uma relação como contrato não exige sempre um acordo na estipulação do respetivo conteúdo; necessário é que esse conteúdo não possa ser imposto contra a vontade de uma das partes» (57). A administração utiliza aqui – como bem reconheceu o Tribunal de Contas (58) – a figura jurídica dos contratos de adesão, mantendo o privado, no conhecimento prévio das respetivas cláusulas, completa liberdade de celebração: só se vincula quem quiser e se quiser.

Enquanto isso não acontecer, não existe sequer contrato mas meros «modelos a que se recorre caso se pretenda celebrar contratos». As cláusulas contratuais gerais «apenas vinculam as partes na medida em que estas celebraram um contrato onde estas cláusulas contratuais gerais sejam reproduzidas e aceites» (59).

2.3 – Finalmente, como já recenseamos, o contrato administrativo de convenção para prestação de cuidados de saúde tem eficácia parcial e também eficácia regulamentar.

Como qualquer outro contrato, inter partes, a convenção fixa os direitos e os deveres da administração e do prestador do serviço, aí se incluindo mesmo as cláusulas que a ADSE tenha estabelecido antes. Na fórmula de Pedro Gonçalves «tais “cláusulas regulamentares””, uma vez incorporadas no contrato, passam a ser, nas relações entre as partes, “cláusulas contratuais”, que estabelecem os direitos e deveres de cada uma delas perante a outra. Nestes termos, todas as disposições estabelecidas até ao momento da celebração do contrato e nele incorporadas têm, entre as partes, natureza e eficácia meramente contratual» (60).

Já não é assim no que respeita a terceiros que, apesar de não terem comparticipado na formação deste negócio jurídico, veem o seu acesso aos serviços da ADSE codeterminado no contrato. Para além do regime legal, a convenção acaba por fixar aspetos que aquele omitia, maxime o montante a pagar em caso de eventual divisão de custos. São as tabelas que, de forma inovadora, determinam, se for caso disso, os montantes a suportar pelo beneficiário.

2.4 – Em suma, a convenção de prestação de cuidados de saúde celebrada com a ADSE é um contrato através do qual «a administração procura obter o concurso de particulares para a prossecução das tarefas de que legalmente está incumbida» ou, noutra fórmula, o contrato mediante o qual «uma entidade administrativa e um sujeito privado definem os termos da colaboração deste no âmbito da prossecução de atribuições administrativas que àquela entidade estão confiadas» (61). Não está em causa um qualquer ato normativo, unilateralmente emitido por uma entidade administrativa (v.g. a ADSE), no exercício das suas funções administrativas, mas um ato jurídico singular resultante da vontade de duas partes, absolutamente iguais no que concerne ao poder jurídico de o celebrar ou não.

Para além disso, para além dos efeitos contratuais que desencadeia entre os outorgantes, a convenção – insistimos – afeta terceiros, incluindo regras relativas à forma e ao modo como deve ser prestado o serviço público convencionado entre as partes. A sua eficácia não é meramente bilateral. Com efeito, malgrado a organização, a gestão e o funcionamento desta modalidade de proteção social disponibilizada pela ADSE já constar do respetivo regime jurídico, existem nela determinadas cláusulas contratuais, expressas (na própria convenção) ou por remissão (tabelas) que criam novos direitos e deveres dos utentes. É o caso, por exemplo, da obrigação de comprovar a qualidade de beneficiário da ADSE mediante a exibição do respetivo cartão (cláusula 3.ª, n.º 1) ou da obrigação de, nos termos das tabelas em vigor, suportar, de imediato, um determinado encargo (cláusula 5.ª, n.º 4). Os beneficiários, para além de com a mera celebração da convenção poderem exigir juridicamente ao privado a prestação dos serviços convencionados, passam a dever cumprir estes deveres. Embora não tenham tido intervenção no contrato, eles são, afinal, afetados por ele. A convenção tem eficácia praeter-contratual (62).

Decorre desta circunstância que algumas das cláusulas inseridas nas convenções celebradas entre a ADSE e os prestadores de serviços «têm uma natureza contratual e uma eficácia geral ou regulamentar – não tendo natureza regulamentar, mas contratual, não ficam sujeitas ao regime de formação ou de impugnação dos regulamentos; porém produzem uma eficácia que é própria dos regulamentos» (63).

Os efeitos regulamentares desencadeados com a celebração do negócio jurídico, não modificam, contudo, a natureza contratual do ato jurídico em causa. Aquelas disposições contratuais têm efeitos regulamentares, mas não são um regulamento, não estando, pois, sujeitas ao regime previsto para a sua formação e para a sua impugnação. Invocar vícios relativos ao incumprimento do modus de formação dos regulamentos será irrelevante. As partes que validamente se vincularam através do contrato não podem vir dizer que, afinal, está em causa um regulamento.

2.5 – Tendo os privados prestadores do serviço contratado com a ADSE, aderido a estas convenções no pleno conhecimento das suas cláusulas e da possibilidade da posterior alteração unilateral das tabelas e das respetivas regras de faturação, vir agora invocar quaisquer vícios, incluindo os relativos à (pretensa) ilegalidade da sua formação e formulação será venire contra factum proprium. Não podem impugnar aquilo que livremente, no pleno exercício da sua autonomia negocial, aceitaram.

Diferente poderá ser, todavia, a posição de terceiros, alheios à celebração daqueles contratos mas afetados pelos seus efeitos jurídicos (maxime os decorrentes da incorporação daquelas tabelas e de consequente obrigação do pagamento das comparticipações aí estipuladas). Na verdade, «como consequência da referida eficácia regulamentar, nasce um direito subjetivo na esfera jurídicas dos utentes e, por isso, os terceiros em função dos quais as cláusulas contratuais tenham sido estabelecidas podem deduzir judicialmente pedidos relativos à execução do contrato, reagindo contra o seu incumprimento» (64). De todo o modo, essa questão é alheia ao objeto deste parecer, pelo que não será aqui abordada (65).

VI

A legalidade das regularizações efetuadas pela ADSE

Munidos com este lastro dogmático mínimo, importa agora enfrentar finalmente, o problema jurídico colocado: a legalidade das regularizações efetuadas pela ADSE, relativas aos anos de 2015 e 2016. Em causa parece estar (o ofício que deu origem a este parecer não é muito claro) apenas questionar, juridicamente, a possibilidade de a ADSE corrigir os valores faturados através dos códigos 6032, 6074 e 6640 sempre que excederem em 10 % os valores médios praticados pelos prestadores congéneres e depois de ponderadas as justificações do prestador, bem como a possibilidade de corrigir os valores faturados através dos códigos 6636 e 7501, com base, agora, no menor valor praticado pelos prestadores envolvidos. Em questão, está, assim, em ambos os casos, uma regra criada e consagrada nas tabelas de 2009 (na sequência de uma reivindicação de algumas entidades convencionadas), alargada nas tabelas reorganizadas em 2014 e, como tal, automaticamente, incorporada nos contratos já, então, existentes ou, desde, então, para cá, celebrados.

No que respeita às alterações introduzidas em 2009 – possibilidade de correção em 10 % dos valores faturados ao abrigo dos códigos 6032 e 6074 – uma vez que elas foram objeto de uma ata adicional celebrada em março de 2009 (vinculando todos aqueles que já haviam contratado com a ADSE) não parece estar em causa a sua legalidade. Através daquela ata inicial ou, depois, através da incorporação contratual do teor das tabelas e respetivas regras (nos casos de adesão posterior à convenção), os cocontratantes aceitaram essa mesma hipótese: a regularização é um efeito da mera execução do contacto, que livre e autonomamente, celebraram. Enquanto não se desvincularem estão sujeitos a ela, pelo simples e normal funcionamento do contrato. Nas duas situações, a vontade soberana dos cocontratantes é, assim, determinante. Aceitaram submeter-se a essa regularização posterior e, tanto quanto resulta do expediente anexo ao ofício que desencadeou este parecer, têm-na acatado. Foi isso mesmo que aconteceu, como ali se refere, relativamente, a faturação emitida entre 2011 e 2014.

