Regulamento de Gestão da Disponibilidade do Medicamento – Infarmed

«Deliberação n.º 1315/2019

Sumário: Deliberação do conselho diretivo do INFARMED, I. P., que aprova o regulamento para gerir a disponibilidade do medicamento.

O Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I. P. (INFARMED, I. P.), considerando que:

a) A garantia do acesso dos cidadãos aos medicamentos de que necessitam assume-se como uma das mais relevantes vertentes do direito fundamental à proteção da saúde, consagrada no artigo 64.º da Constituição da República Portuguesa;

b) Todos os intervenientes no circuito do medicamento, no âmbito da garantia do dever de serviço público, têm como missão garantir o acesso contínuo e adequado aos medicamentos, sendo, em consequência, também responsáveis por prevenir e gerir a escassez dos medicamentos;

c) Os titulares de Autorização de Introdução no Mercado (AIM) estão legalmente obrigados a garantir o contínuo fornecimento das necessidades dos cidadãos do mercado nacional e assegurar a satisfação das encomendas dos distribuidores por grosso que disponham de pedidos de fornecimento por parte de farmácias e serviços farmacêuticos hospitalares nacionais, não podendo recusar o fornecimento de medicamentos que lhe sejam solicitados, devendo monitorizar o fornecimento nacional dos seus medicamentos e desenvolver estratégias para impedir a ocorrência de escassez;

d) Os distribuidores por grosso estão legalmente obrigados a garantir o contínuo e adequado fornecimento das necessidades dos cidadãos no mercado nacional, enquanto agentes que atuam entre os titulares da AIM, que os devem abastecer, e as farmácias, unidades de saúde e outras entidades que legalmente podem adquirir medicamentos, por forma a garantir o seu fornecimento, estando particularmente posicionados para identificar os sinais de indisponibilidade de medicamentos, devendo desenvolver estratégias para minimizar as consequências daquela e, nesse caso, reafectar os stocks de acordo com as necessidades dos cidadãos;

e) As farmácias comunitárias, os serviços farmacêuticos hospitalares nacionais e as instituições de Saúde devem garantir, em permanência, o acesso aos medicamentos adotando procedimentos que o sustentem, nos termos previstos na lei e no presente regulamento;

f) Os profissionais de saúde, de acordo com as suas competências e responsabilidades, devem estar envolvidos na orientação clínica para identificação dos medicamentos ou das terapêuticas alternativas dos seus utentes, em situações em que se preveja a indisponibilidade de um determinado medicamento por um período não compatível com a continuidade de tratamento;

g) Os grupos representativos de cidadãos com doença, colaboram com o INFARMED, I. P. na disponibilização de informação aos cidadãos afetados, nas situações em que o INFARMED, I. P. ou os profissionais de saúde identifiquem como prioritárias, bem como no reporte de situações de indisponibilidade de medicamentos, nos termos previstos no presente regulamento;

h) O INFARMED, I. P. na sua missão de regulação e supervisão do mercado do medicamento deve desenvolver todas as ações que permitam o acesso dos cidadãos aos medicamentos nas melhores condições, mediante recurso às ferramentas e estratégias regulatórias de que dispõe;

i) A recente publicação do Decreto-Lei n.º 112/2019, de 16 de agosto, que procedeu à décima segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de agosto prevê o reforço da importância de um maior envolvimento de todos os intervenientes no circuito do medicamento, especialmente dos titulares de autorização de introdução no mercado, distribuidores por grosso e locais de dispensa (farmácias, locais de venda de medicamentos não sujeitos a receita médica e hospitais);

j) De acordo com o referido diploma legal, compete ao INFARMED, I. P. avaliar, de forma permanente e contínua, as condições de acessibilidade aos medicamentos, em termos qualitativos e quantitativos, com vista a uma melhoria da monitorização do mercado do medicamento em Portugal, clarificando as responsabilidades dos titulares de autorização de introdução no mercado e dos distribuidores por grosso, quanto à obrigação de fornecimento contínuo do mercado nacional de medicamentos;

k) Igualmente se preveem no diploma situações específicas que carecem de regulamentação por parte do INFARMED, I. P., designadamente no que se refere às notificações das faltas ou ruturas de medicamentos, stocks mínimos e prevenção da escassez, instrumentos essenciais para gerir a disponibilidade do medicamento e suprir as faltas no mercado de medicamentos.

