Despacho n.º 14212-A/2024 – Diário da República n.º 232/2024, Suplemento, Série II de 2024-11-29
Saúde – Gabinete da Secretária de Estado da Saúde
Procede à implementação de medidas, a curto prazo, pelas Unidades Locais de Saúde, considerando o aumento de afluência aos serviços de urgência durante o período do inverno.
«Despacho n.º 14212-A/2024
O Plano de Emergência e Transformação na Saúde, aprovado pelo Conselho de Ministros a 29 de maio de 2024, priorizou cinco eixos estratégicos, que se consideram fundamentais para assegurar e reforçar os direitos de acesso à saúde, sendo que um dos eixos estratégicos identificado prende-se com a necessidade de «reforçar a missão do Serviço de Urgência enquanto local para a observação e estabilização das situações clínicas realmente urgentes e emergentes».
Apesar das medidas já implementadas, reconhecendo a pressão que recai sobre os Serviços de Urgência (SU), atento o volume de episódios registados, por autorreferenciação e, em muitos casos, com pouca gravidade clínica, agravada pelas caraterísticas da atual demografia médica, torna-se necessário repensar a sua dinâmica e funcionamento.
Com efeito, atualmente, em Portugal, o consumo de cuidados de doença aguda nos SU prejudica a resposta às situações emergentes e urgentes, sendo que, durante os meses de inverno, o aumento da prevalência de infeções respiratórias trazem desafios adicionais à organização da rede de urgência e à resposta à doença aguda em geral.
A atual situação justifica, assim, que, sem prejuízo da necessidade de reforma estrutural e sustentada da rede de urgência, se adotem medidas de aplicação imediata nas Unidades Locais de Saúde, para que estas se adaptem e preparem para os momentos de maior afluência que se anteveem nas próximas semanas.
Assim, ao abrigo do disposto no artigo 1.º, alíneas a) e b) do artigo 2.º, artigo 3.º, n.º 2 do artigo 5.º, artigo 7.º e artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 124/2011, de 29 de dezembro, na sua redação atual, em conjugação com o n.º 2 do artigo 8.º, o n.º 1 do artigo 10.º e a alínea h) do n.º 3 do artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 32/2024, de 10 de maio, que aprova o regime de organização e funcionamento do XXIV Governo Constitucional, e no uso das competências que me foram delegadas pelo Despacho n.º 5884-A/2024, da Ministra da Saúde, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 100, suplemento, de 23 de maio, determino o seguinte:
1 – As Unidades Locais de Saúde (ULS) integradas no Serviço Nacional de Saúde deverão, com a colaboração de todas as unidades funcionais e respetivos médicos de medicina geral e familiar das repetitivas unidades, criar vagas adicionais para atendimento de utentes com doença aguda, mediante consulta não programada, e elaborar uma matriz de resposta à doença aguda, que atenda às especificidades da população servida e disponível para agendamento através da linha SNS24.
2 – A matriz de resposta referida no número anterior deve observar os seguintes pressupostos:
a) A criação de vagas em todas as agendas, nos períodos da manhã e da tarde;
b) A existência de um serviço de atendimento de consulta em regime aberto, sempre que possível, em todos os concelhos, que funcione aos dias de feriados e fins de semana, no período entre as 8 horas e as 20 horas;
c) A possibilidade de estender o funcionamento do serviço anterior, ao período após a 20 horas e até às 24 horas, nos dias úteis, em função da ativação do plano de contingência local;
d) A abertura, sempre que necessário, de um Centro de Atendimento Clínico, no modelo que a ULS entender mais conveniente (próprio/social/autárquico/privado), de forma a responder à observação de situações agudas não urgentes no próprio dia.
3 – Adicionalmente, as ULS deverão aumentar o número de atendimentos para casos de doença aguda não urgente, criando uma resposta local que permita, por referenciação dos cuidados de saúde primários ou hospitalares, a absorção de doentes com necessidade de contacto médico com especialista da área hospitalar em situação aguda, no espaço de 24 a 48 horas, mas que não necessita de observação em serviço de urgência externa.
4 – O disposto nos números anteriores não pode comprometer o funcionamento do serviço de urgência externa.