O problema parece estar, pois, apenas na reorganização das tabelas em 2014, altura em que, para além da atualização dos preços, se alargou a lógica dos códigos abertos sujeitos à regularização (incluindo nesta metodologia os códigos 6636, 6640 e 7501) sem, para o efeito, celebrar, como em 2009, qualquer ata adicional. A vontade dos cocontratantes já vinculados (que serão a esmagadora maioria) não foi aqui, previamente, auscultada, sendo eles apenas confrontados com a alteração. Quanto aos que se vincularam depois, no perfeito conhecimento deste procedimento e no exercício pleno da sua autonomia individual, a alteração será, igualmente, irrelevante. Também aqui a sua vontade (aceitando submeter-se ao procedimento de regularização) é soberana. Invocar um qualquer vício será uma contraditio in adjeto: não podem impugnar aquilo que, solenemente, se comprometeram a cumprir.

1 – O artigo 302.º do Código dos Contratos Públicos, inserido no capítulo relativo à «conformação da relação contratual» dispõe que «salvo quando outra coisa resultar da natureza do contrato ou da lei, o contraente público pode, nos termos do disposto no contrato e no presente Código: a) Dirigir o modo de execução das prestações; b) Fiscalizar o modo de execução do contrato; c) Modificar unilateralmente as cláusulas respeitantes ao conteúdo e ao modo de execução das prestações previstas no contrato por razões de interesse público, com os limites previstos no presente Código; d) Aplicar as sanções previstas para a inexecução do contrato; e) Resolver unilateralmente o contrato; f) Ordenar a cessão da posição contratual do cocontratante para terceiro».

Como lapidarmente refere Jorge Andrade da Silva, «ao celebrar o contrato, a Administração não deixou de ser detentora do poder público com base no qual o celebrou, de que não pode renunciar ou abdicar e cujo exercício a coloca em manifesta posição de desigualdade relativamente a outro contratante. É assim que, independentemente do que quanto a isso esteja especialmente previsto no contrato, sempre a administração será detentora das chamadas prerrogativas de poder público ou cláusulas exorbitantes em relação ao regime do Direito Privado, isto é, do poder de direção e fiscalização na execução do contrato, do poder de alteração, do poder sancionatório e do poder de rescisão unilateral. São poderes atribuídos por causa da função do contrato, inerentes à própria natureza pública deste que, por isso, não pode afastar essas prerrogativas, mas tão só regular o seu exercício» (66).

Resulta do contrato celebrado entre a ADSE e os prestadores de serviços que estes concordaram com a possibilidade da alteração unilateral das «tabelas e regras em vigor» relativas aos encargos decorrentes da prestação de serviços de saúde, após notificação ao segundo outorgante, nos termos previstos na mesma (cláusula 5.ª). Quando subscreveram a convenção, os prestadores do serviço aceitaram, no pleno exercício da sua autonomia contratual (artigo 405.º, n.º 1, do Código Civil), a atualização automática das tabelas e regras em vigor, mediante a mera notificação dessas mesmas alterações. Dos termos da própria convenção celebrada, resulta, pois, este poder de modificar as tabelas e/ou as regras relativas às mesmas.

Em causa está, assim, uma dupla possibilidade de alteração. O poder de modificação contratualmente consensualizado não se limita às tabelas de preços, incluindo também as suas regras. Como diz o Tribunal de Contas, «são partes integrantes destes acordos, as regras e tabelas relativas aos cuidados de saúde convencionados» (67). A administração pode, portanto, com base neste acordo, alterar os preços ou as tabelas ou os preços e as tabelas.

É o próprio contrato (tal como foi aceite por ambas as partes) que confere essa possibilidade, de modo que a sua concretização pela ADSE em 2014 não é mais do que a execução daquilo que foi, voluntariamente, assumido pelas contrapartes (68). Em bom rigor, não estamos, sequer, portanto, perante uma autêntica modificação do contrato inicial, mas apenas perante uma atualização dos montantes envolvidos e da forma de os apurar, já prevista no próprio contrato. Também aqui, afinal, trata-se apenas de executar, fielmente, a vontade então livremente expressa pelas partes. Nada impede, como veremos infra, que elas fixem cláusulas de atualização dos montantes envolvidos ou sequer da forma de os determinar. Com elas, os prestadores do serviço comprometem-se, justamente, a acatar essas alterações durante a execução do contrato.

No que a esta nova metodologia contabilística concerne, não podemos, aliás, esquecer que ela foi introduzida em 2009, a pedido de alguns dos convencionados da ADSE. A modificação não foi mais uma imposição unilateral e autoritária da administração, mas o acatamento de uma proposta de alguns dos cocontratantes, presumivelmente destinada a aliviar a carga burocrática associada ao registo integral de todos os consumos efetuados na sala cirúrgica: para sua comodidade, em vez de discriminarem cada um dos consumos efetuados, passaram a indicar uma quantia global.

As alterações introduzidas em 2014 prosseguem este mesmo rumo simplificador, procurando compatibilizar a diminuição da carga burocrática dos prestadores do serviço com as exigências de racionalização e de controlo dos custos públicos subjacentes à ADSE. Na verdade, a agilização dos procedimentos de faturação não implica, necessariamente, um menor controlo dos custos, porque, no fundo, como já referimos, os códigos abertos também acabam por ter um limite inultrapassável (69). Subjacentes às alterações estão, pois, sobretudo, as necessidades dos prestadores dos serviços.

1.1 – Os poderes e os limites à modificação unilateral dos contratos públicos, previstos no artigo 302.º do Código dos Contratos Públicos, têm o seu campo de eleição nos casos em que, como aquela norma logo diz, «outra coisa não resultar da natureza do contrato ou da lei». As partes podem – no pleno gozo da sua autonomia contratual – prever outras formas de alteração contratual. Na verdade, «o poder de modificação unilateral pode resultar de um acordo contratual nesse sentido, tendo então nessa hipótese, a conformação que as partes lhe imprimirem. Nessa hipótese, a conformação terá os limites em geral existentes quanto à livre modelação de conteúdos contratuais no seio do exercício duma margem de autonomia pública» (70).

O «preceito legal deverá ser entendido como deixando na disponibilidade das partes a possibilidade de definir e concretizar o âmbito dos poderes do contraente público que consentem essa definição ao nível contratual, como o poder de direção do modo de execução das prestações» (71).

Os poderes de modificação consagrados no artigo 302.º do Código dos Contratos Públicos constituem, pois, uma verdadeira exceção ao pacta sunt servanda. São poderes que extravasam o que, quanto à modificação do contrato, nele tiver sido consagrado. Em vez do estrito adimplemento das obrigações contratuais, a administração tem aqui (independentemente do contrato) o poder de proceder à sua modificação unilateral, ficando, todavia – como forma de proteção dos cocontratantes – sujeita a claros limites legais. Uma vez que no uso do seu ius imperium a administração pode quebrar o contrato original, compreende-se que a Lei fixe determinados limites, sem os quais, obviamente, ninguém arriscaria sequer contratar com a própria administração (72). A possibilidade de alteração do contrato, por vontade unilateral da administração, não pode ser absoluta.

Nada disso acontece, porém, quando é a própria vontade das partes que prevê a possibilidade de alteração unilateral posterior de certas cláusulas do contrato. Nesse caso, uma vez que a alteração emerge da vontade original das partes, não há nenhum limite, para além, é claro, dos, em geral, estabelecidos à liberdade negocial (artigos 280.º e ss. do Código Civil). No fundo, a alteração unilateral ainda consubstancia a vontade bilateral das partes. Foi isso que elas quiseram inicialmente.

1.2 – Acresce que, este tipo de cláusula (atualização automática dos preços e das respetivas regras) não deve, sequer, ser considerado como uma manifestação paradigmática dos negócios usurários – artigo 282.º do Código Civil. Com ela a administração não explora a situação de necessidade, inexperiência, ligeireza, dependência, estado mental ou fraqueza de caráter dos prestadores do serviços, limitando-se a publicitar as condições em que admite celebrar convenções. Os prestadores de serviços interessados é que aderem, de forma livre e consciente, àquele clausulado, sem qualquer outra interferência determinante da administração. Do ponto de vista teórico, sem descer às minudências do caso concreto, de que não cumpre conhecer, a administração não abusa de qualquer limitação dos cocontratantes, ficando antes dependente da aceitação das cláusulas propostas.