Assim, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 9.º, no n.º 10 do artigo 29.º, no n.º 6 do 78.º , no n.º 3 do artigo 94.º-A, na alínea c) do n.º 1 e n.º 2 do artigo 100.º e no n.º 1 do artigo 202.º do Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de agosto, na sua atual redação, e no n.º 6 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 46/2012, de 24 de fevereiro, na sua atual redação, o Conselho Diretivo do INFARMED, I. P. delibera:

1 – Aprovar o Regulamento para gerir a disponibilidade do medicamento, o qual consta em anexo à presente deliberação e dela faz parte integrante.

2 – A presente deliberação entra em vigor no 3.º dia útil seguinte ao da sua assinatura e é publicado na página eletrónica do INFARMED, I. P., e posteriormente no Diário da República.

3 – Com a publicação da presente deliberação são revogados todos os regulamentos e/ou circulares informativas e/ou normativas que se mostrem incompatíveis com as disposições do presente Regulamento, nomeadamente a Deliberação n.º 021/CD/2011, de 27 de janeiro, a Deliberação n.º 050/CD/2012, de 12 de abril e a Circular Normativa n.º 072/CD/2019, de 04 de abril.

31/10/2019. – O Conselho Diretivo: Dr. Rui Santos Ivo, presidente – Dr. António Faria Vaz, vice-presidente – Dr.ª Cláudia Belo Ferreira, vogal.

ANEXO

Regulamento de gestão da disponibilidade do medicamento

Artigo 1.º

Objeto e âmbito de aplicação

1 – O presente Regulamento tem por objeto a fixação de regras e procedimentos para gerir a disponibilidade do medicamento, designadamente no que se refere às notificações das faltas ou ruturas de medicamentos, que devem ser observadas por:

a) Titulares de autorização de introdução no mercado (TAIM);

b) Distribuidores por grosso;

c) Farmácias;

d) Outras entidades legalmente habilitadas a dispensar medicamentos ao público em território nacional.

2 – O Regulamento prevê também as quantidades mínimas de medicamentos, através da constituição do stock mínimo que os distribuidores por grosso de medicamentos a operar no mercado nacional devem dispor em permanência, bem como outras medidas de prevenção de escassez de medicamentos no mercado nacional.

3 – O Regulamento estabelece ainda a participação das associações representativas das pessoas com doença no âmbito da gestão da disponibilidade do medicamento.

Artigo 2.º

Notificação de Falta

1 – Os titulares de autorização de introdução no mercado, os distribuidores por grosso, as farmácias e outras entidades legalmente habilitadas a dispensar medicamentos ao público em território nacional devem notificar ao INFARMED, I. P. a falta de um medicamento, por via eletrónica, de acordo com as respetivas especificidades previstas nos artigos seguintes.

2 – A notificação da falta do medicamento deve ser realizada até 24 horas, após a tomada de conhecimento, devendo as entidades manter evidência das diligências efetuadas com vista à obtenção do fornecimento junto dos restantes intervenientes no circuito do medicamento.

3 – As notificações pelas entidades não abrangidas pelos artigos 3.º e 4.º são reportadas ao INFARMED, I. P., através do contacto com o Centro de Informação do Medicamento e Produtos de Saúde (CIMI)ou através de formulário eletrónico disponível na página daquela Autoridade.

4 – Os profissionais de saúde e os cidadãos podem igualmente comunicar as situações de indisponibilidade do medicamento de que tenham conhecimento através do contacto com o CIMI ou através de formulário eletrónico disponível na página daquela Autoridade.

5 – Após a receção das notificações referidas nos números anteriores, o INFARMED, I. P., analisa os dados recolhidos em conjugação com a demais informação que considere relevante e desencadeia as ações necessárias no âmbito das suas atribuições e competências.

Artigo 3.º

Notificação pela farmácia

1 – As farmácias estão obrigadas a notificar, através de plataforma eletrónica, a falta de uma determinada apresentação de um medicamento que se traduza na inviabilidade de satisfazer uma prescrição, por período superior a 12 horas após a apresentação da mesma.

2 – As farmácias devem ainda notificar, nos termos do número anterior, a inviabilidade de satisfazer o pedido do cidadão no caso de medicamentos para quais não é legalmente exigida a prescrição.

Artigo 4.º

Notificação pelo distribuidor por grosso

1 – Os distribuidores por grosso estão obrigados a notificar ao INFARMED, I. P., através de plataforma eletrónica, a indisponibilidade de uma determinada apresentação de um medicamento, cujo pedido de fornecimento não tenha sido satisfeito por parte de um titular de AIM.