5 – A matriz de resposta referida no número anterior deve prever, pelo menos, os seguintes aspetos:
a) Disponibilização de consulta de doença crónica agudizada por área de especialidade, tendo em conta o histórico de procura, sendo que a referenciação direta deve ser feita a partir dos cuidados de saúde primários ou hospitalares, e ou do próprio serviço de urgência externa;
b) Disponibilização do Hospital de Dia para acesso de utentes em descompensação de patologias específicas, com acesso preferencial e organizado, nomeadamente em situações de insuficiência cardíaca, doença pulmonar obstrutiva crónica, asma, cirrose, entre outras;
c) Nas situações previstas na alínea anterior, após o episódio, os Hospitais de Dia devem disponibilizar contactos diretos aos doentes para eventuais situações de descompensação;
d) Implementação de clínica de diagnóstico rápido, evitando o recurso ao serviço de urgência externa por parte de doentes com alterações clínicas, sem disfunção de órgão(s) que necessitam de estudo rápido, como são exemplos as situações de anemia e neoplasia oculta, entre outras.
6 – A prestação de cuidados médicos de urgência ou emergência deve ser considerada prioritária pelas ULS em relação a situações estáveis, devendo os Conselhos de Administração das ULS garantir que estão reunidas as condições que garantam o funcionamento do serviço de urgência externa, utilizando todos os recursos disponíveis.
7 – Para os efeitos previstos no número anterior, as ULS devem assegurar que:
a) A escala de urgência externa tem precedência organizativa sobre a atividade programada com prioridade normal;
b) O gozo de férias ou outras situações de ausência programada não deve prejudicar, conforme determinado no Despacho n.º 11173-A/2024, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 184, suplemento, de 23 de setembro, a elaboração das escalas de urgência externa;
c) A organização interna da equipa assegura que a existência de um número de elementos inferior ao da equipa-tipo não desvia recursos para a urgência interna, mas assegura prioritariamente atendimento em serviço de urgência externa;
d) No caso das especialidades cirúrgicas, a observação no serviço de urgência externa é prioritária, sendo apenas transferidos para outra unidade hospitalar os doentes que necessitem de intervenção cirúrgica emergente;
e) A transferência hospitalar, referida na alínea anterior, deverá ser em primeira linha para as unidades de proximidade e/ou complementaridade.
8 – As ULS devem garantir uma adequada articulação do serviço de urgência externa com a emergência pré-hospitalar, uma vez que esta constitui uma extensão da rede de urgência na comunidade e a sua permanente operacionalidade é fundamental para uma resposta rápida e atempada. Assim, determina-se que:
a) As equipas pré-hospitalares devem ser libertadas ao nível da triagem, exceto em situações clínicas específicas de emergência, como por exemplo, entrega de doente crítico em sala de emergência ou, no caso de via verde de acidente vascular cerebral, em unidade de TAC;
b) O serviço de urgência externa dispõe de macas em número suficiente para garantir o handover imediato das equipas pré-hospitalares, tendo em conta o histórico de necessidades;
c) A aquisição de macas pelas ULS, em caso de necessidade, deve considerar quer os doentes em serviço de urgência externa, quer os doentes que possam estar a aguardar por internamento em enfermaria.
d) O serviço de urgência externa deve atempadamente identificar necessidades de equipamentos e consumíveis que considere necessários para fazer face a picos de procura (por exemplo, equipamentos de alto fluxo e ventilação não invasiva e equipamentos para abertura de postos de observação/trabalhos adicionais).
9 – As ULS devem gerir as situações em que, apesar do esforço para garantir a escala de serviço de urgência externa, antevejam constrangimentos pontuais. Nessas circunstâncias, importa garantir que:
a) A observação primária no serviço de urgência externa é assegurada antes da transferência de doentes para outras unidades hospitalares;
b) A transferência de doentes só ocorre com indicação inequívoca de tratamento urgente ou emergente ou nível de cuidados não disponível e apenas após observação clínica;
c) O encerramento de valência no serviço de urgência externa só ocorre com autorização prévia da Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde, I. P. (DE-SNS, I. P.), sob proposta do Conselho de Administração da ULS, não sendo suficiente a mera informação ao Instituto Nacional de Emergência Médica, I. P. (INEM, I. P.);
d) Caso venha a ser obtida autorização da DE-SNS, I. P., para encerramento da valência, a mesma deve de imediato ser comunicada ao INEM, I. P., bem como à linha SNS24;
e) Devem as ULS elaborar procedimentos internos que acautelem o disposto nas alíneas anteriores.