1.3 – Este tipo de cláusula também não é per si suscetível de violar a boa-fé, entendida, aqui, como «proibição do contraente em posição de supremacia causar à contraparte prejuízos injustificadamente desproporcionados» (73). Tanto mais que existem outras cláusulas que permitem, a todo o tempo, a desvinculação do cocontratante, mediante denúncia através de mera comunicação escrita, com a antecedência mínima de 30 dias (cláusula 11.º, n.º 3). A possibilidade de alterar unilateralmente os preços e as regras de faturação é compensada pela possibilidade de denunciar o contrato. Uma cláusula não pode ser analisada sem a outra, devendo o contrato ser visto como um todo, no equilíbrio global dos direitos e obrigações que lhe são inerentes.

Aliás, aqui, como em qualquer outra atividade administrativa, a administração, como também os particulares, devem agir de boa-fé (74), não podendo impor-se mutualmente atualizações que a contrariem, como, por exemplo, aquelas que violem o equilíbrio financeiro pré estabelecido.

1.4 – E não se diga que, apesar de previstas no contrato, estas cláusulas de atualização unilateral das tabelas e das suas regras de faturação são abusivas, sendo desproporcionada (75).

Desde logo, porque o melhor juiz da proporcionalidade destas cláusulas é o cocontratante que, apesar da sua existência, aceita celebrar a convenção. Na ponderação dos custos e dos benefícios, entendeu que, ainda assim, o resultado da equação seria positivo (76). Interferir na sua autonomia privada revelaria um certo paternalismo estadual, de que ele não carece. Tanto mais que essa regularização, para além de ter em consideração as explicações do visado, geralmente só opera quando os valores faturados forem 10 % superiores à média. Apenas num caso a regularização tem em atenção o menor valor praticado pelos restantes prestadores do serviço. Significa isto – a menos que aqueles estejam a praticar preços inferiores aos de custo – que não obstante a redução dos montantes globais faturados, os resultados líquidos ainda são positivos. O mecanismo reduz a margem de lucro dos operadores mas não a elimina, não se podendo, pois, considerar, objetivamente, desproporcionado.

Depois, porque o cocontratante pode sempre substituir os códigos abertos pelos códigos fechados que os consubstanciam. Em vez de indicar o valor global pode, como acontecia inicialmente, indicar todos os códigos fechados que compõem aquela parcela geral. É mais burocrático, porventura implicará uma melhor organização dos serviços contabilísticos do cocontratante, mas permite-lhe evitar esta revisão oficial dos montantes a receber. Apesar da alteração, só se sujeita à regularização administrativa dos valores globais faturados quem quiser.

Finalmente, porque ele pode sempre denunciar (cláusula 11.º, n.º 3) no todo, ou em parte, a convenção que livremente subscreveu. Está na sua disponibilidade excluir do âmbito objetivo da convenção que os vincula os serviços que são sujeitos a revisão ou mesmo rejeitá-la in totum. As alterações introduzidas às tabelas, em 2014, foram, como acima se referiu, devidamente comunicadas às entidades convencionadas em agosto de 2014, entrando em vigor em 1 de outubro de 2014, pelo que estas tiveram tempo suficiente para denunciarem a convenção no que concerne aos códigos alterados, ou mesmo a quaisquer outros. Só continuam vinculados porque querem.

2 – A alteração posterior dos preços, das regras ou de ambos, ainda é uma manifestação paradigmática da vontade inicial de ambos os contratantes, estando devidamente legitimada pela sua autonomia contratual: só é assim porque, no momento decisivo de se vincularem, isso foi previsto e querido por ambos.

Esta possibilidade é, para além disso, uma consequência dos princípios de gestão subjacentes à atuação da ADSE [maxime a gestão eficiente dos recursos disponíveis (artigo 6.º, n.º 1, alª b), do Decreto-Lei n.º 7/2017) e a sustentabilidade (artigo 6.º, n.º 1, alª e) (77)], e logo, uma clara manifestação do poder público. A administração deve providenciar pela gestão racional dos parcos recursos existentes, servindo-se, para o efeito, das técnicas jurídicas disponíveis, nomeadamente a da possibilidade de atualização futura dos preços e das respetivas regras de faturação.

VII

Conclusões

Em face do exposto, formulam-se as seguintes conclusões:

1.ª O acesso dos beneficiários aos cuidados de saúde e demais prestações sociais disponibilizados pelo Instituto de Proteção e Assistência na Doença IP (ADSE) pode ser feito mediante o reembolso das despesas ao beneficiário (previamente suportadas por este) ou, então, mediante o pagamento direto à entidade prestadora de serviços, em conformidade com as tabelas e regras de pagamento em vigor (artigo 19.º n.º 3, do Decreto-Lei n.º 118/83, de 25 de fevereiro)

2.ª Para este efeito, «o diretor-geral da ADSE pode celebrar acordos com instituições hospitalares do setor público, privado ou cooperativo, bem como com quaisquer outras entidades singulares ou coletivas, em ordem a obter e a oferecer, com a necessária prontidão e continuidade, as prestações que interessam ao prosseguimento dos seus fins» (artigo 37.º do Decreto-Lei n.º 118/83, de 25 de fevereiro).

3.ª A celebração destes acordos obedece a uma minuta tipo (que pode ser consultada no sítio online da ADSE) da qual constam as condições em que esta celebra com o interessado a convenção destinada a regular a prestação de serviços de saúde aos seus beneficiários.

4.ª Entre essas condições, consta a possibilidade de atualização automática das tabelas e das regras em vigor, mediante mera notificação ao segundo outorgante (cláusula 5.º, n.º 2, da Convenção tipo).

5.ª Em 2009, atendendo às revindicações de alguns dos convencionados, a ADSE celebrou com os prestadores de serviços atas adicionais às convenções anteriormente outorgadas, criando dois códigos globais, sem preços fixos, que permitem a faturação global de todos os consumos utilizados.

6.ª Neste último caso, contudo, nos termos das referidas atas adicionais, a ADSE «reserva-se o direito de corrigir os valores faturados através dos códigos 6032 e 6074 sempre que excederem em 10 % os valores médios praticados pelos prestadores congéneres e depois de ponderadas as justificações do prestador».

7.ª Por despacho do Diretor Geral, de 29 de agosto de 2014, a ADSE agregou num mesmo documento todas as tabelas de preços em vigor, bem como as regras gerais específicas aplicáveis a cada um dos cuidados de saúde/códigos referenciados, que anteriormente estavam dispersos por vários documentos autónomos.

8.ª Para além disso, alterou, igualmente, alguns códigos que anteriormente tinham um valor fixo, passando o prestador a poder proceder à faturação global destes consumos e a ADSE a poder regularizar os valores apurados, caso sejam superiores às médias acrescidas de 10 %, ou, em algumas situações, com base no menor valor praticado pelos prestadores envolvidos.

9.ª Essas alterações foram devidamente comunicadas às entidades prestadoras convencionadas em finais de agosto de 2014, sendo aplicáveis aos serviços de saúde prestados a partir de 1 de outubro de 2014, tendo as entidades convencionadas mantido a faturação nos códigos sujeitos a regularizações já existentes e passado a utilizar os novos códigos regularizáveis então criados.

10.ª As convenções devidamente celebradas entre a ADSE e os prestadores de serviços são contratos administrativos atípicos.

11.ª Mesmo assim, estas convenções, apesar de serem contratos administrativos, contêm cláusulas regulamentares que são fonte de direitos e deveres para terceiros, que não participaram na sua celebração.

12.ª Os efeitos regulamentares desencadeados com a celebração do negócio jurídico, não modificam, contudo, a natureza contratual do ato jurídico em causa (contrato), não pressupondo, pois, o regime juridicamente previsto para a formação e para a impugnação dos regulamentos.

13.ª O poder de atualização unilateral das tabelas de preços e das regras de faturação decorre do próprio contrato (cláusula 5.ª, n.º 2), sendo uma manifestação paradigmática e legítima da vontade inicial das partes.

14.ª O procedimento de regularização relativo aos anos de 2015 e 2016 é legal, não podendo ser afastado por eventuais vícios na elaboração, formação e celebração da convenção e na atualização automática das tabelas de preços e regras em vigor.

Este parecer foi votado na sessão do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, de 22 de novembro de 2018.

João Alberto de Figueiredo Monteiro – João Conde Correia dos Santos (Relator) – Maria de Fátima da Graça Carvalho – Eduardo André Folque da Costa Ferreira – João Eduardo Cura Mariano Esteves – Maria Isabel Fernandes da Costa – Maria da Conceição Silva Fernandes Santos Pires Esteves – Amélia Maria Madeira Cordeiro.

(1) Ofício n.º 6498, de 3 de outubro de 2018, distribuído ao relator por despacho proferido no dia seguinte.

