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Decreto-Lei n.º 23/2020 – Diário da República n.º 100/2020, Série I de 2020-05-22
Presidência do Conselho de Ministros
Estabelece as regras para a celebração de contratos de parceria de gestão na área da saúde
Resumo em Linguagem Clara | Summary in plain english
«RESUMO EM LINGUAGEM CLARA (SEM VALOR LEGAL)
O que é?
O presente decreto-lei estabelece as regras para a celebração dos contratos de parceria de gestão na área da saúde, com caráter supletivo e temporário, em casos de necessidade fundamentada, e define os termos da gestão dos estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde (SNS), quando estes tenham por base a celebração desses mesmos contratos.
O que vai mudar?
Este diploma introduz a previsão expressa das condições necessárias para a criação de parcerias de gestão de estabelecimentos de saúde do SNS, as quais se assumem como supletivas e temporárias.
Para efeitos do preenchimento da condição da «necessidade fundamentada» para a existência da parceria de gestão, a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) e a Administração Regional de Saúde (ARS) territorialmente competente pela área do estabelecimento devem elaborar um estudo, que tem de concluir pela verificação dessa mesma «necessidade fundamentada», ficando sujeito à aprovação do membro do Governo responsável pela área da saúde.
Este estudo deve abordar os pressupostos seguintes na sua análise:
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- Quais as necessidades dos utentes da área geográfica;
- A oferta existente na área e a possibilidade de celebração de contratos de convenção que permitam suprir as necessidades; e
- O prazo que o SNS, sem recurso a parcerias, prevê para suprir as necessidades verificadas.
Preveem-se também os princípios de gestão pública que devem ser observados pela entidade gestora de uma parceria público-privada para gestão de um estabelecimento de saúde do SNS.
Que vantagens traz?
O estudo da ACSS e da ARS permitirá ao membro do Governo responsável pela área da saúde, privilegiando os serviços próprios do Estado ao nível da gestão clínica dos estabelecimentos do SNS, ponderar se a parceria de gestão se enquadra na lógica da Base 6 da Lei de Bases da Saúde, ou seja, se o recurso à mesma tem um caráter supletivo e temporário.
Estabelecem-se os princípios de gestão pública pelos quais se deve reger a entidade gestora de um contrato de parceria para gestão de um estabelecimento do SNS, traduzindo aspetos essenciais e imprescindíveis, que obedecem, principalmente, a deveres de serviço público (ex: garantia da universalidade de acesso).
Quando entra em vigor?
Este decreto-lei entra em vigor no dia 23 de maio de 2020.
«Decreto-Lei n.º 23/2020
de 22 de maio
Sumário: Estabelece as regras para a celebração de contratos de parceria de gestão na área da saúde.
A Lei de Bases da Saúde, aprovada pela Lei n.º 95/2019, de 4 de setembro, veio dar resposta a mudanças significativas no paradigma da saúde em Portugal, ao nível da prestação de cuidados, da demografia, da organização do sistema e da evolução tecnológica.
Especificamente no que concerne à prestação de cuidados de saúde, entendeu-se necessário dar prevalência aos serviços próprios do Estado na gestão clínica dos estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde (SNS), prevendo-se, através do n.º 1 da Base 6 da Lei de Bases da Saúde, que o recurso a entidades do setor privado e social, para esse efeito, apenas seja equacionado em termos supletivos e temporários, em casos de «necessidade fundamentada».
Foi neste contexto que, nos termos do artigo 3.º da Lei n.º 95/2019, de 4 de setembro, se revogou o Decreto-Lei n.º 185/2002, de 20 de agosto, que definia os princípios e os instrumentos para o estabelecimento de parcerias em saúde, em regime de gestão e financiamento privados. Esta revogação ficou, porém, condicionada à entrada em vigor de legislação de desenvolvimento que defina os termos da gestão pública dos estabelecimentos do SNS, de acordo com a mencionada Base 6.
Deste modo, importa, por um lado, estabelecer as regras específicas para o estabelecimento de parcerias em saúde, que envolvam a gestão e prestação de cuidados de saúde, sem prejuízo do regime estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 111/2012, de 23 de maio, na sua redação atual, e, por outro lado, definir os princípios e termos da gestão pública dos estabelecimentos de saúde do SNS que tenham na sua base a celebração de contratos de parceria.
Sem prejuízo da aprovação do presente decreto-lei, cuja entrada em vigor determinará a produção de efeitos imediatos da revogação do referido Decreto-Lei n.º 185/2002, de 20 de agosto, o Governo procederá ainda, num momento subsequente, à aprovação da demais legislação complementar necessária de desenvolvimento do regime estabelecido na Base 6 da Lei de Bases da Saúde, à luz dos princípios pelos quais o SNS deve pautar a sua atuação.
Assim:
No desenvolvimento do regime jurídico estabelecido pela Lei de Bases da Saúde, aprovada pela Lei n.º 95/2019, de 4 de setembro, e nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Objeto
O presente decreto-lei:
a) Estabelece as regras para a celebração, com caráter supletivo e temporário e em casos de necessidade fundamentada, de contratos de parceria de gestão na área da saúde definidos no n.º 1 do artigo 2.º;
b) Define os termos da gestão dos estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde (SNS) quando estes tenham por base a celebração dos contratos referidos na alínea anterior.
Artigo 2.º
Âmbito dos contratos de parceria de gestão na área da saúde
1 – Para efeitos do disposto no presente decreto-lei, os contratos de parceria de gestão na área da saúde são acordos celebrados com entidades privadas e do setor social, nos termos da Base 6 da Lei de Bases da Saúde, aprovada em anexo à Lei n.º 95/2019, de 4 de setembro, que têm por objeto principal assegurar a gestão e prestação de cuidados de saúde correspondentes a um serviço público de saúde em estabelecimentos, ou em parte funcionalmente autónoma daqueles, integrados ou a integrar no SNS, com transferência e partilha de riscos, podendo ainda envolver, entre outras, as atividades de conceção, construção ou conservação daquele estabelecimento, ou de parte funcionalmente autónoma deste.
