- Resolução da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores n.º 30/2021/A – Diário da República n.º 121/2021, Série I de 2021-06-24
Região Autónoma dos Açores – Assembleia Legislativa
Medidas para um diagnóstico e tratamento precoces da endometriose
«Resolução da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores n.º 30/2021/A
Sumário: Medidas para um diagnóstico e tratamento precoces da endometriose.
Medidas para um diagnóstico e tratamento precoces da endometriose
A endometriose é uma doença crónica que se caracteriza pela presença de tecido endometrial (semelhante ao endométrio) em zona extrauterina (por exemplo, paredes exteriores do útero, ovários e trompas de Falópio e, em alguns casos, outros órgãos, como intestinos e pulmões).
Durante o ciclo menstrual este tecido extrauterino comporta-se como o endométrio intrauterino, primeiro proliferando, depois descamando durante a menstruação, o que provoca dor pélvica, muitas vezes incapacitante, hemorragias e os vários sintomas associados a esta doença. De etiologia ainda incerta (contribuição do refluxo menstrual para o desenvolvimento da doença, migração dos implantes endométricos por via hepática, transformação de outras células em células endometriais, predisposição genética, disfunção do sistema imunitário ou exposição a causas ambientais), calcula-se que a endometriose afete 1 em cada 10 mulheres em idade fértil, uma prevalência de 10 %, o que, no caso de Portugal, significaria cerca de 350 000 mulheres com esta doença, a maioria ainda por diagnosticar. Segundo a Sociedade Portuguesa de Ginecologia, os sintomas mais frequentes de endometriose são:
a) Dores menstruais intensas (dismenorreia progressiva), que ocorrem um a dois dias antes da menstruação, persistem durante a mesma e podem prolongar-se por alguns dias após o seu término, prevalentes em até 79 % dos casos;
b) Dor durante o ato sexual (dispareunia profunda), que pode persistir após o coito e ser intensa, prevalente em 45 % dos casos;
c) Desconforto a urinar (disúria) e dificuldade em evacuar (disquesia), prevalentes em até 25 % e 29 % dos casos, respetivamente;
d) Dor abdominal ou lombar, prevalente em 58 % dos casos;
e) Dor pélvica crónica, prevalente em 69 % dos casos, e dor pélvica aguda associada com rotura, hemorragia ou infeção de um endometrioma.
Podem existir ainda outros sintomas associados, como a hemorragia uterina anómala, a fadiga crónica, retorragias e hematúria ou sintomas gastrointestinais inespecíficos ou pneumotórax catamenial espontâneo.
Entre 30 % a 50 % dos casos de endometriose têm infertilidade associada e certas manifestações da doença resultam em incapacidade de levar uma gravidez a termo. Simultaneamente, estima-se que cerca de 50 % das mulheres em ciclos de procriação medicamente assistida por razões de infertilidade sejam mulheres com endometriose, normalmente por diagnosticar.
Tendo em conta a descrição dos sintomas e os impactos que têm na saúde, qualidade de vida social, profissional, relacional, sexual e reprodutiva das mulheres, não é difícil perceber que esta é uma doença que deixa uma marca intensa na vida das mulheres, muitas vezes logo desde que se inicia a puberdade. Estas consequências são agravadas pelo diagnóstico tardio da doença, o que faz com que as mulheres tenham de viver durante muitos anos com a doença, sem saberem que a têm, sem obterem uma validação das suas queixas e sem terapêutica adequada que possa ajudar a controlar e combater os sintomas.
Estima-se que entre as primeiras queixas e o diagnóstico da doença distem 8 a 10 anos em média. Durante este tempo, estas mulheres veem-se obrigadas a recorrer a inúmeros profissionais de saúde, realizam exames inconclusivos repetidamente, sendo eventualmente não diagnosticadas ou, em alguns casos, diagnosticadas com outras patologias. Neste interregno, as mulheres despendem recursos económicos pessoais e do Estado, à medida que veem a sua qualidade de vida comprometida e sem solução aparente e à medida que a doença continua a progredir. Mas por que razão o diagnóstico demora tanto tempo? Ainda que haja desafios no processo de diagnóstico, a doença pode ser sinalizada através da história clínica, exame ginecológico, recurso a imagem ou a estudo histológico, mas ela continua a ser subdiagnosticada.
Uma das principais causas radica na desvalorização dos sintomas por parte da sociedade e por parte da comunidade médica, e na normalização da dor, a reboque da ideia de que a menstruação é dor.
Dor pélvica persistente ou intensa não é normal e essa ideia precisa de ser desconstruída na sociedade, em geral, e junto das mulheres e dos profissionais de saúde, em particular. A sensibilização das mulheres para a identificação de sintomas que podem indicar algo que está muito para lá do desconforto da menstruação, assim como a sensibilização dos profissionais de saúde para não desvalorizarem estes mesmos sintomas, tornará possível um diagnóstico e tratamento mais precoces da doença.
Assim, a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores resolve, nos termos regimentais aplicáveis e ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 44.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, recomendar ao Governo Regional o seguinte:
1 – A divulgação de informação sobre endometriose nas unidades do Serviço Regional de Saúde, em particular nos Cuidados de Saúde Primários, destinada a utentes em geral e a profissionais de saúde.
2 – A inclusão da endometriose no Plano Regional de Saúde.
3 – A adoção de medidas, sejam informativas e de sensibilização, sejam de acesso a consultas e meios complementares de diagnóstico, que garantam um diagnóstico precoce da endometriose.
4 – A promoção, junto da comunidade escolar, de ações de informação e consciencialização sobre esta doença e os seus sintomas e sobre o que fazer e onde se dirigir no caso de presença de sintomas compatíveis com endometriose.
Aprovada pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, na Horta, em 19 de maio de 2021.
O Presidente da Assembleia Legislativa, Luís Carlos Correia Garcia.»