Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e Biodiversidade 2030


«Resolução do Conselho de Ministros n.º 55/2018

Portugal é reconhecidamente um país rico em património natural, detentor de espécies de flora e de fauna associadas a uma grande variedade de ecossistemas, habitats e paisagens, e integra uma diversidade e riqueza muito relevantes deste património no continente europeu, nos territórios insulares macaronésios, nos ambientes costeiros e litorais e nas profundidades oceânicas do nordeste Atlântico.

A Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e Biodiversidade para 2030 (ENCNB 2030) assenta no reconhecimento de que o património natural português concorre decisivamente para a afirmação do país internacionalmente e, deste modo, contribui para a concretização de um modelo de desenvolvimento assente na valorização do seu território e dos seus valores naturais. Neste mesmo sentido, o Programa do XXI Governo Constitucional estabelece que Portugal se deve posicionar na vanguarda da valorização económica da biodiversidade e dos serviços dos ecossistemas, encarando-os como ativos estratégicos essenciais para a coesão territorial, social e intergeracional.

Com efeito, o paradigma atual da política ambiental nacional, fundado na valorização do território, na descarbonização da economia e na promoção da economia circular, tem no seu centro as questões do emprego, que se quer mais qualificado, da geração de riqueza, que se exige mais sustentável, e do aumento do bem-estar, que se deseja partilhado por todos. Esta ideia de partilha dos benefícios gerados pelos recursos naturais e de participação na sua salvaguarda é reforçada na ENCNB 2030, assumindo a mais-valia de uma política de proximidade, bem como a transversalidade das problemáticas que se colocam nos domínios da biodiversidade, da conservação da natureza, da agricultura, da floresta, do mar e do turismo de natureza, que exigem uma abordagem integrada, convergente e colaborativa destes diferentes sectores de atividade e das entidades governativas competentes.

Num quadro de ação adequado à salvaguarda dos valores naturais com base na matriz de uso e ocupação atual do solo, dá-se particular atenção às áreas classificadas, cuja valorização se promove através da elaboração de instrumentos de ordenamento claros e objetivos, bem como de planos de ação partilhados e integrados em modelos de cogestão que permitam conciliar a dinamização desses territórios com a conservação da natureza e da biodiversidade.

A importância de estancar a perda de biodiversidade para a valorização do território é claramente expressa no Programa do XXI Governo Constitucional e assume especial relevo no contexto das alterações climáticas, devendo prosseguir-se objetivos de sustentabilidade na utilização e afetação dos recursos biológicos e geológicos, através da minimização dos impactes e da valoração dos serviços dos ecossistemas em toda a cadeia produtiva, na perspetiva de uma economia mais circular para a manutenção e promoção da diversidade biológica.

Tendo em consideração os compromissos assumidos no âmbito da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, nomeadamente no que respeita aos objetivos e metas de implementação, o Plano Estratégico da Convenção sobre a Diversidade Biológica e a Estratégia da União Europeia para a Biodiversidade, procura-se ainda consolidar um documento capaz de servir de referencial em relação aos desafios que se impõem à República Portuguesa para o período pós-2020, no contexto de seu enquadramento geopolítico.

Numa lógica de continuidade, reinterpretam-se os princípios adotados na Resolução do Conselho de Ministros n.º 152/2001, de 11 de outubro, à luz do contexto atual, pondo agora em evidência três vértices estratégicos:

i) Melhorar o estado de conservação do património natural;

ii) Promover o reconhecimento do valor do património natural; e

iii) Fomentar a apropriação dos valores naturais e da biodiversidade pela sociedade.

Assim, prossegue-se uma visão de longo prazo que alicerça a melhoria do estado de conservação do património natural na progressiva apropriação do desígnio da biodiversidade pela sociedade, por via do reconhecimento do seu valor para o desenvolvimento do país e na prossecução de modelos de gestão mais próximos de quem está no território.

Com esta ambição, a ENCNB 2030 sistematiza objetivos ordenados por prioridades a prosseguir até 2030, que se desdobram num conjunto de medidas de concretização, para as quais se definem indicadores, prioridades, prazos, meios de verificação, instrumentos e responsabilidades, num quadro de atuação em que o despovoamento dos territórios surge como importante ameaça à biodiversidade, a par da alteração dos sistemas naturais, exponenciada pelas alterações climáticas e pela proliferação de espécies exóticas invasoras. Identificam-se, ainda, as linhas de financiamento existentes e o modelo de financiamento da ENCNB 2030, baseado num plano geral de mobilização de investimento e despesa, que consiste no Plano de Ação para a Conservação da Natureza e da Biodiversidade XXI.

É criado um fórum intersectorial para acompanhar e avaliar a implementação dessas medidas de concretização, envolvendo diversas entidades públicas com responsabilidades diretas no âmbito da conservação da natureza e biodiversidade, bem como da ciência e de tecnologia, sem prescindir da participação das autarquias locais e das regiões autónomas. Por sua vez, o envolvimento da sociedade civil fica desde já assegurado, sem prejuízo de outras formas a desenvolver, com a sua participação em sede de consulta pública, a qual será promovida em relação aos relatórios de avaliação intercalar e final da implementação da ENCNB 2030.

Do processo de participação pública promovido no âmbito da elaboração da ENCNB 2030, que envolveu, durante o ano de 2017, para além da realização de consulta pública, um conjunto de cinco sessões de apresentação em diversas localidades do país, foram tomados em consideração os contributos recebidos. Foram emitidos pareceres pelo Conselho Consultivo do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, I. P., e pelo Conselho Nacional de Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável, nos termos, respetivamente, do n.º 7 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 135/2012, de 29 de junho, e do n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 221/97, de 20 de agosto, nas suas redações atuais.

Assim:

Nos termos da alínea g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve:

1 – Aprovar a Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e Biodiversidade 2030 (ENCNB 2030), anexa à presente resolução e que dela faz parte integrante.

2 – Determinar a elaboração, pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, I. P. (ICNF, I. P.), do Plano de Ação para a Conservação da Natureza e Biodiversidade XXI que identifica as fontes de financiamento e os recursos financeiros necessários para a implementação da ENCNB 2030.

3 – Determinar a elaboração, pelo ICNF, I. P., de um relatório de avaliação intercalar e de um relatório de avaliação final da implementação da ENCNB 2030, os quais devem ser:

a) Sujeitos a consulta pública, por prazo não inferior a 30 dias, e a parecer do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável;

b) Compostos por propostas e recomendações de medidas a adotar, a rever ou a incrementar para a concretização dos objetivos da Estratégia, incluindo a revisão de instrumentos de planeamento estratégico sectoriais ou a elaboração de planos de ação adicionais, quando necessário;

c) Apresentados até aos dias 31 de julho de 2023 e 31 de julho de 2031, respetivamente, ao fórum intersectorial referido no número seguinte.

4 – Determinar a criação de um fórum intersectorial para a ENCNB 2030, com a missão de:

a) Fomentar a cooperação institucional na implementação da ENCNB 2030;

b) Promover o envolvimento e a concertação de propostas das diferentes áreas governativas, visando a integração e a concretização da ENCNB 2030 de forma adequada, nos diferentes planos, programas e políticas sectoriais;

c) Participar na elaboração do Plano de Ação para a Conservação da Natureza e Biodiversidade XXI, com a colaboração do ICNF, I. P., que identifica as fontes de financiamento e os recursos financeiros necessários para a implementação da ENCNB 2030, bem como proceder à respetiva validação e ao acompanhamento da sua execução;

d) Proceder à avaliação da implementação da ENCNB 2030 e dos resultados alcançados que contribuam para a execução das medidas de concretização definidas, através da adoção dos relatórios referidos no número anterior e respetiva apresentação ao membro do Governo responsável pela área do ambiente;

e) Promover a articulação com os serviços competentes do Ministério dos Negócios Estrangeiros, em sede de representação nas instâncias internacionais e europeias, no âmbito da conservação da natureza e biodiversidade.

5 – Estabelecer que o fórum intersectorial aprova o seu regime de funcionamento para o período de vigência da ENCNB 2030 e é constituído por um representante designado por cada uma das seguintes entidades:

a) ICNF, I. P., na qualidade de autoridade nacional para a conservação da natureza e biodiversidade, que coordena;

b) Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I. P.;

c) Turismo de Portugal, I. P.;

d) Agência Portuguesa do Ambiente, I. P.;

e) Gabinete de Planeamento, Políticas e Administração Geral;

f) Direção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos;

g) Direção-Geral da Autoridade Marítima;

h) Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais, I. P.;

i) Uma individualidade de reconhecido mérito no âmbito da conservação da natureza e biodiversidade, designada pelo membro do Governo responsável pela área do ambiente;

j) Uma individualidade de reconhecido mérito no âmbito da conservação da natureza e biodiversidade, designada pela Associação Nacional de Municípios Portugueses;

k) Outras entidades públicas ou privadas que devam ser convidadas, atentas as respetivas competências, em função das matérias em discussão;

6 – Podem ainda ser convidadas outras entidades, sempre que justificado em função das matérias em discussão.

7 – Prever que os governos das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira podem, querendo, fazer-se representar no fórum referido no número anterior.

8 – Determinar que o apoio técnico e logístico ao fórum intersectorial é prestado pelo ICNF, I. P.

9 – Revogar as Resoluções do Conselho de Ministros n.os 41/99, de 17 de maio, e 152/2001, de 11 de outubro.

10 – Estabelecer que a presente resolução entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Presidência do Conselho de Ministros, 5 de abril de 2018. – O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa.

ANEXO

(a que se refere o n.º 1)

Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e Biodiversidade 2030

Introdução

A Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e Biodiversidade 2030 (ENCNB 2030) é um instrumento fundamental da prossecução da política de ambiente e de resposta às responsabilidades nacionais e internacionais de reduzir a perda de biodiversidade.

A avaliação realizada à escala regional e global evidencia, de modo crescente, que a prosperidade económica e o bem-estar da sociedade são suportados pelo capital natural, o que inclui os ecossistemas e os seus serviços, cuja funcionalidade depende, em larga escala, da utilização sustentável e eficiente dos recursos naturais. Neste contexto, a conservação da natureza e da biodiversidade assume-se como um fator de competitividade e de valorização das atividades económicas e como motor de desenvolvimento local e regional, sendo imprescindível a sua integração nas políticas sectoriais relevantes.

É esta a aposta que se quer agora reforçar com o apuramento da ENCNB adotada em 2001, em linha com uma economia que se pretende progressivamente mais circular e mais eficiente em termos de consumo e uso dos recursos, baseada nas possibilidades endógenas do país e, em especial, no conhecimento, na capacitação e na mobilização do nosso capital natural.

Este documento foi produzido tendo por base as recomendações do Relatório Nacional de Avaliação da Execução da ENCNB produzido em 2009, os compromissos nacionais estabelecidos sucessivamente por Portugal nos diversos palcos – bilateral, União Europeia (UE), Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) e Nações Unidas -, em matéria de política de biodiversidade e conservação da natureza, o quadro macroeconómico e financeiro do país na próxima década e as grandes apostas políticas nacionais no sentido de reforçar a centralidade da política de ambiente e no próprio processo de desenvolvimento do país.

Em termos estruturais, a ENCNB 2030 é composta por seis capítulos.

No primeiro capítulo encontra-se uma leitura atual sobre o país, a sua biodiversidade e o seu capital natural; no segundo apresenta-se um diagnóstico e a situação de referência do património natural português; e no terceiro enuncia-se a ambição e a visão para a conservação da natureza e da biodiversidade. A componente estratégica é desenvolvida no capítulo quarto e as componentes operacionais estão contidas nos capítulos cinco e seis, onde são apresentados, respetivamente, os financiamentos e os recursos, bem como a governação e o acompanhamento da implementação da Estratégia.

1 – Portugal, Biodiversidade e Capital Natural Uma Leitura Atual

1.1 – Portugal é um país rico em biodiversidade

Portugal possui, quando comparado com outros países europeus, uma grande diversidade de paisagens, património geológico, e biodiversidade (espécies, habitats, ecossistemas), destacando-se dentro desta um elevado número de endemismos e de espécies relíquia do ponto de vista biogeográfico e/ou genético.

Esta situação privilegiada é consequência da sua localização e contexto biogeográfico e das suas condicionantes geofísicas, para ela contribuindo também a singularidade dos territórios insulares, situados no Oceano Atlântico e inseridos na região macaronésia, e a extensa superfície e a diversidade de ecossistemas marinhos, coluna de água e leitos oceânicos profundos do espaço marítimo, sob jurisdição nacional.

Portugal é reconhecidamente um país rico no que toca ao seu património natural, terrestre e marinho. Esta é uma afirmação indiscutível a nível mundial e sobretudo a nível europeu. Atente-se que Portugal:

. É o 10.º classificado na UE-28 em percentagem de área integrada na Rede Natura 2000 (a Eslovénia é o 1.º país desta lista com cerca de 38 % da sua superfície classificada e a Dinamarca o país com menor área, com cerca de 8 %).

. Apresenta cerca de 22 % da sua área territorial terrestre integrada na Rede Natura 2000 (média UE-28: 18 % Espanha: 27 %).

. Possui cerca de 16 000 km2 (equivalente a cerca de 18 % do território continental) que estão classificados como Sítio de Importância Comunitária (Diretiva Habitats) e cerca de 9 % do território continental delimitado como Zona de Proteção Especial (Diretiva Aves). A este valor acrescerão as áreas marinhas de especial valor para a conservação da natureza, que, no futuro, representarão cerca de 23 000 km2.

. Apresenta 320 geossítios identificados e classificados, de valor científico de relevância nacional e internacional, bem como quatro Geoparques Mundiais da UNESCO, o que revela a sua riqueza em termos de património geológico.

Segundo dados da União Internacional da Conservação da Natureza (International Union for the Conservation of Nature/IUCN), em Portugal encontram representação 35 000 espécies de animais e plantas, ou seja, 22 % da totalidade de espécies descritas na Europa e 2 % das do mundo, o que dá bem a ideia da variabilidade existente. A título de exemplo, refira-se que Espanha possui uma área cinco vezes maior que Portugal Continental e apresenta 54 % das espécies da Europa e 5 % do mundo.

Estes números ilustram bem a riqueza do país, em matéria de biodiversidade, designadamente quando se toma em conta a sua dimensão a nível europeu e a quantidade de espécies que se encontram no seu território, muito devido à sua localização geográfica, na bacia mediterrânica fronteira ao Atlântico.

Os valores naturais em presença no território português implicam a correspondente responsabilidade pela manutenção ou recuperação do adequado estado de conservação de habitats e espécies, quer para os valores endémicos (das 5894 espécies acompanhadas pela IUCN, 22 % estão em Portugal e 15 % destas têm um estatuto de ameaçadas), quer para espécies migratórias de aves e animais marinhos que fazem uso das condições oferecidas pelo país nas suas rotas, bem como pela conservação dos geossítios.

Pese embora se tenha atingido um estágio consolidado das áreas que melhor representam o património natural português, designadamente espécies e habitats, subsiste por dar o derradeiro passo na consolidação dos Sítios de Importância Comunitária (SIC) em área marinha.

Há também a necessidade de assegurar que o património geológico português esteja salvaguardado pelos necessários instrumentos de proteção e gestão territorial.

Este manancial complexo de elevada bio e geodiversidade suporta um conjunto de serviços dos ecossistemas, reais ou potenciais, mas ainda insuficientemente (re)conhecidos, avaliados e contabilizados, os quais, no seu conjunto, agregam o capital natural do país. Num território profundamente moldado pela presença e pela atividade humana desde há séculos, todo este capital natural está intimamente ajustado a um vasto e ancestral património histórico e cultural, constituindo um fator diferenciador e valorizador incontornável do território nacional e, por essa via, de afirmação de identidade e soberania a nível europeu e mundial.

É neste contexto, associado a um território e a uma estrutura fundiária predominantemente detida por proprietários, produtores e gestores privados, designadamente o que abrange o Sistema Nacional de Áreas Classificadas (SNAC), que deverá ser prosseguido o desafio da meta de estancar a perda da biodiversidade nacional, aprofundando a sua conservação e utilização sustentável e promovendo a respetiva valorização, apropriação e reconhecimento por todos os agentes e pela sociedade. Neste âmbito, deverá dar-se enfoque aos benefícios que decorrem dos serviços fornecidos por ecossistemas saudáveis, nomeadamente para a natureza, as pessoas e a economia.

1.2 – O património natural é um ativo estratégico do país

A plataforma Intergovernmental Science-Policy Platform on Biodiversity and Ecosystem Services vem realçar a importância de proteger a biodiversidade e de conter os processos que vêm conduzindo à sua perda, aliás como é recomendado na revisão da Convenção para a Diversidade Biológica, em 2011.

Efetivamente, há muito que se superou o paradigma puramente ‘conservacionista’ em que a proteção se exercia pela negativa, pela proibição de usos e pela ocultação dos valores. Embora esse percurso muito tenha contribuído para a conservação e manutenção das características distintivas de cada uma das áreas protegidas e dos seus valores, também contribuiu para a sua «neutralização», não as incorporando no processo de desenvolvimento.

Hoje em dia, a biodiversidade e a conservação da natureza têm que ser encaradas como uma oportunidade ou uma solução para determinados territórios, desempenhando um papel crucial, designadamente no contexto dos processos de adaptação às alterações climáticas, ao mesmo tempo que as áreas protegidas são hoje entendidas como ativos estratégicos em que, em maior ou menor grau, a presença das atividades humanas é essencial para manter os valores que as caraterizam.

A gestão das atividades humanas é parte essencial dos equilíbrios naturais. Se não há pessoas, não há quem cuide, se não há atividade, não há quem aproveite os recursos e valores deste património e contenha os processos de perda de biodiversidade, cada vez mais ameaçada pelos processos que decorrem das alterações climáticas. Curiosamente, o inverso leva a idênticos resultados: se há muitas pessoas ou sobreutilização e se não existe uma adequada gestão da visitação, não há quem aproveite verdadeiramente os valores e os recursos deste património, acelerando os processos de perda de biodiversidade.

Em conjunto, é preciso criar condições de equilíbrio: para fixar as pessoas e controlar a pressão humana, para promover e gerir a visitação e a fruição das áreas naturais, dinamizando modelos de desenvolvimento económico adequados aos valores existentes que valorizem os serviços de ecossistemas.

Este equilíbrio deverá ser atingido através de uma discriminação positiva, de implementação de projetos que assentem nos recursos locais únicos e irrepetíveis e que lhes acrescentem valor.

Hoje é reconhecido que as principais ameaças ambientais que se colocam na atualidade prendem-se com os processos das alterações climáticas e a perda de biodiversidade, pelo que se impõe uma ação articulada e mais orientada para a realidade objetiva das espécies, dos habitats e da ação do próprio homem naquilo em que cria relações simbióticas com a natureza.

Paralelamente, a preservação e a promoção dos bens e valores da biodiversidade e da conservação da natureza, marcados pela índole do seu interesse público, geram condicionantes e custos adicionais para as populações residentes que o Estado atenua através da atribuição de determinados benefícios – benefícios que, em primeira mão, se traduzem em investimento público diretamente aplicado, mas também, e cada vez mais, na procura das externalidades positivas que será possível produzir, com o envolvimento de outros agentes e parceiros. Estão em causa parceiros como os municípios, as organizações não-governamentais (ONG), as universidades e politécnicos, bem como as associações profissionais e representativas dos sectores económicos, entre outros.

O reconhecimento do carácter inamovível dos valores e recursos, o incremento do conhecimento científico e técnico, a divulgação dos valores existentes e a sua apropriação por parte dos cidadãos abrem o caminho para um novo posicionamento neste domínio.

Assim, assumir as áreas protegidas e classificadas como ativos estratégicos do território constitui um dos vetores fundamentais da política de conservação da natureza e biodiversidade a prosseguir.

Torna-se, por isso, um objetivo premente alterar a perceção negativa que é usualmente tida destas áreas que contribuem para um desenvolvimento sustentável e duradouro da «nossa casa comum», designadamente através das funções de sequestro do carbono, da manutenção da biodiversidade, da valorização do território e da paisagem, do aproveitamento dos recursos endógenos.

A consideração da diversidade biológica, enquanto ativo estratégico, revela então uma múltipla função: por um lado, a de proteção dos seus valores intrínsecos e, por outro, a da sua valoração social e económica.

Esta valoração é possível através da mobilização dos fatores de produção que se concentram nas áreas mais representativas para a conservação da natureza e biodiversidade e que não estão a ser devidamente aproveitados, assim como da sua incorporação nas cadeias de valor dos produtos e das atividades: as pessoas e as atividades que desenvolvem, os recursos únicos e emblemáticos, a paisagem, a cultura e os «saber fazer», as infraestruturas e os equipamentos. Em suma, a valoração que decorre dos benefícios resultantes da atividade económica que estes bens são capazes de gerar.

1.3 – Portugal confronta-se com um grande desafio: apropriar e conhecer para gerir melhor

Estas vastas áreas do território nacional e, muito em particular, a Rede Nacional de Áreas Protegidas (RNAP) são uma realidade incontornável que deve ter «destaque no mapa». Reúnem, no seu conjunto, um património nacional do qual o país se deve apropriar e colocar ao serviço das pessoas e da sua economia, conscientes de que tal património é um fator distintivo do país, como o são a sua cultura e paz social, contribuindo também para a sua projeção no panorama internacional.

Sendo Portugal, reconhecidamente, um país rico no que toca ao seu património natural, terrestre e marinho e porque se pretende projetar o património natural como um ativo estratégico do país são três os vetores a adotar na política de conservação da natureza e biodiversidade, nas próximas décadas:

1.3.1 – A apropriação das áreas classificadas pelas pessoas e a gestão de proximidade

As áreas classificadas são manifestações singulares dos valores e recursos que têm sofrido abandono que afeta vastas áreas rurais, levando à alteração de equilíbrios naturais que se julgavam perenes e autossustentados per se.

É conhecida a regressão populacional que o país tem vindo a sofrer, com particular impacte nas regiões de montanha e de fronteira, onde coincidentemente se localizam boa parte das áreas protegidas. A regressão demográfica nos territórios de menor densidade afeta também as áreas protegidas que vêm perdendo pessoas – um dos recursos determinantes para a sua conservação. Com efeito, os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) revelam que a regressão de população nos territórios de baixa densidade onde existem áreas protegidas esteve em linha com os demais, situando-se em média nos 10 % entre o período de 2001 e 2011. Todavia, no interior das áreas protegidas essa regressão foi de quase 20 %.