2 – O disposto no presente decreto-lei não prejudica a aplicação do regime previsto no Decreto-Lei n.º 111/2012, de 23 de maio, na sua redação atual, nem no Decreto-Lei n.º 138/2013, de 9 de outubro.
Artigo 3.º
Condições para a celebração de contratos de parceria de gestão na área da saúde
1 – A celebração de contratos de parceria de gestão na área da saúde assume caráter supletivo e temporário e depende, para além de outros requisitos legalmente aplicáveis, da existência de necessidade fundamentada.
2 – A necessidade fundamentada é demonstrada em estudo, a realizar pela Administração Central do Sistema de Saúde, I. P., e pela Administração Regional de Saúde territorialmente competente, que é aprovado pelo membro do Governo responsável pela área da saúde após consulta pública, e que antecede a apresentação da proposta fundamentada a que se refere o n.º 1 do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 111/2012, de 23 de maio, na sua redação atual.
3 – Do estudo a que se refere o número anterior devem resultar claros os pressupostos que levaram às conclusões alcançadas, incluindo:
a) As necessidades dos utentes na respetiva área geográfica;
b) A oferta existente na área e a possibilidade de celebração de contratos de convenção que permitam suprir as necessidades;
c) O prazo para que o SNS, sem recurso a contratos de parceria, consiga suprir as necessidades verificadas.
4 – Pelo caráter temporário da celebração de contratos de parceria na área da saúde, estes só podem ser sujeitos a renovação mediante realização de novo estudo, nos termos do presente artigo, que, ademais, fundamente o não suprimento das necessidades no prazo anteriormente previsto.
Artigo 4.º
Contrato de parceria de gestão na área saúde
1 – O estabelecimento de saúde que seja objeto de contrato de parceria regulado pelo presente decreto-lei deve assegurar a prestação de cuidados de saúde, nos termos dos demais estabelecimentos que integram o SNS, bem como a continuidade dos cuidados de saúde e o acesso dos utentes do SNS, de acordo com a articulação definida e as responsabilidades que lhe estão atribuídas.
2 – A entidade que proceda à gestão do estabelecimento de saúde que seja objeto de contrato de parceria, abreviadamente designada como entidade gestora, deve ser uma sociedade comercial com sede e administração principal localizadas em Portugal e cujo objeto exclusivo seja o exercício da atividade objeto do contrato.
Artigo 5.º
Princípios de gestão pública
A entidade gestora deve assegurar o cumprimento dos princípios de gestão aplicáveis às restantes entidades que integram o SNS, nomeadamente:
a) O acesso aos cuidados de saúde, bem como a sua continuidade, por parte dos utentes da sua área de influência, de acordo com as redes de referenciação definidas e contribuindo para o funcionamento em rede do SNS;
b) A garantia do cumprimento dos direitos do utente dos serviços de saúde consagrados na lei, designadamente dos tempos máximos de resposta garantidos;
c) A primazia da qualidade na prestação de cuidados de saúde, garantindo a sua constante atualização, com base na evidência, e mantendo sempre presente a necessidade do foco no utente e na humanização dos cuidados prestados;
d) A inclusão de ações de promoção da saúde e de prevenção da doença em toda a cadeia de cuidados prestados;
e) A garantia do tratamento integral dos utentes de acordo com a melhor prática clínica, independentemente da sua condição económica, social, de complexidade e/ou gravidade da situação clínica e respetivo prognóstico;
f) A aplicação do regime disposto nos diplomas que definam o regime legal de carreira das profissões da área da saúde;
g) A disponibilização de informações estatísticas relativamente à utilização dos serviços, para efeitos de auditoria e fiscalização e controlo de qualidade, no respeito pelas regras deontológicas e de segredo profissional;
h) O respeito pelas orientações técnicas emanadas pelos serviços competentes do Ministério da Saúde;
i) O respeito pelos protocolos, requisitos e especificações técnicas para recolha, tratamento e transmissão de informação clínica e administrativa, definidas contratualmente;
j) A inclusão da sociedade civil em conselhos consultivos, nomeadamente das associações representativas dos utentes, permitindo a sua participação nos processos de tomada de decisão.
Artigo 6.º
Obrigações da entidade gestora
O contrato de parceria fixa as obrigações da entidade gestora, para efeitos do disposto no presente decreto-lei, e ainda:
a) As atividades acessórias que a entidade gestora pode prosseguir;
b) A possibilidade de utilizar o estabelecimento para a realização de prestações de saúde fora do âmbito do serviço público que assegura, desde que essa utilização se faça, comprovadamente, sem prejudicar o cumprimento das obrigações de serviço público;
c) As receitas que são consideradas remuneração da entidade gestora, designadamente as resultantes de prestações a terceiros no âmbito de atividades acessórias ou de serviços não previstos para a generalidade dos utentes.
Artigo 7.º
Aplicação no tempo
O presente decreto-lei não se aplica às parcerias cujo processo, nos termos do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 111/2012, de 23 de maio, na sua redação atual, se tenha iniciado antes da sua entrada em vigor.
Artigo 8.º
Entrada em vigor
O presente decreto-lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 30 de abril de 2020. – António Luís Santos da Costa – Mário José Gomes de Freitas Centeno – Marta Alexandra Fartura Braga Temido de Almeida Simões.
Promulgado em 5 de maio de 2020.
Publique-se.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
Referendado em 5 de maio de 2020.
O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa.»