(2) Cfr. o referido preâmbulo. No mesmo preâmbulo, refere-se, depois, que, para além disso, «desde a publicação da lei citada, se criaram múltiplas organizações de assistência e se estimularam as entidades patronais, e os grupos profissionais ou de interesses comuns, à ação social protetora dos trabalhadores e das suas famílias».

(3) Artigo 64.º, cuja redação era a seguinte:

«Artigo 64.º

(Saúde)

Todos têm direito à proteção da saúde e o dever de a defender e promover.

O direito à proteção da saúde é realizado:

a) Através de um serviço nacional de saúde universal e geral e, tendo em conta as condições económicas e sociais dos cidadãos, tendencialmente gratuito;

b) Pela criação de condições económicas, sociais, culturais e ambientais que garantam, designadamente, a proteção da infância, da juventude e da velhice, e pela melhoria sistemática das condições de vida e de trabalho, bem como pela promoção da cultura física e desportiva, escolar e popular, e ainda pelo desenvolvimento da educação sanitária do povo e de práticas de vida saudável.

Para assegurar o direito à proteção da saúde, incumbe prioritariamente ao Estado:

a) Garantir o acesso de todos os cidadãos, independentemente da sua condição económica, aos cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabilitação;

b) Garantir uma racional e eficiente cobertura de todo o país em recursos humanos e unidades de saúde;

c) Orientar a sua ação para a socialização dos custos dos cuidados médicos e medicamentosos;

d) Disciplinar e fiscalizar as formas empresariais e privadas da medicina, articulando-as com o serviço nacional de saúde, por forma a assegurar, nas instituições de saúde públicas e privadas, adequados padrões de eficiência e de qualidade;

e) Disciplinar e controlar a produção, a distribuição, a comercialização e o uso dos produtos químicos, biológicos e farmacêuticos e outros meios de tratamento e diagnóstico;

f) Estabelecer políticas de prevenção e tratamento da toxicodependência.

O serviço nacional de saúde tem gestão descentralizada e participada».

(4) Cf. o respetivo preâmbulo.

(5) Cf. o respetivo preâmbulo. Este regime foi completado pela Portaria n.º 351/2007, de 30 de março, que estabeleceu a estrutura nuclear da Direção-Geral de Proteção Social aos Funcionários e Agentes da Administração Pública e as competências das respetivas unidades orgânicas e fixou o limite máximo de unidades orgânicas flexíveis.

(6) Este diploma foi, entretanto, alterado pelo Decreto-Lei n.º 153/2015, de 7 de agosto, que transferiu a dependência ADSE do Ministério das Finanças para o Ministério da Saúde.

(7) Entretanto alterado pelo Decreto-Lei n.º 33/2018, de 15 de maio.

(8) Cfr. o preâmbulo do referido diploma.

(9) Cuja redação é a seguinte:

«Artigo 6.º

Princípios de gestão

1 – A ADSE, I. P., pauta a sua atuação pelos seguintes princípios, sem prejuízo do disposto na lei-quadro dos institutos públicos:

a) Exercício da sua atividade de acordo com elevados padrões de qualidade;

b) Garantia de eficiência económica na gestão;

c) Gestão por objetivos devidamente determinados e quantificados e avaliação periódica dos resultados;

d) Princípio da transparência:

i) A sua contabilidade é organizada nos termos da lei, permitindo identificar claramente todos os fluxos financeiros, operacionais e económicos;

ii) As contas patrimoniais espelham de forma adequada as responsabilidades e os níveis de sustentabilidade financeira dos planos de benefícios de saúde e de proteção social;

e) Princípio da sustentabilidade:

i) O plano de benefícios, o valor dos descontos e das contribuições a cargo dos beneficiários são determinados em função da sustentabilidade presente e futura dos planos de benefícios geridos pela ADSE, I. P.;

ii) A gestão dos riscos obedece a uma gestão financeira prudente suportada em avaliações e estudos atuariais e financeiros, de acordo com as boas práticas nacionais e internacionais.

f) Princípio da eficiência: A gestão das despesas com a prestação dos cuidados de saúde tem em vista a obtenção do máximo de benefícios para os beneficiários, respeitando o princípio da sustentabilidade.

g) Princípio da equidade: A gestão assegura uma repartição equitativa dos custos com os planos de benefícios de saúde.

h) Princípio da gestão participada: Através da participação dos beneficiários na sua governação, ao nível das decisões estratégicas e de controlo financeiro.

i) A ADSE, I. P., rege-se pelo princípio da autossustentabilidade, devendo adequar o plano de benefícios às suas receitas».

(10) Sucessivamente: artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 45002, de 27 de abril de 1963; artigo 1.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 476/80, de 15 de outubro; artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 279/99, de 26 de junho; artigo 1 do Decreto Regulamentar n.º 23/2007, de 23 de março; artigo 1.º do Decreto Regulamentar n.º 44/2012, de 20 de junho.

(11) Art. 1.º do Decreto-Lei n.º 7/2017, de 9 de janeiro.

(12) Foi, entretanto, alterado pelo Decretos-Leis n.os 90/98, de 14 de abril, pelo Decreto-Lei n.º 279/99, de 26 de julho, pelo Decreto-Lei n.º 234/2005, de 30 de dezembro, pela Lei n.os 53-D/2006, de 29 de dezembro, pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril, pela Lei n.º 55- A/2010, de 31 de dezembro, pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 105/2013, de 30 de julho, pelo Decreto-Lei n.º 161/2013, de 22 de novembro, pela Lei n.º 30/2014, de 19 de maio, pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro e pelo Decreto-Lei n.º 33/2018, de 15 de maio.

(13) Nos termos do artigo 1.º deste decreto-lei, a ADSE «tem por objetivo a proteção social nos seguintes domínios:

a) Cuidados de saúde;

b) Encargos familiares;

c) Outras prestações de segurança social. No âmbito dos cuidados de saúde, a sua ação exerce-se relativamente a:

a) Promoção e vigilância da saúde;

b) Prevenção, tratamento e recuperação da doença. No domínio dos encargos familiares, enquanto não for redefinido o regime de segurança social para a função pública, o regime do abono de família obedece aos seguintes princípios:

a) Pagamento do abono de família e prestações complementares através dos organismos processadores dos vencimentos para os funcionários no ativo e da Caixa Geral de Aposentações para os reformados e aposentados;

b) Unidade do regime mediante a articulação dos serviços referidos na alínea anterior com a ADSE, através do exercício por esta do apoio técnico e coordenação das operações inerentes à atribuição do abono. No tocante a outras prestações de segurança social, a atividade da ADSE deve desenvolver-se segundo parâmetros que a levem a intervir a favor dos respetivos beneficiários sempre que se registe uma alteração desfavorável do equilíbrio entre as suas necessidades e os meios de que dispõem para as satisfazer».

(14) Cuja redação é a seguinte:

«3 – O pagamento pela ADSE dos cuidados prestados assenta nas técnicas do reembolso ao beneficiário e do pagamento direto à entidade prestadora de serviços, de conformidade com o legalmente estabelecido».

Por despacho de 8 de abril de 2004, o Secretário de Estado do Orçamento aprovou as tabelas de cuidados de saúde do regime livre (Despacho n.º 8738/2004, publicado no Diário da República, 2.ª série de 3 de maio de 2004).

(15) Esses montantes constam atualmente das tabelas anexas ao Despacho n.º 8738/2004, de 8 de abril, do Secretário de Estado do Orçamento, publicado no Diário da República n.º 103, 2.ª série, de 3 de maio de 2004, assim dando a devida execução prática àquela primeira modalidade de funcionamento da ADSE.

(16) A mesma possibilidade resulta, de forma indireta, do artigo 23.º, cuja redação é a seguinte:

«Artigo 23.º

Cuidados hospitalares

1 – No domínio dos cuidados hospitalares, a proteção é garantida, nas modalidades por eles praticadas e nos termos de acordos celebrados, em:

a) Hospitais do Estado, incluindo qualquer unidade de cuidados primários;

b) Hospitais e clínicas cooperativos;

c) Hospitais e clínicas privadas.

2 – Quando o beneficiário recorrer a qualquer unidade hospitalar com a qual a ADSE não tenha acordo, esta concorre para as despesas efetuadas pelo beneficiário com as importâncias resultantes da aplicação do previsto no n.º 3 do artigo 19.º deste diploma».