As pessoas e as atividades que desenvolvem são um elemento distintivo de cada ecossistema, assegurando, quando em harmonia, os equilíbrios simbióticos que se construíram ao longo dos tempos. São ainda manifestações singulares de uma realidade social e cultural e são o sinal da vitalidade de cada região. Também quem procura a fruição de áreas naturais parte ao encontro dessa realidade integral que resulta da convivência harmoniosa entre as atividades humanas e a natureza.

O despovoamento é uma tendência pesada, pelo que é necessário continuar na procura de soluções que permitam o acesso aos bens e serviços de que as pessoas dependem, sobretudo ao trabalho. Há que encontrar alternativas de desenvolvimento que considerem as mais-valias das amenidades ambientais e a salvaguarda do património natural.

Os resultados obtidos pelo Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), ao longo dos anos, evidenciam um aumento consistente do número total de visitantes nas áreas protegidas. Em 2014, esse total ascendeu aos 215 327 visitantes, em 2015 aos 296 799 e em 2016 atingiram-se as 341 747 visitas. Note-se que, pela dificuldade de apuramento do número de visitantes nas áreas protegidas, estes resultados são realizados de forma sistemática, envolvendo a contabilização dos visitantes a estruturas de receção do ICNF, os visitantes em visitas guiadas, os participantes em diversos eventos – quer os organizados por terceiros e autorizados pelo ICNF ou em parceria com o ICNF, quer apenas os organizados pelo ICNF – e os participantes em ações de voluntariado. Estes números evidenciam o crescimento acelerado da procura destas áreas e o valor acrescentado dos bens e serviços que têm génese nas áreas protegidas.

Importa fazer uso das oportunidades existentes, realçando-se a crescente sensibilidade geral para o ambiente, acompanhado da progressiva notoriedade internacional dos valores naturais e biodiversidade do país que deve ser potenciada, alavancando instrumentos como o Natural.PT, que promove as áreas protegidas e contribui para projetar os produtos e serviços regionais produzidos nessas áreas.

Interessa também reforçar os sinais da presença do próprio Estado nos territórios por ele administrados, evitando ser associado ao sentimento de abandono, ao mesmo tempo que é preciso uma atitude vigilante, orientada para a defesa dos valores, mas também para a sua promoção e valorização.

Complementarmente, é importante levar mais além este propósito, tornando mais próxima a gestão das áreas protegidas daqueles que estão no território, permitindo uma melhor leitura dos seus desafios e adaptabilidade das soluções.

Efetivamente, a gestão das áreas protegidas abrange dimensões relevantes no domínio ambiental, económico e social, que se complementam e que carecem de uma gestão articulada e orientada para o propósito da sua valorização e aproveitamento.

Na prossecução da política ambiental, as áreas protegidas constituem a infraestrutura indispensável para a concretização dos propósitos da conservação da natureza, tendo o ICNF, enquanto autoridade nacional para a conservação da natureza e biodiversidade, a missão de assegurar o cumprimento das obrigações internacionais e nacionais neste domínio, a salvaguarda da RNAP, através do seu planeamento integrado e articulado, assim como a concretização dos objetivos transversais no domínio das ações de conservação ativa e de monitorização de espécies e habitats.

A determinação de valorizar a RNAP, como uma rede coerente e consistente, não pode esquecer que a gestão particular de cada área protegida encerra especificidades próprias decorrentes dos seus valores naturais, mas também socioculturais e económicos, para as quais as entidades que estão no território detêm, reconhecidamente, uma capacidade de mobilização e interação que a proximidade e conhecimento do território lhes confere.

Nesse sentido, os municípios são as entidades que melhor agregam as expectativas e oportunidades locais, pelo que, com a permanência com que interagem com os territórios sob sua jurisdição, constituem-se como parceiros essenciais para a gestão de proximidade e a dinamização das valências socioculturais e económicas que concorram para a valorização das áreas protegidas.

Ao mesmo tempo, há manifestações várias da vontade das autarquias em desempenhar um papel mais interventivo na gestão dos territórios que lhe estão confiados, incluindo aqueles que estão integrados em áreas protegidas. Mas há, sobretudo, uma nova cultura que reconhece os valores em que assenta a conservação da natureza e que reconhece o retorno social e económico de uma gestão que os acautele e mobilize.

Pretende-se instituir uma dinâmica de gestão de proximidade, em que as diferentes entidades colocam ao serviço das áreas protegidas o que de melhor têm para oferecer no quadro das suas competências e atribuições, pelo que se adotará, de forma progressiva, um modelo de gestão participativo, colaborativo e articulado em cada uma destas áreas, juntando neste desiderato a autoridade nacional para a conservação da natureza e biodiversidade, os municípios e quem, pelo conhecimento técnico-científico aplicado nestas áreas, possa contribuir para este fim.

A riqueza do país em matéria de biodiversidade, bem como a responsabilidade pela manutenção do adequado estado de conservação dos habitats e espécies constituem um desafio imenso que se coloca ao Estado Português, mas também às autarquias, às empresas, às Organizações Não Governamentais de Ambiente (ONGA), aos investigadores, em suma, a todos os cidadãos.

Foi formulado um protótipo para uma nova gestão das áreas protegidas da Rede Nacional através do Projeto Piloto para a Gestão Colaborativa do Parque Natural do Tejo Internacional, envolvendo os três municípios que aí têm território, o ICNF, a Quercus, o Instituto Politécnico de Castelo Branco e a Associação Empresarial de Castelo Branco.

Um ano após o início deste projeto serão avaliados os seus resultados, havendo um elevado grau de confiança que a nova forma de gestão, colaborativa, participativa e de maior proximidade poderá ser aplicada a outras áreas protegidas, com as alterações legislativas que for necessário realizar.

Estão em causa 8 % do território continental que reúne o conjunto mais representativo dos valores do património natural e paisagístico.

É imperioso mobilizar estes ativos, onde a gestão das atividades humanas é essencial para manter os valores que as caraterizam, com base numa nova cultura que é sensível às questões ambientais, reconhece os valores da conservação da natureza e o retorno social e económico proveniente de um modelo de cogestão.

1.3.2 – O conhecimento

Parte primordial de uma estratégia bem-sucedida para intervir numa dada área advém do domínio do conhecimento que sobre a mesma se possa exercer. Para tornar possível encarar uma realidade e sobre ela atuar, é necessário saber caracterizá-la, determinar o propósito a atingir e, perante as possibilidades e instrumentos disponíveis para sobre ela agir, gizar uma estratégia de ação.

O nível do conhecimento que se detém do património natural fragiliza a tomada de decisão. Portugal possui um quadro de referência na caracterização dos habitats naturais com cerca de 20 anos de idade. Durante este tempo não foram constituídos instrumentos sistémicos e perenes de monitorização, pelo que, salvo algumas exceções, a informação em que hoje o país se sustenta para determinar o «estado atual de conservação dos habitats e espécies» é de base pericial.

Por outro lado, a gestão da RNAP assenta em instrumentos de planeamento com uma média de idades de cerca de 10 anos. Acresce que se verifica um desvio de seis anos na constituição das Zonas Especiais de Conservação (ZEC), que são a consequência da delimitação dos SIC integrados na Rede Natura 2000, sendo que este processo acarreta, necessariamente, a atualização da cartografia de habitats e a identificação do estado de conservação dos habitats.

Em suma, a informação sobre o estado de conservação dos habitats é frágil e os instrumentos de gestão do território carecem de ser, em alguns casos, atualizados.

Em particular, os níveis de conhecimento e de sistematização do conhecimento sobre a biodiversidade marinha e sobre a estrutura, o funcionamento e a expressão espacial dos ecossistemas marinhos, numa área sobre jurisdição nacional muito vasta e abrangendo profundidades oceânicas significativas, exigem um investimento particular que aprofunde os esforços já feitos nos últimos anos no sentido de colmatar as lacunas de conhecimento mais relevantes. Em 2008, numa negociação liderada por Portugal, foram globalmente adotados os critérios dos Açores («Orientação e critérios científicos dos Açores para identificação de áreas marinhas ecológica ou biologicamente significativas e conceção de redes representativas de áreas marinhas protegidas em oceano aberto e mar profundo», Anexos I e II da Decisão IX/20 da CDB) para identificação de EBSA – Áreas Marinhas com Significado Ecológico ou Biológico -, um contributo da Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB) à Assembleia Geral das Nações Unidas para a conservação e utilização sustentável do meio marinho.

Este processo procede à identificação de áreas com valor natural relevante, mas não classifica áreas protegidas, nem impõe às áreas medidas de gestão espacial ou sectorial.

As autoridades nacionais iniciaram o processo de «Identificação e sustentação científica de Áreas Marinhas com Significado Ecológico e Biológico», em território sob jurisdição nacional, tendo já sido submetidas ao Secretariado da CDB as EBSA Madeira Tore e Meteor, estando outras duas áreas em fase de preparação.

Há que tomar diligências que permitam ultrapassar, rapidamente, o défice de informação atualizada, de modo a se proceder a uma avaliação criteriosa de prioridades, uma definição esclarecida de objetivos e metas que se pretendem atingir e a sustentar modelos de gestão assentes em dados de terreno.

Para tal, estão em curso os processos tendentes à elaboração da cartografia dos habitats e dos planos de gestão dos 61 SIC da Rede Natura 2000, abrangendo cerca de 22 % do território e 90 % das áreas protegidas. Com a sua elaboração o país passará a dispor de informação atualizada sobre o estado de conservação dos seus habitats e espécies e a beneficiar dos instrumentos apropriados, pela sua especificidade, para a gestão do seu estado de conservação, permitindo ainda a obtenção do estatuto de ZEC.

Apesar de existir um inventário do património geológico português, não foram tomadas medidas para a sua gestão. É necessário proceder à delimitação detalhada dos geossítios, identificar o respetivo grau de conservação e os geoindicadores que possam ser usados na sua monitorização e ainda definir usos potenciais para garantir a utilização sustentável do património geológico por parte da sociedade.

Ao mesmo tempo, é necessário articular e conjugar os instrumentos de gestão territorial. A desejada articulação tem de ir ao encontro da gestão do território no que ao planeamento municipal diz respeito, assim como da consideração dos planos de gestão dos SIC da Rede Natura 2000, assegurando a cabal salvaguarda e proteção dos valores e recursos nacionais.

Em matéria de ordenamento do território, o modelo que tem sido prosseguido no país tem por base uma progressiva capacitação dos municípios, em nada comparável à existente na década de 90, ao mesmo tempo que, ao nível nacional, se elaboraram os instrumentos de planeamento que estabelecem as diretivas e os regimes normativos em função dos princípios e objetivos que prosseguem.

Lei n.º 31/2014, de 30 de maio, que aprovou as bases gerais da política pública de solos, de ordenamento do território e de urbanismo, determinou que os planos especiais de ordenamento do território fossem reconduzidos a programas, já desprovidos da eficácia plurissubjetiva de que aqueles planos dispõem. No sentido de salvaguardar os recursos e valores que enformam as regras dos planos especiais, mais determinou a obrigatoriedade de proceder à integração do conteúdo dos planos especiais de ordenamento do território nos planos territoriais intermunicipais ou municipais, diretamente vinculativos dos particulares.

A aplicação prática do referido regime jurídico levou à identificação de situações de fronteira que é necessário acautelar, na medida em que há requisitos regulamentares nos referidos planos especiais que estão fora do âmbito material e substantivo dos Planos Diretores Municipais (PDM). São requisitos que se encontram nesta situação por força da sua própria natureza e especificidade ou porque extravasam as fronteiras territoriais do mesmo. A realidade demonstrará que os planos de gestão dos SIC da Rede Natural 2000, que abrangem 90 % das áreas protegidas, se afirmarão como os instrumentos apropriados para a gestão do estado de conservação dos habitats e espécies.

Interessa ainda encontrar mecanismos de monitorização que permitam uma avaliação mais regular do estado de conservação dos valores naturais, ainda que os indicadores possam ser indiretos ou centrados em valores que sejam mais relevantes num quadro global de valores ou mais representativos de um todo.

Pretende-se, com esta abordagem, criar uma dinâmica proativa de gestão da conservação da natureza e da biodiversidade, assente na informação e no conhecimento.

Está em curso a elaboração de todos os Programas Especiais do Parque Nacional e dos Parques Naturais, no total de 14.

Os mesmos serão acompanhados muito proximamente e articulados com os respetivos Conselhos Estratégicos das Áreas Protegidas, que incluem entidades associativas e empresariais dos sectores considerados relevantes no contexto da área protegida em causa. Os Programas Especiais estão a ser elaborados por equipas internas do ICNF e têm um prazo de elaboração de ano e meio.

Este esforço significativo na elaboração de Programas Especiais contém, em si mesmo, dois objetivos principais: dispor de instrumentos de planeamento e programação atualizados para a gestão e salvaguarda de recursos e valores naturais de expressão nacional, assim como assegurar a boa implementação do sistema de gestão territorial aos diversos níveis.

1.3.3 – A articulação de políticas

As áreas classificadas funcionam em rede e com interconexões que têm de ser salvaguardadas. Se é certo que 18 % do território continental está classificado como SIC, percebe-se a relevância da restante área do país para o desígnio da conservação da natureza.

Os SIC não são mais do que áreas onde há uma maior representatividade de valores que se distinguem numa área maior. Percebe-se, então, que a conservação da natureza não se esgota nestas áreas de valor excecional e que entre elas há um efeito de rede, alicerçada em interconexões que têm de ser garantidas.

Por outro lado, as práticas sectoriais na agricultura, nas florestas, no mar e no turismo são essenciais para a conservação da natureza. Os sítios com interesse para a conservação da natureza são áreas onde a prática agrossilvopastoril, florestal, piscatória e turística são uma realidade material e desejável.

Não há políticas de conservação da natureza operativas sem uma integração e efetiva promoção das mesmas nos instrumentos que levam à prática de políticas sectoriais, nomeadamente na agricultura, no mar, no turismo e nas florestas.

Esta integração no sector florestal é, hoje, uma realidade administrativa pelo facto da autoridade nacional florestal e da conservação da natureza e biodiversidade ser partilhada, mas impõe-se uma maior articulação de propósitos, meios e instrumentos para que se alcancem mais e melhores resultados.

A atual Política Comum de Pescas e as metas da UE nesta área impõem objetivos de sustentabilidade reforçados para este sector, cuja concretização carece de uma melhor articulação com a presente Estratégia.

Do mesmo modo, será necessário aprofundar esta articulação relativamente ao espaço marítimo nacional, designadamente ao nível do estudo dos ecossistemas, da definição do «Bom Estado Ambiental» das águas marinhas, a valorização das funções e monitorização dos recursos e da promoção e conservação do ambiente e da biodiversidade marinha.

Os exemplos melhor sucedidos de promoção de políticas de conservação da natureza, porque de longo alcance e estabilidade, encontram a sua explicação na articulação intersectorial e multinível.

Por outro lado, compreende-se hoje que a biodiversidade não é um exclusivo de zonas rurais – a biodiversidade também tem expressão nas áreas urbanas. É cada vez mais reconhecida a importância de uma estrutura ecológica estruturada e interligada, para melhorar a qualidade de vida das cidades e respetivas zonas periurbanas.

A biodiversidade existe num parque nacional, mas também numa parcela agrícola, num prado, numa mata, ou mesmo num pequeno jardim, e cada vez mais os espaços verdes em comunhão com os elementos da paisagem e os habitas, como os rios, as matas e outros mais formais como os jardins, detêm funções urbanas indispensáveis ao bem-estar das pessoas que habitam a cidade, para a qualidade da vivência urbana, contribuindo para melhorar as suas amenidades ambientais e paisagísticas.

Daí que, para além do reforço do papel das áreas protegidas e de estancar os processos de perda de biodiversidade, pretende-se ainda promover iniciativas de conservação da biodiversidade em contexto urbano, em articulação com os municípios, disseminando os espaços de lazer e de usufruto público, recuperando as zonas ribeirinhas e criando novas áreas verdes com funções específicas, que contribuam, simultaneamente, para a qualidade do ar e o sequestro de carbono.

Portanto, hoje sabe-se que há que ser mais flexível e ajustar a formulação dos propósitos e a sua operacionalização a cada realidade.

É nesta realidade transversal que a conservação da natureza se desdobra, ganhando escala e uma ação efetiva, pelo que este é um desafio de articulação essencial.

É aqui que, uma vez mais, a atuação dos municípios, mas também das ONGA e da Academia, bem como a sua apropriação por esta realidade, fundamenta um novo olhar para o papel que as autoridades do território poderão ter no contexto da conservação da natureza.

É necessário tornar efetivas as medidas traduzidas para as políticas de âmbito sectorial.

Os instrumentos de política agrícola, florestal, do mar e do turismo são fundamentais para a concretização de medidas orientadas para a conservação do património natural. O modelo vigente tem ido no sentido dos incentivos a determinadas práticas serem integrados nos respetivos sectores, de modo a haver uma efetiva articulação com os principais eixos de atuação. Reforça-se que este modelo é o correto e a concretização desta expectativa ditará se a sua bondade é real.

Há oportunidades nos apoios ao desenvolvimento rural cuja concretização é essencial, designadamente aquelas que se dirigem à gestão do habitat agrícola. No domínio mais direto da floresta há uma convergência de propósitos que é facilitada pela gestão conjunta com a conservação da natureza. É importante prosseguir com o esforço de articulação de estratégias no domínio da floresta, que é, em si mesmo, um importante vetor para a sustentação e conectividade de ecossistemas.

Na sequência dos incêndios de 2016 que afetaram significativamente o Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG) foi formulado o Plano-Piloto para o PNPG, no âmbito do qual sobressaem dois projetos de manifesto interesse público: a melhoria das comunicações móveis, envolvendo três operadores de telecomunicações, a EDP Distribuição e cinco municípios, permitindo a colocação em funcionamento de seis estações até final de 2017 e as restantes duas até dezembro de 2018; a contratação de 10 equipas para reforçar a ação do Corpo Nacional de Agentes Florestais (CNAF), no total de 50 efetivos, e respetivos equipamentos.

Este Plano-Piloto inclui ainda projetos de restauro das matas nacionais ardidas (Mezio e Ramiscal), de prevenção e proteção de habitats da Mata Nacional do Gerês e ainda a preservação de núcleos únicos de pinheiro-silvestre e de teixiais. As intervenções físicas deste Plano-Piloto rondam uma área de 7000 ha, sendo que 6000 ha afetam muito positivamente habitats naturais de elevado interesse para a conservação da natureza.

O Plano-Piloto do Parque Nacional da Peneda Gerês representa um valor de investimento global de 8,43 M(euro), a executar maioritariamente até 2022, embora haja um investimento residual que se prolonga até 2025. Desta verba, cerca de 5,8 M(euro) encontram financiamento junto do Fundo Ambiental.

Os bons resultados obtidos determinaram a formulação de cinco novos projetos abrangendo o Parque Natural de Montesinho, o Parque Natural Douro Internacional e o Parque Natural Tejo Internacional, assim como a Reserva Natural da Serra da Malcata e o Monumento Natural das Portas de Ródão. Estes projetos prosseguem, na sua essência, os mesmos objetivos: reforçar as equipas de CNAF e apostar na prevenção, restaurar os habitats ardidos atendendo às especificidades de cada um, executar ações diferenciadoras e demonstrativas das boas práticas que devem orientar a intervenção nas áreas sensíveis.

2 – Situação de do PaReferência trimónio Natural

2.1 – Espécies e Habitats

Conhecer a biodiversidade, entendida como o conjunto dos ecossistemas, das várias espécies e da sua composição genética, em resultado da história evolutiva, a começar pelo seu inventário, é uma tarefa que reveste carácter sistemático e continuado.

Apesar de não dizerem respeito à globalidade das espécies da flora e da fauna protegidas, os resultados dos Relatórios Nacionais de Aplicação das Diretivas Habitats (2007-2012) e Aves (2008-2012) espelham, de uma forma razoável, o seu estado geral de conservação, particularmente para a fauna de vertebrados (com exceção para os peixes marinhos) e para a flora vascular. Considera-se igualmente representativa das pressões e ameaças que sobre eles atuam.

No âmbito da elaboração do Relatório Nacional de Aplicação da Diretiva Habitats para o período 2007-2012 (Diretiva 92/43/CEE), foram realizadas avaliações globais ao estado de conservação de 324 espécies: 191 da flora; 133 da fauna – moluscos, artrópodes, peixes, anfíbios, répteis e mamíferos; e 99 habitats naturais e seminaturais. Os resultados obtidos indicam genericamente que os estados de conservação «inadequados» prevalecem sobre os «favoráveis», tanto para espécies como para habitats, em todas as regiões biogeográficas, com exceção dos habitats do Mar da Macaronésia. No Mar Atlântico não foram registados habitats em condição favorável, o mesmo acontecendo às espécies no Mar da Macaronésia. A percentagem de avaliações «desconhecidas» é elevada, em particular para as espécies.

Já as avaliações realizadas à avifauna no âmbito da elaboração do Relatório Nacional de Aplicação da Diretiva Aves para o período 2008-2012, num total de 257 espécies avaliadas, indicam a tendência das populações de espécies nidificantes, sobretudo no que se refere a longo prazo, como a principal lacuna de informação. Nas populações invernantes a tendência predominante é de crescimento (curto prazo) e estabilidade (longo prazo), sendo menos evidente a insuficiência de informação. A tendência do range, avaliada exclusivamente para as nidificantes, é na sua maioria estável (a curto e longo prazo).

Nos Açores, as lacunas de informação para avaliação das tendências são comuns à grande maioria das espécies avaliadas.

Na Madeira, a principal lacuna diz respeito à tendência do range a longo prazo, sendo que, no entanto, na tendência do range a curto prazo predominam tanto a estabilidade como o aumento. Relativamente à tendência da população a longo prazo impera a estabilidade, sendo notória a insuficiência de informação para o curto prazo. A análise da combinação das tendências de curto e longo prazo (tanto para a dimensão da população como para o range), que foi usada como aproximação à avaliação da melhoria ou degradação do estado das populações, não evidencia um número significativo de espécies em situação de deterioração.

No âmbito das avaliações efetuadas ao abrigo das Diretivas Habitats e Aves foram identificadas pressões e ameaças que dão conta de uma tipologia de problemas que, com maior ou menor intensidade, afetam ou podem vir a afetar os valores naturais, de que são exemplos a presença de espécies exóticas invasoras, a artificialização e fragmentação da rede hidrográfica, a destruição e fragmentação de habitat, nomeadamente, pela construção de grandes infraestruturas e transformações do uso do solo, a realização de práticas não sustentáveis de utilização agrícola ou florestal e a perturbação humana. De referir a necessidade de ter em conta as alterações climáticas, cujos riscos e eventuais efeitos começaram a fazer parte da agenda política nacional desde a seca de 2005.