2 – Para efeitos do disposto do número anterior, a notificação deverá ser acompanhada da informação relativa às quantidades encomendadas pelo distribuidor por grosso e às quantidades fornecidas pelo TAIM, bem como as quantidades do mesmo medicamento que tenham sido exportadas pelo distribuidor por grosso no período de dois meses imediatamente anterior.

Artigo 5.º

Notificação de Rutura

1 – Os titulares da autorização de introdução no mercado de medicamentos devem notificar a(s) rutura(s) ao INFARMED, I. P., com a antecedência mínima de dois meses em relação à data prevista para início da indisponibilidade do medicamento no mercado nacional, salvo casos de urgência devidamente justificada, através do Portal Sistema de Informação para a Avaliação das Tecnologias de Saúde (SIATS).

2 – Para efeitos do disposto no número anterior é considerada como data de início de rutura, o dia a partir do qual se prevê que determinada apresentação deixe de estar disponível nos distribuidores por grosso, tendo por base o consumo do medicamento e a quantidade colocada no mercado.

3 – As ruturas são classificadas quanto ao risco para a saúde pública em:

a) Baixo: Medicamentos com similares (mesma substância ativa, igual forma farmacêutica e dosagem);

b) Médio: Medicamentos com alternativas terapêuticas limitadas ou insuficientes (medicamentos com mesma substância ativa, diferente forma farmacêutica e/ou diferente dosagem, e indicação clínica sobreponível);

c) Elevado: Medicamentos sem alternativa terapêutica (diferente substância ativa, independentemente de terem ou não a mesma CFT e/ou a mesma indicação terapêutica).

4 – Para as situações classificadas nos termos do número anterior com risco médio e elevado, o titular de AIM deve ainda remeter ao INFARMED, I. P., no mínimo, os seguintes dados:

a) Fundamentação objetiva e suscetível de verificação do motivo que originou a rutura;

b) Identificação de alternativas terapêuticas para os referidos medicamentos, comercializadas em Portugal ou em outros países do espaço económico europeu, e medidas necessárias para a sua substituição;

c) Proposta de comunicação a todos os profissionais de saúde com a informação descrita na alínea anterior, a qual deve contemplar os meios para a sua divulgação e os destinatários a que a mesma se dirige;

d) Medidas previstas para minimizar o impacto da ausência do fornecimento do medicamento.

Artigo 6.º

Medidas de prevenção de escassez

1 – Os TAIM de medicamentos em que uma parte do processo de fabrico está dependente de uma única instalação e não disponham de alternativas terapêuticas ou que tenham alternativas limitadas e sempre que a interrupção do seu fornecimento possa resultar num risco para a saúde pública, deverão, mesmo que o medicamento não se encontre em situação de rutura, ter disponível de forma permanente e atualizada a seguinte informação:

a) Identificação das ações a desencadear junto dos mercados mundiais por forma a procurar assegurar o fornecimento do mercado nacional;

b) Avaliação contínua da procura e da oferta de produto, incluindo a análise dos stocks nacionais e internacionais, que permita aferir o impacto de potenciais ruturas e preparação de respostas adequadas;

c) Identificação e garantia da manutenção do nível do stock dos referidos medicamentos de forma a assegurar o abastecimento regular do mercado durante um período mínimo de dois meses de consumo;

d) Identificação de alternativas terapêuticas para os referidos medicamentos, comercializadas em Portugal ou noutros países;

e) Avaliação dos riscos na saúde dos cidadãos em caso de indisponibilidade do medicamento;

f) Referência aos procedimentos de gestão de risco nomeadamente ao nível da avaliação de eficácia do circuito de distribuição;

g) Plano de comunicação aos diversos intervenientes, incluindo ao INFARMED, I. P., distribuidores, locais de dispensa, instituições de saúde, profissionais de saúde e associações representativas de pessoas com doença e associações de defesa de utentes de saúde.

2 – A informação referida no número anterior deve encontrar-se disponível para avaliação por parte do INFARMED, I. P. quando solicitado.

Artigo 7.º

Critérios para determinação de quantidades mínimas (Stock)

1 – Os distribuidores por grosso no mercado nacional devem dispor permanentemente de medicamentos em quantidade e variedade suficientes para garantir o fornecimento adequado e contínuo das farmácias e demais entidades legalmente autorizadas para a dispensa de medicamentos em território nacional, bem como assegurar a continuidade do acesso dos cidadãos aos medicamentos, nomeadamente tendo em conta o fornecimento médio de unidades de determinado medicamento, a sua tipologia e o tempo médio de reposição do mesmo em stock.