(17) Cuja redação é a seguinte:

«[…] 2 – A ADSE, I. P., prossegue as seguintes atribuições:

a) […]

b) Celebrar os acordos, convenções, contratos e protocolos que interessem ao desempenho da sua missão e acompanhar o cumprimento dos mesmos».

(18) E que aqui se reproduz:

«CONVENÇÃO

Entre:

O Instituto de Proteção e Assistência na Doença, I. P. …, na qualidade de primeiro outorgante;

e

(Nome) …, contribuinte n.º …, com sede em …, representada por …, na qualidade de segundo outorgante, celebram a presente convenção que visa regular a prestação de serviços de saúde aos beneficiários da ADSE.

Cláusula 1.ª

1 – O segundo outorgante compromete-se a prestar serviços de saúde aos beneficiários da ADSE, em ambulatório e ou internamento, nas nomenclaturas autorizadas pela ADSE que constam nas tabelas de preços em vigor.

2 – Os serviços de saúde abrangidos pela presente convenção serão prestados em …

3 – A presente convenção vincula o segundo outorgante relativamente a todos os profissionais por si identificados e que realizam a prestação dos serviços de saúde, designadamente o corpo clínico e técnico legalmente habilitado.

4 – A presente convenção abrangerá igualmente os serviços de saúde que possam envolver outras nomenclaturas, outros locais de prestação e outros profissionais, que posteriormente à outorga da presente convenção venham a ser autorizados pela ADSE, mediante proposta do segundo outorgante.

5 – As tabelas de preço em vigor são as publicitadas no Portal da ADSE.

Cláusula 2.ª

Excluem-se do âmbito da presente convenção os serviços de saúde prestados aos beneficiários da ADSE:

a) em consequência de acidente de trabalho, de doença profissional ou de ato da responsabilidade de terceiro.

b) no âmbito da saúde pública, de ensaios clínicos e com recurso a terapêuticas não convencionais;

c) no âmbito da cirurgia estética, com exceção da cirurgia reconstrutiva quando por consequência de acidente ou doença do foro oncológico, pós-cirurgia amputadora ou tumoral.

Cláusula 3.ª

1 – Na prestação dos serviços de saúde, o segundo outorgante deve proceder à verificação da qualidade de beneficiário da ADSE, comprovada pela exibição do respetivo cartão.

2 – Em caso de dúvida ou na falta do cartão de beneficiário, a verificação da qualidade de beneficiário pode ser efetuada através de documento de identificação legalmente reconhecido e da consulta à ADSE DIRETA, no Portal da ADSE.

3 – Relativamente aos descendentes de idade inferior a 6 meses, que ainda não tenham cartão de beneficiário, a identificação deve ser feita através da respetiva cédula pessoal e da identificação do beneficiário titular.

Cláusula 4.ª

1 – O segundo outorgante obriga-se a:

a) Prestar aos beneficiários da ADSE as melhores condições de atendimento e a não estabelecer qualquer tipo de discriminação em relação a quaisquer outros beneficiários ou utentes, independentemente da entidade financiadora a que se encontrem associados;

b) Garantir aos beneficiários o direito à privacidade pessoal;

c) Aplicar as tabelas de preço e as respetivas regras em vigor;

d) Cumprir os procedimentos instituídos pela ADSE;

e) Cumprir as regras relativas à prescrição de medicamentos feita por via eletrónica desmaterializada, nos termos da legislação aplicável.

f) Garantir a atualização da informação relacionada com a sua prestação de serviços, bem como das nomenclaturas que realiza, dos locais de prestação que utiliza e dos profissionais que colaboram com o segundo outorgante;

g) Privilegiar a utilização dos serviços disponíveis na ADSE DIRETA.

2 – O segundo outorgante vincula-se ainda, dentro dos limites impostos pelas regras deontológicas e pelo segredo profissional, a facultar à ADSE:

a) As informações médicas para efeitos de auditoria;

b) Os relatórios médicos circunstanciados relativos aos beneficiários da ADSE;

c) Elementos considerados necessários à avaliação dos serviços prestados, visando designadamente o esclarecimento de dúvidas suscitadas na conferência da faturação e de situações que sejam objeto de eventual reclamação por parte dos beneficiários;

d) O acesso aos locais de prestação de serviços para efeitos de verificação do cumprimento das obrigações contratuais.

3 – O segundo outorgante deve também cumprir os parâmetros de controlo de qualidade de serviços e de técnicas, designadamente, as disposições dos manuais de boas práticas aplicáveis às suas áreas de atividade.

4 – O segundo outorgante autoriza a ADSE a verificar a regularidade da sua situação tributária e contributiva, através da consulta prevista nas disposições legais aplicáveis.

5 – Sem prejuízo do direito de resolução do contrato, o incumprimento comprovado dos deveres estabelecidos na alínea a) do n.º 1 sujeita o segundo outorgante ao pagamento à ADSE, a título de cláusula penal, de uma indemnização no valor de mil euros.

Cláusula 5.ª

1 – Os encargos decorrentes da prestação de serviços de saúde aos beneficiários são pagos de harmonia com as tabelas e regras em vigor.

2 – Sempre que a ADSE proceda à atualização das tabelas e regras referidas no número anterior, elas serão automaticamente aplicadas à presente convenção, após notificação ao segundo outorgante e nos termos previstos na mesma.

3 – Entre as partes podem ser acordadas contrapartidas financeiras no quadro da antecipação dos prazos de pagamento ou da realização de determinados níveis de atividade.

4 – Sempre que nos termos das tabelas em vigor, seja suportado encargo por parte do beneficiário, ele deverá ser satisfeito perante o segundo outorgante aquando da prestação dos serviços de saúde, contra a entrega do correspondente recibo, que deverá conter os elementos previstos nas regras em vigor, para além da menção expressa: “CONVENÇÃO C/ ADSE”.

Cláusula 6.ª

1 – A faturação dos serviços de saúde tem periocidade mensal e deverá dar entrada na ADSE até ao dia 30 do mês seguinte àquele em que se verificou a prestação, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.

2 – A faturação dos serviços de saúde prestados em regime de internamento deverá dar entrada na ADSE até ao dia 30 do mês seguinte ao da verificação da alta.

3 – A prestação de serviços de saúde a descendentes de beneficiários com menos de 6 meses de idade que ainda não possuam cartão de beneficiário da ADSE deverão ser faturados em nome do beneficiário titular, com a indicação de que se referem a descendentes nessas condições.

Cláusula 7.ª

1 – O segundo outorgante fica obrigado a enviar, por transferência eletrónica, um ficheiro de dados com o desenvolvimento detalhado da faturação, salvaguardando os requisitos técnicos estabelecidos pela ADSE.

2 – Após o envio com sucesso do ficheiro de dados, o segundo outorgante deve remeter à ADSE:

a) a fatura/nota de honorários, contendo todos os elementos legalmente exigidos;

b) os documentos de suporte;

c) os documentos de quitação das verbas pagas ao segundo outorgante;

d) as respetivas notas de débito/crédito sempre que o segundo outorgante identifique através da consulta da sua conta corrente quaisquer movimentos de regularização.

3 – O segundo outorgante deverá proceder ao pré-registo dos documentos enumerados no número anterior, na ADSE DIRETA.

4 – Consideram-se documentos de suporte:

4.1 – A cópia ou duplicado do documento de quitação (recibo) relativo ao copagamento do beneficiário que deve:

a) obedecer aos requisitos legais;

b) referenciar expressamente o número de identificação do beneficiário na ADSE;

c) discriminar para cada ato ou cuidado de saúde prestados: a nomenclatura, a quantidade, n.º de dente (quando aplicável), o valor (encargo do beneficiário), local de prestação, a identificação do médico ou técnico responsável e a data da sua realização.

d) constar a assinatura do beneficiário ou, no caso de manifesta impossibilidade do mesmo, a assinatura de um representante reconhecido pelo beneficiário.

4.2 – A prescrição médica ou o relatório médico quando previsto nas regras anexas às tabelas de preços em vigor;

4.3 – Documento comprovativo da respetiva situação clínica quando exigido.