Relativamente à fauna de vertebrados com estatuto de ameaça, foram publicados em Portugal vários Livros Vermelhos, datando a última revisão de 2005 realizada sob coordenação do ICNF.

No conjunto do Continente e dos arquipélagos dos Açores e da Madeira, foram realizadas 553 avaliações, sendo que:

. 46 % classificadas como «Pouco Preocupante LC»;

. 12 % com «Informação Insuficiente DD»;

. 42 % abrangendo as três categorias de ameaça «Criticamente em Perigo CR», «Em Perigo EN» e «Vulnerável VU» e ainda as categorias «Quase Ameaçado NT» e «Regionalmente Extinto RE».

Os resultados mostraram que o grupo mais ameaçado é o dos peixes dulçaquícolas e migradores, nomeadamente em consequência dos cursos de água serem um dos habitats mais intervencionados, através da imposição de barreiras à circulação, modificação das margens e alteração das características físico-químicas e biológicas da água e proliferação de espécies exóticas invasoras, não obstante os investimentos em sistemas de saneamento e de passagens para peixes em açudes e barragens, efetuados há mais de uma década.

Em 2013, foi publicado o Atlas e Livro Vermelho dos Briófitos Ameaçados de Portugal, sob coordenação do Museu Nacional de História Natural e da Ciência. A avaliação do estatuto de ameaça seguiu as orientações IUCN para a aplicação ao nível regional dos critérios e categorias de ameaça e as adaptações para a Europa, de acordo com os conceitos propostos por Hallingbäck et al. (1995), por Sérgio et al. (2007) e por Garilleti & Albertos (2012).

Em Portugal continental foram avaliados 704 taxa, dos quais:

. 1,7 % foram considerados «Regionalmente Extintos – RE»;

. 28,4 % ameaçados;

. 6 % «Criticamente em Perigo – CR»;

. 11,3 % «Em Perigo – EN»;

. 11,1 % «Vulnerável – VU».

As principais ameaças sobre os briófitos estão associadas a práticas de silvicultura não sustentável, incluindo o recurso a espécies não nativas, a alterações de práticas, o abandono agrícola e os fogos florestais. A expansão urbana e infraestruturas rodoviárias, a drenagem, as alterações do ciclo hidrológico e as espécies invasoras são também indicadas como importantes ameaças.

Na Madeira, embora não tenham sido elaborados Listas ou Livros Vermelhos, analisaram-se os três grupos terrestres com maior preponderância na biodiversidade local – plantas (Pteridófitas e Espermatófitas), moluscos terrestres e artrópodes, os quais representam 95 % da biodiversidade terrestre endémica deste arquipélago.

Nos Açores, com a adaptação do Regime Jurídico de Conservação da Natureza e da Biodiversidade (RJ CNB), foi criado um mecanismo permanente de avaliação do estado de conservação de diversos taxa existentes em estado natural no território do arquipélago, recorrendo a metodologias padronizadas e seguindo os critérios fixados pela IUCN (Species Survival Comission).

As espécies sujeitas a exploração merecem também uma referência.

Efetivamente, nas águas interiores, particularmente em áreas de ocorrência de espécies com estatuto de proteção relevante ou elevado valor comercial ou desportivo, foram criadas Zonas de Proteção, Zonas de Pesca Profissional, Zonas de Pesca Reservada e Concessões de Pesca, com regulamentos ou normas específicas para a proteção dos recursos aquícolas e sustentabilidade da pesca.

Em alguns sistemas pesqueiros e nas provas de pesca desportiva realizadas em águas interiores, a modalidade de «captura e devolução à água», também designada como «pesca sem morte» é a regra, tratando-se de uma utilização não consumptiva (não extrativa) dos recursos aquícolas.

Relativamente à pesca e ecossistemas marinhos, o relatório de avaliação inicial da Estratégia Marinha submetida por Portugal no âmbito da Diretiva-Quadro Estratégia Marinha (DQEM) para a subdivisão do Continente, classifica em «Bom Estado Ambiental Atingido» a maioria dos descritores avaliados, incluindo a biodiversidade, a integridade dos fundos marinhos, as populações de peixes e moluscos explorados comercialmente e os contaminantes nos peixes e mariscos para consumo humano.

Atualmente, a maioria das espécies exploradas comercialmente encontra-se num estado que indica um «Bom Estado Ambiental Atingido», elevado ou moderado. São detetados problemas na biomassa dos stocks de cinco das espécies de pescado avaliadas, que exigem recuperação através do estabelecimento de limites de pesca.

Considera-se que estão criadas condições, ao abrigo da Portaria n.º 114/2014, de 28 de maio, mais favoráveis à proteção dos fundos marinhos dos impactes adversos da atividade da pesca, ao impedir a utilização e a manutenção a bordo de artes de pesca suscetíveis de causar impactes negativos nos ecossistemas de profundidade, e ao obrigar ao registo e à comunicação sobre esponjas e corais capturados.

Nos Açores o RJ CNB, estabelecido pelo Decreto Legislativo Regional n.º 15/2012/A, de 2 de abril, cria mecanismos de regulação da captura e comércio de espécies marinhas protegidas sujeitas a exploração.

No que diz respeito às espécies alvo de exploração cinegética, verificam-se atualmente lacunas de conhecimento para a sua grande maioria, nomeadamente sobre a dimensão das populações e suas tendências. Pese embora a falta de dados sobre a abundância das espécies cinegéticas em geral, urge avaliar de modo detalhado se existem problemas graves relativamente ao seu estado de conservação.

Concretamente, e a título de exemplo, de referir que para a rola-comum (Streptopelia turtur), os dados de censos existentes (Censo de Aves Comuns, SPEA) apontam para um decréscimo populacional acentuado em Portugal que acompanha a tendência de declínio verificada a nível europeu (Relatório do Artigo 12.º da Diretiva Aves 2008-2012). Do mesmo modo, o Plano de Ação internacional para a espécie, em desenvolvimento [International Single Species Action Plan for the Conservation of the European Turtle-dove Streptopelia turtur (2018 to 2028)], identifica claramente a perda de habitat e os níveis de pressão cinegética como ameaças à sua conservação, nomeadamente ao nível da rota migratória ocidental que as populações portuguesas integram.

Outra espécie que se encontra numa situação preocupante é o coelho-bravo (Oryctolagus cuniculus) com elevados níveis de incidência de mixomatose e da doença hemorrágica viral (DHV), as quais têm conduzido as populações desta espécie a níveis críticos nalgumas zonas do país. Para além do seu valor em termos da atividade cinegética, esta é uma das espécies presas mais relevantes dos ecossistemas mediterrânicos, designadamente para predadores de topo da fauna autóctone ibérica, de que são exemplos o lince ibérico, com um nível de especialização trófica praticamente exclusivo, e aves de rapina, como a águia-imperial ou o bufo-real.

No que diz respeito às raças e cultivares autóctones e seus parentes selvagens, e após séculos de conservação de inúmeras variedades usadas tradicionalmente na agricultura, assiste-se hoje a uma séria erosão dos recursos genéticos vegetais, fruto de múltiplas causas, seja pela crescente utilização de híbridos modernos, pela pressão sobre diversos parentes selvagens, pela crescente idade dos agricultores ou ainda pelos agentes bióticos nocivos.

2.2 – Ecossistemas

Os ecossistemas, conjugadamente com a geodiversidade que lhe está associada, proporcionam uma ampla gama de benefícios diretos e indiretos. Matos, floresta, espaços agrícolas e agroflorestais, zonas húmidas, rios, lagos e oceanos fornecem uma grande variedade de produtos, como, por exemplo, alimentos, água, ar, matérias-primas e serviços que estão na base da sobrevivência e do desenvolvimento das sociedades humanas.

Alguma utilização indevida dos ecossistemas, nomeadamente, para uso agrícola e silvícola, industrial ou residencial, para vias de comunicação e aproveitamento hidroelétrico, mas principalmente o abandono agrícola existente em algumas áreas do país, assim como o aumento da procura de bens naturais e da pressão sobre a capacidade de assimilação de resíduos, tem reduzido a sua capacidade de fornecer bens e serviços.

O único exercício abrangente de avaliação dos ecossistemas em Portugal (Nações Unidas, 2000-Millennium Ecosystem Assessment) evidenciou o histórico da intensificação agrícola e a florestação com recurso a monoculturas intensivas e a espécies não autóctones, com impactes negativos na biodiversidade e nos serviços de regulação dos ecossistemas. A rede hidrográfica sofreu modificações hidromorfológicas significativas e com o aumento dos níveis de poluição, incluindo a poluição pontual e difusa. O problema das espécies exóticas invasoras agravou-se e aumentou a pressão sobre os ecossistemas costeiros. Quanto aos ecossistemas marinhos, a avaliação do Millennium Ecosystem Assessment realça que o sector das pescas representava, à data, cerca de 0,3 % da economia portuguesa, sendo que a indústria alimentar representa adicionalmente cerca de 2 %. Com exceção de algumas situações de stocks a serem explorados fora de limites biológicos de segurança, os recursos apresentam indícios de estabilidade, após um ajustamento estrutural que levou a uma redução das capturas.

As infraestruturas verdes, em que se aplicam soluções com base nas funções e serviços dos ecossistemas, em alternativa às soluções de engenharia clássica, poderão constituir um instrumento importante para a recuperação de ecossistemas. Além de benefícios ecológicos, estas estruturas oferecem vantagens económicas e sociais, contribuindo de modo decisivo para integrar a biodiversidade e geodiversidade noutros domínios políticos, como a agricultura, a silvicultura, a água, o meio marinho e as pescas, a política de coesão, a mitigação e a adaptação às alterações climáticas, os transportes, a energia e o ordenamento do território.

A dificuldade de criação de valor de mercado para os serviços dos ecossistemas em novas áreas de negócio, bem como a difícil e complexa valoração e comunicação desse valor, têm afastado o reconhecimento da mais-valia da biodiversidade para outros sectores.

2.3 – Património Geológico

Em Portugal existem quatro geoparques mundiais, a saber, Naturtejo, Arouca, Terras de Cavaleiros e Açores, integrados na Rede Global de Geoparques da UNESCO (Global Geoparks Network – GGN). No quadro de uma parceria entre o ICNF e a Universidade do Minho, desde 2010, foi possível inventariar e caracterizar 320 geossítios de relevância nacional e internacional, sendo este o mais completo inventário sobre património geológico existente no país e que veio colmatar uma importante lacuna nesta área do conhecimento. Existem igualmente outros inventários específicos que incluem muitos outros geossítios de relevância local e regional, como é o caso dos 130 geossítios identificados no Parque Nacional da Peneda-Gerês, os 115 geossítios englobados no Inventário de Sítios com Interesse Geológico e os Locais de Património geológico-mineiro identificados no Roteiro de Minas – informação disponível no portal do Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG). Contudo, não obstante o trabalho que tem vindo a ser desenvolvido pelas entidades competentes, existem ainda lacunas a suprir, como a conclusão da delimitação dos geossítios a nível nacional, os critérios para a sua identificação e valoração e a harmonização de inventários.

Dos monumentos naturais integrados na RNAP, o Monumento Natural das Pegadas de Dinossáurios de Ourém/Torres Novas é o único para o qual existe uma estratégia de gestão definida, incluindo medidas de conservação e ações de educação e interpretação.

Nos Açores, o Geoparque Açores assenta numa rede de 121 geossítios, dos quais 57 (55 geossítios terrestres e 2 marinhos) foram selecionados como prioritários para o desenvolvimento de estratégias de conservação e para implementação de ações de valorização.

Relativamente ao património geológico da Ilha da Madeira, existe um inventário abrangendo 37 geossítios com valor científico (disponível em http://geossitios.progeo.pt), num estudo encomendado pelo Governo Regional. Existe um outro inventário do património geológico da ilha de Porto Santo, que identificou 20 geossítios com valor científico, educativo e turístico.

A maior parte das pressões e ameaças ao património geológico advém, direta ou indiretamente, da deterioração e destruição induzida por algumas atividades humanas, sendo de salientar a exploração de recursos geológicos, as atividades recreativas e turísticas, as atividades militares e o desenvolvimento de obras e infraestruturas. Neste contexto torna-se essencial assegurar um acompanhamento e uma atualização periódica da vulnerabilidade e relevância dos geossítios, bem como desenvolver estudos com incidência naqueles com elevado valor científico e risco de degradação significativo.

As bases do regime jurídico da revelação e do aproveitamento dos recursos geológicos existentes no território nacional, incluindo os localizados no espaço marítimo nacional (aprovadas pela Lei n.º 54/2015, de 22 de junho) estabelecem que as políticas públicas neste domínio têm em vista assegurar o conhecimento dos recursos geológicos, a fim de valorizar a dimensão cultural, histórica e social e a competitividade do sector extrativo. Este regime já enquadra a necessidade das autoridades públicas competentes promoverem as medidas necessárias para a conservação dos bens geológicos, tendo sobretudo em conta os objetivos de política atrás enunciados, explicitando que aquelas entidades devem adotar estratégias concertadas.

No entanto, é ainda necessária legislação de conservação complementar, independentemente dos fins de aproveitamento dos bens geológicos e em função dos valores científico, educativo, estético e cultural dos geossítios, nomeadamente através da sua inclusão nos vários instrumentos de gestão territorial e tendo em vista o cumprimento dos objetivos do RJ CNB.

2.4 – Rede Fundamental de Conservação da Natureza (RFCN)

A RFCN foi criada pelo Decreto-Lei n.º 142/2008, de 24 de julho, que instituiu o RJ CNB, sendo constituída pelo SNAC e pelas áreas de continuidade: a Reserva Ecológica Nacional (REN), a Reserva Agrícola Nacional (RAN) e o domínio público hídrico (DPH).

As áreas de continuidade da RFCN, para a qual contribuem genericamente a REN, a RAN e o DPH, estabelecem ou salvaguardam a ligação e o intercâmbio genético de populações de espécies selvagens entre as diferentes áreas nucleares de conservação. Deste modo, contribuem para uma adequada proteção dos recursos naturais e para a promoção da continuidade espacial, da coerência ecológica das áreas classificadas e da conectividade das componentes da biodiversidade em todo o território, bem como para uma adequada integração e desenvolvimento das atividades humanas, nos termos dos respetivos regimes jurídicos.

A REN constitui uma estrutura biofísica que, por via de um regime de proteção específico e da sua assimilação nos instrumentos de planeamento territorial, contribui expressiva e estruturalmente para a conectividade das áreas nucleares de conservação, em particular na faixa de proteção do litoral e nas áreas de sustentabilidade do ciclo hidrológico terrestre associadas aos cursos de água, detendo, ainda, um papel relevante enquanto instrumento de regulamentação do regime da Rede Natura 2000, constituindo o suporte físico que assegura a manutenção do estado de conservação favorável de habitats naturais e de espécies da flora e da fauna e a promoção dos serviços dos ecossistemas.

O SNAC é constituído pela RNAP, pelas áreas classificadas que integram a Rede Natura 2000 e pelas demais áreas classificadas ao abrigo de compromissos internacionais ou bilaterais assumidos pelo Estado Português.

Rede Nacional de Áreas Protegidas

Atualmente fazem parte integrante da RNAP, no Continente, 47 Áreas Protegidas em território continental, incluindo 32 de âmbito nacional: um parque nacional, 13 parques naturais, nove reservas naturais, duas paisagens protegidas e sete monumentos naturais, 14 de âmbito regional/local (duas reservas naturais, 11 paisagens protegidas e um parque natural) e ainda uma área protegida privada. Os sete monumentos naturais têm objetivos de designação orientados fundamentalmente para a salvaguarda do património geológico.

No seu conjunto, a RNAP ocupa, no Continente, uma área de 793 086,1 ha, contabilizando área marinha (536,2 km2) e área terrestre, o que representa cerca de 8 % da sua área total.

A área marinha integrante da RNAP diz respeito aos parques naturais do Litoral Norte, Arrábida, Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, às reservas naturais das Dunas de S. Jacinto, Berlengas, Lagoas de Santo André e da Sancha e ao monumento natural do Cabo Mondego.

Nos Açores, a unidade de gestão de base da Rede de Áreas Protegidas na Região são os Parques Naturais de Ilha em cada uma das nove ilhas do arquipélago e o Parque Marinho do Arquipélago dos Açores. Cada um dos Parques Naturais de Ilha abrange um conjunto específico de áreas protegidas, utilizando a classificação da IUCN, adaptando-a às particularidades geográficas, ambientais, culturais e político-administrativas do território do arquipélago dos Açores, sendo que estão contempladas as seguintes categorias: parque nacional, reserva natural, monumento natural, área protegida para a gestão de habitats ou espécies, paisagem protegida e área protegida de gestão de recursos.

Na Região Autónoma dos Açores (RAA) encontram-se classificadas 24 reservas naturais, 10 monumentos naturais e 16 paisagens protegidas, entre outras. Os Parques Naturais de Ilha e o Parque Marinho dos Açores incluem ainda outras áreas classificadas, ao abrigo de diretivas e convenções internacionais (Rede Natura 2000, OSPAR, Convenção Ramsar, MAB).

Na Região Autónoma da Madeira (RAM) estão classificados: um parque natural, o Parque Natural da Madeira; quatro Reservas Naturais, das Ilhas Selvagens, das Ilhas Desertas, do Sítio da Rocha do Navio e parcial do Garajau; uma área protegida, do Cabo Girão; e a Rede de Áreas Marinhas Protegidas de Porto Santo. A área protegida do Cabo Girão engloba o Parque Natural Marinho do Cabo Girão, o monumento natural do Cabo Girão e a paisagem protegida do Cabo Girão. O Parque Natural da Madeira, criado em 1982, inclui zonas com diferentes estatutos de proteção, abrangendo cerca de dois terços da Ilha da Madeira.

Globalmente para o Continente e as Regiões Autónomas, e de acordo com os dados mais recentes (ICNF, CDDA/Agência Europeia do Ambiente, dezembro de 2016), as áreas protegidas designadas ao abrigo de legislação nacional, integrando a RNAP e as tipologias de áreas protegidas dos Açores e da Madeira, abrangem cerca de 850 000 ha de superfície terrestre e 250 000 km2 de superfície marinha (coluna de água e/ou leito marinho), correspondendo a área marinha protegida a quase três vezes a área terrestre nacional.

Rede Natura 2000

A Rede Natura 2000 em Portugal é composta por 107 áreas designadas no âmbito da Diretiva Habitats e 62 Zonas de Proteção Especial (ZPE) designadas no âmbito da Diretiva Aves, distribuídas pelo Continente e Regiões Autónomas. Encontram-se classificados no Continente 62 SIC e 42 ZPE, na RAA 2 SIC, 23 ZEC e 15 ZPE, e na RAM encontram-se designados 8 SIC, 1 sítio da lista nacional proposto para designação como SIC, 11 ZEC e 5 ZPE.

Em Portugal, a Rede Natura 2000 abrange cerca de 22 % da área total terrestre, acrescidos de cerca de 39 000 km2 de área marinha.

Áreas classificadas ao abrigo de compromissos internacionais

As áreas classificadas ao abrigo de compromissos internacionais incluem: 31 Sítios Ramsar (13 dos quais nos Açores), assim designados ao abrigo da Convenção de Ramsar relativa às Zonas Húmidas com interesse internacional em particular para as aves aquáticas, totalizando 132 487,7 ha; 11 Reservas da Biosfera da UNESCO, das quais seis no continente, quatro nos Açores e uma na Madeira; duas áreas protegidas com Diploma Europeu de Áreas Protegidas do Conselho da Europa (ambas na Madeira); 10 Reservas Biogenéticas (duas delas na Madeira, as restantes no Continente); 17 áreas marinhas protegidas no âmbito da Convenção OSPAR; e 4 geoparques englobados na Rede Global de Geoparques (UNESCO, junho de 2016).

De entre as áreas classificadas ao abrigo de compromissos internacionais merecem destaque as Reservas da Biosfera da UNESCO, que distingue com a chancela da UNESCO as áreas com reconhecido valor natural, que funcionam como laboratórios vivos e são representativas de um exemplar equilíbrio entre a conservação da natureza e as atividades humanas.

O Programa da UNESCO «O Homem e a Biosfera» (MaB) é um Programa Intergovernamental que estabelece uma base científica para a melhoria das relações entre as pessoas e o seu ambiente global. Este Programa propõe uma agenda de pesquisa interdisciplinar e capacitação entre os Estados Membros, visando trabalhar as dimensões ecológica, social e económica da perda da biodiversidade.

O Paul do Boquilobo foi a primeira Reserva da Biosfera classificada em Portugal em 1981, sendo que atualmente são seis em território continental, de um total de 11. Destaca-se o facto de ter sido classificada no ano de 2016 a Reserva da Biosfera das Fajãs de São Jorge, assim como a Reserva da Biosfera Transfronteiriça do Tejo/Tajo, a terceira no país com carácter transfronteiriço e, em 2017, a Reserva da Biosfera de Castro Verde.

Desde 1981 e até 2012 foram classificados em Portugal continental um total de 18 Sítios Ramsar – decorrentes da Convenção das Zonas Húmidas com interesse internacional para as aves aquáticas – Convenção de Ramsar – e 13 na Região Autónoma dos Açores.

Ainda ao abrigo de compromissos internacionais, deve destacar-se a iniciativa dos Geoparques Mundiais da UNESCO, criada em 2015, que passa a integrar neste contexto todos os geoparques globais, no quadro do Programa Internacional Geociência e Geoparques da UNESCO criado no mesmo ano (e que substitui o Programa Internacional de Geociências criado em 1972), a qual vem consolidar a atuação anterior da UNESCO no reconhecimento de que os territórios com património geológico de relevância internacional devem suportar uma estratégia local com vista ao desenvolvimento sustentável das comunidades que habitam esses territórios. Atualmente existem quatro Geoparques Mundiais da UNESCO em território nacional (por ordem cronológica de criação): Naturtejo da Meseta Meridional, Arouca, Açores e Terras de Cavaleiros.

Finalmente, na tipologia Áreas Protegidas Transfronteiriças, existem duas classificações, ambas no Continente: o Parque Internacional Tejo-Tajo (PITT), constituído pelas áreas correspondentes aos Parques Naturais do Tejo Internacional e do Tajo Internacional; e o Parque Transfronteiriço Gerês-Xurés, constituído pelo Parque Nacional da Peneda-Gerês e pelo Parque Natural Baixa Limia-Serra do Xurés.