10 – Para mitigar o constrangimento relativo à impossibilidade de transferir os doentes com indicação para internamento para o serviço respetivo, determina-se que:
a) As ULS onde se verifique esta impossibilidade devem constituir uma equipa de gestão de camas, garantindo que a mesma é dotada de um regulamento e a sua ação é divulgada por todas as direções de departamento e/ou serviço;
b) As ULS devem celebrar um protocolo, articulado com os outros hospitais da rede, para retorno de doentes ao hospital de origem, após a sua estabilização ou tratamento definitivo;
c) As ULS devem instituir um modelo flexível de gestão de camas (a título de exemplo, médicas versus cirúrgicas) em função da procura;
d) Em caso de aumento da procura de camas médicas, a diminuição da atividade cirúrgica deve estar prevista no plano de contingência;
e) As ULS devem instituir um modelo de governação dos serviços que permita a existência de altas ao fim de semana, sendo que a data de alta previsível deve ser registada no sistema.
11 – Não obstante a gestão otimizada de camas, o período de inverno pode comportar desafios adicionais, devendo as ULS prever a possibilidade de expandir interna ou externamente a respetiva capacidade. Assim, determina-se que:
a) Todas as camas existentes na unidade hospitalar devem estar operacionais, existindo plano de ativação das mesmas com base na procura;
b) A medida plasmada na alínea anterior deve também ter presente os recursos humanos disponíveis, cujo plano de recrutamento deve ser definido pelo Conselho de Administração da ULS;
c) Deve estar prevista a abertura de locais de contingência interna para doentes a aguardar vaga em enfermaria, impedindo assim a concentração de doentes em serviço de urgência externa, em condições sub-ótimas, no que diz respeito à segurança, privacidade e conforto;
d) Devem ser contratualizadas camas no exterior, tendo em conta o histórico de número de doentes internados em serviço de urgência externa, em anos anteriores, de forma a garantir a libertação do serviço de urgência externa para novos doentes;
e) Os doentes com alta clínica, mas que permaneçam na ULS por situação social, devem de imediato ser comunicados ao Instituto da Segurança Social, I. P., tendo esta instituição o dever de garantir enquadramento em instituição adequada com a maior brevidade;
f) Sem prejuízo do disposto no número anterior, sempre que, no momento da admissão ou em momento posterior, se anteveja a possibilidade de vir a ocorrer um risco de permanência, apesar da alta clínica, devido a situação social, deve ser notificado, de imediato, o Instituto da Segurança Social, I. P.
g) As equipas médicas dos internamentos devem ser responsáveis pelos doentes internados a aguardar vaga no serviço de urgência externa ou em espaços de contingência;
h) As equipas complementares dos restantes serviços (enfermeiros, técnicos auxiliares de saúde e outros) devem ser organizadas de forma a privilegiar a manutenção da capacidade das equipas do serviço de urgência externa;
i) Do ponto de vista administrativo, os doentes que se encontram no serviço de urgência externa devem ser contabilizados para efeitos dos indicadores de contratualização, como integrados nos serviços de internamento.
12 – Tendo em vista acompanhar a situação em cada uma das ULS, os respetivos Conselhos de Administração devem remeter à DE-SNS, I. P., até ao dia 8 de cada mês, informação sobre o ponto de situação das medidas a adotar nos termos do presente despacho, referente ao mês imediatamente a seguir.
13 – Na sequência da informação obtida nos termos do número anterior, a DE-SNS, I. P., apresenta ao membro do governo responsável pela área da saúde, até ao dia 20 seguinte de cada mês, um relatório com a sua apreciação da situação e, sendo o caso, proposta de medidas corretivas a adotar.
14 – O presente despacho entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
28 de novembro de 2024. – A Secretária de Estado da Saúde, Ana Margarida Pinheiro Povo.»