Criação de programa tratamento das pessoas com diabetes mellitus tipo 1, através da colocação de Sistemas de Administração Automática de Insulina (SAAI)

«Despacho n.º 6440/2023

O Programa do XXIII Governo Constitucional prevê que o Governo irá continuar a desenvolver a política de inovação para acesso a novos medicamentos e dispositivos médicos, de acordo com as boas práticas e com relação custo-benefício favorável.

A diabetes mellitus tipo 1 é uma doença crónica, causada pela destruição das células produtoras de insulina no pâncreas e afeta nomeadamente crianças e jovens, obrigando ao tratamento com insulina durante toda a vida.

Apesar da melhoria progressiva do tratamento das pessoas com diabetes mellitus tipo 1, com maior facilidade na monitorização dos valores da glicose, com a disponibilização de diversos tipos de insulina e com a maior facilidade da sua administração, esta patologia continua a afetar a qualidade de vida e a reduzir a esperança média de vida destas pessoas. A ocorrência de complicações agudas, cetoacidose diabética ou hipoglicemia, é muito significativa, causando risco de vida e elevado recurso aos serviços de saúde.

O tratamento otimizado da diabetes mellitus tipo 1, com controle glicémico adequado, reduz de forma significativa o risco de complicações agudas e diminui a ocorrência de lesão de órgãos-alvo, melhorando a qualidade de vida e a sobrevida das pessoas com diabetes.

Na última década e meia generalizou-se o uso de sistemas de Perfusão Subcutânea Contínua de Insulina (PSCI), tendo sido demonstrado que a sua utilização melhora a experiência das pessoas com diabetes mellitus tipo 1 e dos seus familiares, assim como os resultados do tratamento.

Em Portugal, a evolução do número de pessoas com diabetes mellitus tipo 1 em tratamento com PSCI é assinalável, verificando-se que no final de 2022 existiam 4170 dispositivos colocados, dos quais 1849 em doentes em idade pediátrica, conforme demonstrado no gráfico constante do anexo ao presente despacho e do qual faz parte integrante.

A colocação destes dispositivos, o ensino aos utentes e às famílias, o fornecimento dos consumíveis e a monitorização dos resultados são efetuados em 28 Centros de Tratamento (CT), reconhecidos pela Direção-Geral da Saúde (DGS), 27 dos quais dependentes de hospitais públicos, funcionando o outro na Associação Protetora dos Diabéticos de Portugal (APDP), também com financiamento público.

Mais recentemente foram introduzidos no mercado sistemas que representam uma evolução dos dispositivos PSCI tradicionais, que se designam Sistemas de Administração Automática de Insulina (SAAI). Estes sistemas estabelecem uma ligação direta e automatizada entre a monitorização dos valores da glicose e a administração de insulina, estando baseados em algoritmos testados e validados, com ajuste automático do débito basal, correção de hiperglicemias e prevenção de hipoglicemias.

No ano de 2022, o Serviço Nacional de Saúde (SNS) adquiriu, através dos CT, 337 destes dispositivos, que constituem assim 8 % do total de sistemas disponibilizados.

Face à evidência, na literatura internacional, de vantagem no recurso a estes novos sistemas, e à necessidade de proporcionar acesso aos portugueses, em condição de equidade, valor fundador do SNS, através do Despacho n.º 13339/2022, de 17 de novembro, alterado pelo Despacho n.º 3584/2023, de 21 de março, foi constituído um grupo de trabalho, integrando as instituições relevantes do Ministério da Saúde, a comunidade científica e associações de utentes, para:

a) Avaliar a estratégia de acesso a tratamento com PSCI, em termos de resultados obtidos, benefícios para o utente e custos associados;

b) Avaliar os benefícios dos novos dispositivos, com adequada fundamentação técnico-científica e avaliação criteriosa do custo-benefício, tendo em conta o potencial impacto na qualidade de vida das crianças, jovens e adultos atingidos pela doença, bem como das suas famílias;

c) Desenvolver uma estratégia de disponibilização desses dispositivos, com a avaliação do custo-benefício do processo;

d) Apresentar uma proposta de atualização da estratégia de acesso a tratamento com PSCI.

O relatório do grupo de trabalho foi entregue no dia 11 de maio, dando resposta cabal à missão definida e facultando as bases que permitem assumir as decisões adequadas para a generalização do uso dos SAAI nas pessoas com diabetes mellitus tipo 1.