4.4 – Nos casos em que não se estabelece qualquer pagamento por parte dos beneficiários, a cópia ou duplicado do documento de quitação (recibo) é substituído por uma declaração assinada pelo beneficiário, ou por seu representante, onde expressamente constará:

a) a identificação do beneficiário (nome e NUB) a quem foram prestados os serviços de saúde;

b) a discriminação do(s) correspondente(s) código(s) e nomenclatura(s) das tabelas;

c) a discriminação do encargo suportado pela ADSE;

d) tratando-se de medicamentos, próteses intraoperatórias ou de quaisquer outras nomenclaturas com preço variável, deverá ainda constar expressamente uma referência concreta aos correspondentes atos e/ou bens.

5 – Toda a documentação enumerada nos números anteriores deverá ser enviada à ADSE em caixas de cartão, do tipo Arquivador 2001 ou similar e com capacidade na ordem dos 8 centímetros, devendo obedecer aos seguintes requisitos:

a) As caixas devem ser acondicionadas de forma a prevenir o seu esmagamento ou deformação no transporte;

b) As caixas relativas a cada fatura devem ser individualmente identificadas fazendo constar na respetiva lombada vertical o número de identificação fiscal (NIF), n.º de fatura, o n.º de ordem da caixa, o número total de caixas e o ano;

c) As folhas de pré-registo e a fatura são colocadas na primeira caixa (em separado) seguidas de todos os documentos de suporte, ordenados sequencialmente e por ordem crescente, em conformidade com a ordenação do ficheiro de dados;

d) No caso de envio de notas de crédito e/ou de recibos de quitação de verbas já pagas estes deverão ser colocados na primeira caixa e apensos à fatura.

6 – Quando a quantidade de documentação não justifique a utilização das caixas identificadas no ponto anterior, é, em alternativa, utilizado um envelope tipo saco com fole (25 x 35,5 cms).

Cláusula 8.ª

1 – Na conta a indicar pelo segundo outorgante, a ADSE liquida os encargos resultantes da aplicação das tabelas e regras em vigor, no prazo de 120 dias a contar da data da entrada em faturação da ADSE, desde que a mesma não contenha erros, respeite os prazos estabelecidos e seja acompanhada dos documentos de suporte.

2 – A ADSE não se responsabiliza pelo pagamento dos encargos relativos a utentes cujos documentos de despesa não possuam a respetiva identificação como seus beneficiários.

3 – Nos casos de divergência entre os valores da faturação e os resultados da conferência, a ADSE faz as correções adequadas, delas dando conhecimento ao segundo outorgante e procede ao pagamento das quantias apuradas.

4 – Caso sejam detetados na faturação indícios de irregularidades que traduzam a prática de atos lesivos dos interesses da ADSE, pode ser suspenso o pagamento da faturação, sem prejuízo do direto de resolução da convenção nos termos do disposto na cláusula 12.ª

5 – O disposto nos números anteriores é aplicável, com as necessárias adaptações, aos casos em que a ADSE detete na faturação, já paga, erros de cálculo ou indícios de atos lesivos dos seus interesses.

Cláusula 9.ª

1 – O segundo outorgante é responsável, nos termos gerais de direito, por quaisquer prejuízos causados a terceiros no exercício das atividades contratadas pela presente convenção, não assumindo a ADSE qualquer responsabilidade com eles relacionada.

2 – O segundo outorgante responde perante a ADSE ou terceiros pelos atos dos seus representantes legais ou de pessoas que utilize para cumprir as obrigações assumidas pela presente convenção.

3 – Na eventualidade de a ADSE vir a ser demandada por atos praticados pelo segundo outorgante, pelos seus representantes legais ou por pessoa que utiliza ao seu serviço, existe direito de regresso contra essa entidade nos termos gerais de direto.

Cláusula 10.ª

A mudança de local de prestação, a alteração das características do local de prestação, a cessão da exploração, o trespasse, a transferência da titularidade ou a cessão de participações de capital, para efeitos da manutenção da presente convenção, carecem de aceitação da ADSE e devem ser comunicadas no prazo máximo de 15 dias.

Cláusula 11.ª

1 – A presente convenção é válida pelo período de 1 ano a contar da data da sua celebração, salvo o disposto no n.º 3 da presente cláusula.

2 – Findo o prazo a que alude o número anterior, a convenção considera-se automaticamente renovada por igual período ou, mediante prévio acordo das partes contratantes, por diferentes períodos.

3 – Esta convenção pode, a todo o tempo, ser denunciada por qualquer das partes, desde que haja comunicação escrita dessa intenção, com a antecedência mínima de 30 dias.

Cláusula 12.ª

1 – A ADSE pode resolver a convenção com base nos seguintes fundamentos:

a) Violação do presente clausulado e das regras de licenciamento;

b) Não apresentação de faturação por um período ininterrupto de 6 meses.

2 – O segundo outorgante poderá resolver a convenção com fundamento em incumprimento grave imputável à ADSE.

3 – A resolução efetua-se mediante comunicação escrita, com os respetivos fundamentos.

Cláusula 13.ª

Em caso de denúncia ou resolução, nenhuma das partes terá o direito de exigir indemnização por encargos assumidos e despesas realizadas no âmbito da convenção.

Cláusula 14.ª

A presente convenção entre em vigor no dia seguinte ao da sua assinatura.

Lisboa, …/…/…».

(19) A rede conta atualmente, segundo informação disponibilizada no sitio da ADSE, com mais de 1600 prestadores em 3800 locais.

(20) É a seguinte a redação da referida ata adicional:

«Ambulatório/internamento

Ata Adicional

O acordo em vigor, celebrado entre a Direção-Geral de Proteção Social aos Funcionários e Agentes da Administração Pública […], como primeiro outorgante e […] como segundo outorgante, passa a integrar as seguintes disposições:

1 – Nas tabelas do complementar de ambulatório e de internamento passam a constar os códigos 6074 e 6032, sendo de observar os seguintes termos:

a) Estes códigos serão de utilizar em opção e em alternativa aos códigos 6070 a 6073, do complementar de ambulatório e 6025 a 6031 do complementar de internamento.

b) A opção do prestador obriga a aplicar os procedimentos definidos para os códigos 6032 e 6074 sempre que haja lugar a faturação de verbas relativas a piso de sala e exclui a utilização dos códigos referidos na alínea a).

c) A utilização dos códigos 6032 e 6074 destina-se a imputar as despesas com a utilização do bloco operatório e com os consumos em piso de sala. A sua utilização obriga o prestador a emitir o recibo pelas verbas pagas pelo beneficiário com discriminação de todos os itens, com os respetivos valores e sub-totalizador.

d) A Direção-Geral reserva-se no direito de corrigir os valores faturados através dos códigos 6032 e 6074 sempre que excederem em 10 % os valores médios praticados pelos prestadores congéneres e depois de ponderadas as justificações do prestador.

[…]

7 – A presente ata entra em vigor a partir de 01 de abril de 2009 (inclusive)»

(21) Nos termos da tabela «o código 6640 destina-se a imputar os encargos com os materiais de penso, antissépticos e outros produtos consumidos no decurso do internamento exclusivamente associado à prestação de serviços de saúde previstos na tabela da cirurgia. Ainda segundo a mesma tabela, tal código «não pode ser aplicado em simultâneo com os códigos das tabelas de cirurgia (preços globais) e de enfermagem» e implica a emissão de «documento de quitação relativo ao copagamento do beneficiário […] com a discriminação dos valores das várias naturezas de consumos».

(22) Nos termos da tabela «a ADSE reserva-se no direito de corrigir os valores faturados através do código 6640 sempre que excedam 10 % os valores médios praticados pelos prestadores congéneres e para um procedimento. O valor médio será apurado numa base anual podendo ser revisto se as variações anuais não excederem 10 %».

(23) De acordo com as tabelas:

«1 – O grupo dos medicamentos antineoplásicos e imunomoduladores (código 6636), de acordo com a classificação farmacoterapêutica, engloba as classes de medicamentos citotóxicos, hormonas e anti hormonas e imunomoduladores.

2 – Sempre que um medicamento antineoplásico e imunomodulador é codificado com o código 6636, exige-se a identificação do código (quer no ficheiro, quer no recibo do copagamento) definido pela Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I. P. (INFARMED), no domínio do Código Hospitalar Nacional do Medicamento, cuja consulta está disponível no sítio do INFARMED.

3 – Os encargos a considerar no código 6636 respeitam exclusivamente ao consumo dos respetivos medicamentos.

4 – O valor dos medicamentos enquadráveis no código 6636, cujos PVP (máximo) ou PVH (Preço de Venda Hospitalar) estejam definidos, não pode exceder os montantes (valor unitário) previstos na tabela de preços de referência da ADSE – código 6636».