Áreas marinhas

Pela sua especificidade territorial, natureza e objetivos de política particulares, as áreas classificadas por razões de conservação da natureza total ou parcialmente no território marinho merecem uma referência específica, podendo assumir qualquer uma das tipologias de áreas classificadas atrás referidas. De acordo com o RJ CNB «as áreas protegidas delimitadas exclusivamente em águas marítimas sob jurisdição nacional e as áreas de ‘reservas marinhas’ e ‘parques marinhos’ demarcadas nas áreas protegidas constituem a rede nacional de áreas protegidas marinhas».

No âmbito do processo em curso de alargamento da Rede Natura 2000 ao meio marinho, as lacunas de designação referem-se sobretudo a áreas no offshore, tendo em vista a salvaguarda e gestão de espécies de cetáceos e habitats naturais protegidos. Dando continuidade a esta iniciativa, tem vindo a ser elaborado o mapeamento dos habitats naturais marinhos de fundo das águas da Zona Económica Exclusiva (ZEE), subdivisões do Continente e dos Açores, e a avaliação da interação entre a atividade pesqueira e espécies protegidas.

Atualmente, já existem propostas técnicas consolidadas que permitirão, no breve prazo, no Continente e nas Regiões Autónomas, dar um salto qualitativo no sentido de designar um conjunto de SIC marinhos que colmate as lacunas relativas à suficiente salvaguarda de espécies de cetáceos e de habitats marinhos, a fim de estabelecer uma Rede Natura 2000 coerente nos ecossistemas marinhos nacionais. Neste contexto, merece referência o SIC proposto denominado «Cetáceos da Madeira» (Lista Nacional de Sítios), com uma área de aproximadamente 681 500 hectares (6815 km2) abrangendo todas as águas marinhas em redor da Ilha da Madeira, Desertas e Porto Santo até à batimétrica dos -2500 m.

No âmbito da execução da DQEM, o Programa de Medidas (PMe) nacional estabelece a necessidade de Portugal cumprir para as suas águas marinhas a meta de designação de 10 % de áreas marinhas protegidas (AMP) até 2020. Assim, o PMe prevê a constituição de duas novas grandes AMP em zonas oceânicas de grande profundidade, de forma a cobrir adequadamente um dos mais importantes habitats oceânicos: habitat OSPAR montes submarinos. Estas duas AMP incluem o complexo geológico Madeira-Tore e o «arquipélago» submarino do Great Meteor.

No Continente, a RNAP (Parque Natural do Litoral Norte, Reserva Natural das Berlengas, Parque Natural da Arrábida, Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina e Reservas Naturais das Lagoas de Santo André e Sancha e das Dunas de S. Jacinto) e a Rede Natura 2000 (os SIC Litoral Norte, Peniche/Santa Cruz, Sintra/Cascais, Arrábida/Espichel, Costa Sudoeste e Ria de Aveiro e as ZPE Estuários dos Rios Minho e Coura, Ria de Aveiro, Ilhas Berlengas, Cabo Espichel, Lagoa de Santo André, Lagoa da Sancha e Costa Sudoeste e Ria Formosa) abrangem um conjunto de áreas que incluem uma faixa de espaço marinho costeiro, a qual se estende, em média, até aos 20 m de profundidade, exceção feita ao Sítio Arrábida/Espichel, onde são atingidos os 100 m de profundidade. Mais recentemente, em 2015, foi designado o primeiro SIC offshore da subárea da ZEE contígua ao Continente, o Banco Gorringe, e foram designadas duas ZPE exclusivamente marinhas e contíguas à costa, Aveiro/Nazaré e Cabo Raso.

Nos Açores, em termos de RNAP estão nesta data classificados o Parque Marinho do Arquipélago dos Açores, ao abrigo do Decreto Legislativo Regional n.º 28/2011/A, de 11 de novembro, quatro Reservas Naturais Marinhas (Banco D. João de Castro, Campo Hidrotermal Menez Gwen, Campo Hidrotermal Lucky Strike, Monte Submarino Sedlo), duas AMP Oceânicas (Corvo e Faial), uma AMP para a gestão de recursos – AMPG (Banco D. João de Castro) e quatro AMP na plataforma continental estendida para além das 200 milhas marítimas (Reserva Natural Marinha Campo Hidrotermal Rainbow, AMPG de habitats ou espécies Monte Submarino Altair, AMPG de habitats ou espécies Monte Submarino Antialtair, AMPG de habitats ou espécies MARNA Mid-Atlantic Ridge North of the Azores).

Na Madeira foram classificadas a Reserva (Marinha) Natural Parcial do Garajau, a Reserva (Marinha) Natural da Rocha do Navio, a Reserva Natural das Ilhas Desertas (inclui ou sobrepõe com a Rede Natura 2000), a Reserva Natural das Ilhas Selvagens (inclui ou sobrepõe com Rede Natura 2000), a Rede de AMP do Porto Santo (inclui ou sobrepõe com a Rede Natura 2000) e o Parque Natural Marinho do Cabo Girão.

No âmbito da Convenção OSPAR foram submetidas por Portugal três AMP no mar territorial do Arquipélago dos Açores (Banco das Formigas, Ilha do Corvo e Canal Faial-Pico), quatro na ZEE portuguesa contígua aos Açores (Banco D. João de Castro, Campo Hidrotermal Lucky Strike, Campo Hidrotermal Menez Gwen e Monte submarino Sedlo) e uma no leito marinho da plataforma continental estendida (Campo hidrotermal Rainbow). Portugal também liderou a classificação coletiva pela OSPAR de quatro AMP, compreendendo apenas a coluna de água (em águas internacionais): Dorsal Meso-Atlântica a Norte dos Açores, Monte Submarino Altair, Monte Submarino Antialtair e Monte Submarino Josephine. Portugal foi ainda pioneiro na nomeação, em 2006, da Campo Hidrotermal Rainbow, como AMP situada na plataforma continental para além das 200 milhas e também a primeira Parte Contratante da OSPAR a propor a inclusão, em 2005, de uma AMP na rede daquele Acordo Regional, o Banco das Formigas.

No Mar Territorial contíguo ao Continente foram, em 2015, indicadas para classificação OSPAR cinco AMP adicionais: Litoral Norte, Berlengas, Arrábida, Santo André e Sancha e Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, abrangendo a superfície marítima das áreas protegidas costeiras da RNAP com aquelas designações. Destas cinco AMP, duas são Reservas Naturais (Berlengas e Santo André e Sancha) e três Parques Naturais (Litoral de Esposende, Arrábida e Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina), abrangendo os já designados, desde 1999, Parque Marinho Luiz Saldanha-Arrábida e Reserva Marinha das Berlengas).

Tenha-se ainda presente que a Reserva da Biosfera de Santana (Madeira), que corresponde à totalidade da área emersa do concelho de Santana, inclui a área marinha adjacente até à batimétrica dos 200 m, assim como a Reserva da Biosfera das Berlengas, que inclui o arquipélago das Berlengas e a cidade de Peniche, abrangendo cerca de 19.000 ha (190 km2) de espaço marítimo. Nos Açores, existem quatro Reservas da Biosfera abrangendo território marinho contíguo à área terrestre: Corvo, Flores, Graciosa e Fajãs de S. Jorge.

2.5 – Monitorização e vigilância sistemática do património natural

A utilização de indicadores, tanto individualmente como em combinação com outros, é atualmente considerada uma ferramenta essencial na avaliação do estado global da biodiversidade e do património geológico. Os indicadores sumarizam correlações complexas de uma forma inteligível e destacam as principais tendências do estado da biodiversidade e do património geológico, permitindo a avaliação e correção de políticas e linhas de ação, podendo ser usados ao nível nacional, regional ou global.

Em Portugal, existem linhas de vigilância e ou monitorização muito dirigidas, realizadas na sua maioria em áreas classificadas e incidindo sobre espécies e habitats protegidos, suscetíveis de produzir informação que poderá vir a integrar, após adaptação e processamento adequados, um Programa de Monitorização e Vigilância mais vasto e desenhado à escala regional ou nacional, revelando-se, assim, como importantes fontes de dados.

São exemplos algumas linhas de trabalho sobre aves aquáticas invernantes, estações de esforço de anilhagem de aves, mortalidade de aves em linhas de transporte e distribuição e energia, monitorização de lobos mortos, morcegos cavernícolas e abrigos de importância nacional, controlo de espécies exóticas invasoras, utilização de venenos e suas consequências para a Fauna (PAP) (Pterodroma madeira), programa de monitorização (indicadores biológicos) da Diretiva Quadro da Água (DQA), monitorização da condição ambiental de AMP dos Açores, entre muitas outras.

No âmbito do «Bom Estado Ambiental» das águas marinhas, merecem destaque as linhas de monitorização previstas no Programa de Monitorização da DQEM, destinadas a avaliar a dinâmica e tendências do estado ambiental dos ecossistemas marinhos em função de diversos descritores biofísicos. As medidas serão aplicadas nas estratégias marinhas das quatro regiões nacionais e, nalguns casos, têm um foco direto em termos das componentes da biodiversidade, seja relativamente ao estado das espécies exploradas ou protegidas, dos habitats bentónicos ou das pressões exercidas sobre ambos. Relativamente às espécies protegidas, não exploradas, as monitorizações ou avaliações decorrem da aplicação das Diretivas Aves e Habitats.

No que respeito ao património geológico, é de manifesta necessidade a utilização de indicadores em geossítios que apresentem elevado valor científico e risco de degradação.

2.6 – Uso, ocupação e ordenamento do território

Uma análise da distribuição das classes mais relevantes de uso do solo pelas áreas classificadas da RNAP e da Rede Natura 2000, do Continente, permite verificar que o território agroflorestal abarca, no seu conjunto, cerca de 80 % da superfície de áreas classificadas em Portugal Continental, o que atesta a importância das atividades agroflorestais para a conservação e gestão da biodiversidade.

Note-se ainda que cerca de 3/4 das zonas húmidas e costeiras de Portugal se encontram integrados nalguma tipologia de área classificada, o que atesta a relevância dada à proteção destes ecossistemas particularmente sensíveis.

Também nos Açores, e pelos últimos dados disponíveis, se conclui que mais de metade do território regional (cerca de 56 %) é ocupado por uso agrícola e por pastagem. Por outro lado, a floresta e a vegetação natural ocupam cerca de 35 % do território, com 22 % e 13 % de superfície, respetivamente, de acordo com a Carta de Ocupação do Solo da Região Autónoma dos Açores (Secretaria Regional do Ambiente e do Mar/Direção Regional do Ordenamento do Território e dos Recursos Hídricos, dezembro de 2007). Ainda relativamente à Rede Natura 2000 nos Açores, 77 % da área é ocupada por Áreas Naturais, 11 % por Floresta de Produção, 6 % por Áreas Agrícolas e 5 % por pastagens permanentes (Quadro de Ações Prioritárias da Rede Natura 2000-PAF – Açores 2013).

Na Madeira, a classe mais relevante de uso do solo nas áreas classificadas da Rede Natura 2000 é a de «Florestas e meios naturais e seminaturais», com mais de 98 % de superfície (PAF – Madeira 2013).

O planeamento e o ordenamento do território são instrumentos determinantes para a conservação do património natural e o atual regime jurídico introduz desafios essenciais a enfrentar nos próximos anos em termos de política de natureza e biodiversidade, tendo em conta os compromissos jurídicos e políticos a que o país está vinculado neste âmbito.

2.7 – Educação e Ensino

A temática da conservação da natureza e da biodiversidade integra os documentos curriculares da área das ciências naturais dos ensinos básico e secundário, bem como a área transversal de educação ambiental para a sustentabilidade.

No âmbito dos currículos dos ensinos básico e secundário, nos documentos curriculares da área das ciências naturais, bem como da educação ambiental para a sustentabilidade, esta temática é abordada de forma a proporcionar aos jovens competências que lhes permitam intervir, de forma esclarecida e ativa, em problemáticas ambientais relativas à conservação da biodiversidade.

O domínio da educação ambiental integra temáticas relativas à conservação da natureza, da biodiversidade e da geodiversidade, ao nível dos programas curriculares das várias disciplinas, de uma forma transversal, de Programas/Grupos de trabalho interministeriais/estratégias que contemplam a área da educação, bem como em projetos ambientais desenvolvidos nas escolas. Esses projetos são promovidos, nomeadamente por Autarquias, ONGA, entidades dos ministérios com as tutelas da educação e da ciência e outros organismos da Administração Pública.

A adoção da Estratégia Nacional de Educação Ambiental (ENEA 2020), para o período 2017-2020, através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 100/2017, de 11 de julho, constituiu um desafio de grande importância para o futuro coletivo. Viver bem dentro dos limites do planeta é a mensagem mais forte.

Importa sensibilizar os cidadãos, as empresas e as entidades públicas e privadas para a necessidade de melhorar a eficiência da utilização de recursos e para a promoção de economias circulares e de partilha menos consumidoras e desperdiçadoras, mais amigas do ambiente e mais centradas nas especificidades dos territórios.

O sucesso de uma educação ambiental que vise a alteração de paradigma na relação das atividades humanas com os recursos depende da promoção da informação e do conhecimento dos cidadãos também sobre o território onde vivem, sobre as suas capacidades, vulnerabilidades e resiliências.

Também a criação do Prémio ICNF – Uma ideia Natural, cuja primeira edição decorreu em 2017, tem como objetivo reconhecer o mérito e a criatividade e apela sobretudo ao envolvimento dos vários atores na prática da conservação e gestão do património natural. Este envolvimento está na base do que se apelida de uma política de gestão de proximidade para as áreas classificadas. Este prémio está também em linha com a convicção de que, nas áreas mais representativas do património natural, é possível fazer diferente, com recurso às práticas mais adequadas, mais aderentes a cada realidade e com diferentes parceiros.

Nesta ENCNB está patente a integração de uma «cultura ambiental e do território», onde a natureza tem lugar de destaque – tornando-a um imperativo – e fortalecendo a cooperação e parcerias entre as diferentes áreas de governação, nos diferentes níveis, entre o domínio público e o sector privado, entre a investigação e a ação, entre o compromisso e a participação ativa.

3 – Ambição e Visão

3.1 – Ambição

O contexto em que a ENCNB 2030 é desenvolvida é marcado por três apostas que moldam a política de ambiente:

a) A descarbonização da economia, tendo em vista a convergência com o propósito de combate às alterações climáticas e redução do seu efeito a nível global;

b) A economia circular, promovendo a maior eficiência dos processos produtivos e de consumo, reduzindo a utilização de recursos naturais e o seu desperdício nos processos de consumo;

c) A valorização do território, adotando modelos de desenvolvimento que se diferenciem pela combinação de características singulares que o país apresenta e que são a sua marca única e intransponível.

Qualquer um destes três pilares é essencial para a concretização da Estratégia por diferentes motivos. A descarbonização da economia é fator primordial para atenuar o impacte das alterações climáticas, sendo que estas constituem um dos principais fatores de pressão sobre os ecossistemas. Por essa razão são uma ameaça à biodiversidade, quer pelo que podem representar em termos de perda de habitat, quer pela criação de condições para que espécies não autóctones possam vir a encontrar no país condições para o seu desenvolvimento, criando desequilíbrios nos sistemas naturais. Já uma ação no sentido de robustecer a resistência dos ecossistemas pode contribuir favoravelmente para o desiderato de atenuação do efeito das referidas alterações. Embora menos preocupante, de referir a existência de geossítios que podem sofrer os efeitos das alterações climáticas, em particular os que se encontram na linha de costa, pelo impacte da subida do nível do mar.

Complementarmente, a concretização dos propósitos da economia circular promove a redução da pressão sobre os recursos e, consequentemente, sobre o património natural, constituindo-se assim como um desiderato estruturante, pelo que representa ao nível da transformação dos habitats pela necessidade do aprovisionamento dos processos produtivos. Não menos importante é a mudança de paradigma que introduz, na medida em que se passa a considerar os ciclos dos recursos naturais e as suas dinâmicas, levando a uma abordagem que visa a utilização sustentável do património natural.

Por último, a valorização do território coloca de forma determinante o foco na necessidade de realçar aquilo que é o valor reconhecido do património natural do país. Portugal tem uma representatividade relevante de espécies, ecossistemas e geodiversidade, considerando a dimensão terrestre. Contudo, sendo um país pequeno em termos de superfície terrestre, assume uma dimensão muito relevante a nível mundial quando se projeta com a sua área marinha. O seu capital natural é uma oportunidade para o seu desenvolvimento e coloca Portugal perante uma responsabilidade muito grande, na medida em que, quer pela sua diversidade, quer pela sua dimensão, tem obrigações de projeção mundial, às quais deve estar à altura de corresponder, demonstrando que é capaz de cuidar adequadamente de um património sobre o qual reclama a soberania.

3.2 – Visão para 2050

A visão para ENCNB 2030 constrói-se a partir da ambição e da lógica dinâmica que se lhe pretende conferir, com que se pretende:

Alcançar o bom estado de conservação do património natural até 2050, assente na progressiva apropriação do desígnio da biodiversidade pela sociedade, por via do reconhecimento do seu valor, para o desenvolvimento do país e na prossecução de modelos de gestão mais próximos de quem está no território.

3.3 – Princípios e valores transversais

A ENCNB, na sua versão de 2001, apresenta um enunciado de princípios que se mantêm válidos, pondo em evidência os princípios do nível de proteção elevado, da utilização sustentável dos recursos biológicos, da precaução, da prevenção, da recuperação, da responsabilização, da integração, da subsidiariedade, da participação e da cooperação internacional.

Muitos destes princípios têm-se vindo a integrar, ainda que com dinâmicas diferentes, nas culturas e práticas de gestão, de uma forma transversal ao próprio domínio ambiental no seu sentido mais lato. Neste contexto, julga-se importante realçar a forma como se disseminaram as práticas e os instrumentos que concretizaram os princípios da precaução ou da prevenção, assim como o enunciado e a prossecução de objetivos de proteção elevado.

Não obstante, entende-se que persistem desafios no domínio da concretização sistémica e abrangente de uma cultura que ponha em prática os princípios da subsidiariedade e da integração, cujo efeito complementar fomentará a apropriação dos valores naturais pelos diferentes sectores, incluindo as entidades de Administração do Estado (nos seus diferentes níveis hierárquicos), mas também para além deste perímetro. Importa perseverar na criação desta cultura que foi uma marca evidente na ENCNB 2001-2010 e que importa reiterar como um eixo de atuação da atual Estratégia.

O cumprimento deste desiderato invoca o princípio da responsabilização, considerando no seu âmbito o próprio princípio do «poluidor-pagador», e o dever transversal à comunidade na defesa do património natural, dentro e além-fronteiras, através da colaboração internacional, mas também na solidariedade intergeracional.

Complementarmente, merece destaque o princípio da participação e da partilha da informação, mas também do próprio processo de decisão. O caminho que tem vindo a ser trilhado nas últimas décadas tem conduzido a um estágio de maior desenvolvimento da cultura de participação dos cidadãos em geral. Este é um propósito que deve ser mantido e aprofundado, criando fóruns e instrumentos de participação, que sejam abrangentes, mas sobretudo eficazes e consequentes.

A melhoria do estado de conhecimento tem sido um precioso contributo para que se adote uma gestão mais adaptada às diferentes realidades. É pela aposta do conhecimento de base científica que é possível adotar novas abordagens de gestão, que se querem mais ajustadas e assentes em evidências, evitando a aplicação do princípio da precaução de forma indiscriminada. O conhecimento associado à inovação assume um desígnio transversal que concorrerá para diferenciar as distintas abordagens que se pretendem implementar.

Salienta-se, por fim, que os processos de tomada de decisão são, reconhecidamente, mais completos na atualidade. Um dos paradigmas que tem vindo a sobressair é o da sustentabilidade, entendendo-se como a ponderação dos valores ambientais, socioculturais e económicos. É hoje comummente aceite que decisões que ponham sucessivamente em crise um ou mais destes fatores conduzem a resultados desequilibrados e sem futuro. É necessário consolidar a necessidade de ponderar estes três valores nos próprios processos que subjazem à conservação da natureza e da biodiversidade, pois a informação sugere que uma visão desequilibrada do ambiente face às outras realidades, pode levar ao abandono do território e, por essa via, à perda de biodiversidade, sobretudo, em ecossistemas onde a presença humana tem raízes profundas.

Nessa medida, a ENCNB 2030 privilegia como valores transversais aos principais eixos estratégicos a sustentabilidade, o conhecimento, a participação e partilha, assim como a responsabilização.

A ENCNB 2030 vem, assim, reconhecer que o envolvimento dos diferentes sectores da atividade económica, mas também das organizações da sociedade civil, da Academia e das populações e órgãos autárquicos que as representam, é um desígnio imperioso para a concretização de um modelo de desenvolvimento sustentável assente no património natural, num território que, na sua quase totalidade, é de génese privada. Acresce que o aumento do despovoamento dos territórios do interior é considerado um fator de pressão sobre a biodiversidade, pelo que a valorização do património natural, assente numa lógica tendencial de remuneração pelos serviços dos ecossistemas assegurados pelos produtores, gestores e proprietários em geral, contribuirá para conter esta tendência e, simultaneamente, concretizará o potencial de criação de emprego e a fixação das populações associados às atividades ligadas ao património natural e à prestação de serviços dos ecossistemas.

4 – Eixos Estratégicos e Matriz Estratégica

4.1 – Enquadramento geral

O modelo que enforma a ENCNB 2030 assenta em três eixos estratégicos interdependentes e que se projetam solidariamente, designadamente:

Eixo 1 – Melhorar o estado de conservação do património natural. – Este é o objetivo último a concretizar no quadro desta Estratégia. Estancar a perda de biodiversidade é um compromisso global perante uma realidade que é tangível e consensual. No caso nacional, esta realidade assume uma expressão mais relevante na medida em que a riqueza natural do país é hoje mais do que uma obrigação ética, mas antes um dos pilares que concorre para o seu desenvolvimento, a par da sua riqueza cultural e paz social.

Eixo 2 – Promover o reconhecimento do valor do património natural. – Tão importante quanto o conhecimento fundamentado das características, interações e interdependências essenciais do património natural, é a compreensão do serviço que assegura o mesmo e a capacidade de saber transmitir essa realidade. É preciso analisar este património na ótica dos múltiplos serviços que presta e que têm de ser valorizados de forma transversal, conseguindo torná-los evidentes perante a sociedade, levando-a ao reconhecimento da sua utilidade e mais-valia. Esta abordagem, para além de permitir consolidar modelos de desenvolvimento orientados, torna ainda possível concretizar instrumentos de natureza económica e financeira que permitam contabilizar a utilização destes recursos e dinamizar medidas que visem a sua promoção, nomeadamente, por via de um enquadramento fiscal adequado.