2 – Os distribuidores por grosso no mercado nacional devem manter um stock mínimo nos termos do disposto no artigo 94.º-A e da alínea c) do n.º 1 e n.º 2 do artigo 100.º do Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de agosto na sua redação atual, de acordo com os seguintes critérios:

a) Medicamentos comercializados há mais de 12 meses: quantidades de medicamentos não inferiores à média mensal das encomendas de farmácias e outras entidades autorizadas a dispensar medicamentos ao público em território nacional, do último ano;

b) Medicamentos comercializados há menos de 12 meses: quantidades não inferiores à média mensal das encomendas de farmácias e outras entidades autorizadas a dispensar medicamentos ao público em território nacional, calculado desde a data da sua efetiva comercialização.

3 – Relativamente aos stocks previstos no número anterior, a sua definição poderá ser acrescida de uma margem de segurança de 50 % acima dos valores referidos no n.º 2.

4 – Os distribuidores por grosso devem manter e assegurar os níveis de stock mínimo sem prejuízo de os mesmos poderem ser reduzidos ou mobilizados, em casos devidamente justificados por razões de saúde pública, do modo a garantir o fornecimento das farmácias e demais entidades habilitadas a dispensar medicamentos ao público em território nacional.

Artigo 8.º

Informação aos profissionais de saúde e aos cidadãos

1 – O INFARMED, I. P. divulga informação atualizada relativa à disponibilidade do medicamento na sua página eletrónica.

2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, o INFARMED, I. P. promove ainda a divulgação da informação especificamente dirigida a instituições de saúde, associações profissionais e associações que representam cidadãos com doença, estabelecendo canais de comunicação próprios para o efeito.

Artigo 9.º

Colaboração

1 – De modo a contribuir para o adequado desenvolvimento do sistema de gestão da disponibilidade do medicamento, as associações representativas dos titulares AIM, dos titulares de autorização de distribuição por grosso de medicamentos, das farmácias e de outras entidades habilitadas a dispensar medicamentos ao público no território nacional, bem como as associações profissionais e as associações que representam cidadãos com doença devem comunicar ao INFARMED, I. P. toda e qualquer informação que considerem relevante.

2 – A comunicação referida no número anterior deverá ser realizada para o endereço eletrónico disponibilidade@infarmed.pt.

3 – Para efeitos do acompanhamento das medidas relativas à gestão da disponibilidade do medicamento, designadamente as previstas no presente regulamento, é criada uma Comissão de Acompanhamento da Gestão da Disponibilidade do Medicamento (CAGDM), constituída pelas entidades referidas no n.º 1.

Artigo 10.º

Fiscalização

1 – O INFARMED, I. P. no âmbito das suas atribuições e competências, executa as medidas necessárias a garantir o integral cumprimento, por cada um dos intervenientes no circuito do medicamento, das obrigações decorrentes do dever do serviço público essencial de garantia de acesso aos medicamentos, bem como a aplicação do respetivo regime sancionatório.

2 – De forma a assegurar a rastreabilidade dos medicamentos em cada fase do circuito, o fornecimento dos mesmos deve ser coincidente com a documentação associada às transações efetuadas, designadamente em termos de entidades emissoras e recetoras e respetivos produtos transacionados.

3 – Para efeitos do disposto no número anterior e para a verificação do cumprimento do presente regulamento e demais legislação aplicável, todos os intervenientes no circuito do medicamento devem manter à disposição do INFARMED, I. P. o registo das encomendas e fornecimentos bem como toda a documentação referente ao exercício da sua atividade, nomeadamente notas de encomenda, guias de remessa, faturas, notas de crédito, devoluções, entre outras.

4 – A violação das obrigações previstas no presente regulamento constitui contraordenação punível nos termos do disposto do Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de agosto, na sua atual redação, sem prejuízo da responsabilidade civil, disciplinar e criminal que ao caso couber, incluindo a responsabilidade que cabe aos diretores técnicos das entidades envolvidas.

Artigo 11.º

Norma transitória

Até ao desenvolvimento da plataforma eletrónica referida nos artigos 2.º a 4.º, a notificação de falta de medicamento deverá ser realizada para o endereço eletrónico disponibilidade@infarmed.pt contendo a seguinte informação:

a) Número de registo do medicamento em falta;

b) Nome e localização da entidade que comunica a falta.

Artigo 12.º

Disposição Final

O disposto no presente Regulamento é objeto de revisão periódica, em função da gestão da disponibilidade do medicamento.»