(24) Ainda de acordo com as tabelas: «A ADSE reserva-se no direito de corrigir os valores faturados com o código 7501 com base no menor valor praticado pelos prestadores envolvidos».

(25) Neste sentido, José Manuel Sérvulo Correia, Legalidade e autonomia contratual nos contratos administrativos, Almedina (1987), p. 353.

(26) Manual de Direito Administrativo, Almedina, Coimbra (1980), I, p. 576, onde, depois, ainda, se pode ler que «se bem que a relação jurídica nasça de um acordo, trata-se de criar uma relação de subordinação cuja sequência depende da vontade preponderante de um dos sujeitos que pode modificar substancialmente o respetivo objeto». Este critério foi seguido pela jurisprudência, por exemplo, no Ac. do STA de 2 de abril de 1976, BMJ (1976) 256, p. 83 e ss.

(27) José Manuel Sérvulo Correia, Legalidade e autonomia … p. 372.

(28) José Manuel Sérvulo Correia, Legalidade e autonomia … p. 381; No mesmo sentido, Maria João Estorninho, Requiem pelo contrato administrativo, Almedina, Coimbra (1990), p. 83 e ss.

(29) José Manuel Sérvulo Correia, Legalidade e autonomia … p. 396; itálico no original.

(30) Artigo 178.º, que depois enumera, exemplificativamente, uma longa série de contratos legalmente considerados como administrativos.

(31) Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro (na redação da Retificação n.º 18-A/2008, de 28 de março), alterado pela Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro; pelo Decreto-Lei n.º 223/2009, de 11 de setembro; pelo Decreto-Lei n.º 278/2009, de 2 de outubro; pela Lei n.º 3/2010, de 27 de abril; pelo Decreto-Lei n.º 131/2010, de 14 de dezembro; pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro; pelo Decreto-Lei n.º 149/2012, de 12 de julho; pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro; pelo Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31 de agosto (na redação da Retificação n.º 36-A/2017, de 30 de outubro e da Retificação n.º 42/2017, de 30 de novembro); e pelo Decreto-Lei n.º 33/2018, de 15 de maio.

(32) Sobre este conceito, entre outros, Mário Aroso de Almeida, «Sobre o conceito de contrato público no ordenamento jurídico Português», in Marcelo Rebelo de Sousa/Eduardo Vera-Cruz Pinto (coordenadores), Liber Amicorum Fausto de Quadros, Almedina, Coimbra (2016), p. 393 e ss.; Pedro Costa Gonçalves, Direito dos Contratos Públicos, Coimbra, Almedina (2018), p. 11 e ss., em especial, p. 117 e ss.

(33) V.

(34) No caso dos Contratos Interadministrativos, podem estar mesmo em causa duas entidades administrativas; neste sentido, Alexandra Leitão, «Contratos Interadministrativos» in Pedro Costa Gonçalves (organização), Estudos de Contratação Pública, Coimbra Editora, Coimbra (2008), I, p. 733; Para uma definição destes contratos, Idem, Contratos Interadministrativos, Almedina, Coimbra, 2015, p. 19 e ss.

(35) Licínio Lopes Martins, «Contrato público e organização administrativa», in Pedro Gonçalves (organização), Estudo de Contratação Pública, Coimbra Editora, Coimbra (2008), I, p. 688. Embora tenha sido proferida a propósito do Decreto-Lei n.º 97/98, de 18 de abril (que estabelecia o regime de celebração das convenções a que se refere a base XLI da Lei n.º 48/90, de 24 de agosto – Lei de Bases da Saúde e foi revogado pelo Decreto-Lei n.º 139/2013, de 9 de outubro) este pensamento mantém-se atual. Na verdade, o próprio artigo 16.º, n.º 1, classifica, expressamente, as convenções anteriores como contratos de adesão («os contratos de adesão relativos a convenções vigentes cessam no termo do prazo em curso, não podendo ser renovados»).

(36) Para compreender a similitude destes contratos com as convenções objeto deste parecer, basta ler, mais uma vez, as palavras autorizadas de Licínio Lopes [«Direito Administrativo da Saúde», in Paulo Otero/Pedro Gonçalves (coordenadores), Tratado de Direito Administrativo Especial, Almedina, Coimbra (2010), III, p. 261]: «o objeto essencial destes contratos é a obrigação assumida pelos hospitais entidade pública empresarial de prestarem cuidados de saúde aos utentes do SNS, recebendo como contrapartida uma certa remuneração do Estado, a qual tem por base fundamental de cálculo os atos clínicos efetivamente realizados no âmbito da produção que é contratada em cada uma das valências ou linhas de produção existentes (internamento, cirurgia do ambulatório, consultas externas, urgência, hospital de dia, serviços domiciliários, radioterapia, etc.)».

(37) Sobre estas prerrogativas no Código dos Públicos, cfr, por exemplo, J.C. Vieira de Andrade, «A propósito do regime do contrato administrativo no “Código dos Contratos Públicos”», in Pedro Gonçalves (organização), Estudos de contratação pública, Coimbra Editora, Coimbra (2010), II, p. 14 e ss.

(38) Para um resumo da distinção entre contratos administrativos típicos e atípicos, cf., por exemplo, José Luís Esquível, Os contratos Administrativos e a Arbitragem, Almedina, Coimbra (2004), p. 65.

(39) Artigo 6.º A, do referido Código, cuja redação é a seguinte:

«Artigo 6.º A

Contratos de serviços sociais e outros serviços específicos

1 – A parte II não é aplicável à formação dos contratos públicos que tenham por objeto a aquisição de serviços sociais e de outros serviços específicos referidos no anexo IX ao presente Código, que dele faz parte integrante, salvo quando o valor de cada contrato for igual ou superior ao limiar previsto na alínea d) do n.º 3 do artigo 474.º, caso em que se aplica o disposto nos artigos 250.º-A a 250.º-C.

2 – À celebração dos contratos referidos no número anterior são aplicáveis, com as devidas adaptações, os princípios gerais da contratação pública previstos no artigo 1.º-A».

(40) Da mesma forma, de forma sintomática, o contrato de convenção, celebrado nos termos do decreto-lei n.º 183/2013, de 9 de outubro, também está excluído. Neste sentido Pedro Costa Gonçalves, Direito dos Contratos…, p. 294.

(41) Artigo 280.º do Código dos Contratos Públicos, cujo número dois refere que «As demais relações contratuais administrativas, incluindo as estabelecidas entre contraentes públicos, são regidas pela legislação especialmente aplicável, sem prejuízo da aplicação subsidiária do regime da parte III, quando os tipos dos contratos não afastem as razões justificativas da disciplina em causa». Na doutrina, cf. Mário Aroso de Almeida, Sobre o Conceito de Contrato Público…, p. 400.

(42) Sobre a autonomia individual, cf., por exemplo, Joaquim Sousa Ribeiro, O Problema do Contrato As Cláusulas Contratuais Gerais e o Princípio da Liberdade Contratual, Almedina, Coimbra (1999), p. 51 e ss. ou, no âmbito administrativo, Miguel Assis Raimundo, A Formação dos Contratos Públicos, Lisboa, AAFDL (2013), p. 163 e ss.

(43) Como, embora a outro propósito, disse Joaquim Sousa Ribeiro «o espaço de autodeterminação, no sentido de um poder de livre decisão exclusivamente segundo a própria vontade, restringe-se aqui à liberdade de não contratar. Como liberdade do contrato “poder de disposição do “não” que detém cada parceiro na contratação”, ela é na verdade, “imediata expressão do pensamento de liberdade”, “garantindo que ninguém poderá ficar vinculado por um contrato sem ou contra a sua vontade”. Mas a autonomia plena acaba aí, pois, quanto à positiva criação de vinculações, o poder jurisgénico é sempre, por definição, um poder compartilhado, e, nessa medida, um poder limitado» (O Problema do Contrato…, p. 61/2).

(44) Neste sentido, entre muitos outros, Ana Raquel Gonçalves Moniz, Estudos Sobre Regulamentos Administrativos, Almedina, Coimbra (2013), p. 41 e ss.; Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, Almedina, Coimbra (2017), II, p. 145 e ss.; Mário Aroso de Almeida, Teoria Geral do Direito Administrativo, Almedina, Coimbra (2015), p. 129 e ss. Nos termos do artigo 135.º do Código de Procedimento Administrativo os regulamentos: «são normas jurídicas gerais e abstratas que, no exercício de puderes jurídico-administrativos, visem produzir efeitos jurídicos externos».