Eixo 3 – Fomentar a apropriação dos valores naturais e da biodiversidade. – Com efeito, é a partir do reconhecimento do valor do património natural que é possível sustentar a apropriação pela sociedade em geral do desígnio da promoção da biodiversidade e da conservação da natureza. Além de este ser um dos objetivos estratégicos de Aichi no âmbito da Convenção para a Diversidade Biológica (CDB), é também uma marca muito presente na própria ENCNB 2001-2010. Com efeito, já nessa altura se dava grande destaque à necessidade de concretizar as preocupações com esta matéria nas diferentes políticas e práticas sectoriais, algo que permanece como um dos principais desafios da atualidade. Todavia, é preciso ir mais longe na medida em que esta apropriação tem de ser alcançada de forma transversal na sociedade e, em particular, na sua base de sustentação, que são as pessoas que vivem e cuidam dos territórios.

Reconhecer valor leva à apropriação e, por inerência, ao «cuidar». «Cuidar» conduz à melhoria do estado de conservação. A melhoria do estado de conservação facilita o reconhecimento de valor, dando início a um novo ciclo. É este o ciclo virtuoso que marca a ENCNB 2030, lhe dá sentido e confere um carácter dinâmico.

Deste modo, a prossecução da visão da ENCNB 2030 consubstancia-se nestes três eixos estratégicos e nos respetivos objetivos, procurando estabelecer o quadro para implementar metas específicas a definir em sede própria e a prosseguir ao longo do seu período de vigência.

A definição dos objetivos tem em conta o quadro de referência estratégico descrito, assim como a análise sobre a situação de referência do país em matéria de conservação da natureza e biodiversidade.

Importa realçar o papel orientador e estruturante da ENCNB 2030 para a ação face aos desafios do país, mas também assumir que a mesma visa dar uma resposta adequada aos compromissos contraídos por Portugal no plano internacional.

A este respeito, merece naturalmente destaque a CDB e em particular o compromisso com os cinco objetivos estratégicos de Aichi, as seis metas da Estratégia da UE para a Biodiversidade 2020 e as metas relevantes da Agenda das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável 2030.

Não obstante, é importante considerar os desafios particulares do país, pretendendo-se assegurar que é possível configurar uma proposta que concilie esta realidade com os compromissos da CDB.

Assim, o enunciado de objetivos da ENCNB 2030 tem em consideração também o valor intrínseco e patrimonial da biodiversidade e da geodiversidade, bem como o seu papel na manutenção de ecossistemas saudáveis e geradores de serviços fundamentais para assegurar o bem-estar humano e o crescimento económico inclusivo, inteligente e sustentável.

Na figura seguinte apresenta-se o desenho esquemático dos três eixos estratégicos da ENCB 2030 e dos respetivos valores transversais que marcam a cultura de pensamento que se pretende pôr em evidência.

(ver documento original)

Fig. – Representação esquemática dos eixos estratégicos e dos valores da ENCNB 2030.

Verifica-se que os diferentes eixos estratégicos concorrem de forma por vezes simultânea para a prossecução dos objetivos estratégicos de Aichi e das metas da Estratégia da UE para a Biodiversidade 2020, esclarecendo-se na tabela seguinte a forma como este desiderato é alcançado.

No texto que se segue, desenvolvem-se em maior detalhe os três eixos estratégicos que concretizam a ENCNB 2030, procurando apresentar o seu enquadramento geral e os seus objetivos específicos, sendo certo que podem ocorrer situações de interdependência e inter-relação entre os diferentes eixos estratégicos e objetivos.

Pretende-se, assim, assegurar um exercício de sistematização que permita uma leitura mais fácil da matriz estratégica, que consta no quadro síntese e que apresenta, de forma mais sintética, a ambição que se pretende concretizar no período de vigência da ENCNB 2030.

TABELA

Relação dos eixos estratégicos da ENCNB 2030 com os Objetivos Estratégicos de Aichi e as metas da Estratégia da UE para a Biodiversidade 2020

(ver documento original)

4.2 – Eixo 1 – Melhorar o estado de conservação do património natural

4.2.1 – Enquadramento

Os objetivos incluídos a este nível visam enquadrar as ações de conservação e gestão ativa das espécies e dos habitats e de proteção do património geológico, nomeadamente através da redução de pressões e ameaças específicas que sobre eles atuam, tendo em vista prevenir, travar e, quando possível, reduzir a deterioração do seu estado de conservação, melhorando-o quando necessário. Neste contexto, é atribuída uma prioridade clara às ações de conservação in situ, complementadas por outras ações realizadas ex situ, sempre que estas forem consideradas essenciais face aos objetivos de conservação a atingir.

A ratificação do Protocolo de Nagoya sobre o acesso a recursos genéticos e a partilha justa e equitativa dos benefícios provenientes da sua utilização por Portugal, com a sua entrada em vigor em julho de 2017, permitirá dar um passo decisivo para que a utilização de recursos genéticos em Portugal seja realizada em conformidade com a legislação ou disposições regulamentares dos Estados Membros que forneceram os recursos. Por outro lado, a concretização deste desígnio é condição necessária para conferir eficácia à legislação que eventualmente venha a ser adotada em Portugal sobre acesso aos recursos genéticos nacionais.

4.2.2 – Sistema Nacional de Áreas Classificadas (SNAC)

Considera-se como um dos instrumentos fundamentais de concretização dos objetivos neste eixo estratégico a consolidação do SNAC, particularmente no mar, e a sua gestão através de instrumentos eficazes, incluindo os de ordenamento espacial (ver também a este propósito o Eixo Prioritário 3). Neste âmbito têm sido desenvolvidas ações com vista à designação de novas áreas classificadas marinhas, destacando-se o trabalho que tem vindo a ser realizado nas áreas oceânicas na subdivisão dos Açores e na subdivisão da Plataforma Continental Estendida e que se encontra já preconizado na Estratégia Nacional do Mar e no Plano que lhe está associado.

Neste contexto, a meta alvo de compromisso visa contribuir para a concretização da meta 17 de Aichi e do objetivo 14.5 da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, que preconizam a cobertura de 10 % da superfície marinha global por áreas protegidas, através da consolidação da rede de áreas marinhas do SNAC.

Para o património geológico preconiza-se a constituição de uma rede georreferenciada de geossítios com medidas de proteção e valorização inscritas nos instrumentos de gestão territorial relevantes, considerando o inventário já existente de geossítios de importância internacional, nacional, regional e local. Os geossítios de importância internacional e nacional deverão ser integrados no SNAC.

Concomitantemente, é necessário assegurar a definição de objetivos de conservação e medidas de gestão e dotar cada área da Rede Natura 2000 e da RNAP de planos de gestão e programas de execução eficazes, estabelecidos e aplicados em estreita articulação com as autarquias e demais autoridades públicas, os proprietários, os promotores e os sectores de atividade, as ONGA, a comunidade científica e outros parceiros relevantes. Será igualmente relevante promover a avaliação da eficácia das áreas protegidas no que diz respeito ao cumprimento dos objetivos que justificaram a sua classificação, em particular a salvaguarda dos valores naturais em presença.

A adoção de modelos de cogestão, complementando os que o RJ CNB já prevê, trará maior flexibilidade na gestão da RNAP e da Rede Natura 2000 e permitirá o estabelecimento de parcerias virtuosas com as entidades presentes no território, constituindo esta uma proposta estruturante da Estratégia.

Os municípios são parte essencial nestas parcerias pela relevância determinante que têm na estruturação das dinâmicas territoriais, devendo juntar-se à autoridade nacional para a conservação da natureza e biodiversidade – que deve manter a soberania na gestão dos aspetos essenciais à conservação da natureza e biodiversidade – à Academia, às ONGA e entidades representativas dos sectores produtivos.

O ponto essencial que se pretende alcançar é a criação de uma cultura de gestão colaborativa e participada dos diferentes atores no território, em prol de um ativo que a todos pode beneficiar, congregando o melhor que cada uma dessas entidades possa pôr ao serviço das áreas protegidas.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento do objetivo, identificado na matriz estratégica, 1.1. – Consolidar o SNAC e promover a sua gestão partilhada.

4.2.3 – Proteção e recuperação de espécies e habitats

Pretende-se, igualmente, assegurar que, através de diversas intervenções, até 2019, quando se conclui o exercício regular de avaliação de aplicação das Diretivas Aves e Habitats, relativo ao período 2013-2018, as espécies e os habitats protegidos no âmbito das Diretivas Aves e Habitats iniciem uma tendência de recuperação do estado de conservação ou tendência populacional relativamente aos resultados obtidos para o período 2007-2012, para que em 2030 parte significativa das avaliações, agora desfavoráveis, apresente uma variação positiva.

Independentemente de outras ações que se venham a identificar no âmbito deste quadro, considera-se desde já que as espécies ou grupos de espécies com planos de ação e instrumentos análogos já em vigor, ou que venham a ser concluídos no prazo de vigência da ENCNB 2030, deverão ser alvo das medidas prioritárias aí previstas, incluindo casos concretos de intervenções urgentes já identificadas e de que são exemplos o lince ibérico, o lobo ibérico, o saramugo, a águia-imperial-ibérica, as aves necrófagas, o priolo, o roaz-corvineiro, o coelho bravo, entre outras espécies ou grupos de espécies.

A desertificação é um fenómeno que representa um fator de ameaça à biodiversidade. O Programa de Ação Nacional de Combate à Desertificação (PANCD), aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 78/2014, de 9 de julho, tem como objetivo a aplicação das orientações, das medidas e dos instrumentos da Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação nos Países Afetados por Seca Grave e ou Desertificação nas áreas semiáridas e sub-húmidas secas do território nacional. Para o efeito, o PANCD estabelece, para o período 2014-2020, os objetivos estratégicos, as linhas de ação, bem como os indicadores de avaliação do combate à desertificação em Portugal, incluindo questões específicas dirigidas à conservação dos ecossistemas e comunidades das zonas secas, bem como às sinergias entre processos das duas Convenções.

O outro fator de ameaça para o qual se decidiu estabelecer metas próprias de atuação é o que decorre das alterações climáticas, tendo em vista a execução das medidas da Estratégia Nacional de Adaptação às Alterações Climáticas (ENAAC) para o sector da biodiversidade. Estas medidas são relevantes não só do ponto de vista da minimização da perda de biodiversidade associada, como também das soluções que os serviços dos ecossistemas saudáveis poderão disponibilizar para a minimização dos riscos e catástrofes naturais, a manutenção da produtividade primária ou a promoção da qualidade de vida.

Acresce a necessidade de estabelecer um quadro de prioridades de medidas de recuperação para outras espécies e habitats sujeitos a pressões ou ameaças suscetíveis de comprometer ou agravar de modo particularmente grave o seu estado de conservação ou risco de extinção, de modo a racionalizar a atuação e dotá-la da eficiência compatível com os recursos e calendário disponíveis.

Na vertente da abordagem das diferentes pressões e ameaças, este eixo prioritário dedica particular atenção às espécies exóticas invasoras (terrestres e marinhas) e aos agentes patogénicos, enquanto fatores de risco particularmente relevantes para a prossecução dos objetivos de conservação. Consideram-se fundamentais as ações de prevenção da introdução e de controlo da dispersão de espécies exóticas, já no curto prazo, dada a magnitude nos impactes gerados nas diversas componentes da biodiversidade e na integridade dos ecossistemas e das suas funções, com danos sérios em termos económicos e de saúde pública, demonstrados e reconhecidos. O controlo de espécies exóticas invasoras reveste-se de particular especificidade e prioridade em ecossistemas insulares, costeiros e fluviais, bem como em áreas ardidas.

Do ponto de vista da intervenção, identifica-se a necessidade de estabelecer um quadro de referência prioritário de atuação no curto e médio prazo para situações mais prementes.

Neste contexto merece igualmente destaque o caso de espécies invasoras entre os briófitos, cujo estudo e monitorização necessitam ser implementados. É disso exemplo a espécie Campylopus introflexus, cujo comportamento a nível europeu relativamente à sua expansão tem vindo a ser considerada preocupante, existindo já dados para Portugal que confirmam o seu carácter invasor. É uma espécie também já citada para várias ilhas dos Açores.

Para o estabelecimento da prioridade de atuação, estas intervenções deverão ter em conta os contextos próprios da pressão, designadamente em termos da sensibilidade das espécies, habitats, ecossistemas ou serviços ambientais afetados ou ameaçados.

Por outro lado, importa rever os procedimentos de atuação sobre esta matéria, preconizando, nomeadamente, um sistema de prevenção, de alerta precoce e de resposta rápida à introdução e disseminação de espécies exóticas invasoras.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento dos objetivos, identificados na matriz estratégica, 1.2. – Assegurar que as espécies (flora e fauna) e os habitats protegidos melhoram o seu estado de conservação ou tendência populacional, 1.3. – Programar e executar intervenções de conservação e de recuperação de espécies (fauna, flora) e habitats ao nível nacional e 1.4 – Reforçar a prevenção e controlo de espécies exóticas invasoras a nível nacional e no quadro da UE.

4.2.4 – Conservação da diversidade genética animal e vegetal

Relativamente à diversidade genética (animal e vegetal), preconiza-se o estabelecimento de um quadro de referência nacional, bem como a elaboração de planos de conservação para as raças autóctones da fauna e para as plantas cultivares, incluindo os seus parentes selvagens.

No que diz respeito à manutenção da diversidade genética vegetal, merecem destaque as ações previstas no Programa Operacional da Administração Pública para a Conservação e Melhoramento dos Recursos Genéticos Florestais, as que decorrem da atividade desenvolvida pelos Centros de Competência do Sector Florestal, no âmbito da Estratégia Nacional para as Florestas. De destacar também as medidas de apoio dos Programas de Desenvolvimento Rural (PDR) no domínio da conservação e melhoramento dos recursos genéticos animais e vegetais. Merecem aqui referência os Planos Estratégicos Nacionais para os recursos genéticos animais e para os recursos genéticos vegetais, que têm por objetivo a caracterização, a promoção e a utilização sustentável destes recursos em Portugal.

Especial atenção deve ser prestada ao papel fundamental dos dois principais bancos de sementes nacionais internacionalmente reconhecidos: o banco português de germoplasma vegetal do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV), orientado essencialmente para a conservação de sementes de cultivares agrícolas, e o banco de sementes da flora autóctone do Jardim Botânico da Universidade de Lisboa. Releva, ainda, a coleção ampelográfica nacional do INIAV e as várias coleções de espécies fruteiras mantidas pelas Direções Regionais de Agricultura e Pescas, complementadas pelos demais jardins botânicos e pelo Centro Nacional de Sementes Florestais do ICNF.

Pretende-se abranger os parentes selvagens de plantas cultivares e de outras espécies com importância etnobotânica e socioeconómica, bem como estabelecer um processo de inventariação e seguimento das amostras, incluindo a informação relacionada com a diversidade genética conservada e com a sua proveniência, biologia e ecologia.

Identifica-se ainda como prioritário, para as espécies autóctones da flora, o reforço das intervenções de conservação ex situ, particularmente da coordenação das plataformas e iniciativas já existentes, tendo sobretudo em vista o aumento das medidas de investimento e gestão in situ.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento do objetivo, identificado na matriz estratégica, 1.5. – Assegurar e promover a conservação da diversidade genética animal e vegetal.

4.2.5 – Quadro legal de conservação da natureza e biodiversidade

Este eixo estratégico inclui o reforço do quadro de regulamentação e do cumprimento das normas legais de conservação da natureza e da biodiversidade.

Relativamente ao reforço do quadro legislativo, merece destaque a revisão do RJ CNB, atualizando-o face à evolução do quadro de referência internacional, nomeadamente, a Agenda 2030 das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável ou o Plano Estratégico da Convenção sobre a Diversidade Biológica, bem como da UE, nomeadamente, a Estratégia da UE para a Biodiversidade e os resultados da avaliação de desempenho das Diretivas Aves e Habitats – , bem como à premência de reforçar e densificar o quadro legal e o compromisso em torno da proteção, gestão e valorização do património geológico e da geodiversidade nacional, tendo em conta o regime jurídico dos recursos geológicos. Importa concretizar nesta revisão a consagração das soluções que viabilizem modelos de cogestão, considerando a aprendizagem das iniciativas em curso.

Importa, por outro lado, rever e atualizar o regime nacional relativo às espécies exóticas, que data de 1999, adaptando-o juridicamente e em termos operacionais aos novos desafios e, em particular, à regulamentação adotada em 2014 a nível da UE.

Destaca-se igualmente a importância da criação do Cadastro Nacional dos Valores Naturais Classificados nos termos previstos no RJ CNB. Este instrumento de natureza jurídica constitui um registo nacional de informação relevante sobre todos os valores naturais classificados e/ou particularmente ameaçados, nomeadamente sobre os territórios definidos no Continente e nas Regiões Autónomas e as áreas demarcadas nas águas sob jurisdição nacional, com interesse internacional, nacional, regional ou local, bem como sobre os ecossistemas, habitats naturais, espécies de flora e fauna e ainda sobre os geossítios.

As ações de vigilância ativa e fiscalização do património natural são igualmente tratadas neste eixo estratégico, assegurando, por um lado, o cumprimento das disposições legais e regulamentares estabelecidas em matéria de conservação da natureza, biodiversidade e geodiversidade, e apoiando, por outro, a investigação e a repressão dos respetivos ilícitos, tanto em meio terrestre como marinho.

As áreas classificadas existentes e a respetiva superfície a fiscalizar justificam o reforço dos recursos existentes em matéria de vigilância e fiscalização, nomeadamente para:

. A consolidação do Quadro de atuação no combate à pesca ilegal, não reportada e não regulada (IUUF);

. O cumprimento do regime regulador do comércio internacional de espécies selvagens ameaçadas de extinção e de combate ao tráfico de vida selvagem;

. A elaboração e execução de um plano de fiscalização do cumprimento do regime jurídico da utilização dos recursos genéticos;

. A adoção de medidas de redução do risco de mortalidade por envenenamento de animais selvagens, tendo em vista a consolidação de uma plataforma de informação, prevenção e combate ao uso ilegal de iscos envenenados e de otimização do controlo da venda e da utilização de substâncias tóxicas comercializadas legalmente no mercado. A este respeito reforce-se a necessidade de assegurar a implementação do «Programa Antídoto Portugal – PAP».

A definição de planos de vigilância ativa, concertados com as várias autoridades e entidades com competências na matéria, e a utilização de novos métodos de fiscalização, a larga escala e em tempo real, poderão reformar e trazer uma maior eficácia a estas ações, nos termos aliás do que já é preconizado na legislação em vigor.

Por outro lado, a formação especializada, designadamente de agentes institucionais, e o desenvolvimento de plataformas, redes e compromissos de agentes e operadores é também matéria de importância primordial, também explícita na Estratégia da UE para a Biodiversidade 2020. Neste contexto destaca-se a importância do reforço das equipas de Vigilantes da Natureza e da formação contínua dirigida a autoridades policiais, Vigilantes da Natureza, militares da Guarda Nacional Republicana (Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente – SEPNA) e polícias da PSP (Brigadas de Proteção Ambiental – BriPA), bem como do desenvolvimento de campanhas de sensibilização para agentes autárquicos e judiciais, relativamente a questões de conservação da natureza e gestão da biodiversidade e geodiversidade.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento dos objetivos, identificados na matriz estratégica, 1.6. – Reforçar o quadro legal de regulamentação da conservação da natureza e biodiversidade e 1.7. – Reforçar o cumprimento do quadro legal de regulamentação da conservação da natureza e biodiversidade.

4.2.6 – Investigação e inovação

Apesar do esforço permanente que, de há longa data, se aplica na aquisição e atualização de informação, na prática as lacunas de conhecimento sobre o património natural nacional são repetidamente referidas como uma carência transversal no apoio ao sistema de gestão e de decisão. Na realidade, o objeto em questão é intrinsecamente dinâmico: sistemas naturais que interagem e que, por sua vez, dependem de elementos externos com comportamentos igualmente variáveis.

Releva-se assim a importância da existência de uma planificação nacional da produção científica orientada para a colmatação das lacunas de conhecimento e para apoiar, de modo informado, a prossecução dos compromissos jurídicos e políticos do país em matéria de conservação da natureza, incluindo a biodiversidade terrestre e marinha e a geodiversidade.

Persiste uma desatualização ou deficiência de informação sobre componentes relevantes da biodiversidade, nomeadamente, sobre a ocorrência geográfica e o estado de conservação de habitats naturais protegidos, sobre espécies autóctones da flora (com destaque para os Pteridófitos, relativamente aos quais não existem estudos relevantes nas últimas décadas) e também sobre espécies de invertebrados.

Ainda no âmbito da flora, mais concretamente no que diz respeito às espécies de briófitos, foram referidos ou descritos mais de 60 novos taxa para Portugal, a partir de 2001, o que mostra claramente a insuficiência de estudos em alguns grupos de plantas ou áreas geográficas.

No que diz respeito à avaliação do risco de extinção verifica-se a existência de grandes lacunas de informação, como é o caso das espécies vasculares da flora, dos invertebrados terrestres e dos peixes e invertebrados marinhos. Por outro lado, a informação referente aos estatutos de ameaça de espécies de vertebrados (répteis, anfíbios, peixes dulciaquícolas e mamíferos) encontra-se já parcialmente desatualizada.

Relativamente ao património geológico, torna-se necessário consolidar o conhecimento sobre a aplicação de geoindicadores para avaliar o grau de conservação de geossítios e a sua evolução, de modo a assegurar a correta gestão do património geológico, nomeadamente através de um reforço ou estabelecimento de intercâmbios entre geoparques portugueses com instituições congéneres, tanto ao nível europeu como no âmbito da Rede Global de Geoparques.

Em matéria de conhecimento deverá igualmente ser dada uma atenção especial aos processos de desertificação e de alterações climáticas, nomeadamente através da identificação de espécies autóctones típicas e indicadoras de zonas áridas e semiáridas, bem como da descrição da vulnerabilidade (resiliência) da biodiversidade aos processos de desertificação, à degradação do solo e às alterações climáticas.

Merece igualmente destaque o estudo da biodiversidade dos solos, essencial para a sustentabilidade das funções, processos e serviços prestados pelos ecossistemas, bem como a sua monitorização.