O grupo de trabalho estimou a existência de cerca de 30 000 pessoas afetadas pela doença no nosso país e assumiu cerca de metade, 15 000 pessoas, com indicação para tratamento por sistemas automáticos de perfusão.

Embora notando o preço desproporcionalmente elevado dos novos dispositivos e dos seus consumíveis, que aliás faz com que o National Institute for Clinical Excelence (NICE) britânico questione se o seu uso apresenta relação custo-benefício adequado, o grupo de trabalho considerou que o uso de SAAI constitui o tratamento padrão da diabetes mellitus tipo 1 e que o seu uso deve ser facultado a todos os utentes que tenham indicação e motivação para esse tipo de tratamento.

Em termos complementares, no seu relatório, o grupo de trabalho evidenciou igualmente que o acesso universal aos SAAI implica o reforço da capacidade de atendimento dos CT e a construção de um sistema de informação robusto, que permitirá acompanhar a implementação e monitorização do programa.

Ao mesmo tempo, o grupo de trabalho propõe a adoção de um novo modelo de contratação dos dispositivos que, envolvendo riscos em termos financeiros e de cumprimento das regras de contratação pública, exige ainda maior densificação.

Assim, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 32/2022, de 9 de maio, na sua redação atual, determino:

1 – O desenvolvimento, no quadro do Serviço Nacional de Saúde (SNS), de um programa integrado de tratamento das pessoas com diabetes mellitus tipo 1, através da colocação de Sistemas de Administração Automática de Insulina (SAAI) a todos os que tenham indicação e motivação para tal, com desenvolvimento progressivo nos anos de 2023 a 2026.

2 – O referido programa será implementado sob orientação da Direção Executiva do SNS, I. P. (DE-SNS), com supervisão técnica da Direção-Geral da Saúde (DGS).

3 – Para o desenvolvimento do referido programa, sem prejuízo das funções atribuídas à DE-SNS e à DGS, determino desde já que:

a) A DE-SNS proceda à articulação dos diferentes CT de modo a verificar as condições necessárias para o alargamento da sua atividade, designadamente com recurso a profissionais que estão neste momento envolvidos no tratamento de utentes com diabetes mellitus tipo 1 sem utilização desta nova tecnologia;

b) A DE-SNS, em articulação com a Administração Central do Sistema de Saúde, I. P. (ACSS), acautele que os mecanismos de contratualização com as diferentes unidades hospitalares para os anos 2023 a 2026 permitam atingir o objetivo de acesso universal até ao final de 2026;

c) A Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, E. P. E. (SPMS), em estreita articulação com o INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I. P., e com o Serviço de Utilização Comum dos Hospitais (SUCH), desenvolva uma estratégia de compras públicas transparente e eficaz, aliada a uma solução logística e de distribuição, que garanta a diversificação do mercado, melhorando as condições de garantia e de incorporação da inovação tecnológica e otimizando a possibilidade de conduzir a um preço unitário consentâneo com a ambição de generalização do acesso traduzida neste programa, permitindo que este seja sustentável;

d) A DGS, em colaboração com a DE-SNS e recorrendo aos pareceres éticos que se revelem adequados, densifique as regras de prioridade na atribuição dos SAAI, assegurando total transparência no processo;

e) A SPMS, em articulação com a DE-SNS e com a DGS, estabeleça as condições de criação de um sistema de informação adequado à operacionalização e gestão deste programa, assegurando desde logo a plena integração e interoperabilidade com o ecossistema de informação em uso no SNS e o sistema de reporte ao INFARMED dos dados de utilização e consumo;

f) As propostas relativas aos pontos antecedentes devem ser apresentadas ao meu Gabinete, no prazo máximo de 120 dias, até ao dia 1 de outubro de 2023.

4 – O presente despacho entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

30 de maio de 2023. – O Ministro da Saúde, Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro.

ANEXO

Evolução do número de pessoas registadas em tratamento com PSCI ao abrigo do Programa Nacional para a Diabetes

(ver documento original)

Fonte: Grupo de trabalho criado ao abrigo do Despacho n.º 13339/2022, de 17 de novembro, alterado pelo Despacho n.º 3584/2023, de 21 de março.»