(45) Ana Raquel Gonçalves Moniz, Estudos…, p. 47. Apesar de terem sido escritas a propósito da concessão, estas considerações valem, igualmente, no caso das convenções.

(46) Alexandra Leitão, A proteção judicial dos terceiros nos contratos da administração pública, Almedina, Coimbra (2015), p. 129 e ss.

(47) Os poderes do contratante público no Código dos Contratos Públicos, Coimbra Editora, Coimbra, 2011, p. 15.

(48) Neste sentido, por todos, cf. Maria João Estorninho, A fuga para o direito privado contributo para o estudo da atividade de direito privado da administração pública, Almedina, Coimbra (1999), p. 11 e ss.

(49) Pedro Gonçalves, O Contrato Administrativo uma instituição do direito administrativo do nosso tempo, Almedina, Coimbra (2003), p. 66 (itálicos no original).

(50) No mesmo sentido, Jorge Correia de Carvalho Barreira Alves, Contrato e Poder Administrativo: o problema do contrato sobre o exercício de poderes públicos, Gestlegal, Coimbra (2017), p. 679; e Paulo Otero, Legalidade e administração pública o sentido da vinculação da administração à juridicidade, Almedina, Coimbra (2003), p. 524.

(51) Ana Raquel Gonçalves Moniz, Estudos…, p. 48 e 145; Idem, A recusa de aplicação de regulamentos pela administração com fundamento em invalidade contributo para a teoria dos regulamentos, Almedina, Coimbra (2012), p. 509.

(52) Pedro Gonçalves, A concessão de serviços públicos, Almedina, Coimbra (1999), p. 178.

(53) Pedro Gonçalves, A concessão…, p. 182.

(54) Pedro Gonçalves, A concessão…, p. 185.

(55) Supra IV, 2.

(56) Pedro Gonçalves, A concessão…, p. 195.

(57) Pedro Gonçalves, A concessão…, p. 197.

(58) Cfr. O relatório n.º 12/2015, 2.ª Secção (Auditoria ao sistema de proteção social dos trabalhadores em funções públicas – ADSE), onde se pode ler (p. 39) que «o modelo de contratação tem por base a manifestação de interesse por parte da entidade prestadora em aderir ao clausulado-tipo e às regras e tabelas de preços, indicando os atos das tabelas que pretende em concreto realizar».

(59) Sofia Pinto, Os acordos quadro no direito da contratação pública, Coimbra, Almedina, 2011, p. 67.

(60) Pedro Gonçalves, A concessão…, p. 200.

(61) Pedro Gonçalves, A concessão…, p. 200 (itálico no original).

(62) No mesmo sentido, para os acordos de gestão ou de colaboração com as IPSS, cf. Licínio Lopes, As Instituições Particulares de Solidariedade Social, Almedina, Coimbra (2009), p. 372-393 (especialmente 377); para os contratos-programa celebrados entre os hospitais públicos empresariais e o Estado, Idem, Direito Administrativo da Saúde …, p. 261 e 263.

(63) Pedro Gonçalves, A concessão…, p. 202; no mesmo sentido, Ana Raquel Gonçalves Moniz, Estudos…, p. 48 e 145; Idem, A recusa…, p. 509 ou Jorge Correia de Carvalho Barreira Alves, Contrato e Poder…, p. 680.

(64) Jorge Correia de Carvalho Barreira Alves, Contrato e Poder…, p. 680.

(65) Sempre se dirá, porém, que nos termos do artigo 287.º, número três, do Código dos Contratos Públicos «o contrato que constitui situações subjetivas passivas para terceiros ou do qual resultem efeitos modificativos, impeditivos ou extintivos de direitos de terceiros só se torna eficaz nessa parte mediante consentimento dos titulares dos direitos ou obrigações visados»; sobre este regime, que exclui as cláusulas contratuais de efeito normativo, cuja eficácia depende de publicidade conferida segundo as formalidades aplicáveis aos regulamentos do contraente público (n.º 4), cf. Jorge Correia de Carvalho Barreira Alves, Contrato e Poder…, p. 681.

(66) Código dos Contratos Públicos comentado e anotado, Almedina, Coimbra (2010), p. 721. Sobre estes poderes, cfr, por exemplo, Carla Amado Gomes, «A conformação da Relação contratual no Código dos Contratos Públicos»», in Pedro Gonçalves (organização), Estudos de contratação pública, Coimbra Editora, Coimbra (2008), I, p. 525; ou Lourenço B. Manoel de Vilhena, O Poder de modificação unilateral do contrato administrativo pela administração (e as garantias contenciosas do cocontratante perante este exercício), AAFDL, Lisboa (2007), p. 97 e ss.

(67) Relatório n.º 12/2015, 2.ª Secção (Auditoria ao sistema de proteção social dos trabalhadores em funções públicas – ADSE -), p. 72; onde também se pode ler – repetimos – que «o modelo de contratação tem por base a manifestação de interesse por parte da entidade prestadora em aderir ao clausulado-tipo e às regras e tabelas de preços, indicando os atos das tabelas que pretende em concreto realizar» (p. 39).

(68) Sobre esta possibilidade de alteração, cf. Lourenço B. Manoel de Vilhena de Freitas, O poder de modificação …, p. 123; Sérvulo Correia, Legalidade e autonomia …, p. 719 e ss. onde se pode ler que «isto significa que se reconhece ao contrato a função de sede complementar de competências do contraente administrativo relativamente à outra parte. A nosso ver, a aceitação deste postulado sem aparentes dúvidas quanto à sua harmonização com os ditames da legalidade administrativa só se explica pela já mencionada centragem dos contratos administrativos sobre objetivos em si mesmos passíveis de contratação privada e pela acentuada reserva quanto à sua utilização como forma substitutiva da do ato administrativo para conformação de situações exclusivamente concebíveis no âmbito do Direito Administrativo» (p. 720/1).

(69) Supra III, 2.

(70) Lourenço B. Manoel de Vilhena de Freitas, O poder de modificação …, p. 123.

(71) Pedro Miguel Pereira, Os poderes do contratante público no código dos contratos públicos, Coimbra Editora, Coimbra, (2011), p. 59/60; Pedro Gonçalves, «A relação jurídica fundada em contrato administrativo», Cadernos de justiça administrativa (2007), 64, p. 39.

(72) Carla Amado Gomes, A conformação…, p. 567.

(73) Joaquim Sousa Ribeiro, O Problema do Contrato…, p. 175/6.

(74) Artigo 10.º do Código de Procedimento Administrativos, cuja redação é a seguinte:

«Artigo 10.º

Princípio da boa-fé

1 – No exercício da atividade administrativa e em todas as suas formas e fases, a Administração Pública e os particulares devem agir e relacionar-se segundo as regras da boa-fé.

2 – No cumprimento do disposto no número anterior, devem ponderar-se os valores fundamentais do Direito relevantes em face das situações consideradas, e, em especial, a confiança suscitada na contraparte pela atuação em causa e o objetivo a alcançar com a atuação empreendida».

(75) Em nosso entender, o juízo de proporcionalidade não pode aqui resultar do artigo 281.º do Código dos Contratos Públicos («O contraente público não pode assumir direitos ou obrigações manifestamente desproporcionados ou que não tenham uma conexão material direta com o fim do contrato») que impede que a administração se sujeite a contratos desproporcionados, mas não o contrário.

(76) Nas palavras de José Manuel Sérvulo Correia: «nos casos em que a prossecução do interesse público a cargo da Administração não dispensar a titularidade de poder para a conformação autoritária e imediatamente eficaz de situações jurídicas de execução do contacto, incumbe ao contraente público o ónus de fazer prever esse poder no próprio contrato. A cláusula de sujeição será assumida conscientemente pelo cocontratante, que avaliará em face das circunstâncias concretas se ela é conciliável com os interesses próprios que promove através do contrato» (Legalidade e autonomia …, p. 738).

(77) Sobre estes princípios, supra II, 1.1.

Este parecer foi homologado por despacho de 5 de dezembro de 2018, de Sua Excelência o Secretário de Estado Adjunto e da Saúde.

Está conforme.

Lisboa, 19 de dezembro de 2018. – O Secretário da Procuradoria-Geral da República, Carlos Adérito da Silva Teixeira.»