Torna-se ainda importante priorizar os trabalhos de experimentação e investigação que possam minimizar os danos provocados pelos agentes patogénicos que afetam a biodiversidade, com particular destaque para o impacte sobre espécies e habitats protegidos.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento do objetivo, identificado na matriz estratégica, 1.8. – Reforçar a investigação e inovação orientada para as prioridades de política de conservação da natureza, incluindo para a colmatação de lacunas de conhecimento de base.

4.2.7 – Monitorização do património natural

A lacuna ao nível de sistemas de monitorização com indicadores eficientes tem condicionado a capacidade de avaliar o grau de concretização das políticas de natureza e de biodiversidade e das políticas sectoriais, particularmente do seu impacte na conservação dos elementos do património natural.

Por esta razão, considera-se prioritário desenvolver um sistema coerente e abrangente de monitorização e acompanhamento da biodiversidade e da geodiversidade, fundamental para o apoio à tomada de decisão, e que deverá incluir indicadores robustos, tanto a uma macro escala como à escala operacional da gestão de espécies e habitats protegidos. Este sistema deve ser ancorado numa lógica de interoperabilidade, em sistemas já existentes ou previstos noutros instrumentos estratégicos ou programáticos, com indicadores e programas de monitorização relevantes para a política de conservação da natureza e biodiversidade.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento do objetivo, identificado na matriz estratégica, 1.9. – Garantir a estruturação de um sistema coerente e útil de monitorização continuada do estado de conservação dos valores naturais.

4.2.8 – Visibilidade do valor do património natural

Este eixo estratégico aborda as questões de sensibilização ambiental, comunicação e participação pública. Apesar de, na última década, se ter assistido a um notável progresso da participação da sociedade civil e a um aumento da consciência das populações para as questões da conservação da natureza, continua a existir falta de sensibilização do público para muitos dos aspetos relevantes, bem como dificuldade na transmissão de conceitos importantes.

A informação pública relativa ao valor intrínseco do património natural e a sua importância enquanto produtor de serviços ambientais, com repercussões para as atividades e o bem-estar humano, é uma questão de primeira importância. Deverá ser estabelecido um programa de formação e sensibilização para temas específicos de conservação da natureza dirigido à sociedade em geral. Especial ênfase deve ser dada à componente de educação ambiental no contexto dos programas e atividades curriculares e extracurriculares dos vários graus de ensino.

Por outro lado, a organização da informação existente num sistema integrado de informação georreferenciada sobre biodiversidade e geodiversidade, assim como o desenvolvimento de um mecanismo nacional de comunicação e de partilha de conhecimento, são outros dos requisitos necessários para que a informação seja útil, partilhável e, por essa via, aplicável nos diferentes domínios e sectores no suporte ao desenvolvimento de políticas. No domínio da partilha de informação é, assim, reconhecida a necessidade de garantir a consolidação definitiva e a interoperabilidade de sistemas de informação sobre biodiversidade e geodiversidade.

A par do conhecimento e da sua disponibilização, também a perceção sobre o valor do património natural deve ser reforçada com o aumento das ocorrências informativas, temáticas, nomeadamente através dos vários meios de comunicação social como a rádio, os jornais, a televisão e portais, bem como a realização de encontros e debates e o incentivo à participação pública em processos de decisão.

Sobre a partilha de informação destaca-se ainda a importância da organização de eventos de natureza científica e de divulgação sobre a biodiversidade e geodiversidade, pela troca de conhecimentos e de experiências que tais iniciativas proporcionam.

Face à escassez de informação sobre geodiversidade e património geológico em áreas protegidas, dirigida ao público visitante, torna-se necessário incrementar conteúdos sobre estes temas nas estratégias de informação e interpretação que se desenvolvem nestas áreas.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento do objetivo, identificado na matriz estratégica, 1.10 – Aumentar a visibilidade e perceção pública do valor do património natural e dos serviços de ecossistemas.

4.2.9 – Cooperação internacional

Nesta matéria propõe-se a integração das políticas de conservação da natureza e da biodiversidade nas relações externas de Portugal, e da participação nacional na governação internacional da biodiversidade, designadamente através do reforço da diplomacia verde e do estabelecimento de um quadro estratégico de coordenação da cooperação em matéria de conservação da natureza e biodiversidade.

Este quadro deve ser adequado à evolução e dinâmica da arquitetura internacional da cooperação, conforme os princípios acordados internacionalmente, designadamente na Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, na Agenda de Ação de Adis Abeba para o Financiamento do Desenvolvimento e demais acordos multilaterais no domínio do ambiente de que Portugal é Parte contratante.

Sendo o cumprimento das obrigações nacionais decorrentes de compromissos internacionais relevante para afirmação de Portugal a nível externo, incluindo da UE, propõe-se o reforço sustentado dos fluxos financeiros nacionais, públicos e privados, entre 2020 e 2030, em linha com esses compromissos.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento do objetivo, identificado na matriz estratégica, 1.11. – Reforçar a diplomacia verde e a participação nacional na governação internacional da biodiversidade.

4.3 – Eixo 2 – Promover o reconhecimento do valor do património natural

4.3.1 – Enquadramento

O mapeamento, a avaliação da condição e a valoração dos ecossistemas e dos serviços de ecossistemas tem sido comprovado como a metodologia mais robusta para tornar tangível a conservação da natureza e o valor da biodiversidade nos ciclos económicos, permitindo a sua efetiva integração e ponderação no quadro da gestão política e operacional dos países.

Percebe-se, assim, que se destaque a necessidade de conceber e adotar uma estratégia que vise o mapeamento dos ecossistemas existentes em Portugal e seus serviços mais relevantes. Neste contexto, importa ainda proceder a uma avaliação do seu estado de conservação, bem como levar a cabo uma valoração dos serviços prestados, tendo presente a simultânea identificação das prioridades de recuperação de ecossistemas degradados, identificando a natureza das intervenções a adotar para contrariar essa degradação.

4.3.2 – Valorização e remuneração dos serviços dos ecossistemas

A par do seu relevo para estancar a perda da biodiversidade e fornecer serviços de aprovisionamento e regulação eficientes assentes em ecossistemas saudáveis, o papel do SNAC assume progressiva relevância, designadamente as áreas protegidas da RNAP, a Rede Natura 2000, entre outras áreas classificadas. Com efeito, é cada vez mais notório o impacte que estas áreas podem ter para alavancar o desenvolvimento económico, na medida em que, pela sua excelência, concorrem para tornar o país num destino cada vez mais atrativo para residir e visitar. É necessário avaliar e dar valor a esta característica ‘cultural’ dos serviços destes ecossistemas.

A RNAP e a Rede Natura 2000 são ainda instrumentais para a concretização de objetivos de coesão territorial. É necessário dar expressão a um novo olhar sobre estas áreas, de modo a que possam contribuir para fomentar a economia local, criando empregabilidade e, deste modo, contribuindo para evitar a perda de população.

As novas atividades económicas ligadas ao uso sustentável dos recursos são primordiais, na medida em que podem promover o desenvolvimento das áreas classificadas, sendo certo que a presença e a atividade humana perene é fundamental para os objetivos de conservação que se ambicionam. Torna-se, portanto, estratégico dinamizar as dimensões de desenvolvimento social e económico sustentável destas áreas.

Os ecossistemas proporcionam uma ampla gama de benefícios diretos e indiretos. Florestas, espaços agrícolas e agroflorestais, zonas húmidas, rios, lagos e oceanos fornecem uma grande variedade de produtos (alimentos, água, matérias-primas), que estão na base do desenvolvimento das sociedades humanas. Para além desta função de aprovisionamento, os ecossistemas cumprem uma função singular na regulação dos diferentes ciclos naturais (água, ar e outros recursos naturais e genéticos essenciais à vida) e têm um valor cultural cada vez mais apreciado e mobilizador. Deste modo, considera-se fundamental criar as condições para levar a cabo uma valoração dos principais serviços prestados pelos ecossistemas, a nível nacional, regional e local, visando a sua contabilização económica assente numa estratégia de utilização sustentável e eficiente dos recursos, e definir modelos que permitam a integração deste valor nos diferentes sectores de atividade, na economia e nas finanças.

Nesta perspetiva, é também crucial estudar metodologias para a remuneração dos serviços dos ecossistemas, que, a título experimental, serão testadas em áreas protegidas selecionadas para constituírem um projeto-piloto neste âmbito.

Esta valoração e remuneração não dispensa a concretização de um processo nacional (e/ou regional) de mapeamento e de espacialização dos ecossistemas e dos serviços dos ecossistemas, assim como da avaliação do seu estado e condição, e em conjunto, baseada em metodologias robustas como as que têm vindo a ser desenvolvidas na UE, através da Comissão Europeia – Joint Research Center e da Agência Europeia do Ambiente – e em colaboração com os Estados Membros e diversos stakeholders, no âmbito da execução da meta 2 da Estratégia de Biodiversidade da UE 2020. Estas metodologias são coerentes com as classificações de serviços dos ecossistemas desenvolvidas no âmbito do Millenium Ecosystem Assessment, TEEB (The Economics of Ecosystems and Biodiversity) e CICES (Common International Classification of Ecosystem Services). A valoração dos serviços dos ecossistemas revela-se indispensável para o desenvolvimento de metodologias de pagamentos dos mesmos serviços, no âmbito das diferentes políticas sectoriais.

No que diz respeito a ações de recuperação de ecossistemas, as prioridades estão focadas nos que suportam e estão relacionados com a promoção da resiliência a riscos, incentivando e apoiando a recuperação e a requalificação ambiental e paisagística das áreas afetadas. Particularmente relevante, é a promoção e a recuperação da conectividade assegurada pelos ecossistemas terrestres, através de infraestruturas verdes, e ecossistemas aquáticos (dulciaquícolas e de transição) e marinhos.

Considera-se, contudo, que, independentemente das prioridades de recuperação já identificadas, deve ser preparado um plano de ações prioritárias de recuperação de ecossistemas que oriente a planificação e execução dos investimentos públicos e privados neste domínio.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento dos objetivos, identificados na matriz estratégica, 2.1. – Promover o mapeamento e avaliação da condição dos ecossistemas e melhorar a sua capacidade de fornecer, a longo-prazo, serviços relevantes para o bem-estar humano e 2.2. – Evidenciar a economia da biodiversidade e dos ecossistemas, em particular o seu papel para o desenvolvimento sustentável e qualidade de vida.

4.3.3 – Instrumentos ao nível da fiscalidade verde

Neste âmbito, a ENCNB 2030 prevê como seu propósito constituir uma prática de divulgação dos montantes de despesa pública, assim como um sistema de marcadores de despesa pública em matéria de conservação da natureza e biodiversidade.

São igualmente estabelecidos objetivos e metas para consolidar o contributo dos instrumentos económicos com relevância para a utilização sustentável da biodiversidade.

Complementarmente, interessa revisitar o mecanismo de financiamento com incidência na Lei das Finanças Locais, tendo em vista tornar operacional e eficaz a sua aplicação, de modo a promover o investimento na conservação do património natural.

Prevê-se também avaliar o impacte dos incentivos e subsídios na conservação da biodiversidade, visando adotar um plano público de prioridades e metas de eliminação, reforma e phasing-out de subsídios prejudiciais e de promoção e aplicação de incentivos positivos.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento dos objetivos, identificados na matriz estratégica, 2.3. – Aumentar o investimento público em conservação da natureza e biodiversidade, 2.4. – Consolidar o contributo dos instrumentos fiscais para a conservação da natureza e utilização sustentável da biodiversidade, e 2.5. – Assegurar uma aplicação coerente dos sistemas de incentivos e subsídios com os objetivos de conservação e utilização sustentável da biodiversidade.

4.4 – Eixo 3 – Fomentar a apropriação dos valores naturais e da biodiversidade

4.4.1 – Enquadramento

Este é o nível da Estratégia com que pretende assegurar objetivos e metas relativos ao aprofundamento da integração da biodiversidade e da proteção do património geológico em sectores produtivos e económicos fundamentais, seja daqueles que utilizam os recursos da biodiversidade e que por isso dependem de ecossistemas estrutural e funcionalmente saudáveis, seja dos que, por via da sua atividade, são suscetíveis de gerar maiores impactes negativos sobre um ou mais componentes da biodiversidade e do património geológico.

Em ambos os casos, são prosseguidos objetivos de sustentabilidade na utilização e afetação dos recursos, através da minimização dos impactes, da promoção e valorização dos serviços dos ecossistemas ao longo de toda a cadeia produtiva, numa lógica económica circular e eficiente, que assegure a manutenção e mesmo a promoção da diversidade biológica, contabilizando económica e socialmente os serviços por ela proporcionados através dos ecossistemas que suporta.

Simultaneamente, é dado relevo à necessidade de aprofundar a integração destes objetivos noutras políticas horizontais e de suporte, numa lógica mutuamente apoiada de aplicação, com destaque para a água, o mar, o planeamento e ordenamento do território e a ação climática e energia. É o eixo da Estratégia particularmente dirigido para a integração sectorial.

São, assim, objetivos deste eixo estratégico aprofundar o contributo da agricultura e da silvicultura para a conservação da natureza, garantir a utilização sustentável dos recursos aquáticos, promover a articulação das metas de clima e energia com os objetivos de conservação da natureza e biodiversidade, aumentar a qualificação da oferta de serviços de turismo de natureza, aprofundar a aplicação integrada e coordenada das políticas de gestão de qualidade da água e de promoção e gestão dos ecossistemas, espécies e habitats dependentes das massas de água, assegurar a sustentabilidade da utilização de recursos genéticos marinhos e terrestres, diminuir a perda de solo associada ao uso inadequado face à conservação dos valores naturais e garantir o reforço da integração dos objetivos de conservação da natureza e biodiversidade nos instrumentos de ordenamento do espaço terrestre e marítimo.

Em termos de planeamento e ordenamento do território, os objetivos e metas considerados decorrem naturalmente dos desafios e oportunidades geradas pelo desenvolvimento dos novos paradigmas de planeamento e ordenamento dos espaços marítimo e terrestres e que decorrerão ao longo de todo o período de vigência da Estratégia. Este processo deverá contar necessariamente com o envolvimento ativo dos agentes socioeconómicos, das ONG e das entidades públicas nacionais, regionais e municipais, em diversos níveis da sua atuação.

Igualmente fundamental é reforçar a este nível os esforços já lançados para promover e valorizar a integração da biodiversidade nas estratégias, políticas e cadeias de produção das empresas, reforçando abordagens como a iniciativa Business & Biodiversity e assegurando um crescente reconhecimento das oportunidades que a economia da biodiversidade e dos ecossistemas pode oferecer ao sector privado da economia, seja ao nível dos produtores, seja nas escalas transformadoras e industriais, incluindo o turismo, seja no sector financeiro.

Sob este eixo são, assim, revistas e preconizadas metas de integração dos objetivos de conservação da natureza e biodiversidade em todos os programas sectoriais e regionais, bem como nos instrumentos de ordenamento do espaço marítimo, assegurando a coerência da aplicação de ambos os regimes em áreas classificadas que abrangem espaço terrestre e marinho.

Refira-se igualmente a necessidade assegurar a integração da componente da biodiversidade nas políticas de adaptação às alterações climáticas, seja para evidenciar a relevância do contributo da biodiversidade para a agenda climática, seja para assegurar a sustentabilidade da ação climática, prevenindo que daí decorram fatores prejudiciais que promovam a degradação dos ecossistemas e dos serviços de regulação e aprovisionamento que devem assegurar.

4.4.2 – Agricultura

É inegável o efeito que a transformação do solo agrícola e das práticas agrícolas têm nos ecossistemas, consequentemente no equilíbrio das espécies. A atividade agrícola constitui um dos pilares fundamentais para a conservação da natureza. É, por isso, essencial que as políticas públicas no domínio da agricultura ponderem, a um nível estratégico, a conservação dos solos, bem como o impacte sobre a biodiversidade, sendo algumas das espécies muito relevantes para o próprio sucesso da economia agrícola.

Subjacente ao objetivo para o sector agrícola está a aplicação de forma coerente, em todo o território, dos apoios da Política Agrícola Comum (PAC), em particular através dos PDR e dos pagamentos ecológicos do regime de pagamentos diretos, em especial nas áreas classificadas, assegurando a prossecução dos objetivos de gestão agrícola e florestal das áreas protegidas e da Rede Natura 2000.

Este objetivo tem como pressuposto que todos os apoios da PAC asseguram a sustentabilidade dos investimentos agrícolas e florestais, promovendo a competitividade do sector numa lógica multifuncional, cooperativa e inovadora e, simultaneamente, a promoção da qualidade estrutural e funcional dos ecossistemas e seus serviços.

Deve reconhecer-se que o abandono generalizado da atividade agrícola e florestal conduz à degradação e perda de património natural. Deste modo, é urgente travar este abandono, criando condições para a melhoria da rentabilidade económica das zonas mais deprimidas, promovendo a viabilidade económica das atividades responsáveis pela conservação de uma parte significativa de espécies, habitats e ecossistemas dependentes de práticas agro-silvo-pastoris específicas.

Pressupõe, igualmente, a definição e execução de planos de ação, quer no domínio do controlo sanitário, quer fitossanitário, assim como do plano de ação nacional para o uso sustentável de produtos fitofarmacêuticos e ainda a implementação dos planos estratégicos nacionais para os recursos genéticos animais e vegetais.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento do objetivo, identificado na matriz estratégica, 3.1. – Aprofundar o contributo da agricultura para os objetivos de conservação da natureza e da biodiversidade.

4.4.3 – Floresta

A floresta constitui parte muito significativa da ocupação do território e, tal como as áreas agrícolas, desempenha uma função estruturante para a conservação da natureza e biodiversidade. A floresta, enquanto habitat, é o suporte de um conjunto muito diversificado de espécies.

O desenvolvimento da economia da floresta tem raízes profundas no país e nela estão ancoradas atividades económicas essenciais. É importante manter condições para que tais atividades se mantenham e abrir espaço para uma maior diversificação dos serviços da floresta. Esta diversificação pode constituir uma oportunidade para a presente Estratégia, na medida em que pode, por essa via, aumentar a expressão da floresta autóctone, assim como da própria manutenção dos espaços florestais consolidados.

Parte fundamental neste processo são os instrumentos de planeamento florestal, designadamente os Programas Regionais de Ordenamento Florestal, mas também os instrumentos de maior escala, como sejam os Planos de Gestão Florestal (PGF).

Com efeito, os PGF têm um papel na conservação e gestão sustentável da floresta, integrando-se numa rede de instrumentos essenciais para a aplicação das políticas florestal, de recursos hídricos, de conservação, de desenvolvimento industrial, entre algumas das mais relevantes. A elaboração e execução dos PGF, para uma parte substancial da superfície de espaços florestais portugueses, constituem hoje um dos principais desafios do sector.

Destaca-se ainda como fundamental a recuperação de ecossistemas florestais abandonados, particularmente em áreas englobadas no SNAC.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento do objetivo, identificado na matriz estratégica, 3.2. – Aprofundar o contributo da silvicultura para os objetivos de conservação da natureza e da biodiversidade.

4.4.4 – Mar

Os objetivos e metas aqui previstos visam aprofundar, no contexto das Políticas Marítima Integrada e Comum de Pescas e instrumentos associados, o apoio à conservação e recuperação dos recursos biológicos explorados e dos ecossistemas e espécies marinhas em geral, ao desenvolvimento sustentável da aquicultura e à promoção da economia do mar e do crescimento azul, em estreita integração com regimes de ordenamento do espaço marítimo e avaliação ambiental adequados e assegurando as metas atrás referidas.

Também no mar os efeitos das alterações climáticas, através do aumento da temperatura das águas e da sua acidificação, estão a induzir alterações significativas nas comunidades marinhas, bem como a migração, para latitudes mais setentrionais, de muitas populações.

Ao nível dos ecossistemas marinhos, pretende-se que sejam identificados os «ecossistemas marinhos vulneráveis», procedendo-se à sua integração na Rede Fundamental de Conservação da Natureza, sendo dotados de planos de gestão da pesca (incluindo sistemas de cogestão) e das demais atividades marítimas, nos termos do regime de uso e planeamento espacial do espaço marítimo nacional e tendo em conta os princípios de gestão baseados em ecossistemas.

No caso particular dos habitats bentónicos, serão desenvolvidos planos de adaptação de práticas de pesca lesivas, incluindo no-take zones.

Importa ainda concretizar um programa nacional de avaliação das capturas acessórias de mamíferos, aves e répteis marinhos, e de ensaio e utilização de artes e tecnologias que diminuam o seu impacte.

Ao nível da aquicultura, destaca-se a avaliação de impacte da utilização de espécies exóticas ou transgénicas e do impacte decorrente da recolha de ovos ou larvas de espécies autóctones.

Espera-se globalmente contribuir para o desenvolvimento e a prossecução das metas de «Bom Estado Ambiental» do ambiente marinho enquadradas na DQEM e o estado de conservação favorável das espécies e habitats protegidos das Diretivas Aves e Habitats, de modo integrado entre si e com as metas de qualidade ecológica da DQA.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento dos objetivos, identificados na matriz estratégica, 3.3. – Garantir a utilização sustentável dos recursos marinhos e 3.4. – Promover e articular a integração dos objetivos da conservação da natureza e biodiversidade nos planos, programas, instrumentos e normas do espaço marítimo.

4.4.5 – Águas interiores e sistemas fluviais

Nas massas de águas interiores e nos sistemas fluviais, o foco consiste na elaboração ou revisão de planos de gestão e exploração dos recursos aquícolas ou de outros documentos reguladores da pesca.

Pretende-se, assim, aprofundar a aplicação integrada e coordenada das políticas de gestão de qualidade e quantidade da água e de promoção e gestão dos ecossistemas, espécies e habitats dependentes das massas de água (de superfície e subterrâneas), bem como de manutenção e recuperação dos serviços dos ecossistemas associados ao aprovisionamento de água em quantidade e qualidade para o consumo doméstico e industrial, à conservação do solo e à manutenção da biodiversidade. Neste sentido, é uma meta deste eixo assegurar que os Planos de Gestão de Região Hidrográfica (PGRH) integrem as metas de qualidade ecológica, com medidas e opções essenciais à prossecução dos objetivos de gestão relevantes das áreas protegidas e da Rede Natura 2000.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento do objetivo, identificado na matriz estratégica, 3.5. – Garantir a utilização sustentável dos recursos em águas interiores e sistemas fluviais.

4.4.6 – Energia e indústria extrativa

Relativamente a estes sectores produtivos, o foco será, numa lógica de transição para uma economia de baixo carbono, a sustentabilidade das atividades de prospeção e extração dos recursos minerais, produção e distribuição de energia, apostando no reforço da produção e da inovação tecnológica sustentáveis das energias renováveis e na eficiente utilização dos recursos, de modo a minimizar a afetação da biodiversidade em todos os seus níveis. As redes energéticas assistiram a um grande desenvolvimento, respondendo aos desafios da diversificação de fontes de energia e de sistemas de produção, o que tem conduzido a um redesenho da rede de transporte.

Para este objetivo será necessário estabelecer os critérios da significância do impacte das fontes de energias renováveis sobre o património natural, com base nos processos de avaliação e monitorização ambiental, incluindo no ambiente marinho.

Refira-se, a propósito, a necessidade de dar continuidade aos mecanismos de adaptação e correção no âmbito do planeamento da instalação das linhas de transporte e distribuição de energia. Merecem referência a este respeito os protocolos estabelecidos desde 2003 com diferentes parceiros, nos quais se inclui o ICNF, e que muito contribuíram para o conhecimento científico, assim como para a correção de pontos de maior sensibilidade da avifauna.

Do mesmo modo, preconizam-se ações de recuperação do passivo ambiental da indústria extrativa, nomeadamente no que diz respeito a áreas de exploração de recursos geológicos abandonadas. Algumas destas áreas podem ser adaptadas para uma outra utilização ambientalmente sustentável, como é o caso de um uso educativo para alunos de diversos níveis de ensino ou até mesmo um uso recreativo/turístico. No âmbito da concretização de novas concessões para prospeção, pesquisa e exploração de recursos minerais, designadamente em meio marinho, revela-se essencial integrar requisitos de conservação do património natural nos processos de tomada de decisão, no âmbito dos procedimentos de avaliação de impacte ambiental.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento dos objetivos, identificados na matriz estratégica, 3.6. – Promover a articulação das metas de clima e energia com os objetivos de conservação da natureza e biodiversidade e 3.7. – Assegurar a conservação da biodiversidade e da geodiversidade nas atividades de prospeção, pesquisa e exploração de recursos minerais.

4.4.7 – Turismo

O turismo e as atividades conexas em áreas classificadas são aqui abordados no sentido de aumentar a qualificação da oferta de serviços e o seu contributo para a sustentabilidade da gestão das áreas classificadas, bem como também na perspetiva de sustentar o contributo que o património natural pode prestar ao desenvolvimento de um sector estratégico na economia e no PIB nacional. Trata-se, conjugadamente com o desenvolvimento dos processos de contabilização económica (accounting) dos serviços dos ecossistemas (ver Eixo 2), de introduzir e desenvolver neste sector um segmento de crescimento associado ao capital natural único do país.

Pretende-se o desenvolvimento de uma atividade turística compatível com a preservação do património natural, nomeadamente através da qualificação dos espaços e infraestruturas de suporte em áreas classificadas (designadamente centros de receção, núcleos museológicos, sinalética, trilhos, infraestruturas de observação, entre outras), compatíveis com as características ecológicas, geológicas e culturais de cada área.

A marca «Natural.PT», baseada em produtos e serviços associados à RNAP, apresenta uma componente de projeção do seu potencial turístico, que procura criar sinergias com iniciativas e intervenções no âmbito das Administrações Regionais Autónomas e Locais de gestão sustentada dos recursos endógenos naturais e do património cultural, contribuindo para o aumento de número de visitantes.

O Programa Nacional de Turismo de Natureza (PNTN), aprovado através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 51/2015, de 21 de julho, alargado em 2009 ao território do SNAC e definido em termos do seu âmbito, dos seus objetivos e das ações a desenvolver, visa contribuir para a promoção e a afirmação dos valores e as potencialidades das áreas classificadas, propiciar a criação de produtos e serviços turísticos adequados e promover a atividade de visitação.

Também a Estratégia para o Turismo 2027, aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 134/2017, de 27 de setembro, define um referencial estratégico para Portugal como destino turístico sustentável, onde o desenvolvimento turístico assenta na conservação e na valorização do património natural e cultural do país. De referir, contudo, a possibilidade de existência de sobrecarga turística em alguns locais e destinos, designadamente de natureza ambiental e social, com os correspondentes impactes negativos. Esta fragilidade, a acautelar na programação da atividade turística, é, aliás, identificada na referida Estratégia.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento do objetivo, identificado na matriz estratégica, 3.8. – Promover a oferta e qualificação dos serviços no domínio do turismo de natureza, que concorram para a gestão sustentável dos territórios e salvaguardem o património natural e identidade cultural.

4.4.8 – Utilização de recursos genéticos

Tendo presentes as normas globais inscritas no Protocolo de Nagoya à Convenção sobre a Diversidade Biológica, adotado em 2010, importa instalar e aplicar, nos prazos previstos nesse âmbito, o regime nacional que regulará a conformidade de utilização dos recursos genéticos pelos operadores nacionais, atendendo ainda ao Regulamento que estabelece o regime a nível da UE.

Neste âmbito procurar-se-á assegurar a conformidade da utilização dos recursos genéticos com os regimes legais de acesso dos países fornecedores desses recursos, sobretudo nos sectores conexos com a biotecnologia e a investigação científica. Importa agora que Portugal avalie o impacte do possível desenvolvimento de um regime de acesso aos recursos genéticos, no território terrestre e marítimo sob jurisdição nacional, e da contratualização dos termos da partilha dos benefícios que decorrem da utilização destes recursos obtidos no território português.

Importa igualmente rever o regime legal de acesso e utilização dos recursos genéticos para a alimentação e agricultura, no âmbito dos instrumentos juridicamente vinculativos que regulam estas matérias a nível internacional e em linha com o disposto no plano estratégico nacional para os recursos genéticos vegetais.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento do objetivo, identificado na matriz estratégica, 3.9. – Assegurar a sustentabilidade da utilização de recursos genéticos terrestres e marinhos.

4.4.9 – Infraestruturas de transporte e de comunicações

O investimento efetuado nas duas últimas décadas em Portugal em infraestruturas de transporte viário resultou na concretização de uma significativa parte da rede prevista no Plano Rodoviário Nacional. Importa avaliar em que medida é que as redes de infraestruturas podem estar a contribuir para o efeito barreira e a fragmentação de habitats, bem como o efeito de exclusão ou de mortalidade, de modo a sustentar intervenções que visem corrigir eventuais impactes.

Outra realidade que importa avaliar diz respeito à eventual utilização pelas espécies dos canais criados por tais infraestruturas, permitindo fomentar por essa via a conectividade entre habitats, promovendo a gestão dos espaços verdes de forma a suportar estas ligações. Já as infraestruturas de telecomunicações e os serviços que podem proporcionar são essenciais para a dinamização das estratégias de visitação, a manutenção e a salvaguarda das áreas classificadas.

Assegurar a partilha de infraestruturas de suporte pelos operadores nas áreas classificadas e dinamizar a constituição de uma cobertura adequada de telecomunicações, designadamente nas áreas protegidas, será uma medida de grande alcance, permitindo possuir melhores condições de segurança para residentes e visitantes, atuar rapidamente sobre ocorrências, facilitar a visitação pela disponibilização de informação em tempo real e permitir implementar sistemas de monitorização do número de visitantes. Esta infraestrutura constitui parte importante numa mudança de paradigma de usufruto das áreas protegidas e será motor da inovação na sua gestão.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento do objetivo, identificado na matriz estratégica, 3.10. – Assegurar a sustentabilidade das infraestruturas de transporte e comunicações.

4.4.10 – Empresas e património natural

A consolidação de uma marca de excelência como a «Natural.PT», qualificadora dos recursos endógenos reais e potenciais dos territórios mais representativos da singularidade natural do território português, da sua biodiversidade, geodiversidade e cultura, funcionará como alavanca privilegiada para a projeção do capital natural.

Tal facilitará os fatores de desenvolvimento local de base sustentável necessários à promoção da qualidade de vida, da sustentação de uma estrutura económica e social capaz de gerar a fixação e rejuvenescimento das populações acima de níveis críticos, gerando emprego e lógicas inovadoras e multifuncionais de utilização dos espaços rurais, particularmente no interior e nas áreas mais despovoadas.

É ainda objetivo deste eixo estratégico promover e valorizar a integração da biodiversidade nas estratégias, políticas e cadeias de produção das empresas, reforçando abordagens como a iniciativa Business & Biodiversity.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento dos objetivos, identificados na matriz estratégica, 3.11. – Aumentar a qualificação da oferta de produtos e serviços, integradores do património natural e cultural, contribuindo para a sustentabilidade da gestão dos territórios das áreas classificadas e 3.12. – Promover e valorizar a integração da conservação da natureza e da biodiversidade nas estratégias, políticas e processos operacionais das empresas.

4.4.11 – Instrumentos de planeamento e Avaliação Ambiental de propostas e projetos de desenvolvimento

O atual regime jurídico de políticas públicas de ordenamento do território, solo e urbanismo estabelece que os planos de âmbito municipal e intermunicipal são os instrumentos que determinam a classificação e a qualificação do uso do solo e cujas regras vinculam direta e imediatamente os particulares. Constitui, assim, uma prioridade a elaboração de programas especiais de ordenamento das áreas protegidas e consequente integração das suas diretrizes no conteúdo dos Planos Municipais que reforçarão, no seu conteúdo e substância, os princípios de conservação da natureza.

Prevê-se ainda a arquitetura de um subsistema de monitorização e avaliação da aplicação dos instrumentos de gestão territorial, com indicadores adequados à monitorização e avaliação da realização e do resultado da prossecução dos objetivos de conservação da natureza e de utilização sustentável de recursos naturais, designadamente no âmbito do Programa Nacional da Política do Ordenamento do Território.

Para além dos instrumentos de planeamento, importa destacar o papel dos instrumentos de avaliação ambiental prévia, como sejam a Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) de planos e programas e a Avaliação de Impacte Ambiental (AIA) ou Avaliação de Incidências Ambientais (AIncA) de projetos.

Ainda que não sejam instrumentos na esfera direta da Estratégia, estes instrumentos merecem referência pelo seu papel fundamental para a concretização de propósitos essenciais de salvaguarda do ambiente e de conservação do património natural, através da aplicação do princípio da precaução e da abordagem hierárquica da avaliação ambiental prévia, que assenta em evitar os impactes de planos e projetos, minimizando-os caso tal não seja possível e, a jusante, compensando de modo proporcional e prévio ao licenciamento os impactes induzidos, quando os mesmos sejam irreversíveis e não mitigáveis, e demonstrada que seja, antecipadamente, a ausência de alternativas conjugada com o reconhecimento de imperativo interesse público. Neste contexto, e sem colocar em causa as obrigações legalmente consagradas, podem ser previstas abordagens e soluções de não perda líquida de biodiversidade.

É necessário reforçar uma abordagem mais sistémica a instrumentos de planeamento, integrando a AAE, robustecendo a qualidade e transversalidade das análises e, consequentemente, melhorando as propostas de desenvolvimento.

Em relação à AIA, e tendo em vista uma progressiva melhoria dos procedimentos previstos por este regime jurídico, considera-se da maior importância atualizar a tipologia de projetos face às atividades económicas emergentes, designadamente no meio marinho, bem como reforçar o acompanhamento da fase de Pós-avaliação dos projetos.

Complementarmente, torna-se necessário desenvolver um maior esforço no aumento do conhecimento sobre a eficácia das medidas de mitigação e compensação, tendo em vista corrigir ou ajustar o figurino que tem sido utilizado, particularmente nos casos em que se revelem desajustadas.

A implementação das medidas de concretização referidas contribuem para o cumprimento dos objetivos, identificados na matriz estratégica, 3.13. – Garantir a integração dos objetivos de conservação da natureza e biodiversidade nos instrumentos de ordenamento, estratégias, planos e programas, assegurando a coerência de aplicação de regimes nas áreas classificadas e sua conectividade e 3.14. – Atualizar o regime jurídico de avaliação de impacte ambiental.

4.5 – Matriz estratégica

A matriz estratégica da ENCNB 2030, referente à concretização das matérias propostas nos três eixos estratégicos fundamentais de execução da política de conservação da natureza e biodiversidade, com um total de 30 objetivos (11 no Eixo 1, cinco no Eixo 2 e 14 no Eixo 3) e 104 medidas de concretização, consta no Quadro Síntese.

As medidas de concretização de cada objetivo são detalhadas através de indicadores de resultado, prazo de execução e meios de verificação, que são categorizados com a atribuição de prioridades variáveis entre 1 e 3, a saber:

. Prioridade 1: Concretização essencial para a execução da ENCNB 2030;

. Prioridade 2: Concretização importante para a execução da ENCNB 2030;

. Prioridade 3: Concretização de importância complementar para a execução da ENCNB 2030.

Esta matriz aponta igualmente para o enquadramento financeiro da operacionalização de cada medida de concretização, bem como o seu suporte jurídico e legal. Entre os instrumentos financeiros são de destacar os programas operacionais do quadro de financiamento europeu e o Fundo Ambiental, criado pelo Decreto-Lei n.º 42-A/2016, de 12 de agosto.

A componente institucional e social da ENCNB 2030 é particularmente evidenciada com a definição nesta matriz estratégica das entidades responsáveis e de um leque alargado de outras entidades intervenientes na operacionalização das medidas de concretização. Estas entidades integram a Administração Central e as Autarquias Locais, bem como as Regiões Autónomas e representantes da sociedade civil, da Academia e das organizações sectoriais relevantes, sendo que as entidades responsáveis foram identificadas atendendo às suas competências e áreas de intervenção direta.

A matriz estratégica é, assim, essencial para a definição de uma estrutura de planeamento e acompanhamento da execução da ENCNB 2030, promovendo a complementaridade e criando sinergias entre sectores, dinamizando a participação da sociedade civil nos processos de decisão e racionalizando meios e recursos.

5 – Financiamento e Recursos

5.1 – Enquadramento

O presente capítulo sistematiza a necessidade de financiamento no domínio da conservação da natureza e os principais instrumentos financeiros hoje disponíveis para as concretizar.

Para além do reforço de recursos de proximidade que importa dotar a autoridade nacional para a conservação da natureza e biodiversidade, um dos aspetos mais relevantes é a necessidade da existência de quadros estratégicos e programáticos, contendo conjuntos de ações estruturadas e articuladas entre si, e que permitam a otimização na mobilização de recursos financeiros necessários.

A necessidade de uma ação perseverante na elaboração de planos de gestão coerentes para as áreas classificadas, de planos de ação para as espécies e outras intervenções ao nível dos habitats que sejam transversais ao território é reforçada. Trata-se duma ação fundamental por parte da autoridade nacional para a conservação da natureza e biodiversidade, a que se deve juntar, na mesma lógica, a definição de planos consistentes de monitorização e de vigilância.

Não obstante a elevada especificidade do tema e a escala do país, é também relevante fomentar a criação de uma base alargada de entidades, que complementem a autoridade nacional para a conservação da natureza e biodiversidade, permitindo melhorar a capacidade de execução dos objetivos da ENCNB 2030.

Para este efeito é necessário assegurar estabilidade no financiamento ao longo do tempo para os múltiplos projetos, de modo a permitir dar perenidade e segurança às diferentes organizações. É importante ainda apostar na qualificação e capacitação de tais organizações para que possam reunir condições de elegibilidade e capacidade de gestão perante os requisitos dos diferentes programas, em particular quando esteja em causa o financiamento por via de fundos comunitários.

5.2 – Sistematização das Atividades a Conduzir

O financiamento da conservação da natureza deve destinar-se, no essencial, a apoiar a concretização das atividades que se podem sistematizar nos seguintes grandes grupos:

. Planos de gestão e de valorização de áreas classificadas, designadamente das áreas protegidas, Rede Natura 2000 e Reservas da Biosfera;

. Planos de ação para espécies;

. Planos de ação para intervenção em habitats (numa lógica transversal e que extravasa as áreas classificadas como seja, por exemplo, o controlo de espécies exóticas);

. Planos de monitorização (e consequente especificação das ações);

. Processos de inovação;

. Processos de suporte (como seja o Natural.PT e outros instrumentos que promovem ou apoiam o processo de gestão);

. Vigilância.

Destas atividades, duas assumem particular destaque em razão do impacte e volume de financiamento que lhe tem sido dirigido, a seguir detalhadas.

5.2.1 – Investimento em áreas classificadas e recuperação de habitats

Tal como referido, as áreas protegidas beneficiarão se para as mesmas forem desenvolvidos planos de valorização concertados e partilhados com os parceiros no território, designadamente com os municípios.

Tais planos terão como fundação os respetivos programas de ordenamento, mas devem ser complementados com ações de âmbito mais alargado, considerando as dimensões socioculturais e económicas, associadas à valorização do território.

O modelo de cogestão que se propõe desenvolver tem como um dos seus pontos essenciais a construção desses planos de valorização, considerando um horizonte mais lato, concebendo um modelo de desenvolvimento ambiental e socioeconómico dos territórios e respetivo plano de financiamento.

Pela singularidade de cada área protegida, esta é uma estratégia que terá de ser delineada caso-a-caso. A adoção de modelos de cogestão facilitará a articulação de intenções e a majoração do efeito por essa via e permitirá atingir resultados de mais largo alcance. Facilitará também o acesso a linhas de financiamento, porquanto ficará evidente a convergência dos projetos para benefício da área e dos seus objetivos de conservação.

Complementarmente, o plano de valorização deve conter, em si mesmo, o desenvolvimento de soluções de autofinanciamento, designadamente das operações correntes em cada área protegida e se possível o próprio reinvestimento. O aprofundamento de uma cultura sistémica nesta gestão e envolvendo um maior número de áreas pode sustentar a adoção de soluções transversais integradas num enquadramento fiscal adequado.

Este modelo pode ser aplicável ao conjunto de áreas que compõem o SNAC, sendo que, no momento em que a ENCNB 2030 foi desenvolvida, decorrem duas iniciativas paralelas que visam dinamizar esta abordagem, designadamente o Projeto-Piloto do Tejo Internacional (que visa testar um processo de cogestão numa área protegida de âmbito nacional) e o projeto da Rede Nacional das Reservas da Biosfera da UNESCO (assente no financiamento proveniente do programa EEA Grants – Mecanismo Financeiro do Espaço Económico Europeu).

Dentro deste quadro importa também destacar o Parque Nacional da Peneda-Gerês, onde os cinco municípios do Parque, em conjunto com o ICNF, desenvolveram e concretizam um Plano de Valorização. A Associação de Desenvolvimento das Regiões do Parque Nacional da Peneda-Gerês (ADERE PG) representa um paradigma que se destaca no contexto das áreas protegidas de âmbito nacional, na medida em que reúne os municípios, o ICNF e outras entidades entre os seus associados, desempenhando um papel instrumental na valorização do Parque Nacional.

Tal plano é financiado por via do Fundo Ambiental e também pelos municípios. A contrapartida nacional é alavancada no financiamento obtido junto de diferentes fundos comunitários.

No quadro do investimento na recuperação e regeneração de habitats, há que considerar, uma vez mais, o contributo orientador que advirá dos programas de ordenamento das áreas protegidas e dos planos de valorização que se venham a conceber dos planos de gestão das ZEC, mas também dos planos de controlo das vias prioritárias de propagação de espécies exóticas.

5.2.2 – Planos de ação para espécies

Os planos de ação para as espécies assumem um carácter transversal e que transcendem as áreas classificadas.

Neste contexto, há a considerar o esforço despendido sobre duas espécies em particular.

No caso do lobo ibérico, pretende-se que o Plano de Ação para a Conservação do Lobo Ibérico em Portugal promova uma aposta maior na prevenção de ataques do lobo, permitindo alterar o paradigma atual, muito assente no pagamento de prejuízos.

Acresce o Plano de Ação para a Conservação do Lince Ibérico em Portugal 2015-2020, que traduz um caso de sucesso a nível mundial e que tem projetado a Península Ibérica como um exemplo de articulação em torno de um projeto comum, visando salvar da extinção esta espécie. No que concerne ao lince ibérico, devem perseverar os esforços na reintrodução criteriosa da espécie em Portugal, devendo ser assegurados os meios financeiros que permitam a continuação e consolidação dos programas ex situ e in situ, considerando ainda que não se perspetiva que este último possa continuar a ser apoiado em financiamento comunitário nos mesmos moldes que até 2017.

Antevê-se que qualquer uma destas ações ficará quase integralmente dependente do financiamento direto do Estado e com possibilidade muito limitada, à exceção de ações de investimento novas, ao recurso a cofinanciamento comunitário.

Os encargos correntes destes dois projetos correspondem a um valor médio anual na ordem dos 1,5 M(euro), a que há que somar o esforço em curso no maneio de habitats, apoiado por um conjunto de entidades, para além da esfera da autoridade nacional para a conservação da natureza e biodiversidade e em que participam os municípios e as empresas, e que não deverá sofrer alterações até ao ano horizonte de 2030.

Pese embora o valor aplicado noutras espécies tenha uma expressão negligenciável quando comparada com esta realidade, deverão ser concretizadas as condições para sustentar os respetivos planos de ação.

Para além dos Planos de Ação já aprovados e em fase de implementação, está em fase final o referente às aves necrófagas.

5.3 – Situação atual do financiamento público da conservação da natureza

Como se reconhece, muito da ação em matéria de conservação da natureza tem sido fortemente alavancada pelos programas comunitários e há a expectativa que no próximo Programa de Ação da UE se mantenha a aposta na biodiversidade, especialmente relevante no contexto das alterações climáticas.

No Continente, o esforço direto em conservação da natureza e biodiversidade, sem contabilizar os custos de estrutura do ICNF, foi programado para 2017 em cerca de 4,76 M(euro), valor previsto no orçamento do Fundo Ambiental. As verbas especificamente orientadas para projetos na conservação da natureza no Fundo Ambiental foram cerca de 6 vezes superiores ao que tradicionalmente estava disponível no extinto Fundo para a Conservação da Natureza e da Biodiversidade.

Destas verbas, cerca de 3,6 M(euro) corresponde ao financiamento direto de ações a concretizar pela autoridade nacional para a conservação da natureza e biodiversidade. Cerca de metade deste valor destina-se a apoiar a conservação ativa do lince e do lobo e uma outra parte relevante da referida verba destina-se à aquisição de equipamento para a constituição de dez novas equipas de Vigilantes da Natureza e outras dez equipas para apoiar o Corpo Nacional de Agentes Florestais, numa missão específica de apoio à implementação do Plano-Piloto do Parque Nacional da Peneda-Gerês para a prevenção de incêndios florestais e de valorização e recuperação de habitats naturais. O equipamento destas equipas representa um investimento na ordem dos 1,3 M(euro). O remanescente destina-se a financiar um significativo conjunto de projetos onde a autoridade nacional para a conservação da natureza e biodiversidade está envolvida, estando os mesmos apoiados em financiamento comunitário. O valor total desses investimentos ascende a mais de 6,5 M(euro), destacando-se em particular o projeto que visa a designação das ZEC, que representa mais de metade deste valor.

O essencial da verba restante, o remanescente dos 4,76 M(euro), destina-se a outras entidades que não a autoridade nacional para a conservação da natureza e biodiversidade, destacando-se os municípios integrados no Parque Nacional da Peneda-Gerês, por força da implementação das ações que lhes incumbem, bem como outras entidades envolvidas no respetivo Plano-Piloto deste parque. Também nesta situação estão em causa algumas ações alavancadas em financiamento comunitário, num investimento total de cerca de 2,3 M(euro).

A circunstância que levou à necessidade de intervir com prioridade no Parque Nacional da Peneda-Gerês, e a consequente concretização das ações previstas, deverá permitir reafetar as verbas disponíveis para outros projetos, onde este modelo se pretende replicar.

Note-se que, para 2018, o Fundo Ambiental tem já prevista a consagração de uma verba no valor de 6,25 M(euro) em conservação da natureza e biodiversidade.

5.4 – Programas Internacionais de Financiamento

Portugal dispõe de acesso a um conjunto de programas internacionais onde são enquadráveis projetos e ações no âmbito da conservação da natureza e da biodiversidade, entre os quais se destacam os Fundos Europeus Estruturais e de Investimento (FEEI).

5.4.1 – Quadro de Ações Prioritárias da Rede Natura 2000

O Prioritized Action Framework (PAF) do Continente estabelece as prioridades de intervenção e investimentos do Estado português entre 2014 e 2020, focadas na aplicação das Diretivas Aves e Habitats e, concretamente, na consolidação e gestão da Rede Natura 2000, sendo a referência para o estabelecimento do Acordo de Parceria e das políticas e programação dos FEEI até 2020.

As intervenções prioritárias aí preconizadas estão associadas em grande medida a três áreas: (i) colmatação e revisão do conhecimento sobre a biodiversidade protegida; (ii) gestão da Rede Natura 2000 e valorização das áreas protegidas; (iii) designação de sítios da Rede Natura 2000 no meio marinho, particularmente no off-shore.

5.4.2 – Fundos Estruturais e de Investimento

O Acordo de Parceria – Portugal 2020 «adota os princípios de programação da Estratégia Europa 2020 e consagra a política de desenvolvimento económico, social, ambiental e territorial que estimulará o crescimento e a criação de emprego nos próximos anos em Portugal».

Este Acordo é aplicado pelo Portugal 2020 que engloba o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, o Fundo Social Europeu, o Fundo de Coesão, o Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural, o Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas. O Portugal 2020 é operacionalizado através de 16 Programas Operacionais a que acrescem os Programas de Cooperação Territorial, nos quais Portugal participará a par com outros Estados Membros, dos quais se destacam os seguintes para o financiamento da execução desta Estratégia:

. Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos (POSEUR);

. Programa para o Ambiente e a Ação Climática (LIFE);

. Programa de Desenvolvimento Rural (PDR 2020);

. Programa Operacional MAR 2020 (MAR 2020);

. Horizonte 2020;

. Programa Operacional Competitividade e Internacionalização (COMPETE 2020).

Para a execução da ENCNB 2030, revelar-se-ão determinantes os investimentos que decorram do próximo quadro comunitário de apoio.

5.5 – Fundos e fontes de financiamento nacionais

Destacam-se neste capítulo os meios financeiros, oriundos de fundos nacionais, para o desenvolvimento da presente Estratégia.

5.5.1 – Orçamento das autoridades

As receitas próprias ou provenientes do Orçamento do Estado ou Orçamento Regional têm assegurado o financiamento de meios humanos e de projetos de investimento quando não é possível o recurso a fontes de financiamento alternativas. Está em causa uma panóplia vasta de ações que requerem esforço de investimento e um apoio constante do ponto de vista operacional.

Importa destacar que a autoridade nacional acumula atualmente a missão da conservação da natureza e biodiversidade com a missão da floresta, sendo que os seus recursos humanos dão um apoio transversal a estas duas áreas, a que se somam a caça e a pesca.

Desde o processo de fusão ocorrido em 2012, o ICNF procura criar uma cultura transversal e potenciar sinergias com um modelo de gestão que não destrinça a afetação de recursos para as suas diferentes missões. De igual modo, a gestão dos seus ativos, nomeadamente, áreas protegidas, matas nacionais, reservas de caça e de pesca, integram-se indiferenciadamente ao nível do controlo de gestão, no âmbito global do instituto.

Não obstante se reconhecer que há ações que concorrem para diferentes missões, por exemplo, quando a gestão florestal converge com propósitos conservacionistas em detrimento da produção, é importante que o modelo de gestão evolua para permitir perceber o esforço despendido na gestão dos seus principais ativos e ações.

5.5.2 – Fundo Ambiental

Em funcionamento desde o início de 2017, o Fundo Ambiental, criado pelo Decreto-Lei n.º 42-A/2016, de 12 de agosto, na dependência do membro do Governo responsável pela área do ambiente, tem por finalidade apoiar políticas ambientais para a prossecução dos objetivos do desenvolvimento sustentável, e explicitamente da Agenda 2030, contribuindo para o cumprimento dos objetivos e compromissos nacionais e internacionais, designadamente os relativos à conservação da natureza e biodiversidade, a par com as alterações climáticas, os recursos hídricos e os resíduos.

A gestão integrada das receitas que convergem no Fundo Ambiental tem permitido resolver desequilíbrios em algumas áreas tradicionalmente subfinanciadas, como tem sido o caso da conservação da natureza.

Pretende-se que o recurso ao Fundo Ambiental confira maior estabilidade ao financiamento dos projetos, designadamente aqueles que têm sido prosseguidos pela autoridade nacional para a conservação da natureza e biodiversidade. Tal permitirá também comparticipar projetos, cuja tipologia será previamente especificada pela mencionada autoridade, ainda que estes sejam desenvolvidos por outras entidades diretamente beneficiárias, na medida em que prossigam objetivos que se insiram na sua missão, estejam enquadrados em Planos de Ação de Espécies, ou que se revelem estruturantes à concretização da ENCNB 2030.

Pretende-se recorrer ao Fundo Ambiental para apoiar integralmente projetos que não reúnam condições de elegibilidade em programas de financiamento comunitário, sendo que o fundo poderá participar na contrapartida nacional de projetos que reúnam tais condições.

5.5.3 – Fundo Florestal Permanente

O Fundo Florestal Permanente (FFP) criado pelo Decreto-Lei n.º 63/2004, de 22 de março, e cuja administração está a cargo do ICNF, destina-se a apoiar a gestão florestal sustentável nas suas diferentes valências, em conformidade com o previsto na Lei de Bases da Política Florestal, e visa cumprir os objetivos da Estratégia Nacional para as Florestas (ENF 2015).

5.5.4 – Fundo Azul

O Fundo Azul, criado pelo Decreto-Lei n.º 16/2016, de 9 de março, cuja condução estratégica incumbe ao membro do Governo responsável pela área do mar, prossegue quatro objetivos: o desenvolvimento da economia do mar, a investigação científica e tecnológica, a segurança marítima e a proteção e monitorização do meio marinho.O último objetivo concretiza-se do seguinte modo: i) Garantir o «Bom Estado Ambiental» do domínio público marítimo; ii) Prevenir e combater a poluição do meio marinho; iii) Proteger ou recuperar ecossistemas e biodiversidade marinha; iv) Responder a situações de emergência de salvaguarda dos interesses nacionais marítimos; v) A consciencialização social sobre a importância do mar.

5.5.5 – Programa Valorizar

O Programa de Apoio à Valorização e Qualificação do Destino – Programa Valorizar, aprovado pelo Despacho Normativo n.º 9/2016, de 28 de outubro, é um programa de apoio ao investimento na qualificação do destino turístico Portugal, a cargo do Turismo de Portugal (TdP), que visa a concessão de apoios financeiros a projetos de investimento e a iniciativas que tenham em vista a regeneração e reabilitação dos espaços públicos com interesse para o turismo e a valorização turística do património cultural e natural do país. A administração do Programa está a cargo do TdP.

Destaca-se a criação neste âmbito da Linha de Apoio à Valorização Turística do Interior, pelo Despacho Normativo n.º 16/2016, de 30 de dezembro, que tem por objeto o apoio ao investimento a iniciativas e a projetos com interesse para o turismo, que promovam a coesão económica e social do território, bem como da Linha de Apoio à Sustentabilidade, pelo Despacho Normativo n.º 18/2017, de 24 de outubro.

5.5.6 – Fundo de Inovação, Tecnologia e Economia Circular

O Fundo de Inovação, Tecnologia e Economia Circular, criado pelo Decreto-Lei n.º 86-C/2016, de 29 de dezembro, na dependência do membro do Governo responsável pela área da economia, tem por finalidade apoiar políticas de valorização do conhecimento científico e tecnológico e sua transformação em inovação, de estímulo à cooperação entre instituições de ensino superior, centros de interface tecnológico e o tecido empresarial e de capacitação para um uso mais eficiente dos recursos. Deste modo, preserva a sua utilidade e valor ao longo de toda a cadeia de produção e utilização, nomeadamente, através da eficiência material e energética.

5.5.7 – Papel dos Parceiros

As ações a desenvolver no domínio da conservação da natureza têm sido concretizadas, de uma forma generalizada, no perímetro direto da gestão das autoridades públicas.

Não obstante, estas autoridades têm sido apoiadas na sua missão por outras entidades, nas quais se destacam as ONG, a Academia, os municípios e as próprias empresas.

Essa realidade tem tido maior expressão na gestão de habitats, devendo ser alargada a outras áreas como sejam a conservação ativa de espécies (esta ocorre de forma mais expressiva para alguns grupos de avifauna e também no caso do lince ibérico) e sua monitorização, bem como ações no âmbito do património geológico. O papel estruturante da autoridade nacional para a conservação da natureza e biodiversidade, numa estratégia de envolvimento de outros parceiros, incide na avaliação e ponderação da capacidade (competência e estrutura) de resposta dos parceiros. Compete-lhe ainda o papel determinante na elaboração de especificações técnicas, a definição de condições de habilitação para tais atividades e o apoio na estruturação e identificação de linhas de financiamento.

O papel dos parceiros tem-se mostrado muito importante em matérias como sejam projetos de intervenção em habitats, na concretização de esquemas de monitorização, na produção de informação científica e técnica de suporte a processos de tomada de decisão sobre o SNAC e na sensibilização para a conservação da natureza.

Não obstante, reconhece-se ainda a importância e a necessidade de robustecer a capacidade instalada, para a execução de ações no domínio da conservação da natureza e biodiversidade, por parceiros que complementem a ação da autoridade nacional para a conservação da natureza e biodiversidade.

5.5.8 – Instrumentos económicos

Interessa desenvolver um referencial de enquadramento que desenvolva um pacote articulado de instrumentos económicos e financeiros para a conservação da natureza e biodiversidade a serem concretizados de um modo faseado e num horizonte temporal de médio prazo.

Como instrumentos fiscais há que retomar o estabelecido na Lei das Finanças Locais, que abrange as transferências fiscais para os Municípios em função da superfície do território abrangida por áreas classificadas, através do Fundo Geral Municipal (integrado no Fundo de Equilíbrio Financeiro), nas quais os municípios vêm alocados 5 ou 10 % da dotação o Fundo em função de serem abrangidos até ou por mais de 70 % de áreas classificadas, respetivamente.

5.6 – Principais linhas para um novo paradigma

As origens de financiamento para a conservação da natureza deverão manter-se estáveis no futuro próximo, destacando-se o Estado, diretamente por via do seu orçamento e do Fundo Ambiental.

Antecipa-se que permanecerá um apoio aos municípios, às ONG e às empresas, muito estimulado pela possibilidade de apresentar projetos que possam ser alvo de cofinanciamento comunitário.

As receitas geradas pela conservação da natureza têm um carácter difuso. São geradas a montante pelas atividades dos sectores agrícola e florestal, mas cada vez mais em sectores empresariais que se sustentam mais especificamente nos valores naturais, como sejam as empresas que promovem atividades de turismo de natureza, alojamento a turistas, restauração, etc. O emprego gerado por estas atividades é, em si mesmo, fonte de receita, pela cobrança de impostos sobre o rendimento de empresas e pessoas. Acrescem os impostos municipais que possam incidir sobre o património ou sobre as atividades locais. Há ainda que considerar o rendimento que advém de taxas, rendas por contrapartida da utilização do património edificado e as receitas geradas pela venda de bens e produtos, assim como de serviços associados ao património natural.

Um dos aspetos que importa colmatar diz respeito ao conhecimento efetivo desta realidade económica e financeira. A expectativa que existe para o crescimento da atividade turística, sugere que o Turismo de Natureza possa ser uma das áreas com maior potencial de crescimento. O património natural constitui, aliás, uma das apostas da Estratégia para o Turismo 2027, na medida em que concorre para combater a sazonalidade e promove a valorização do território.

O modelo de financiamento a adotar para a conservação da natureza deve manter a universalidade do acesso ao património natural. Deve considerar a necessidade de prosseguir projetos coerentes e articulados que tenham propósitos claros de concorrer para a promoção e valorização do património natural.

Para além desta consistência, o modelo deve assegurar condições de estabilidade a médio prazo e privilegiar a incidência local. Com efeito, quem está mais próximo do território tem uma melhor capacidade para gerir os desafios locais, porque os identifica e conhece de forma mais completa e pode, de forma mais ágil, adaptar-se a essa realidade. Nesse sentido, a aposta em modelos de cogestão de áreas classificadas constitui um instrumento a privilegiar.

O financiamento com origem no orçamento do Estado (e que hoje se dissemina transversalmente pela plenitude de ações que a autoridade nacional para a conservação da natureza e biodiversidade deve assegurar) deve concentrar-se preferencialmente no apoio aos custos da sua estrutura e esta na parte estruturante da sua ação, designadamente a elaboração de planos e programas que disciplinem a atuação aos mais diferentes níveis, mas também às ações estruturais (infraestruturas e benfeitorias no domínio público nacional), a ações estratégicas (destinadas a lançar novas abordagens de gestão que possam depois ser generalizadas e que visem o seu autofinanciamento), assim como a ações de âmbito transversal ou especial complexidade (como é o caso dos Planos de Ação do Lince ou do Lobo ibérico). Deve também apostar-se de forma firme e decisiva na missão de vigilância ativa e prevenção.

Devem ser criadas condições para criar maior atratividade para o investimento local por parte dos municípios (designadamente nas áreas classificadas e no quadro da concretização de modelos de cogestão, que terão na sua base modelos de valorização do território devidamente articulados e especificados), assegurando que as receitas geradas localmente concorrem para o autofinanciamento da gestão de tais áreas.

Do mesmo modo, deve-se aumentar a atratividade para o investimento pelas empresas e ao abrigo do mecenato. Há uma consciência progressivamente mais vincada sobre os benefícios que decorrem de uma visão de gestão que privilegie a sustentabilidade e a responsabilidade social que deve ser incentivada, pela criação de um conjunto estruturado de oportunidades que possam ser apoiadas e das quais resultem benefícios mútuos.

A avaliação dos instrumentos fiscais deve ser ponderada de forma criteriosa ao nível da Fiscalidade Verde e considerar a estratégia que se pretende induzir. Trata-se de uma avaliação complexa que está por fazer e que deverá considerar o princípio da neutralidade fiscal. Essa análise deve incidir com principal prioridade na participação dos municípios na cogestão de áreas classificadas.

5.7 – Plano de Ação para a Conservação da Natureza e Biodiversidade XXI

A concretização das medidas da ENCNB 2030 deverá assentar num plano geral de mobilização de investimento e despesa, a iniciar em 2018 e a designar como Plano de Ação para a Conservação da Natureza e Biodiversidade XXI, no qual serão refletidas as opções estratégicas e políticas em matéria de conservação da natureza e biodiversidade, assim como identificadas e priorizadas as medidas de concretização a desenvolver, estimados os montantes financeiros a envolver, referenciadas as fontes de financiamento a mobilizar e definidos os indicadores e as entidades responsáveis pela sua concretização.

O Plano de Ação para a Conservação da Natureza e Biodiversidade XXI será elaborado pelo ICNF, em estreita concertação com os demais intervenientes, e em colaboração com o fórum intersectorial para a ENCNB 2030. O Plano de Ação terá como base o conjunto de intervenções que incidem na melhoria do estado de conservação do património natural, na promoção do reconhecimento do valor do património natural e na apropriação dos valores naturais e da biodiversidade pela sociedade, assumindo-se como o instrumento plurianual de referência e de atuação no âmbito da conservação da natureza e da biodiversidade de Portugal.

Tendo presente os objetivos e o horizonte consagrados da ENCNB 2030, o Plano de Ação para a Conservação da Natureza e Biodiversidade XXI será objeto de um acompanhamento continuado, permitindo avaliar os resultados alcançados face aos efeitos esperados, corrigir atempadamente eventuais desvios e conhecer a execução física e financeira por tipologia de intervenção e área de atuação, bem como proceder à sua atualização sempre que as dinâmicas territoriais, os instrumentos estratégicos, de planeamento e financeiros assim o exigirem.

Todavia, este documento não esgotará o seu potencial na interação entre a Estratégia e a gestão das respetivas intervenções, introduzindo um modelo de governança que se pretende mais robusto e fortalecido por via da operacionalização do fórum intersectorial da ENCNB 2030, do acompanhamento continuado e da monitorização, assim como mais integrado, adaptativo e colaborativo.

Este Plano será também um importante instrumento para a preparação do ciclo de programação europeu 2020-2030.

6 – Governação e Acompanhamento da Aplicação da Estratégia

Uma verdadeira responsabilização em matéria de ambiente, e especificamente em termos de conservação da natureza e biodiversidade, implica o reforço da coordenação e articulação entre os diferentes serviços e organismos relevantes neste âmbito. Este constitui, aliás, um dos eixos estratégicos mais relevantes da presente Estratégia, tal como a que a antecedeu.

Complementarmente, o novo quadro de competências em matéria de gestão do espaço marítimo, no âmbito das atribuições da área governativa do mar e respetivas instituições, em particular na necessidade de articulação, coordenação e compatibilização dos instrumentos de ordenamento do espaço marítimo nacional com os programas e planos territoriais e do alinhamento necessário entre a política de preservação da qualidade do meio e dos recursos marinhos e a ENCNB 2030.

O nível essencial para a concretização da Estratégia é o que decorre da orientação política do Conselho de Ministros, sendo que o acompanhamento da implementação das medidas de concretização previstas na ENCNB 2030 requer a criação de uma estrutura multissectorial, promovendo a complementaridade, criando sinergias, racionalizando meios e recursos e assegurando a continuidade que estes processos sempre reclamam.

Nesse sentido, o fórum intersectorial da ENCNB 2030 integra representantes das entidades públicas nacionais com competências no âmbito da conservação da natureza e biodiversidade, bem como da ciência e de tecnologia, com representação ao nível da Administração Central e das Autarquias Locais, sem prescindir da participação das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, prosseguindo uma estratégia territorial abrangente, concertada e adequada às diferentes especificidades geográficas.

Este fórum tem como missão particular assegurar a desejável cooperação institucional, a articulação entre os diversos níveis de governação territorial, bem como o envolvimento dos diversos sectores na participação e concertação necessárias a uma implementação da Estratégia adequada nos diferentes planos, programas e políticas sectoriais e considerando sempre as especificidades geográficas. Em simultâneo, tem, ainda, como desígnio promover a articulação institucional indispensável à melhor representação nacional nas instâncias internacionais e europeias, no âmbito da conservação da natureza e biodiversidade.

O ICNF, enquanto autoridade nacional para a conservação da natureza e biodiversidade, assume particulares responsabilidades na prossecução destas finalidades, que acrescem às da elaboração do Plano de Ação para a Conservação da Natureza e Biodiversidade XXI, no qual se identificam as fontes de financiamento e os recursos financeiros necessários para a implementação da ENCNB 2030, bem como às da respetiva validação e ao acompanhamento da sua execução.

A avaliação da implementação da ENCNB 2030 e dos resultados alcançados que contribuem para a execução das medidas de concretização definidas é realizada no fórum intersectorial, através da adoção dos relatórios intercalar e final que o ICNF deverá elaborar. Estes relatórios são devidamente acompanhados de parecer do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável e têm em consideração os contributos sectoriais dos diferentes ministérios, incluindo a referência expressa sobre a adequação ou a necessidade de revisão dos instrumentos de planeamento estratégico sectoriais existentes.

O envolvimento da sociedade civil nesta fase de acompanhamento da implementação da Estratégia fica assegurado através do convite à participação em sede de consulta pública promovida em relação aos relatórios, quer de avaliação intercalar, quer de avaliação final.

Este processo avaliativo, que se pretende global, sequencial e cumulativo, não pode deixar de considerar outros documentos entretanto elaborados com finalidades análogas e relacionadas com a conservação da natureza e biodiversidade, devendo com estes articular-se e adaptar o respetivo conteúdo. A este título, refiram-se:

. A avaliação promovida no âmbito da Convenção sobre a Diversidade Biológica;

. Os relatórios sobre o estado do ambiente e sobre o estado do ordenamento do território, apresentados pelo Governo à Assembleia da República, os quais traduzem a evolução da respetiva situação de referência e passarão a incluir uma menção específica ao desenvolvimento da presente Estratégia;

. Os relatórios de aplicação das Diretivas Aves e Habitats.

Deverá, de igual modo, esta avaliação apoiar-se, sempre que possível, na análise de indicadores que permitam aferir, com objetividade, a evolução da situação das espécies, dos habitats e dos ecossistemas, bem como do património geológico, assim como a eficácia dos planos e programas aplicados e a pertinência da elaboração de planos de ação adicionais.

Como resultado, pretende-se que esta avaliação convirja para a formulação de recomendações destinadas a aperfeiçoar a execução da Estratégia, indicando as medidas de concretização adequadas que importa adotar, rever ou incrementar, tendo em vista a prossecução dos objetivos visados.

QUADRO SÍNTESE

(ver documento original)»